Acórdão nº 2200/08.6TBFAF-A.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Fevereiro de 2019

Magistrado ResponsávelROSA RIBEIRO COELHO
Data da Resolução07 de Fevereiro de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 2ª SECÇÃO CÍVEL I - Em 16.2.2012 AA e sua mulher BB intentaram contra CC, DD, EE e mulher FF, GG e marido HH, II e marido JJ, KK e mulher LL, MM e marido NN, OO e mulher PP, por apenso ao processo de inventário instaurado por óbito de QQ e RR, uma ação declarativa, pedindo que: - se declare que a descrição da verba nº 1 da relação de bens apresentada no referido processo de inventário contém um erro de facto porque o respetivo prédio ocupa uma área global de 1662 m2, conforme planta topográfica junta, dele fazendo parte um logradouro no qual se localizam o tanque e as fossas da casa, várias oliveiras, ramadas com videiras, uma garagem e um alpendre anexo, uma corte e um canastro/espigueiro; - se proceda, em conformidade, à emenda da partilha celebrada no mesmo inventário.

Alegaram, em síntese nossa, que, ao pretenderem tomar posse da referida verba nº 1, que lhes foi adjudicada, foram impedidos de o fazer quanto a construções e plantações existentes no seu logradouro; tal oposição foi feita pelos réus GG e HH, que sustentam que o logradouro onde se acham tais construções e plantações faz parte de uma outra verba – a nº 4 – que lhes foi adjudicada.

Estes réus contestaram.

Excecionaram a caducidade do direito dos autores e apresentaram a sua versão dos factos, pedindo a absolvição do pedido.

Veio a ser proferida sentença que julgou a ação improcedente, absolvendo os réus do pedido.

Apelaram os autores, tendo sido proferido acórdão no Tribunal da Relação de Guimarães que alterou a decisão proferida sobre os factos e julgou a ação procedente, ordenando a consequente emenda à partilha.

Os réus GG e HH interpuseram recurso de revista contra tal acórdão, tendo apresentado alegações onde pedem: - a sua revogação e substituição por outro que repristine na totalidade a sentença da 1ª instância, mormente na parte relativa à factualidade dada como provada; - que, a manter-se a operada alteração da decisão proferida sobre os factos, se conheça da nulidade do acórdão recorrido e se julgue verificada a exceção de caducidade do direito dos autores à emenda da partilha.

Formularam, para tanto, as conclusões que passamos a transcrever[1]: 1 - O presente recurso vem interposto do douto Acórdão que, na procedência do recurso da Apelação interposto pelos Autores, revoga a douta decisão proferida na Ia instancia e, por via disso, julga procedente a ação de emenda à partilha instaurada ao abrigo do disposto no artigo 1387° do Código de Processo Civil em vigor naquela data.

2 - O Tribunal a quo procedendo à reapreciação da matéria de facto, alterou parte do ponto 1.5, e deu como provados os pontos 1.3, 1.4 e 1.13 do acervo de facto considerado não provado pela Ia instância, com o que não se concorda.

3 - A referida alteração da matéria de facto, nos pontos de facto referidos, foi feita por o Tribunal a quo considerar que as declarações de parte do Autor AA conjugadas com as declarações da testemunha QQ, seu filho, permitiam tal alteração.

4 - Acontece que na opinião dos réus/recorrentes os pontos 1.3, 1.4 e 1.13 não podiam ter sido dados como provados, pelo Tribunal a quo, um vez que a sua inclusão resulta da errada aplicação da lei do processo, mormente da relevância que o Tribunal deu ao depoimento de parte do Autor e que não podia nem devia ter sido dada.

5 - Assim, nos pontos 1.3, 1.4 e 1.13 o Tribunal a quo deu como provado que: "1.3. O prédio descrito na verba n° l compreende o tanque, as fossas da casa, várias oliveiras, uma ramada com videiras, um alpendre anexo, uma corte e um canastro/espigueiro.

1.4. Nunca, em especial no decurso de várias reuniões efectuadas entre autores e Réus para tentarem viabilizar uma partilha amigável dos bens da herança dos Inventariados, foi posta em causa por ninguém que a composição material do prédio sub iudice era a que ficou assinalada.

1.13. Os Autores não teriam aceitado a adjudicação do prédio constante da verba n° 1 sem o logradouro e as construções integrantes melhor descritas em 1.3." 6 - Ora, lendo o Acórdão recorrido verifica-se que a alteração da matéria de facto teve por base o Auto de Inspeção e nas declarações de parte do Autor AA, bem como no testemunho de seu filho QQ, uma vez que a curta referencia aos depoimentos prestados pela ré II, pela testemunha SS e TT, diz-nos que os mesmos não depuseram sobre os aludidos pontos da matéria de facto.

7 - No caso em apreço, sabe-se que o cerne da questão está em apurar se na partilha ficou acordado entre todos os interessados se os anexos, as oliveiras e a ramada integram a casa de habitação (prédio da verba n° 1) ou se integram as leiras da cerdeira (prédio da verba n° 4), uma vez que ambos os prédios, bem como os anexos, a ramada, o terreno de logradouro e as leiras da cerdeira, faziam parte da herança dos inventariados, pais do Autor marido e da Ré GG, e por eles eram usados, sem quaisquer restrições e para os fins a que se destinavam.

8 - Ora, do Acórdão recorrido extrai-se que a matéria de facto inserida nos números 1.3, 1.4 e 1.13 foi dada como provada com base, única e exclusivamente, nas declarações de parte do Autor marido e da testemunha QQ, seu filho, pois que nenhuma outra testemunha ou documento foram apresentados por forma a corroborar tais declarações.

9 - Acontece que por mais credíveis que fossem as declarações de parte do Autor, a verdade é que as mesmas não poderiam nem podem ser tidas como um meio de prova, muito menos quando desacompanhadas de qualquer meio de prova que as corrobore, uma vez que as declarações de parte não podem valer como prova de factos favoráveis à parte. Neste sentido vide Ac. Rei. Porto de 20.11.2014 (disponível em www.dgsi.pt.

10 - De resto, não se pode olvidar o que a respeito escreveu o réu ... no requerimento que juntou aos autos a fls. 472 documento esse que não foi impugnado por nenhuma das partes, mas que o Tribunal recorrida não atendeu.

11 - Deste modo, verifica-se que o Venerando Tribunal da Relação errou na aplicação que fez dos preceitos legais em apreço, mormente do disposto no artigo 662° do Código de Processo Civil.

12 - Por outro lado, pelas razões expostas no corpo destas alegações, não foram alegados nem provados factos tendentes a identificar o logradouro que no dizer dos Autores fazia parte do prédio da verba numero 1 dos autos de Inventário, quer quanto à sua configuração, área e respetivas construções nele edificadas, sabendo-se como se sabe, que com a mencionada verba confinavam e confinam outros prédios rústicos que de igual modo faziam parte do acervo hereditário e que naqueles autos foram partilhados.

13 - Além disso, entendem os réus recorrentes que os números 1.3., 1.4 e 1.13 não contêm factos concretos, mas apenas e tão-só conclusões.

14 - De facto, dizer-se que "o prédio descrito na verba n° 1 compreende o tanque,..." sem se identificar a área concreta e limites do dito prédio (tendo em conta que os Autores alegaram uma determinada área do prédio, mas que não ficou provada, e alegaram determinados limites, com referencia a um levantamento topográfico que juntaram aos autos, mas que também não ficaram provados), é o mesmo que nada dizer, já que a respetiva resposta constitui, ela própria, a solução da questão jurídica [Neste sentido cfr. Ac. da Relação do Porto de 27/01 /2009, proc. 0827885, disponível in www.dgsi.pt/jtrp] 15 - Assim torna-se evidente que a matéria dos pontos 1.3 e 1.4 e 1.13 não podia ter a formulação conclusiva que lhes foi dada.

16 - Este mais Alto Tribunal podendo apreciar a bondade da decisão de facto, próprio sensu é-lhe lícito contudo - por se tratar já de matéria jurídica - verificar se determinada proposição, retida como facto provado, reflecte (indevidamente e em que medida) uma questão de direito ou um juízo de feição conclusiva ou valorativa, [cfr. Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 29.04.2015, disponível em www.dgsi.pt] 17 - Em conformidade, devem os pontos 1.3. 1.4 e 1.13 serem excluídos da factualidade assente por a sua inclusão violar as regras do direito processual probatório.

18 - Ademais, da factualidade provada no número 1.2 resulta que o prédio descrito na verba n° 1, da respetiva relação de bens constitui uma "uma casa de habitação, com área coberta de 166m2 e 51 m2 de logradouro, ...".

19 - Ora, no artigo 8o da petição inicial os Autores alegaram que o prédio da verba n° 1 tinha uma área total de 1.062 m2 e não a área de 217m2 (correspondentes á soma dos 166 m2 de área coberta com dos 51 m2 de logradouro). Para além disso, no artigo 9o da mesma peça processual alegaram que o mencionado prédio compreende o tanque e fossas, várias videiras, uma garagem e um alpendre anexo, uma corte e um canastro/espigueiro.

20 - Este concreto ponto consta do elenco dos factos não provados inseridos na douta sentença proferida em Ia Instância, sendo que sobre este facto o Tribunal recorrido não se pronunciou.

21 - Entendem os recorrentes que sem dar este concreto facto como provado, não podia o Tribunal da Relação considerar que o prédio da verba n° 1 da descrição da verba n° 1, compreende o...

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