Acórdão nº 79/18.9YFLSB de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelFERREIRA PINTO
Data da Resolução21 de Março de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso do Supremo Tribunal de Justiça I - Relatório: Dr. AA, Juiz Conselheiro, na situação de aposentado, propôs, ao abrigo do disposto no artigo 168º, n.º 1, do Estatuto dos Magistrados Judiciais [EMJ], aprovado pela Lei n.º 21/85, de 30 de julho, a presente ação administrativa especial de impugnação de ato administrativo para anulação da deliberação do CSM, de 11 de julho de 2018, e para “condenação do CSM à prática de ato administrativo”.

Para tanto alegou os seguintes fundamentos: a. Em 23 de março de 2018, solicitou ao CSM que, definindo a sua situação estatutária, deliberasse o seu regresso à situação de jubilado, com efeitos a partir da eficácia dessa deliberação.

  1. O CSM deliberou, em 11 de julho de 2018, que não se suscitava qualquer dever de decisão e de deliberação, porquanto a pretensão do Autor era extemporânea, uma vez que o prazo legal para fazer essa opção já havia decorrido e, consequentemente, estava consolidada a sua situação de aposentação.

  2. Para o Autor, este ato administrativo, consubstanciado naquela deliberação, sofre do vício de total falta de fundamentação.

  3. Aduz, ainda, que não está aqui em causa a sua omissão de opção pelo estatuto de jubilação, pois é verdade que não fez a declaração exigida pelo artigo 7º, n.º 2, da Lei n.º 9/2011, de 12 de abril.

  4. Na verdade, o que verdadeiramente está em causa são as consequências derivadas dessa falta de declaração.

  5. Ora, não tendo o CSM se pronunciado sobre elas, no ato impugnado, ou seja, não tendo referido quais são essas consequências, viola o dever de fundamentação previsto mo artigo 152º, n.º 1, alínea c), do Código do Procedimento Administrativo [CPA], o qual tem por base o artigo 268º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa [CRP], que consagra que os atos administrativos carecem de fundamentação expressa.

  6. Em consequência dessa falta de fundamentação, o CSM não apreciou e/ou conheceu das questões que invocou, relativas à fixação seu estatuto aposentação/jubilação, e que são: Desproporção do prazo de três meses concedido para a opção; Necessidade de deliberação do CSM; Necessidade de notificação dos interessados; Restrição de direitos – Perda do Estatuto de Jubilado.

    h.

    Contudo, o CSM, decidindo como decidiu, interpretou o artigo 7º, n.º 2, da Lei n.º 9/2011, no sentido de que o prazo aí estabelecido, para a opção entre a jubilação ou a aposentação, era adequado e proporcionado, que, findo esse prazo, ficava automaticamente, ou melhor, “ope legis”, definida a sua situação, que não havia necessidade da sua intervenção e de se efetuar uma notificação aos seus destinatários para fazerem a opção exigida.

  7. Segundo ele, o prazo de 03 meses foi desadequado e desproporcionado, para fazer a mencionada opção, dado que ela implicava “a modificação e reorganização da sua vida pessoal e profissional”, pois quando entrou em vigor o citado artigo 7º, n.º 2, era membro de um tribunal arbitral, com julgamento iniciado e prova produzida, que não se conseguia concluir nesse prazo.

  8. Entendendo-se que tal prazo era suficientemente adequado para fazer essa opção e que, com o seu decurso, a sua situação estatutária ficava definida e consolidada, essa interpretação do artigo 7º, n.º 2, da Lei n.º 9/2011, viola o princípio da proporcionalidade, decorrente do Estado de direito democrático, os deveres de gestão dos magistrados e do exercício da ação disciplinar pelo CSM, previstos no artigo 217º, n.º 1, da CRP, e incorre em violação de lei, sendo, por isso, anulável.

  9. Interpretando-se, também, essa norma no sentido de que a modificação da situação estatutária dos seus destinatários, não implicava uma sua notificação pelo CSM para fazerem a opção, viola-se o artigo 268º, n.º 3, da CRP, que consagra que os atos administrativos devem ser notificados aos interessados na forma prevista na lei.

  10. No seu entender, o CSM ao presumir que por não ter feito a declaração a sua situação de aposentado tornou-se definitiva, não teve em consideração que, nessa altura, a sua situação estatutária já era definitivamente a de jubilado, estando, apenas, provisoriamente suspensa, conforme dispunha o artigo 67º, n.º 6, do EMJ, na redação dada pela Lei n.º 10/94, de 05 de maio.

  11. Por outro lado, a perca do estatuto de jubilado só se verifica, legalmente, por razões disciplinares ou por declaração de renúncia, nos termos do artigo 67º, do EMJ [o relevo que o CSM deu ao seu silêncio, apesar da lei não especificar qual a sua consequência, é sempre ilidível pois trata-se de uma presunção], sendo que o seu estatuto já se encontrava definitivamente adquirido de base.

  12. Essa interpretação feita pelo CSM é inconstitucional, por violar os princípios da precisão ou determinabilidade das normas jurídicas, vertente do princípio da segurança ou da confiança, ínsito no artigo 2º, da CRP, ou seja, por violar os princípios do Estado de direito democrático. Termina pedindo a anulação do ato impugnado e requerendo a condenação do CSM na apreciação do seu requerimento, reconhecendo-lhe o estatuto de Juiz Conselheiro jubilado.

    ~~~~Por sua vez, o CSM na sua resposta, efetuada ao abrigo do artigo 174º, do EMJ, diz, em suma, o seguinte: 1. O CSM é um órgão do Estado integrado na Administração Judiciária, estando sujeito à Constituição e à Lei, atuando, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé.

    1. O “presente recurso”, sendo de um processo de impugnação de um ato administrativo o seu objeto circunscreve-se à anulação ou à declaração de nulidade desse ato, estando vedada a reapreciação do mérito, conveniência ou oportunidade do ato administrativo e a sua substituição por outro.

    2. Assim, o pedido feito pelo Impugnante da sua condenação no sentido de reconhecer-lhe “o estatuto de juiz conselheiro jubilado”, extravasa os limites do “recurso contencioso de anulação”.

    3. O Dr. AA apresentou um requerimento no CSM, em 29 de março de 2018, solicitando que fosse definida a sua situação estatutária pelo Plenário e que tal deliberação determinasse o seu regresso à situação de jubilado.

    4. Ora, o Exmo. Juiz Conselheiro jubilou-se em 17 de dezembro de 1993, tendo pedido, em 14 de novembro de 1994, a suspensão da sua condição de jubilado, tendo esse pedido sido deferido com produção de efeitos a partir de 01 de dezembro de 1994.

    5. Por sua vez, o artigo 7º, n.º 2, da Lei n.º 9/2011, de 12 de abril, referente ao regime transitório relativo à jubilação, determinou que “[o]s magistrados judiciais ou do Ministério Público com a jubilação suspensa devem, no prazo de três meses a contar da data de entrada em vigor da presente lei, optar pela mesma ou pela aposentação.” 7.

      O Exmo. Juiz Conselheiro não fez qualquer declaração nem nesse prazo, de 3 meses, nem até 29 de março de 2018, data em que requereu ao CSM que definisse a sua situação estatutária.

    6. Ora, o CSM não pode ser censurado por ter cumprido a lei, não se verificando, pois, qualquer violação do princípio da proporcionalidade, da tutela da confiança e nem da segurança jurídica.

    7. Acresce que, quando o artigo 7º, n.º 2, entrou em vigor, a situação do Exmo. Juiz Conselheiro era a de aposentado e não a de jubilado, pois estava com a sua jubilação suspensa.

    8. O legislador terminou, com efeitos retroativos, com a possibilidade de suspensão do estatuto da jubilação e concedeu aos beneficiários dessa mesma suspensão à data, a possibilidade de, em prazo, optarem pelo regresso ao referido estatuto ou, em alternativa, à continuação na situação de aposentado.

    9. Ora, a Lei não prevê expressamente a consequência da omissão na escolha, na medida em que tal omissão implica naturalmente a transição para definitiva de uma situação até aí temporária: a aplicação do regime de aposentação.

    10. Esta interpretação não viola o princípio da confiança no sentido da manutenção de um benefício, de regresso à situação da jubilação, que lhe teria sido concedido quando do deferimento da suspensão do mesmo estatuto.

    11. Acresce que inexiste qualquer dever do CSM tomar qualquer deliberação a respeito da situação estatutária do Exmo. Juiz Conselheiro, porque a sua situação jurídica ficou definitivamente constituída pela circunstância de nada ter declarado, no prazo concedido pelo artigo 7º, n.º 2, da Lei n.º 9/2011, de 12 de abril.

      Termina pedindo que seja julgado improcedente “o presente recurso contencioso”.

      ~~~~~~Notificados o demandante e o demandado, nos termos e para os efeitos do artigo 176º, do EMJ, alegaram ambos, mantendo as suas posições, tendo o demandante desistido parcialmente da causa de pedir, os seja, tendo abandonado, expressamente, a invocação dos fundamentos da falta de fundamentação e da omissão do dever de decidir, e invocando, também, a violação do princípio da igualdade, face ao regime concedido para as arbitragens tributárias, em que os magistrados judiciais, suspendendo temporariamente a condição de jubilado, podem exercer funções de árbitro em matéria tributária – artigo 7º, n.º 5, do Regime Jurídico da Arbitragem Temporária [RJAT}, na redação dada pelo artigo 14º, da Lei n.º 20/2012, de 14 de maio.

      ~~~~Por sua vez, o Ministério Público, pronunciou-se “pela improcedência da ação impugnatória” acompanhando a posição do CSM, sendo que agora o Exmo. Juiz Conselheiro fundamenta a sua pretensão apenas “na violação dos princípios constitucionais da proporcionalidade e da determinabilidade e precisão das normas jurídicas, que referencia à interpretação e aplicação que a deliberação impugnada fez da norma do artigo 7º, n.º 2, da Lei n.º 9/2011”.

      Notificadas as alegações do Mº Pº a ambas as partes, não houve qualquer pronúncia sobre as mesmas.

      ~~~~ Questão prévia: Nas suas alegações o Exmo. Senhor Juiz Conselheiro levanta a questão do regime legal subsidiário a que aludem os artigos 168º, n.º 5, e 178º, ambos do EMJ, face ao teor da resposta do CSM.

      Segundo ele, depois da alteração ao Código de Processo dos Tribunais Administrativos [CPTA]...

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