Acórdão nº 1052/09.3TBAMD-C.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelJORGE DIAS
Data da Resolução23 de Fevereiro de 2021
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção Cível.

1 - Nos autos principais de expropriação, de que este recurso é apenso, foi proferida sentença que fixou o valor da indemnização a pagar pela expropriante “EP – Estradas de Portugal, S.A.” - agora, “Infra-Estruturas de Portugal, S.A.” - à expropriada “Alves Ribeiro, S.A.” em € 11.695.532,00.

2 - Desta sentença, foram interpostos recursos pela expropriante e pela expropriada.

3 - Por acórdão deste Tribunal da Relação de Lisboa de 24 de Janeiro de 2019, foi julgado improcedente o recurso interposto pela expropriante “EP – Estradas de Portugal, S.A.”; e julgado parcialmente procedente o recurso interposto pela expropriada “Alves Ribeiro, S.A.”, tendo sido mantido o valor da indemnização fixado na sentença recorrida e decidido: “deverá a atualização da indemnização ser feita até à notificação do despacho para o levantamento da quantia depositada, passando a incidir a atualização, daí em diante, sobre a diferença entre o montante fixado na sentença final e o montante já disponibilizado”.

4 - Por despacho proferido em 25/03/2019, foi determinada a notificação da entidade expropriante para depositar os montantes em dívida e juntar ao processo nota discriminada, justificativa dos cálculos da liquidação de tais montantes, nos termos do art. 71º, nº 1 do Código das Expropriações (aprovado pela Lei nº 168/99, de 18 de Setembro, doravante designado por CE).

5 - Em 05/04/2019, a entidade expropriante depositou a quantia de € 4.600.898,61 que, em seu entender, corresponde à quantia em dívida, juntando, em requerimento de 08/04/2019, documento contendo “Cálculo da Atualização da indemnização (art. 24º do CE)”, por si elaborado, e dois documentos emitidos pelo Instituto Nacional de Estatística, onde constam, nomeadamente, os Índices de Preços no Consumidor exceto habitação.

6 - A expropriada veio impugnar o montante depositado, alegando, em síntese útil, que: discorda do cálculo efetuado pela expropriante, colocando em causa a aplicação informática colocada na internet pelo INE; e, o cálculo da expropriante assenta num erro, porquanto considera como valor a atualizar o valor indemnizatório em singelo, deduzido do valor cujo levantamento foi autorizado, e não o valor indemnizatório atualizado até essa data.

7 - Foi notificada a entidade expropriante para responder e apresentar prova no prazo de 10 dias, nos termos e para os efeitos previstos no art. 72º, nº 2 do CE.

8 - A entidade expropriante veio responder, mantendo o valor por si anteriormente indicado e defendendo que: a plataforma de cálculo disponibilizada pelo INE é utilizada constantemente nas atualizações em processos de expropriação; e, nos cálculos que apresentou, a entidade expropriada subtrai, de forma errónea, o valor fixado na decisão final já atualizada ao valor cujo levantamento foi autorizado, quando o correto seria o de subtrair o valor fixado na decisão final e o valor cujo levantamento foi autorizado.

9 - Após ser notificada das diligências efetuadas pelo tribunal a quo junto do INE para cálculo por esta entidade dos valores atualizados e respetivos índices de preços no consumidor exceto habitação, veio a expropriada, em requerimento de 13/01/2020, impugnar o montante indicado pelo INE, alegando que: a atualização elaborada pelo INE considera índices negativos da evolução dos preços, o que conduz à redução de um valor total de € 2.647.024,51 da indemnização devida à Expropriada; na atualização das indemnizações devidas em expropriações por utilidade pública não podem ser considerados os índices negativos na evolução do índice de preços no consumidor, pois a aplicação desses índices reduz efetiva e materialmente o valor da indemnização devido aos expropriados, desrespeitando assim a justiça indemnizatória que é devida aos expropriados; concluindo que: “porque no cálculo da atualização efetuada pelo INE foram considerados os índices de evolução negativos, a que correspondeu uma dedução de € 2.647.024,51 ao valor da indemnização devida à Expropriada, haverá que acrescer este valor ao da indemnização atualizada apresentado pelo INE e defendido pela Expropriante (€ 12.699.396,98 – cfr. Requerimento da Expropriante de 08.04.2019). Assim, € 12.699.396,98 + € 2.647.024,51 = € 15.346.421,49.”, sendo este último o valor da indemnização devidamente atualizada.

10 - Por despacho de 07/02/2020, foi decidido o incidente de impugnação do montante depositado previsto no art. 72º, nº 2 do CE, nos seguintes termos: “Decisão quanto à impugnação do montante depositado (artigo 72° do Código das expropriações) Na sequência do acórdão que fixou, a final, a indemnização pela expropriação, a entidade expropriante veio juntar guia de depósito do montante de 4.600.898,61 euros e, nos termos do artigo 24.° e 71.° do Código das Expropriações, apresentar o cálculo atualizado da indemnização (fls. 1814).

A entidade expropriada veio apresentar discordância quanto ao cálculo efetuado pela entidade expropriante, colocando em causa uma obscura e indecifrável aplicação informática colocada na internet, ainda que pelo INE.

Em segundo lugar, e caso assim não se entenda, o cálculo da entidade expropriante assenta num erro porquanto considera como valor a atualizar o valor indemnizatório em singelo, deduzido do valor cujo levantamento foi autorizado e não o valor indemnizatório atualizado até essa data.

A entidade expropriante respondeu, ao abrigo do artigo 72.°, n°.2 do Código das expropriações, dizendo que a plataforma de cálculo disponibilizada pelo INE é utilizada constantemente nas atualizações em processos de expropriação. Diz que a entidade expropriada, subtrai, de forma errónea, o valor fixado na decisão final já atualizada ao valor cujo levantamento foi autorizado, quando o correto seria o de subtrair o valor fixado na decisão final e o valor cujo levantamento foi autorizado.

* Sobre a questão do cálculo efetuado com base no índice de preços ao consumidor, foi determinada a notificação do INE para informar se as ferramentas de cálculo disponibilizadas no sítio de internet permitem obter um resultado fidedigno e para ela própria proceder à atualização do montante indemnizatório.

O INE veio informar que a ferramenta de cálculo permite alcançar um resultado fidedigno, apresentando os resultados dos valores atualizados (fls. 1842 e 1843).

Apesar do lapso do tribunal no despacho quanto à apresentação dos montantes de referência, foi proferido despacho a 22-11-2019 a verificar que o INE apresentou, na atualização que identificou como número 3, um cálculo com a metodologia mais correta, que segue o modelo defendido pela própria entidade expropriante.

Perante a incompreensão da entidade expropriada pelas divergências nos cálculos, o tribunal solicitou novos esclarecimentos, tendo o INE apresentado um cálculo detalhado, concretizando o erro no cálculo efetuado pela expropriada. (fls. 1859 e ss.). Explica que o resultado do cálculo corresponde ao valor apurado.

Em resposta, a entidade expropriante parece assumir a existência do erro no cálculo efetuado, dando razão, nesta parte, ao INE.

Não existem mais diligências que se afigurem necessárias à decisão (artigo 72.° do Código das expropriações).

Cumpre apreciar e decidir.

O artigo 24.° do Código das Expropriações estabelece o seguinte: 1 - O montante da indemnização calcula-se com referência à data da declaração de utilidade pública, sendo atualizado à data da decisão final do processo de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação, (sublinhado nosso).

2 - O índice referido no número anterior é o publicado pelo Instituto Nacional de Estatística relativamente ao local da situação dos bens ou da sua maior extensão.

3 - Nos casos previstos na parte final do n.° 8 do artigo 5.° e no n.° 6 do artigo 13.°, a atualização do montante da indemnização abrange também o período que mediar entre a data da decisão judicial que fixar definitivamente a indemnização e a data do efetivo pagamento do montante atualizado.

Relativamente às questões suscitadas pela entidade expropriada, concluímos o seguinte:

  1. Das explicações apresentadas pelo INE (fls. 1843), tendo em conta a simulação da atualização mês a mês ou anual (fls. 1861 verso e ss.), conclui-se pela aplicação de um fator de atualização de 1.01399346344342 para o primeiro período de outubro de 2007 a 2009 e de 1.09581151341848 para o segundo período de abril de 2009 a janeiro de 2019. Concatenando estes cálculos com aqueles efetuados pela entidade expropriante, verifica-se que a mesma utiliza, para o segundo período de abril de 2009 a janeiro de 2019, de um fator de atualização de 1.09811756029510. Tendo em conta o índice de preços no consumidor Continente, excluindo a habitação, consideramos que o fator de atualização correto é aquele que é utilizado pelo INE, pelo que importa fazer a correção do cálculo.

  2. Relativamente à segunda questão suscitada pela entidade expropriante, consideramos que a mesma tem razão. Ou seja, o valor de base para o cálculo do segundo montante de atualização não é o valor da indemnização fixada na decisão final mas o valor atualizado à data de abril de 2009, ou seja, o valor de 11.965.532,00 euros, pelo que importa determinar a retificação do cálculo atualizado.

  3. De uma forma extemporânea, tendo em conta o prazo previsto no artigo 71.°, n.°3 do Código das Expropriações, a entidade expropriada vem colocar o problema da consideração pelo INE dos índices negativos da evolução dos preços, e que levam a uma redução da indemnização de 2,6 milhões de euros. Ou seja, entende que só devem ser atendidos os índices positivos da evolução dos preços.

Consideramos que, ainda assim, a entidade expropriada não tem razão.

O que o artigo 24.° do Código das Expropriações estabelece é que a indemnização deve ser atualizada à data da decisão final do processo de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação. A evolução pode ser positiva ou negativa...

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