Acórdão nº 2966/16.0T8PTM.E1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelROSA TCHING
Data da Resolução16 de Maio de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 2ª SECÇÃO CÍVEL I. Relatório 1. AA, veio intentar ação declarativa comum contra BB - Promoção Imobiliária, Ldª, pedindo a condenação desta no pagamento da quantia de € 205.269,88 e do IVA correspondente, acrescida de juros de mora devidos desde a citação e até efetivo e integral pagamento.

Alegou, para tanto e em síntese, ter celebrado com a ré contrato de empreitada para a construção de duas moradias unifamiliares, pelo preço ajustado de € 370.000,00 cada uma, e que apesar dos trabalhos executados, que incluíram trabalhos adicionais posteriormente adjudicados, a ré apenas pagou parte do preço acordado, o que forçou o A. a deixar a obra, sem a concluir.

  1. A R. contestou, por exceção e por impugnação. Não obstante admitir ter acordado verbalmente com a autora a construção das duas moradias identificadas nos autos, invocou a nulidade destes contratos de empreitada, por não terem sido reduzidos a escritos, tal como impõe o art. DL nº 12/2004, de 09.01, na redação dada pelo Dl nº 18/2008, de 29.01, em conjugação com a Portaria nº 1371/2008, de 02.12.

    Mais sustentou ter pago ao autor todas as faturas que lhe foram apresentadas e que corresponderam à obra que efetivamente efetuou, com exceção das quantias retidas em cada uma das faturas pagas, a título de garantia da boa execução da obra, e que, conforme refere o autor, totalizam € 7.800,00.

    Concluiu pela procedência da invocada nulidade e pela improcedência da ação, exceto no que respeita à referida quantia de € 7.800,00.

  2. Na sua resposta, o autor concluiu pela improcedência da invocada nulidade, mas, para a hipótese do tribunal vir a declarar nulo o contrato, por falta de observância da forma legal, pugnou pela condenação da ré no pagamento das quantias peticionadas.

    Requereu, assim, em alternativa e ao abrigo do disposto no art. 265º do CPC, a condenação da ré a título de enriquecimento sem causa.

  3. Dispensada a realização da audiência prévia, foi proferido despacho que fixou o valor da ação e indeferiu a requerida ampliação da causa de pedir.

    Proferido despacho saneador, nele relegou-se para a sentença o conhecimento da invocada nulidade.

    5. Após audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença que julgou a ação parcialmente procedente e condenou a ré a pagar ao autor a quantia de € 143.220 (cento e quarenta e três mil, duzentos e vinte euros), acrescida de IVA, à taxa de 23%, nos termos do artº 18º, nº 1, c) do Código do IVA (no montante de € 32.940,60).

  4. Inconformados com esta decisão, dela apelaram o autor e a ré para o Tribunal da Relação de Évora, que, por acórdão proferido em 28.06.2017, julgou improcedentes as apelações, mantendo a decisão recorrida.

  5. Inconformada com esta decisão, a ré dela interpôs recurso de revista excecional com o fundamento no disposto no art. 672º, nº1, al. c) do CPC para o Supremo Tribunal de Justiça, concluindo as suas alegações com as seguintes conclusões que se transcrevem: «l.

    a- O STJ só conhece, em princípio, de questões de direito, salvo, como nos casos como os dos autos, em que esteja em causa a violação pelas instâncias de regras imperativas sobre direito probatório, a chamada prova vinculada; 2.

    a- As instâncias deram como provado um preço para o (s) contrato (s) de empreitada dos autos, nulo (s) por vício de forma, socorrendo-se, para tanto de presunção judicial retirada da restante prova produzida nos autos; 3.

    a- A exigência legal de redução a escrito do contrato pelo empreiteiro é uma formalidade "ad substantiam" pelo que nos termos do art.° 364.°, n.° 1 do CC. a sua prova é vinculada á existência de documento de força probatória superior; 4.

    a- O mesmo se diga da declaração negocial relativa ao estabelecimento do preço do contrato de empreitada, como elemento essencial deste, nos termos do art.° 1207.° do C.C. e do art° 29.°, n.° 1, al. d) do DL. n.° 12/2004, de 29/01; 5.

    a - O documento junto como Documento n.° 1 com a petição inicial é um documento apócrifo, não está assinado, quer pelo A. quer pela R., nele esta não está identificada e não está datado, não podendo, sequer, ser considerado como documento particular, uma vez que a sua autoria nem sequer está estabelecida, como impõe o art.° 373.°, n.° 1 do CC; 6.

    a- O documento junto como Documento n.° 1 com a petição inicial não é idóneo a fazer a prova do preço acordado pelas partes para o preço da empreitada, não podendo ele ser dado como provado com fundamento em presunção judicial, como fizeram as instâncias; 7.

    a- Tendo a acção sido proposta no pressuposto da validade do contrato de empreitada, o que não é o caso, uma vez que já foi declarada a sua nulidade por falta do formalismo prescrito na lei, não podiam as instâncias ter dado como provado o preço dele, sem violação do regime previsto no art.° 289.°, n.° 1 do CC. e da jurisprudência do Assento n.° 4/95 de 28/03/1995; 8.

    a- Sendo o contrato de empreitada nulo por falta de forma e tendo essa nulidade efeitos retroactivos com "destruição" do negócio, como se ele nunca tivesse existido, no montante da restituição do que foi prestado pelo empreiteiro ao dona da obra, não está incluído o lucro que aquele esperava retirar de um negócio que a lei considera nunca ter existido, devendo aquela restituição seguir as regras do enriquecimento sem causa; 9.

    a- O Acórdão sob recurso é nulo, nos termos das alíneas b) e d) do art.° 615, ex vi do art.° 666.°, n.° 1, ambos do CPC, uma vez que nele não se especificaram quais as razões de direito que justificaram a decisão quanto à matéria de direito, por se ter limitado a aderir à fundamentação da decisão em l.

    a instância, nem se conheceu de questões de que deveria ter tomado conhecimento, designadamente, quanto à questão do lucro; 10.

    a- O Acórdão recorrido está em contradição com o Acórdão da Relação de Guimarães, de 12/07/2016, relatado pelo Juiz Desembargador Dr. João Diogo Rodrigues, já transitado, o qual foi proferido no domínio da mesma legislação - o D.L n.° 12/2004, de 09/01 e o art.° 364.°, n.° 1 do CC. - e sobre a mesma questão fundamental de direito - prova do preço do contrato de empreitada declarado nulo-; ll.

    a- O Acórdão recorrido violou os artigos n.° 373.°, n.° 1, 364.°, n.° 1 e 289.°, n.° 1 do CC. e 615, alíneas b) e d) e 666.°, n.° 1 do CPC.

  6. a- Deve o presente recurso excepcional de Revista ser julgado procedente e, em consequência, declarar-se nulo o Acórdão recorrido por falta de fundamentação da decisão de direito e por omissão de pronúncia quanto à questão do lucro, ordenando-se a sua reforma e, em qualquer caso, revogá-lo, substituindo-se por Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça que condene apenas a R. a restituir o que se vier a apurar dever ser restituído, segundo as regras do enriquecimento sem causa, a liquidar por recurso ao incidente previsto no art.° 609.° do CPC.» 8. A autora respondeu, terminando as suas contra-alegações com as seguintes conclusões que se transcrevem: «l.ª - Constatamos que, quer a 1.° Instância quer a 2.° Instâncias apreciaram e julgaram de acordo com as regras do Direito e a sua livre convicção, não havendo qualquer reparo a fazer às decisões proferidas, que nos parecem adequadas à matéria de facto e de direito.

    1. - Ambas as decisões foram no mesmo sentido, não tendo havido voto de vencido, por parte de qualquer elemento que tenha feito parte do coletivo de juízes do tribunal da Relação de Évora, 3ª - Não se enquadrando o caso concreto em nenhuma das situação previstas no art.° 672 do C.P.C., deve o recurso de revista ser rejeitado com base na norma contida no n.° 3 do Art.° 671 do C.P.C.

    2. - Finalmente, face ao exposto, devem assim improceder todas as conclusões vertidas nas alegações do recorrente».

    Termos em que pugna pela manutenção do acórdão recorrido.

  7. A Formação a que alude o art. 672º, nº3 do CPCivil, decidiu admitir a revista excecional.

  8. Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

    *** II.

    Delimitação do objeto do recurso Como é sabido, o objeto do recurso determina-se pelas conclusões da alegação do recorrente, nos termos dos artigos 635.º, n.º 3 a 5, 639.º, n.º 1, do C. P. Civil, só se devendo tomar conhecimento das questões que tenham sido suscitadas nas alegações e levadas às conclusões, a não ser que ocorra questão de apreciação oficiosa[1].

    Assim, a esta luz, as únicas questões a decidir, traduzem-se em saber se: 1ª- a prova do preço num contrato de empreitada declarado nulo, por falta de forma escrita, pode ser feita mediante prova testemunhal ou qualquer outro...

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