Acórdão nº 1205/15.5T9VIS.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Fevereiro de 2019

Magistrado ResponsávelLOPES DA MOTA
Data da Resolução13 de Fevereiro de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACÓRDÃO Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório 1.

AA, arguido, com a identificação que consta dos autos, actualmente preso em cumprimento de pena, interpõe recurso do acórdão proferido pelo tribunal colectivo da Instância Central da comarca de ..., de 6 de Junho de 2018, que, realizando o cúmulo jurídico das penas correspondentes aos crimes em concurso, lhe aplicou uma pena única de 12 anos e 6 meses de prisão, acrescida da pena de 150 dias de multa, à taxa diária de €5,00 (cinco euros), e uma pena única de 3 anos e 4 meses de prisão, em resultado da condenação nas seguintes penas:

  1. Nos presentes autos, por acórdão de 16.11.2016, do tribunal colectivo da Instância Central da comarca de ..., de que foi interposto recurso para o Supremo Tribunal de Justiça quanto a todas as penas aplicadas, decidido por acórdão de 13.7.2017, transitado em julgado em 31.7.2017, pela prática de: i. Um crime de abuso sexual de crianças agravado, previsto e punido pelos artigos 171.º, nºs 1 e 2, e 177.º, n.º1, al. a), ambos do Código Penal (na pessoa de BB), na pena de 9 (nove) anos de prisão, por factos praticados entre o ano de 2000 e Setembro de 2009; ii. Um crime de abuso sexual de crianças agravado, previsto e punido pelos artigos 171.º, n.º1, e 177.º, n.º1, al. a), ambos do Código Penal (na pessoa de CC), na pena de 6 (seis) anos de prisão, acrescida da pena acessória de inibição do exercício do poder paternal, nos termos do art.179.º, al. a), do Código Penal, por factos praticados entre 2006 e 2010; iii. Um crime de abuso sexual de crianças, previsto e punido pelo artigo 171.º, nºs 1 e 2, do Código Penal (na pessoa de EE), na pena de 6 (seis) anos de prisão, por factos praticados entre 2006 e 2009; iv. Um crime de abuso sexual de crianças, p.p. pelo artigo 171.º, n.º1, do Código Penal (na pessoa de DD), na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, por factos praticados no dia 11 de Dezembro de 2015 (factos respeitantes ao processo n.º 880/15.5GCVIS, apensado a este processo); Em cúmulo jurídico de todas estas penas, foi o arguido condenado na pena única de 13 (treze) anos de prisão.

    b) No processo nº 252/15.1GCVIS da Instância Local da Comarca de ..., por sentença de 15.01.2016, transitada em julgado no dia 15.02.2016, pela prática de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152.º, n.º s 1, al. a), e 2, do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 9 (nove) meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, condicionada à frequência do Programa para Agressores de Violência Doméstica, por factos praticados entre 2001 e 9.6.2015.

    c) No processo nº 47/08.9FBAVR do tribunal da comarca de ..., por sentença de 28.01.2011, transitada em julgado a 04.03.2011, por factos de 22.2.2008, pela prática de um crime de exploração de jogo de fortuna e azar, previsto e punível nos termos dos artigos 1.º, 3.º, 4.º, n.º1, al. g), 108.º e 116.º do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2/12, na redacção do Decreto-Lei n.º 10/95, de 19/01, na pena de 3 (três) meses de prisão que, nos termos do disposto no artigo 43.º, n.º1, 47.º e 71.º do Código Penal, foi substituída por igual número de dias de multa, à taxa diária de €5,00 (cinco euros) e em 150 (cento e cinquenta) dias de multa, à mesma taxa diária; em cúmulo destas penas, foi condenado na pena única de 240 (duzentos e quarenta) dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco euros), posteriormente substituída, por despacho de 11.05.2012, nos termos do artigo 48.º, n.º 1, do Código Penal, por 240 horas de trabalho, que cumpriu, tendo a pena sido declarada extinta em 27.6.2016.

    1. Apresenta motivação de que extrai as seguintes conclusões (transcrição): “1ª - No caso em apreço o Arguido Recorrente sofreu as seguintes condenações: - Proc. nº 47/08.9FBAVR – condenação transitada em julgado em 04/03/2011; - Proc. nº 252/15.1GCVISS – condenação transitada em julgado em 15/02/2016; - Proc. nº 1205/15.5T9VIS – condenação transitada em julgado em 31/07/2017; 2ª - Ora, quanto ao primeiro grupo de penas cumulado pelo Tribunal a quo, discorda do Recorrente da inserção da condenação objecto do Proc. nº 47/08.9FBAVR, porquanto a pena que ali lhe foi aplicada, 3 meses de prisão substituída por igual número de dias de multa, à taxa diária de 5€ e de 150 dias de multa à mesma taxa, o que em cúmulo originou uma condenação na pena única de 240€ dias de multa, foi cumprida e já declarada extinta pelo cumprimento em 31/07/2014 – razão pela qual não pode ser englobada no cúmulo jurídico, sob pena de assim se violar o princípio da confiança e do ne bis in idem (art. 29º nº 5 da CRP) (Acórdão do STJ de 29/04/2010, em que é relator Santos Carvalho); 3ª - Posteriormente, na operação de formação dos dois grupos de condenação o Tribunal a quo retirou à pena única aplicada nos presentes autos (13 anos) a pena parcelar correspondente ao crime perpetrado na pessoa de DD (2 anos e meio), vindo depois a integrá-lo num outro grupo, conjuntamente com o crime objecto do Proc. nº 252/15.1GCVIS, o que se veio a revelar manifestamente injusto para o Arguido, porquanto passou a ter-se em linha de conta uma pena parcelar (2 anos e meio) que, não fora o presente cúmulo, o Arguido não iria cumprir na totalidade, em virtude de a mesma ter sido englobada numa pena única.

      1. - Tal operação é também manifestamente injusta, desde logo, pelo facto de pese embora haver sido retirada a pena parcelar de 2 anos e meio a uma pena única de 13 anos, tenha o Tribunal a quo, nesse primeiro grupo de penas de prisão, aplicado uma pena de 12 anos e seis meses, pelo que o “desconto” foi irrisório.

      2. - Indo posteriormente o Tribunal a quo cumular esta pena de 2 anos e meio com a pena aplicada no Proc. nº 225/15.1GCVIS (2 anos e 9 meses de prisão suspensa na execução), alcançando uma pena de 3 anos e 4 meses de prisão efectiva.

      3. - Tal significa fazer tábua rasa do sistema de pena conjunta, adoptando um sistema de acumulação material, porquanto, e como é bom de ver, o Arguido, pelos quatro crimes que nos presentes autos foram alvo de uma pena conjunta de 13 anos de prisão, cumpriria (a manter-se a decisão Recorrida), uma pena superior a esses 13 anos.

      4. - No que concerne às concretas penas aplicadas, discorda o Recorrente da transformação da pena de prisão suspensa aplicada no Proc. 252/15.1GCVIS em pena de prisão efectiva.

      5. - Cremos que a pena de prisão suspensa não pode ser cumulada com uma pena de prisão efectiva, desde já em virtude da sua diferente natureza, mas também, e fundamentalmente, porque, e porque assim o determina a segurança jurídica que as decisões penais devem merecer, uma pena suspensa só pode ser revogada em caso de incumprimento culposo do condenado.

      6. Ao assim não ser consideramos ter sido violado o disposto nos arts. 55º e 56º do Código Penal.

      7. - Ainda que assim não se entenda, defendendo-se a possibilidade de cumular tais penas, não resulta do acórdão quaisquer justificações para a transformação da pena suspensa em pena efectiva, não se justificando por qualquer via a não manutenção da suspensão da pena, quando não há qualquer notícia que demonstre que essa suspensão não assegure as finalidades da punição.

      8. - Quanto ao primeiro grupo de penas, e atendendo aos critérios de punição ínsitos no nº 2 do art. 77º, resulta uma moldura penal entre os 9 e os 21 anos de prisão.

      9. - Crê o Recorrente que a fixação em 12 anos e 6 meses é excessiva, ultrapassando a medida da culpa.

      10. - No caso em apreço, e atendendo a que a pena mais elevada é de 9 anos, e as restantes duas de 6 anos cada uma, reputa-se-nos adequada uma pena única de 11 anos de prisão.

      11. - No que tange ao grupo 2, e na sequência do que se deixou já dito supra, crê o Recorrente que a pena de prisão suspensa não pode ser cumulada com a pena de prisão.

      12. - De facto, das penas deste grupo uma delas, de 2 anos e 9 meses, era suspensa, razão pela qual não iria ser cumprida pelo condenado, a menos que violasse grosseiramente as condições que determinaram a suspensão, o que não aparenta ser o caso, e a outra era uma pena parcelar de 2 anos e meio, que o Arguido também não cumpriria integralmente em virtude de a mesma fazer parte de uma pena única (que agora foi desfeita).

      13. - É, pois, excessiva a pena de 3 anos e 4 meses fixada pelo Tribunal a quo para este segundo grupo de penas, crendo o recorrente que de acordo com a moldura aplicável, e atendendo ao concreto circunstancialismo, deve a mesma ser fixada no seu limite mínimo: 2 anos e seis meses.

      14. - Conclui-se desta forma ter sido foi violado o disposto nos artigos 40º e 71º, ambos do Código Penal Termos em que deve o recurso ser julgado procedente com as legais consequências.” 3. Respondeu o Ministério Público, pela Senhora Procuradora da República no tribunal recorrido, dizendo, em conclusões (transcrição): “1. O recurso do arguido deve-se, cremos, à errada compreensão das regras aplicáveis quer à efectivação do cúmulo jurídico, quer à determinação da pena do cúmulo 2. No conhecimento superveniente do concurso de crimes, o momento temporal relevante para a verificação dos seus pressupostos é o do trânsito em julgado da primeira condenação por qualquer dos crimes em concurso 3. No caso concreto, há um primeiro marco temporal a atender (correspondente ao primeiro trânsito em julgado) que delimitará os factos e respectivas penas que hão-de ser abarcados num primeiro cúmulo, e, há também um segundo momento temporal relevante (correspondente ao segundo trânsito em julgado) e que delimitará o âmbito do segundo cúmulo a efectuar.

    2. Houve pois que proceder, não a um cúmulo jurídico, mas a dois (por serem dois os momentos temporais relevantes para a determinação de cada uma das penas que será englobada no cúmulo) donde resultaram duas penas únicas a cumprir sucessivamente pelo arguido 5. É competente para o conhecimento superveniente do concurso e para a aplicação das duas referidas penas únicas, o Tribunal (e processo) da última condenação, no caso, o nosso...

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