Acórdão nº 27885/17.9T8LSB.L1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelCHAMBEL MOURISCO
Data da Resolução13 de Janeiro de 2021
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Processo n.º 27885/17.9T8LSB.L1.S2 (Revista excecional) - 4ª Secção Acordam na formação a que se refere o n.º 3 do artigo 672.º do Código de Processo Civil da Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA na ação declarativa emergente de contrato de trabalho, com processo comum, que instaurou contra as sociedades FRK - SERVIÇOS DEMARKETING NA INTERNET, S.A., ACTUALSALES GROUP, SGPS, S.A., PHT PORTUGAL, UNIPESSOAL, LDA. e BB, veio interpor recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, nos termos conjugados dos artigos 671.º, n.º 1 e 3, e 672.º, n.º 1, alínea c), todos do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi n.º 6 do art.º 81.º do Código de Processo do Trabalho.

  1. Apreciado liminarmente o recurso, foi determinado pelo relator que, após trânsito, se proceda à remessa do processo à distribuição pela formação a que se alude no n.º 3 do art.º 672º do CPC, tendo em vista a apreciação dos pressupostos de admissibilidade do recurso de revista excecional interposto pelo Autor/Recorrente AA relativamente ao segundo segmento de recurso, atinente à “(…) Absolvição da Recorrida no pagamento dos diferenciais de subsídio de férias, por se considerar que as comissões não integram a base de cálculo do subsídio de férias (€ 18.334,54)”.

    3.

    No despacho liminar foi ainda considerado que o recurso é tempestivo; que o recorrente tem legitimidade; que se verificam os requisitos do valor da ação e da sucumbência e ainda a existência de dupla conforme.

  2. Distribuído o processo a esta formação, cumpre indagar se estão preenchidos os pressupostos para a admissibilidade da revista excecional referidos na alínea c) do n.º 1 do artigo 672.º do Código de Processo Civil.

  3. A revista excecional é um verdadeiro recurso de revista concebido para as situações em que ocorra uma situação de dupla conforme, nos termos do artigo 671.º, n.º 3, do Código de Processo Civil.

    A admissão do recurso de revista, pela via da revista excecional, não tem por fim a resolução do litígio entre as partes, visando antes salvaguardar a estabilidade do sistema jurídico globalmente considerado e a normalidade do processo de aplicação do Direito.

    Assim, só é possível a admissão do recurso pela via da revista excecional se estiverem preenchidos os pressupostos gerais de admissão do recurso de revista e se esta não for possível pela existência da aludida situação de dupla conforme.

  4. Nos presentes autos, como resulta do despacho liminar estão preenchidos os pressupostos gerais de admissibilidade do recurso decorrentes do artigo 629.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, sendo certo que a decisão recorrida confirmou no segmento referido, sem mais, a decisão proferida pela 1.ª instância, pelo que estamos perante uma situação de dupla conforme, nos termos do n.º 3 do artigo 671.º do Código de Processo Civil.

  5. O recorrente invocou como fundamento da admissão do recurso o disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 672.º do Código de Processo Civil, com o seguinte enquadramento: «Absolvição da Recorrida no pagamento dos diferenciais de subsídio de férias, por se considerar que as comissões não integram a base de cálculo do subsídio de férias (€ 18.334,54); Tal decisão (que manteve a anteriormente proferida em 1.ª instância) também se encontra em contradição com (pelo menos) outro acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, já transitado em julgado, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, mais concretamente (cfr. Doc. 3 que se junta): Acórdão do TRP de 07-07-2016, P. 2201/15.8T8VNG.P1, in www.dgsi.pt): “Auferindo o A. uma retribuição mista, composta por uma parte fixa e outra variável -as comissões - que consubstanciam uma parte considerável daquela e são auferidas na razão direta do número de clientes angariados pelo A., tais prestações retributivas são uma contrapartida do modo específico da execução do trabalho, posto que estão diretamente ligadas à sua efetiva prestação e, assim, tal como ocorre com a retribuição de férias, também o subsídio de férias deve incluir a média das comissões auferidas pelo A. nos doze meses anteriores.” Também este aresto se encontra em total contradição com o acórdão sub judice, sendo certo que os casos são rigorosamente idênticos: 1) Tanto naquele caso, como neste, a retribuição do trabalhador era composta por uma parte fixa e outra variável, sendo esta constituída por comissões.

    2) Naquele aresto entendeu-se que as comissões configuram uma contrapartida do modo específico da execução do trabalho, pelo que integram a base de cálculo do subsídio de férias (artigo 255.º, n.º 2, do CT de 2003 e artigo 264.º, n.º 2 do CT de 2009); 3) Já no acórdão sub judice entendeu-se que as comissões não configuram uma contrapartida do modo específico da execução do trabalho, pelo que não integram a base de cálculo do subsídio de férias (artigo 255.º, n.º 2, do CT de 2003 e artigo 264.º, n.º 2 do CT de 2009; Assim, é admissível recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 672.º, n.º 1, alínea c) do CPC, aplicável ex vi n.º 6 do art.º 81.º do CPT.» Após este enquadramento, apresentou as suas alegações, tendo concluído: «… c) Vem o Recorrente também interpor revista da absolvição da Recorrida no pagamento dos diferenciais de subsídio de férias, tendo-se considerado que as comissões não integram a base de cálculo do subsídio de férias (€ 18.334,54), o que está em contradição com (pelo menos) outro acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, mais concretamente o Acórdão do TRP de 07-07-2016 (P. 2201/15.8T8VNG.P1, in www.dgsi.pt), pelo que é admissível revista nos termos do artigo 672.º, n.º 1, alínea c) do CPC, aplicável ex vi n.º 6 do art.º 81.º do CPT.

    … m) Também merece reparo a decisão de manter a absolvição da Recorrida no pagamento das diferenças a título de subsídio de férias, por se entender que as comissões não integram a base de cálculo desse subsídio, pois supostamente não configuram “contrapartida do modo específico da execução do trabalho” (cfr. artigo 264.º, n.º 2 do CT2009 e artigo 255.º, n.º 2 do CT2003), mas tão-só “modo específico de retribuir o trabalho”.

    1. Parece-nos desacertado tal argumento, o qual confunde realidades distintas: o que configura apenas “um modo específico de retribuir o trabalho” seria, por exemplo, um prémio de desempenho, o qual não está minimamente ligado às funções que o trabalhador exerce, mas tão-só ao seu desempenho, o mesmo se aplicando, por exemplo, a um bónus extraordinário, atribuído à generalidade dos trabalhadores devido aos bons resultados da empresa.

    2. Porém, as comissões não podem ser colocadas neste mesmo plano, pois apenas são praticadas no caso de trabalhadores que têm com funções angariar negócio para a sua entidade empregadora, sendo remunerados em função disso.

    3. Portanto, s.m.o. as comissões não se tratam de um simples “modo específico de retribuir o trabalho” (isso seria o caso de um simples prémio de desempenho), mas sim de uma verdade “contrapartida do modo específico da execução do trabalho”, na medida em que faz parte das funções do trabalhador angariar negócio e é essa a ratio das comissões.

    4. Desta forma, é devido ao Recorrente a título de diferencial do subsídio de férias pago ao longo da relação (integração no respetivo cálculo dos valores médios das quantias auferidas a título de comissões) um montante total não inferior a € 18.334,54, impondo-se tal condenação.» (Fim da transcrição parcial das conclusões do recorrente) 8.

    Vejamos: Como já se referiu, a recorrente invoca como fundamento da admissão do recurso o disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 672.º do Código de Processo Civil, que refere o seguinte: 1 - Excecionalmente, cabe recurso de revista do acórdão da Relação referido no n.º 3 do artigo anterior quando: … c) O acórdão da Relação esteja em contradição com outro, já transitado em julgado, proferido por qualquer Relação ou pelo Supremo Tribunal de Justiça, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, salvo se tiver sido proferido acórdão de uniformização de jurisprudência com ele conforme.

    Abrantes Geraldes (Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2018, 5.ª Edição, pág. 383) refere que esta terceira exceção à regra da irrecorribilidade em situações de dupla conforme está ligada ao vetor da uniformidade jurisprudencial e da certeza na aplicação do direito.

    O citado autor acrescenta que «A coerência interpretativa é promovida pela verificação de costumes jurisprudenciais ou de jurisprudência constante ou consolidada, o que determina que certos impulsos em sentido divergente sejam...

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