Acórdão nº 8346/15.7T8LSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Setembro de 2018
Magistrado Responsável | FERNANDA ISABEL PEREIRA |
Data da Resolução | 18 de Setembro de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: AA intentou o presente processo comum de declaração (despejo) contra a Casa da Comarca da … - Associação Regionalista, pedindo: - que fosse decretada a resolução do arrendamento com fundamento na falta do pagamento de rendas por período superior a dois meses; - a condenação da ré no despejo e na desocupação imediata do locado, bem como na sua entrega à autora, totalmente devoluto de pessoas e bens; - a condenação da ré no pagamento à autora das rendas em dívida referentes de Dezembro de 2014 a Abril de 2015, num total já vencido de 4586,85€, acrescido de juros civis à taxa legal desde o vencimento até efectivo e integral pagamento; - a condenação da ré no pagamento à autora de indemnização desde a data da citação e até entrega efectiva do locado, correspondente ao dobro da renda mensal de 1016,70€, no valor mensal de 2033,40€; - a condenação da ré em sanção pecuniária compulsória, ao abrigo do disposto no art. 829-A , nºs 1 e 4, do Código Civil, nos seguintes termos: a) pagamento de uma quantia pecuniária correspondente a 1/30 da renda, equivalente a 33,90€, por cada dia de atraso na entrega do locado devoluto; b) aplicação de uma taxa anual de 5% desde o trânsito em julgado da decisão condenatória sobre os montantes em dívida relativos à obrigação de pagamento das rendas já vencidas e à indemnização pedida (2033,40€).
Para fundamentar as pretensões deduzidas alegou, em síntese, que é proprietária de um prédio de que faz parte o andar dado de arrendamento à ré e que, por carta de 14/10/2014, desencadeou o processo para a transição do contrato de arrendamento para o regime do NRAU e actualização da renda, nos termos legais, para 1016,70€, o que a ré não aceitou, continuando a pagar o valor da renda antiga. Por carta de 13/12/2015 a autora comunicou à ré a resolução do contrato de arrendamento, com fundamento na falta de pagamento das rendas, encontrando-se em dívida, de Dezembro de 2014 a Fevereiro de 2015, o diferencial entre uma e outra.
A ré contestou por impugnação e por excepção. No âmbito desta última alegou ser nula a carta da autora por violar normas do regime de transição em causa e ter procedido ao pagamento das rendas, embora pelo valor antigo. Mais invocou a caducidade do direito da autora à resolução do contrato e a existência de falhas na avaliação do imóvel.
Concluiu pela improcedência da acção e, prevenindo a sua eventual procedência, deduziu reconvenção, na qual pediu a condenação da autora no pagamento da quantia de 121.259€ a título de indemnização pela denúncia do contrato de arrendamento, pelos valores que entregou e pelas obras que fez.
A autora replicou, impugnando a facticidade atinente às excepções e à reconvenção e defendendo a sua improcedência.
Posteriormente, a ré informou que havia efectuado uma transferência bancária para a conta da autora, nos termos do artigo 33º nº 10 do NRAU.
Em resposta a autora defendeu a inaplicabilidade do disposto naquele normativo, por não ter havido denúncia do contrato de arrendamento, e impugnou o valor depositado, que qualificou de extemporâneo, nos termos do artigo 1084º nº 3 do Código Civil e 14º nº 3 do NRAU.
Realizado o julgamento e proferida sentença, foram a acção e a reconvenção julgadas parcialmente procedentes, decidindo-se: - reconhecer a resolução do contrato de arrendamento com fundamento na falta do pagamento de rendas e condenar a ré no despejo e na desocupação imediata do locado, bem como na sua entrega à autora livre de pessoas e bens, e ainda no pagamento à autora das rendas vencidas de Dez2014 a Maio2015 - (as quantias correspondentes à diferença entre as efectivamente pagas e a nova renda de 1076,70€) e vincendas até efectiva entrega do locado, acrescidas de juros de mora à taxa legal desde o vencimento de cada renda até pagamento. Mais condenou a ré, a título de sanção pecuniária compulsória, no pagamento da quantia de 33,90€ por cada dia de atraso no cumprimento da obrigação de restituição do locado, absolvendo a ré do mais pedido; - condenar-se a autora a pagar à ré quantia a liquidar ulteriormente correspondente ao valor da reparação de emergência de parte da cobertura efectuada entre 2010 e 2011; - do mais pedido foram a autora e a ré absolvidas.
Inconformada, apelou a ré.
O Tribunal da Relação, por acórdão de 6 de Dezembro de 2017, proferiu a seguinte decisão: «Pelo exposto, julga-se procedente o recurso quanto à decisão da acção, revogando-se a sentença recorrida, na parte em que julgou procedente parcialmente a acção e substituiu-se a mesma por esta que agora julga a acção totalmente improcedente, absolvendo a ré dos pedidos formulados pela autora.
Esta revogação da sentença faz cair, por arrastamento, a condenação da autora em parte do pedido reconvencional que agora se julga também totalmente improcedente, indo a autora absolvida de todos os pedidos reconvencionais, revogando-se por isso, também nesta parte, a sentença.
O recurso da autora fica prejudicado, ficando as custas de parte da ré a cargo da autora.
As custas de parte da ré, quanto à acção e quanto ao seu recurso, são a suportar pela autora em 22,44%.
As custas de parte da autora, quanto à acção e quanto ao recurso da ré, seriam a suportar pela autora em 77,56%, mas a ré está dispensada do pagamento de custas, por ter apoio judiciário.» Recorre agora a autora de revista para este Supremo Tribunal de Justiça.
Na sua alegação formulou extensas conclusões que se transcrevem: «1. O Acórdão recorrido chumbou a acção por ter considerado ineficaz a comunicação da senhoria para actualização da renda para todo o espaço arrendado, referindo que parte do imóvel não está abrangida pelo arrendamento, quando afinal está, implicando tal que ao inquilino não foram fornecidos os elementos que a lei impõe, designadamente o valor da renda peio espaço total arrendado.
2. Recorre-se do apontado fundamento, não em abstracto, enquanto ponto de sumário jurisprudencial, mas tal como configurado e aplicado pelo tribunal recorrido no vertente caso concreto.
3. Ao apreciar o pedido, o tribunal tem de considerar a causa de pedir enunciada na petição inicial, e não pode basear a sentença de mérito em causa de pedir não invocada peio autor; simetricamente, sendo o R. recorrente, ao apreciar o pedido por aquele formulado por via de recurso de revogação de sentença com determinado fundamento, o tribunal ad quem tem de considerar esse fundamento tal como enunciado pelo Réu Recorrente na Alegação e nas Conclusões, e não pode basear o acórdão de mérito que lhe concede provimento, em fundamento diverso ou não invocado peio recorrente, (nº 2 do artº Ó089, nº 1 do artº 609º, e alínea e), do nº 1, do artº 615º, ex vi artº 663º, nº 2, e 6óó9, nº1. todos do CPC).
4. Questões, na acepção destas normas, são matérias trazidas aos autos e submetidas à decisão do Tribunal, nos precisos termos e com o objecto e o fundamento com que foram suscitadas pelas partes, para obter determinado efeito jurídico, procedentes de determinado facto jurídico, tendo em vista uma relação de causalidade entre o facto jurídico causal concretamente invocado de que a pretensão procede -a causa de pedir-, e o concreto efeito jurídico pretendido, decorrente desse facto, - o pedido -.
5. Decorre dos princípios da autonomia da vontade e do dispositivo que se o tribunal concede à parte o efeito jurídico que aquela pretende obter, mas procedendo de facto jurídico diverso do invocado, estará a julgar extra vel ultra petitum, sendo nula a sua decisão, nos termos do artº 159, nº1, alínea e) do CPC; ao julgar procedente determinada pretensão nuclear formulada pela parte, o Tribunal deve, sob pena de nulidade, fazê-lo quer no que respeita ao pedido quer no que respeita à causa de pedir 6. A improcedência da acção sustentada pela Ré tem como pedido e causa de pedir principal a declaração de inidoneidade da carta da Autora de 14.10.2014 para operar a transição para o NRAU e proceder à actualização da renda, resultante de a senhoria com ela ter praticado acto simulado, e, por isso, nulo, ao pretender, não esses efeitos, mas a resolução do contrato de arrendamento, através da redução do seu objecto, impossibilitante da respectiva manutenção.
7. Já o acórdão revidendo, entendeu coisa muito diversa, afastando expressamente as teses da 'nulidade por simulação' e da 'resolução do contrato por redução do seu objecto'.
8. O tribunal a quo decidiu que a carta da senhoria era ineficaz para realizar os seus fins legais, e designadamente a actualização da renda, com o fundamento de que nessa comunicação, ao pôr em causa aquilo que é o objecto do contrato, dizendo que uma determinada parte do imóvel não faz parte do mesmo, tal se reflectir no valor da renda e na susceptibilidade de satisfazer as finalidades do arrendatário, e nessa medida não lhe dar minimamente o conhecimento dos elementos necessários para a tomada conscienciosa daquelas decisões.
9. Enquanto o tribunal a quo entendeu que a comunicação da Autora pecava por falta de elementos informativos essenciais impostos nas normas dos artºs 30º e 50º do NRAU, sem os quais o inquilino ficava impossibilitado de tomar conscienciosamente as decisões que se lhe impunham, já a Ré entendeu que, não obstante a comunicação da senhoria lhe fornecer todos os elementos essenciais, e legalmente exigidos, para tomar as competentes decisões, que inclusivamente tomou, a verdade é que a senhoria nunca pretendeu, senão simuladamente, actualizar a renda e transitar o arrendamento para o regime do NRAU, mas apenas o que quis foi operar a resolução do contrato por redução do objecto do arrendamento, impossibilitando dessa forma a sua manutenção: ou seja, sendo parecido o efeito jurídico produzido, é diversa a causa de pedir que o produz, ou o seu fundamento.
10. Tanto que a Ré se considerou de posse dos elementos necessários para a tomada conscienciosa das decisões aludidas, que expressamente as tomou de forma e sentido inequívocos, sem reservas de qualquer tipo, ou...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO-
Acórdão nº 304/20.6T8PTL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Junho de 2023
...por, no impugnado entendimento do Tribunal, resultar menor VPT – favorável à Autora –, no acórdão do STJ de 18-09-2018, Processo 8346/15.7T8LSB.L1.S1, em que, na comunicação e na caderneta predial, se omitiu um sótão que integrava o locado, e no acórdão da Relação de Guimarães de 03-10-2019......
-
Acórdão nº 708/19.7T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 09 de Junho de 2020
...p. 1696/037TBFAF.G1 disponível em www.dgsi.pt. Cfr., o Ac. do STJ de 13-09-2018 (relatora: Fernanda Isabel Pereira) - revista n.º 8346/15.7T8LSB.L1.S1 – 7.ª Secção, disponível em...
-
Acórdão nº 2790/17.2T8FAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 17 de Janeiro de 2019
...assinado pelo declarante e remetido por carta registada com aviso de receção. Como é referido no Ac. STJ de 18.09.2018, processo n.º 8346/15.7T8LSB.L1.S1[3], «A especificidade e o rigor impresso às formalidades exigidas explicam-se, em boa parte, pela circunstância de a comunicação em causa......
-
Acórdão nº 304/20.6T8PTL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Junho de 2023
...por, no impugnado entendimento do Tribunal, resultar menor VPT – favorável à Autora –, no acórdão do STJ de 18-09-2018, Processo 8346/15.7T8LSB.L1.S1, em que, na comunicação e na caderneta predial, se omitiu um sótão que integrava o locado, e no acórdão da Relação de Guimarães de 03-10-2019......
-
Acórdão nº 708/19.7T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 09 de Junho de 2020
...p. 1696/037TBFAF.G1 disponível em www.dgsi.pt. Cfr., o Ac. do STJ de 13-09-2018 (relatora: Fernanda Isabel Pereira) - revista n.º 8346/15.7T8LSB.L1.S1 – 7.ª Secção, disponível em...
-
Acórdão nº 2790/17.2T8FAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 17 de Janeiro de 2019
...assinado pelo declarante e remetido por carta registada com aviso de receção. Como é referido no Ac. STJ de 18.09.2018, processo n.º 8346/15.7T8LSB.L1.S1[3], «A especificidade e o rigor impresso às formalidades exigidas explicam-se, em boa parte, pela circunstância de a comunicação em causa......