Acórdão nº 424/13.3T2AVR.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelOLIVEIRA ABREU
Data da Resolução23 de Maio de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – RELATÓRIO AA e BB intentaram a presente acção declarativa, contra, Herdeiros de CC, na pessoa de DD; EE - Comércio de Automóveis, Lda.; FF, Unipessoal, Lda.; GG - Comércio de Automóveis, Lda., e Fundo de Garantia Automóvel, pedindo a condenação destes a pagar-lhes a quantia global de €236.130,18, a título de danos não patrimoniais e patrimoniais, acrescida dos juros legais, vencidos e vincendos.

Articulam, com utilidade, que no dia 25/06/2011, cerca das 03,15 horas, na A1, ao Km 258,909, sentido norte–sul, ocorreu um acidente de viação no qual foi interveniente o veículo automóvel da marca BMW, modelo 663C, com a matrícula ...-JB-..., conduzido por CC, e no qual seguiam, como passageiros, HH, II e JJ, tendo o referido veículo sofrido um despiste com capotamento transversal, de que resultou a morte do HH, filho dos Autores.

O veículo BMW circulava sem seguro de responsabilidade civil automóvel, e, de acordo com o auto de notícia, era propriedade de EE - Comércio de Automóveis, Lda., pese embora, na Conservatória do Registo Automóvel, a propriedade do veículo se encontre registada em nome da Ré GG - Comércio de Automóveis, Lda..

O legal representante destas empresas afirma ter vendido este BMW ao CC a 21/06/2011, afirmando a mãe deste, que as assinaturas apostas nos documentos da aquisição do veículo não pertencem ao seu filho.

O aludido veiculo BMW foi vendido à EE, Lda., pela Ré/FF, Unipessoal, Lda.

O Instituto da Segurança Social, IP, veio deduzir, contra os ora Réus, pedido de reembolso de €5.030,64 que pagou, a título de despesas de funeral a DD (€ 2.515,32) e a AA (€ 2.515,32), mães, respectivamente, de CC e de HH, falecidos em resultado das lesões sofridas no acidente, dizendo ter direito ao reembolso daquele montante total contra os responsáveis do acidente, por sub-rogação legal, prevista no art.º 70.º da Lei n.º 4/2007, de 16/01, e nos termos do Decreto-Lei n.º 59/89, de 22/02.

A Ré/FF, Unipessoal, Lda., na contestação que apresentou, requer a sua absolvição do pedido, por não lhe poder ser assacada qualquer responsabilidade por aquilo que está descrito no petitório.

A Ré/GG, Lda., na sua contestação, informou ter a empresa EE - Comércio de Automóveis, Lda, alterado a sua denominação particular para GG - Comércio de Automóveis, Lda. e excepcionou: a) a ineptidão da petição inicial, por ininteligibilidade do pedido; b) que os AA. são parte ilegítima por, segundo esta Ré, a acção dever ser proposta pela herança jacente e indivisa do HH; c) a sua (da Ré GG) ilegitimidade passiva por ter vendido, a 21/06/2011, o veículo ao CC, sustentando ainda que o CC foi o único responsável pela ocorrência do acidente que vitimou o filho dos AA.

Na sua contestação, o Fundo de Garantia Automóvel alega ter procedido à abertura de um processo de sinistros, e, terminado o processo de averiguações, entendeu que o sinistro ocorreu por culpa do condutor do veículo de matrícula ...-JB-..., considerando, porém, que o comportamento do falecido HH, ao fazer-se transportar no veículo de matrícula ...-JB-..., sem utilizar o cinto de segurança, esteve na origem da projecção e embate violento do seu corpo no separador central em cimento da A1, provocando-lhe as lesões corporais que estiveram na génese da sua morte.

Entende, por isso, que o grau de comparticipação do lesado para a produção dos danos terá de se fixar em 33%, por aplicação do disposto no artigo 570º do Código Civil.

O Réu/Fundo de Garantia Automóvel, na resposta de fls. 187/192, pede a sua absolvição do pedido de reembolso deduzido pelo Instituto da Segurança Social, IP, com o fundamento de que, nos termos do n.º 3 do art.º 51º do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21/08, não responde por ele.

Contestou, também, a Ré/DD: a) excepcionando a ineptidão da petição inicial por ininteligibilidade do pedido e por falta de causa de pedir; b) defendendo que o CC não era o proprietário do veículo de matrícula ...-JB-..., e que o despiste com capotamento ocorre em virtude do rebentamento do pneu traseiro, tendo concorrido para este rebentamento o mau estado em que se encontravam os pneus, com sulcos com altura inferior a 1,6 mm, a par de que as lesões sofridas pelo HH não teriam ocorrido se este viajasse com o cinto de segurança devidamente colocado.

Os Autores, na réplica, requerem que se releve o lapso de escrita da parte conclusiva da petição inicial, pois dizem “ser o R. condenado” quando pretendiam dizer “ser os RR. condenados”; defendendo, outrossim, que as invocadas excepções devem ser julgadas improcedentes.

Foi proferido despacho, a 03/06/2013, que decidiu que o pedido de condenação do Réu, sem especificar qual dos Réus demandados pretendem os Autores ver condenados, tem de ser levado à conta de lapso manifesto e que, sendo patente, admite correcção, nos termos do artigo 249º do Código Civil, tendo sido proferido despacho, a convidar os Autores a corrigir a petição inicial, por falha na alegação de factos para caracterizar a culpa do condutor do veículo na eclosão do acidente.

Os Autores vieram apresentar petição inicial corrigida.

Foi proferido despacho saneador que julgou improcedentes as excepções: a) de nulidade da petição inicial, por ininteligibilidade do pedido, por o pedido de condenação do R., sem especificar qual dos RR. demandados pretendem os AA. ver condenados, ter de ser levado à conta de lapso, que já foi corrigido na nova petição inicial apresentada; b) de nulidade da petição inicial por falta ou ininteligibilidade da causa de pedir, por todos os RR. terem compreendido perfeitamente a causa de pedir da petição inicial, tendo sido supridas as deficiências da mesma na nova petição apresentada; c) de ilegitimidade dos AA., por serem estes os titulares da indemnização que julgam assistir-lhes, nos termos dos artigos 495.º e 496.º do C.Civil; d) de ilegitimidade passiva da Ré GG, Lda, por ser controvertida a questão de saber quem é o proprietário do veículo de matrícula ...-JB-.... A Ré é, por conseguinte, parte legítima, por ter interesse directo em contradizer - artigo 30.º, nºs. 1 e 2, do Código de Processo Civil.

Foi proferida decisão que julgou a acção improcedente quanto à Ré/FF, Unipessoal, Lda., absolvendo-a dos pedidos, por os Autores não terem articulado factos de onde se possa retirar por que razão esta sociedade há-de responder civilmente perante eles.

Foi, também, julgado improcedente o pedido feito pelo Instituto da Segurança Social, IP, contra o Fundo de Garantia Automóvel, por a responsabilidade deste estar limitada ao excedente do que não for satisfeito pela Segurança Social, nos termos do n.º 3 do art.º 51º do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21/08.

Foram elaborados os temas da prova, que não sofreram reclamações.

Calendarizada a audiência final, foi esta realizada com observância do formalismo legal, tendo o Tribunal de 1ª Instância proferido decisão, de facto e de direito, que julgou a acção parcialmente procedente por provada, e, consequentemente, condenou: “a) os RR. Herança aberta por óbito de CC, GG, Lda, e Fundo de Garantia Automóvel a pagarem, solidariamente, aos AA. AA e BB a indemnização total de € 117.000,00, sendo metade para cada um dos AA., valor a que acrescem juros de mora, à taxa legal, a partir da prolação da presente sentença e até integral pagamento; b) a GG, Lda, e a Herança aberta por óbito de CC a pagarem, solidariamente, ao Instituto da Segurança Social, IP, € 2.515,32, a que acrescem juros de mora, à taxa legal, a partir da citação e até integral pagamento; c) e absolveu os RR. do mais contra eles peticionado.” Inconformados, os Autores/AA e BB, e os Réus, Herdeiros de CC, GG - Comércio de Automóveis, Lda., e Fundo de Garantia Automóvel, recorreram de apelação, tendo o Tribunal a quo conhecido do interposto recurso, proferindo acórdão em cujo dispositivo foi consignado: “a) - julgar a apelação interposta pela Ré Herança aberta por óbito do CC parcialmente procedente por provada e consequentemente revogando a decisão recorrida, absolve-se a referida Ré dos pedidos contra si formulados pelos Autores AA e BB; b) - Julgar as apelações interpostas pelos Autores, Ré GG, Lda e Fundo de Garantia Automóvel improcedentes por não provados e, consequentemente, manter a condenação solidária da Ré GG, Lda. e Fundo de Garantia Automóvel a pagar aos Autores o montante de € 117.000,00 (cento e dezassete mil euros), bem como ao Instituto ao Instituto da Segurança Social, IP, a quantia € 2.515,32 (dois mil quinhentos e quinze euros e trinta e dois cêntimos).

  1. - manter o restante decidido.” Contra este acórdão, proferido no Tribunal da Relação do Porto, insurgiram-se os Réus, GG - Comércio de Automóveis, Lda., e Fundo de Garantia Automóvel, tendo sido proferida decisão singular que rejeitou os interpostos recursos, sendo que o Réu/Fundo de Garantia Automóvel, reclamou para a Conferência, desta decisão singular, tendo sido proferido acórdão que atendeu a aludida reclamação, revogando a decisão singular, na parte que rejeitou o recurso do Réu/Fundo de Garantia Automóvel, admitindo-o, como de revista.

    O Réu/Fundo de Garantia Automóvel, ao interpor recurso de revista, sustentou o mesmo, aduzindo as seguintes conclusões: “I. Considerando o facto de o Tribunal da Relação ter condenado o aqui Recorrente - solidariamente com a Ré GG - Comércio de Automóveis, Lda. - tendo por base as regras da responsabilidade objectiva ou pelo risco, logra aplicação no caso sub judice o disposto no n.º 3 do artigo 504.º CC, ou seja, a responsabilidade do FGA abrangerá apenas os danos pessoais da pessoa transportada; II. E tal sucederá já que todos os passageiros que seguiam no veículo de matrícula JB eram transportados gratuitamente, ou seja, esse tipo de transporte “...é o não pago, o gracioso, efectuado por gentileza, por cortesia, normalmente por espírito de liberalidade e no interesse, sobretudo, do transportado, de que a boleia é o caso típico.” - cfr. Acórdão do STJ, de 4.7.96, publicado no BMJ 459-532...

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