Acórdão nº 20324/16.4T8PRT-A.P2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Julho de 2019

Magistrado ResponsávelOLIVEIRA ABREU
Data da Resolução04 de Julho de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – RELATÓRIO Por apenso aos autos de execução de sentença em que são exequentes, AA e BB, a executada CC S.A. apresentou oposição por embargos.

Articulou, com utilidade, que os embargados/exequentes litigam de forma abusiva e contra a s regras da boa-fé porque omitem parte da sentença exequenda, na medida em que, considerando o que da mesma resulta, a embargante/executada tem de efectuar os pagamentos reclamados pelos embargados/exequentes, mas não nos termos que são peticionados.

Na liquidação efectuada os embargados/exequentes requerem o pagamento da quantia de €2.745,10 a título de juros compulsórios, mas tal sanção não é devida porque a embargante/executada não se encontra em qualquer incumprimento, sendo que mesmo que assim não fosse, apenas serão devidos juros desde o trânsito em julgado da sentença, o que só ocorreu em 12 de Setembro de 2016, importando, assim, ser reduzida para €126,04 a quantia peticionada.

Invoca também a inexequibilidade da sentença referindo que do título exequendo resulta que em consequência da anulação do negócio, então declarada, assiste aos embargados/exequentes o direito de pedir a restituição da quantia entregue, no entanto, assiste à embargante/executada, da mesma forma, o direito de exigir a entrega da fracção objecto do negócio, pois, estão em causa obrigações recíprocas.

Na sequência da sentença a embargante/executada enviou aos embargados/exequentes uma carta registada com a/r na qual solicitava uma vistoria ao imóvel, para que lhe fossem restituídas as chaves e entregue a fracção e ainda para proceder ao pagamento aos embargados/exequentes da quantia que lhes era devida, mas não obteve qualquer resposta.

Até hoje os embargados/exequentes recusam-se a desonerar e a entregar à embargante/executada a fracção livre de pessoas e bens, donde, é inexequível a sentença nos moldes peticionados pelos embargados/exequentes.

Conclui pedindo a procedência dos embargos com a extinção da execução.

Os embargados/exequentes contestaram alegando que os juros peticionados são devidos e estão bem contabilizados porque somente a 2ª Ré interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, limitado à questão da consideração de terceiro de boa-fé para efeitos de manutenção, ou não, da hipoteca sobre o imóvel cuja compra e venda foi anulada.

Mais referem que, contrariamente ao que é alegado na petição inicial, o pagamento pela embargante/executada aos embargados/exequentes da quantia exequenda não é a contraprestação da entrega do imóvel livre de pessoas e bens, não existindo por isso qualquer sinalagma funcional no cumprimento destes deveres de restituição, sendo que estão inteiramente disponíveis para proceder à entrega do imóvel.

Assim, visando a execução, o pagamento da quantia devida a título do preço do imóvel e respectivos juros, não existe fundamento legal para obstar à mesma.

Conclui pugnando pela improcedência dos presentes embargos.

Calendarizada e realizada a audiência final foi proferida sentença, em cujo dispositivo se consignou: “Pelo exposto julgo os presentes embargos parcialmente procedentes, determinando o prosseguimento da execução apenas para cobrança da quantia de €7.500,00 acrescida dos juros de mora contados à taxa de juros prevista para os juros civis (4%) desde a data do trânsito em julgado do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto acrescidos dos juros compulsórios previstos no artº. 829º. A nº. 4 do CC. Custas por embargante e embargados na proporção do decaimento. Notifique.” Inconformados, os Embargados/Exequentes recorreram de apelação, tendo a Embargante/Executada apresentado contra alegações interpondo recurso subordinado, ao que os Embargados/Exequentes reponderam.

O Tribunal a quo conheceu dos interpostos recursos, proferindo acórdão em cujo dispositivo foi consignado: “Face ao exposto e na procedência dos recursos aqui interpostos pelos apelantes AA e BB e CC Lda., respectivamente, altera-se do seguinte modo a decisão recorrida: Julgam-se os presentes embargos improcedentes por não provados, determinando o prosseguimento da execução para os seguintes efeitos: 1º) Para restituição do preço e demais encargos antes melhor identificados no ponto 1 dos factos provados; 2º) Para cobrança da quantia de €7.500,00 acrescida dos juros de mora contados à taxa de juros prevista para os juros civis (4%) desde a data do trânsito em julgado do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto acrescidos dos juros compulsórios previstos no art.º 829º-A nº 4 do Código e contados até ao dia 11 de Maio de 2016.

As custas são a cargo da parte vencida em cada um dos recursos (cf. art.º527º, nºs 1 e 2 do CPC).” É contra esta decisão que a Embargante/Executada/CC S.A., se insurge, interpondo recurso de revista, formulando as seguintes conclusões: “I. O fim e os limites da execução são definidos pelo título executivo.

  1. Para que a sentença possa servir de base à execução, não é necessário que condene no cumprimento de uma obrigação, bastando que esta obrigação que se pretende executar dela derive implicitamente (cfr. Ac. do STJ in CJ STJ 1999 II).

  2. Não sendo de excluir que se possa recorrer à parte motivadora da sentença para reconstituir e fixar o verdadeiro conteúdo da decisão (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9/5/1996 in BMJ 457 263).

  3. In casu, na parte dispositiva final, a sentença dada à execução omite a condenação da exequente na restituição da fração à executada, apenas ordenando “o cancelamento da respectivo registo de propriedade a favor dos autores...”.

  4. Para além do cancelamento do registo de propriedade a favor dos exequentes referido no segmento decisório, na parte da motivação (fundamentação) a questão da restituição da fração é tratada direta e expressamente quando aí se consigna que: - “A regra geral sobre os efeitos da declaração de nulidade está consagrada no art.ª 289º. nº. 1 do Código Civil, segundo a qual a mesma tem efeito retroativo, devendo ser restituído tudo o que tiver sido prestado…”, (...) - “por força da destruição do negócio de compra e venda operada pelo artº. 289º. do CC, e reflexamente o negócio constitutivo da hipoteca, (…) sendo agora tal hipoteca ineficaz perante a 1ª. ré, a quem se devolve a fracção em causa, tudo se passando como se não tivessem existido tais negócios)” e mais à frente “sendo a anulabilidade declarada, e tendo esta efeitos retroactivos nos termos do artº. 289º. nº. do CCivil, …, tem como efeitos não só a “destruição” do acto ( devolvendo-se a propriedade do imóvel à esfera jurídica da 1ª. ré), como também o cancelamento da inscrição de propriedade a favor dos autores …”, VI. Assim, e tendo presente o disposto no art.º 289 nº1 do C. Civil donde dimana a repristinação das coisas ao estado anterior à celebração do inválido acordo, tendo por isso cada uma das partes de restituir tudo o que, a tal título, recebeu, impõe-se à Exequente, aqui Recorrida, a obrigação de devolver a fração à Executada, e a esta, por seu turno, devolver as importâncias que por ela lhe foram pagas, o que deve ser efetuado de forma simultânea.

  5. Significa que se atendermos ao próprio contexto do título oferecido à execução, nomeadamente através dos seus próprios fundamentos, a restituição simultânea da fração, objeto do contrato está compreendida no próprio título executivo – vide neste sentido o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 9/5/1996 in BMJ 457 263.

  6. Porquanto em função da aplicação do regime do art.º 289 n.º1 do C. Civil e por força do contexto (fundamentação) da sentença (título executivo) está implícito que a condenação abrangeu também a restituição simultânea da fração objeto do contrato de compra e venda anulado.

  7. E sendo assim, é lícito em sede de oposição à execução, a executada aqui recorrida, invocar ao abrigo dos art.ºs 289 nº 1 e 290 nº1 ambos do C. Civil a prestação simultânea da restituição a fim de repor o statu quo ante, ou seja, o regresso à situação anterior à celebração do negócio, o que corresponderá aquilo que foi a pretensão deduzida pelos Recorridos na ação declarativa cuja sentença é dada à execução.

  8. Deve pois, revogar-se o Acórdão recorrido nesta parte – mantendo-se o segmento decisório quanto ao recurso subordinado apresentado pela Executada -, julgando os embargos parcialmente procedentes, tal como decidido em 1.º instância, sendo licito à recorrente reter o pagamento até que a fração lhe seja entregue, devendo as prestações serem simultâneas.

  9. Caso assim não se entenda, o que não se concebe nem concede e que aqui apenas se equaciona por mera cautela de patrocínio, sempre se dirá que o Acórdão proferido merece ser alterado e limitar os juros de mora e juros compulsórios previstos no art.º 829º.A nº. 4 do CC devidos, nas quantias referentes à restituição aos Exequentes (autores) o preço por estes pago àquela pela compra da fração e todas as despesas inerentes a essa transmissão, no valor de €127.793,05, indo assim ao encontro com o entendimento perfilhado nesse mesmo acórdão no que à quantia de €7.500,00 diz respeito.

  10. Consta do referido ponto 4 que a Recorrente enviou aos Recorridos uma missiva com o intuito de agendar uma visita ao imóvel e “acertar o pagamento da quantia que lhes é devida”.

  11. Missiva/declaração que se tornou eficaz logo que chegou ao poder do destinatário ou é dele conhecida, sendo considerada eficaz a declaração que só por culpa do destinatário não foi por ele oportunamente recebida (art.º 224.º,n.ºs 1 e 2 do C.Civ.).

  12. Assim, se em 11 de Maio de 2016 a Recorrente interpela os Recorridos e manifesta a sua vontade em cumprir com a sentença, diga-se pagamento, e são estes que ignoram a recorrente, recusam facultar o IBAN e recusam toda e qualquer colaboração, optando por dar entrada do requerimento executivo, não pode considerar-se que seja a Recorrente que se encontra em mora, mas sim o inverso.

  13. Segundo o disposto no nº. 2 do art.º 804º do Código Civil, o devedor considera-se constituído em mora quando, por...

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