Acórdão nº 131502/16.0YIPRT.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelMARIA DA GRAÇA TRIGO
Data da Resolução17 de Outubro de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1. AA, S.A.

intentou procedimento de injunção contra BB - Investimentos Imobiliários, Lda.

, peticionando o pagamento do montante total global de € 5.386.603,04 (cinco milhões trezentos e oitenta e seis mil seiscentos e três euros e quatro cêntimos), sendo que € 3.843.680,35 (três milhões oitocentos e quarenta e três mil seiscentos e oitenta euros e trinta e cinco cêntimos) correspondem a capital e € 1.542.922,69 (um milhão quinhentos e quarenta e dois mil novecentos e vinte e dois euros e sessenta e nove cêntimos) a juros moratórios vencidos; peticionando ainda os juros moratórios que se vencerem até efectivo e integral pagamento, calculados à taxa dos juros comerciais, acrescidos de juros calculados à taxa de 5% desde a aposição de fórmula executória, de acordo com o art. 13º, alínea d), do Decreto-Lei nº 269/98, de 1 de Setembro.

Alegou para o efeito e em síntese que, no exercício da sua actividade comercial de construção de edifícios, prestou e vendeu à requerida, por solicitação desta, diversos serviços e produtos que se encontram discriminados, em conformidade com o acordado pelas partes, nas facturas que identifica no requerimento inicial, algumas com pagamento parcial, permanecendo a requerida em falta na quantia de € 3.843.680,35 a que acrescem os respectivos juros de mora.

Devidamente citada veio a R. deduzir oposição, na qual invocou em síntese que, por contratos celebrados em 15/09/2010, 19/07/2011, 23/08/2011 e 14/09/2011, a requerente acordou com a requerida na “dação em pagamento àquela dos imóveis que identifica para extinção das dívidas desta em conta-corrente”, e, que nos termos daqueles contratos, a requerente declarou desde logo extinta, por pagamento, a dívida pelos montantes do valor atribuído a cada imóvel, num total de € 5.639.000,00. As escrituras de dação em pagamento seriam outorgadas no prazo de doze meses, a contar da celebração de cada um dos contratos; passando a requerente a dispor daqueles prédios como sendo sua possuidora e legítima proprietária; não havendo ainda a requerente transmitido a seu favor os prédios entregues em dação, por não poder pagar o IMT respectivo, sendo que, à data, o Presidente do Conselho de Administração da A. era também gerente da R. Decorridos que foram os diversos prazos de doze meses sem que a A. marcasse qualquer das escrituras de dação em pagamento, por não dispor dos meios financeiros necessários ao pagamento do IMT, a ora A. pediu à ora R. que lhe outorgasse procuração concedendo-lhe poderes para realizar as escrituras quando lhe fosse a ela conveniente sem ter de despender, em prazo certo, as quantias correspondentes ao IMT devido, ao que a requerida anuiu, e a requerida outorgou, em 13/05/2013, a favor do indicado Presidente do Conselho de Administração da A. procuração com poderes bastantes, mantendo-se os prédios formalmente na titularidade da requerida. Entre requerente e requerida vigorava um “contrato de conta-corrente, com débitos e créditos mútuos, até à apresentação pela requerente do primeiro Plano Especial de Revitalização em 24/05/2012” e, em conformidade, “não só o valor das facturas individualmente consideradas não seria exigível pela requerente à requerida, mas apenas o respectivo saldo ao tempo do encerramento”, “como, aplicando o valor dos prédios entregues em dação ao saldo alegadamente em dívida, a requerida nada deve”.

Invocou ainda a R. a prescrição dos juros vencidos antes de cinco anos a contar da data da sua citação para os termos da injunção. Concluiu que deverá o peticionado pela requerente improceder, devendo a oposição ser julgada totalmente procedente e absolvendo-se a requerida do pedido.

A A. respondeu à matéria da excepção, através do requerimento de fls. 102 e segs. e em sede de audiência prévia (a fls.143 e segs.), invocando em resumo que os indicados contratos de “dação em pagamento” são simulados pois as declarações negociais neles apostas não reflectem a vontade real das partes, sendo que a A. nunca quis extinguir a dívida da R., tendo as partes apenas em vista ocultar das instituições de crédito o passivo da R. que dificultaria o acesso desta ao crédito, essencial para a prossecução do seu objecto social.

Acresce que, em 02/04/2013, procurando uma solução para o pagamento da dívida da R., as partes desenharam então uma forma de garantir pelo menos o pagamento parcial da dívida, acordando que a R. transmitiria para a A. os bens imóveis constantes das dações em pagamento ora impugnadas, assim como de outros imóveis, mas desta vez atribuindo aos imóveis valores inferiores, de harmonia com o seu real valor de mercado.

Concluindo a A. pela simulação absoluta dos contratos de dação e invocando a respectiva nulidade. E mais alegando que, entendendo-se que as dações em cumprimento sub judice são válidas e não foram revogadas tacitamente pelo contrato celebrado a 02/04/2013, sempre teria de se considerar que lhes são aplicáveis exigências de forma, em virtude de terem por objecto a transmissão de bens imóveis; e mais teria de se considerar que a dívida nunca se extinguiu, uma vez que a R. não satisfez a prestação que estava a seu cargo, transmitindo para a A. a propriedade dos imóveis. Concluiu que deve a alegada excepção de cumprimento improceder.

Por sentença de fls. 679 foi proferida a seguinte decisão: “Por todo o exposto: 4.1. Julga-se parcialmente procedente a acção e procedente a excepção de prescrição de juros deduzida pela ré e, em consequência: 4.1.1. Condena-se a ré a pagar à autora a quantia de € 2.216.646,12 (dois milhões duzentos e dezasseis mil, seiscentos e quarenta e seis euros e doze cêntimos), referente às facturas nº 2010/…3, nº 2010/1…2, nº 2010/1…5, nº 2010/1…6, nº 2010/2…5, nº 2010/2…0, nº 2010/2…5 e nº 2010/3…4; 4.1.2. Condena-se a ré a pagar à autora os juros vencidos e vincendos, calculados às taxas legais estabelecidas para os créditos comerciais, sobre aquela quantia, devidos desde 12/01/2012 até efectivo e integral pagamento; 4.2. Absolve-se quanto ao mais a ré dos pedidos deduzidos.” Inconformadas, A. e R. interpuseram recurso para o Tribunal da Relação de Guimarães, pedindo a alteração da decisão relativa à matéria de facto e a reapreciação da decisão de direito.

Por acórdão de fls. 813 foi alterada a matéria de facto e, a final, proferida a seguinte decisão: “Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação, em julgar improcedente o recurso de apelação da Autora e parcialmente procedente o recurso de apelação da Ré, pelos fundamentos acima expostos, condenando-se a Ré a pagar à Autora a quantia de € 495 071,60 (nesta parte se revogando e alterando a sentença recorrida), acrescida dos juros de mora vencidos e vincendos, calculados às taxas legais estabelecidas para os créditos comerciais, sobre aquela quantia, e em tudo o mais se mantendo o decidido.

Custas pela Autora e Ré, na proporção dos respectivos decaimentos em 1ª e 2ª instâncias.

*** Julga-se verificada a litigância de má fé da Autora na causa, fixando-se em 7 UCS o valor da multa legal.” 2.

Veio a R. interpor recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, formulando as seguintes conclusões: “I - O presente recurso tem por objecto o acórdão proferido em 2018.10.18, na parte em que condenou a Ré a pagar à Autora a quantia de € 495.071,60, acrescido de juros de mora vencidos e vincendos, calculados às taxas legais estabelecidas para os créditos comerciais sobre aquela quantia.

II - No acórdão proferido, o Tribunal a quo julgou improcedente o recurso de apelação da Autora e parcialmente procedente o recurso de apelação da Ré, condenando a Ré a pagar à Autora a quantia de € 495.071,60 (nesta parte revogando e alterando a sentença recorrida), acrescida dos juros de mora vencidos e vincendos, calculados às taxas legais estabelecidas para os créditos comerciais, sobre aquela quantia, e em tudo o mais mantendo o decidido.

III - Conforme decorre da fundamentação do acórdão, a quantia que o Tribunal ora recorrido condenou a Ré a pagar à Autora - € 495.071,60 - é referente às facturas n.º 2011/4…0, 2011/4…1, 2011/4…3 e 2011/4…4, as quais, de acordo com o entendimento do mesmo Tribunal, por serem posteriores aos contratos de dação em cumprimento, não poderiam considerar-se extintas por aqueles.

III - Acontece que a Ré havia sido absolvida, pela sentença de primeira instância, do pagamento das referidas facturas, não tendo nenhuma das partes recorrido da sentença quanto a essa parte (cfr. Conclusão I das alegações de recurso apresentadas pela Recorrente e cfr. pontos 2, 3, 8, 9 e 10 das conclusões das alegações de recurso apresentadas pela Recorrida).

IV - Com efeito, a quantia de € 2.216.646,12, em que a Ré havia sido condenada, era referente apenas às facturas n.º 2010/…3, n.º 2010/1…2, n.º 2010/1…5, n.º 2010/1…6, n.º 2010/2…5, n.º 2010/2…0, n.º 2010/2…5 e n.º 2010/3…4 e foi dessa parte apenas que a Ré recorreu; e a Autora, por sua vez, recorreu apenas da sentença na parte em que absolveu a Ré do pagamento da totalidade das facturas n.ºs 3…1/2010, 3…2/2010 e 4…4/2010.

V - Ora, nos termos do disposto no art.º 635.º, n.º 4, do Código de Processo Civil, as conclusões da alegação delimitam o objecto do recurso e, por conseguinte, as questões de que o Tribunal pode tomar conhecimento.

VI - Atento o exposto, o Tribunal a quo, ao condenar a Ré a pagar à Autora a quantia de € 495.071,60, relativa às facturas 2011/4…0, 2011/4…1, 2011/4…3, 2011/4…4, não sendo objecto de nenhum dos recursos interpostos, conheceu de questão de que não podia tomar conhecimento.

VII - Com efeito, o Tribunal a quo, no acórdão recorrido, considerou extinta toda a alegada dívida respeitante às facturas peticionadas nos presentes autos, com excepção das facturas 2011/4…0, 2011/4…1, 2011/4…3, 2011/4…4, ou seja, considerou extinta a alegada dívida relativa a todas as facturas em cujo pagamento a Recorrente havia sido condenada pela primeira instância - as quais, conforme resulta da sentença, não incluíam as...

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