Acórdão nº 23273/15.0T8PRT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Abril de 2019

Magistrado ResponsávelCHAMBEL MOURISCO
Data da Resolução10 de Abril de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Processo n.º 23273/15.0T8PRT.P1.S1 (Revista) - 4ª Secção CM/PH/LD Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I Relatório: 1.

AA intentou ação declarativa de condenação, com processo comum, contra a BB, CRL pedindo:

  1. O reconhecimento da existência de um contrato de trabalho entre si e a ré; b) A declaração da ilicitude do seu despedimento com as legais consequências; c) A condenação da ré a pagar-lhe a quantia de EUR 28 783,12, a título de diferenças salariais, férias, subsídio de férias e subsídio de Natal e proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal, acrescida de EUR 3.825,00, no que concerne a férias, subsídio de férias, vencidos no dia 1.1.2015, e subsídio de Natal e proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal, vencidos com a cessação do contrato; d) A condenação da Ré a pagar-lhe a contrapartida devida pela coordenação dos Cursos …. e ..., ainda não apurada, a liquidar em execução de sentença; 2.

    A Ré contestou, alegando em síntese que o contrato que celebrou com a autora foi um contrato de prestação de serviço, que cessou na sequência de carta de rescisão remetida.

    1. O Tribunal de 1.ª instância decidiu julgar a ação improcedente absolvendo a ré dos pedidos.

    4. Inconformada, a autora interpôs recurso de apelação, tendo o Tribunal da Relação decidido:

  2. Julgar a apelação da autora parcialmente procedente, e, em consequência, revogar a sentença recorrida; b) Declarar que o vínculo existente entre a autora e a ré, desde 01 de outubro de 2006 a 31 de julho de 2015, consubstanciou um contrato de trabalho por tempo indeterminado; c) Declarar a ilicitude do despedimento da autora; d) Condenar a ré a pagar à autora a quantia a liquidar, a título de retribuições, férias, subsídio de férias e de Natal, vencidas no período compreendido entre 01 de setembro de 2015 e a data do trânsito em julgado do presente acórdão, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde o trânsito em julgado da decisão de liquidação e até integral pagamento; e) Condenar a ré a pagar à autora a indemnização em substituição da reintegração no montante de EUR 7 344, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data do trânsito em julgado do acórdão até efetivo e integral pagamento; f) Condenar a ré a pagar à autora a quantia de EUR 27 808,67 correspondente às diferenças de retribuição entre o valor pago pela ré e o devido, desde os anos letivos de 2006/2007 a 2014/2015, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até efetivo e integral pagamento; g) Condenar a ré a pagar à autora a quantia de EUR 3 825, correspondente às férias e respetivo subsídio, devidas em 2015 e aos proporcionais de férias, respetivo subsídio e subsídio de Natal, referentes ao ano de 2015, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até efetivo e integral pagamento; h) Absolver a ré do restante peticionado; i) Julgar a ampliação da apelação improcedente.

    1. Inconformada com esta decisão, a ré interpôs recurso de revista, tendo, de forma expressa e separadamente, no requerimento de interposição de recurso, arguido a nulidade do acórdão por excesso de pronúncia, defendendo que o Acórdão recorrido, ao ter alterado/eliminado oficiosamente os pontos 97, 5, 35, 36, 37, 63, 73, 75, 91 e 106 da matéria assente, bem como ao ter aditado oficiosamente os pontos 5-A, 35-A e 75-A, sem que tal matéria tenha sido impugnada pelas partes/recorrentes, pronunciou-se por excesso. Acrescenta que tal matéria não é de conhecimento oficioso, particularmente o ponto 97 da matéria assente, que configura, sem margem para dúvida, uma circunstância fáctica e não uma mera conclusão, um juízo de valor ou uma expressão jurídica.

      Nas suas conclusões, a recorrente invocou o erro na decisão sobre a matéria de facto, alegando que, na resposta ao recurso de apelação, requereu a ampliação do âmbito do recurso de revista, nos termos do art.º 636.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, impugnando os pontos 35, 78 e 79 da matéria de facto, que no seu entender devem ser eliminados pois o ponto 35 é conclusivo e os pontos 78 e 79 integram matéria de direito. Considera ainda que o ponto 66 dos factos provados integra matéria de direito, pelo que deve ser eliminado.

      Quanto ao mérito questiona a natureza do contrato, que em seu entender é um contrato de prestação de serviço e não um contrato de trabalho, como se declarou no acórdão recorrido, defendendo que o art.º 71.º do Estatuto da Carreira Docente não é aplicável ao caso dos autos, sendo inconstitucional a interpretação feita.

      Sustenta que conseguiu ilidir a presunção de laboralidade, pelo que deve ser revogado o acórdão recorrido e substituído por outro que a absolva de todos os pedidos.

      Finalmente defende que caso se conclua pela existência de contrato de trabalho deve considerar-se que o mesmo foi celebrado a termo certo, pelo que deverá ser-lhe aplicável o art.º 393.º, n.º 2 do Código do Trabalho e não os artigos 389.º, 390.º e 391.º do mesmo diploma legal.

      Nas conclusões da revista a recorrente invoca a violação dos artigos 236.º, n.º 1, 342.º, 1152.º e 1154.º, todos do Código Civil,10.º e 12.º do Código do Trabalho de 2003, 13.º da Constituição da República Portuguesa, 71.º do ECDU (Estatuto da Carreira Docente Universitária), 129.º, n.º 1, al. d), 389.º, 390.º, 391.º e 393.º do Código do Trabalho.

    2. A autora contra-alegou, defendendo a improcedência do recurso interposto pela ré.

    3. Neste Supremo Tribunal de Justiça, o Excelentíssimo Senhor Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de ser negada a revista.

    4. Em síntese, nas suas conclusões, a recorrente suscita as seguintes questões que cumpre solucionar:

  3. A nulidade do acórdão por excesso de pronúncia; b) Erro na decisão sobre a matéria de facto; c) A natureza do contrato, que em seu entender é um contrato de prestação de serviço e não um contrato de trabalho como se declarou no acórdão recorrido. II A) Fundamentação de facto: A1) O Tribunal da 1.ª instância deu como assente a seguinte matéria de facto, que se transcreve: 1. A Ré é a entidade instituidora do estabelecimento de ensino superior cooperativo denominado «CC».

    1. A CC é uma instituição dedicada à criação, transmissão, crítica e difusão de cultura, arte, ciência e tecnologia que tem como objetivos o ensino, a investigação e a prestação de serviços nestes vários domínios, numa perspetiva interdisciplinar, em ordem ao desenvolvimento dos países e povos lusófonos, designadamente, no âmbito da Euro-Região do Noroeste Peninsular, conforme artigo 2.°, n.º 1, dos Estatutos da CC, celebrando, na prossecução destas finalidades, contratos de trabalho com pessoal docente e não docente.

    2. A responsabilidade pela gestão administrativa, económica e financeira da CC cabe à BB, CRL, sendo atribuído à Ré, o exercício do poder disciplinar sobre pessoal docente, técnico, administrativo ou outro, bem como sobre os estudantes.

    3. A CC goza de autonomia científica, cultural e pedagógica, traduzindo-se a autonomia pedagógica na capacidade de livremente estabelecer: a) A definição das formas de ensino e de avaliação; b) A distribuição do serviço docente; c) O ensino de novas experiências pedagógicas, tendo o direito a requerer a acreditação de ciclos de estudos, junto da entidade legalmente competente.

    4. A Autora foi admitida pela Ré, no dia 1 de outubro de 2006, para exercer funções de docente do Ensino Superior com a categoria académica de Assistente, em regime de tempo integral, por documento denominado de «contrato de docência em regime de tempo integral» assinado por ambas as partes, junto aos autos a fls. 89 e 90, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

    5. Mediante o pagamento de uma retribuição mensal, de acordo com a tabela anexa ao referido contrato.

    6. E que à data era de EUR 25,01/hora.

    7. A Autora obrigou-se, a exercer as suas funções em regime de tempo integral, recaindo sobre si o compromisso de não exercer funções no regime de tempo integral noutra instituição pública ou privada, de ensino superior ou de outro grau de ensino.

    8. O serviço de docência em regime de tempo integral compreende, além da lecionação das aulas previstas no parágrafo anterior, a avaliação de conhecimentos e a prestação semanal de um período igual a metade da carga horária letiva, para assistência a alunos, orientação de teses e estágios e para atividades de investigação.

    9. O acordo teve início em 1 de outubro de 2006, acordando as partes que, o contrato renovar-se-ia no final do termo, 28 de fevereiro de 2007, se nada fosse dito em contrário por qualquer uma das partes.

    10. O referido contrato foi sendo sucessivamente renovado até ao dia 3 de julho de 2015.

    11. Através de carta datada de 31 de julho de 2015, a Ré comunicou à Autora que iria proceder, ao abrigo da cláusula quinta, à «rescisão» com efeitos imediatos, do contrato de docência, celebrado no dia 01/10/2006, referindo-se que, oportunamente, a Autora seria contactada pelos serviços de recursos humanos da Ré para «a recontratar a partir do próximo ano letivo, embora num modelo contratual diverso do até aqui praticado».

    12. No início de cada semestre, era atribuído à Autora um determinado serviço docente, definindo-se, igualmente, o período de docência semanal e respetivo horário da Autora.

    13. A partir de outubro de 2007, a Ré aumentou a remuneração horária da Autora para EUR 25,50.

    14. Desde a data da sua admissão, a Autora sempre desempenhou a atividade de professora, segundo horário e mediante os tempos de lecionação que se passam a identificar: 16. No 1º semestre do ano letivo de 2006/2007, na qualidade de assistente/regente da cadeira semestral de ..., a Autora lecionou na Faculdade de ... da CC, 3 horas semanais.

    15. No 2º semestre do ano letivo de 2006/2007, na qualidade de assistente/regente da cadeira semestral de ...I, a Autora lecionou na Faculdade de ... da CC, 3 horas semanais.

    16. No 1º semestre do ano letivo de 2007/2008, na qualidade de assistente/regente das cadeiras semestrais de ... e ...II, a Autora lecionou na...

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