Acórdão nº 318/05.6TVPRT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 24 de Maio de 2018
Magistrado Responsável | TOMÉ GOMES |
Data da Resolução | 24 de Maio de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam da 2.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: I – Relatório 1.
A sociedade AA, Lda (A.), instaurou, em 24/01/2005, ação declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra a sociedade italiana BB, S.R.L. (R.), alegando, no essencial, que: .
A A. dedica-se à representação, agência exclusiva, divulgação e promoção de vendas, em Portugal, de produtos de fábricas estrangeiras; .
No âmbito de tal atividade, a A. celebrou com a R. um contrato de agência com vista a angariar clientela para esta, no mercado nacional, na promoção e venda de aços mediante o pagamento de uma retribuição de 3% sobre o produto das vendas; .
Tal contrato, que vigorava então há cerca de 20 anos, foi reafirmado em 07/07/1993, sendo as vendas efetuadas e faturadas tanto diretamente pela A. como pela filial da R. em Espanha; .
Porém, a R., sem justificação e de imediato, pôs termo ao mesmo em 03/02/2003, apropriando-se da clientela angariada pela A.; .
Por carta de 26/01/2004, a A. reclamou da R. as indemnizações devidas pela referida denúncia, bem como as comissões ainda por liquidar, o que esta recusou; .
Nos últimos cinco anos que precederam a denúncia, a A. auferiria um total de comissões de € 97.763,80, numa média anual de € 19.552,76, mas desse montante ficou por pagar o montante de € 47.101,00; .
Em face disso, assiste à A. o direito ao pagamento do montante € 47.101,00 correspondente às comissões em falta, da indemnização de € 11.134,99, equivalente ao triplo da média mensal, no valor de € 3.711,60, das comissões vencidas no decurso do ano precedente ao ano da denúncia, pela inobservância do prazo legal de três meses para o pré-aviso, e da quantia de € 19.552,76, a título de indemnização de clientela.
Concluiu pedindo a condenação da R. a pagar-lhe a quantia total de € 77.788,75 com todas as consequências legais.
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A R. apresentou contestação, na qual, além de invocar a exceção da incompetência internacional e a caducidade dos direitos peticionados: .
Sustentou que a A., desde abril de 2001, nada angariou para a R., nem intermediou qualquer venda, o que determinou a extinção do contrato de agência por falta de qualquer atividade da agente; .
E, no mais, impugnou a maior parte dos factos alegados pela A., negando que tenha denunciado o sobredito contrato e afirmando ter pago à mesma A. todas as comissões dos contratos por ela angariados, quando vencidas, bem como tudo o que lhe devia pagar. Concluiu pela procedência das exceções invocadas e, em qualquer caso, pela improcedência da ação.
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A A. deduziu réplica a pugnar pela improcedência das exceções invocadas.
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Findos os articulados, foi proferido despacho saneador a julgar improcedente a exceção da incompetência e a relegar para final o conhecimento das exceções perentórias deduzidas, procedendo-se, de seguida, à seleção dos factos tidos por relevantes como organização da base instrutória, conforme fls. 101-104.
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Após vicissitudes várias em sede de diligências instrutórias e finda a audiência final, no decurso da qual a A. ampliou o pedido de forma a abranger os juros de mora vencidos e vincendos, à taxa dos juros comerciais, foi proferida a sentença de fls. 1482 a 1517, datada de 10/07/2016, na qual foi inserida a decisão de facto e respetiva motivação, a julgar a ação parcialmente procedente, condenando-se a R. a pagar à A. as quantias de € 47.101,00, pelas comissões em falta, e de € 10.000,00, a título de indemnização da clientela, acrescidas de juros de mora desde a citação, à taxa decorrente dos artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 597/05, de 19/07, e absolvendo-a no mais peticionado.
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Inconformada com tal decisão, a R. interpôs recurso para o Tribunal da Relação do Porto, no âmbito do qual foi proferido o acórdão de fls. 1599 a 1615/v.º, datado de 20/04/2017, a revogar a sentença recorrida e a absolver a R. dos pedidos por que vinha condenada.
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Desta feita, vem agora a A. pedir revista, pugnando pela reposição da sentença da 1.ª instância, para o que identifica, nas respetivas conclusões, as seguintes questões essenciais: 1.ª – O erro de julgamento do acórdão recorrido na parte em que, diversamente do julgado em 1.ª instância, concluiu não existir fundamento para a inversão do ónus da prova relativamente ao montante total de € 97.763,80 de comissões auferíveis pela A. nos últimos cinco anos que precederam a denúncia do contrato de agência - conforme por ela alegado e vertido sob o artigo 13.º da base instrutória -, com violação do disposto nos artigos 12.º e 13.º do Dec.-Lei n.º 178/ 86, de 03-07, dos artigos 342.º e 344.º, n.º 2, do CC e nos artigos 7.º, 417.º e 620.º do CPC; 2.ª – O erro de julgamento do mesmo aresto na parte em que concluiu pela insuficiência de factos que preenchessem os requisitos dos artigos 33.º e 34.º do Dec.-Lei n.º 178/86, de 03-07, na redação dada pelo Dec.-Lei n.º 118/93, de 13-04, que servem de pressupostos do invocado direito a indemnização da clientela. 8.
A Recorrida apresentou contra-alegações a pugnar pela inteira confirmação do julgado.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
II – Fundamentação 1. Factualidade dada como provada nas instâncias Vem dada como provada nas instâncias a factualidade que, para melhor clareza expositiva, se reordena nos seguintes moldes: 1.1.
A A. dedica-se à representação, agência exclusiva, divulgação e promoção de vendas em Portugal de produtos de fábricas estrangeiras – resposta ao art.º 1.º da base instrutória; 1.2.
A A. celebrou com a ré R. um contrato mediante o qual se obrigou a angariar clientela e correspondentes vendas de produtos especiais de aço – alínea A) dos factos assentes; 1.3.
A comissão a que a A. tinha direito era de 3% – alínea B) dos factos assentes; 1.4.
Em 07/07/93 e na sequência do contrato referido em 1.2, que já estava em vigor entre as partes, foi enviado à A. o fax de fls. 7/8 dos autos acompanhado do doc. de fls. 393, 394, 392 e 395 a 401 [sendo a ordem de envio do fax a correspondente à paginação antes referida e cuja tradução se encontra a fls. 1436 a 1440 e 1465 e 1471 (quanto à última página daquele texto) – vide ata de fls. 1449] correspondente ao clausulado de um contrato de agência escrito em exclusividade sem representação para produtos de aço ali descriminados no “anexo A” e que a aqui A. deveria devolver à R. assinado em sinal de aceitação e confirmação do mesmo, o que esta não fez – resposta ao art.º 2.º da base instrutória; 1.5.
Nos termos do clausulado referido em 1.4, a A. continuava a exercer as funções referidas em 1.2, angariando clientela e promovendo a venda de forma exclusiva por referência aos produtos referidos no “anexo A”, por período indeterminado – resposta aos artigos 3.º e 4.º da base instrutória; 1.6.
A A. comprometeu-se para com a R. a não representar no mercado português outros produtores de aço inoxidável dentro dos produtos que a R. fabricava e de que a A. era representante em Portugal – resposta ao art.º 15.º da base instrutória.
1.7.
A A. continuou a sua atividade referida em 1.2 após o envio do fax referido em 1.4, angariando mais clientes para a R., a quem incumbia depois outorgar os respetivos contratos, sendo a comissão referida em 1.3, calculada sobre o produto das vendas efetuadas em Portugal e promovidas pela A. – resposta aos artigos 5.º a 7.ª da base instrutória; 1.8.
A R. comunicou verbalmente à A. a cessação do contrato referido em 1.2, em data não apurada mas não posterior a abril de 2002 – resposta ao art.º 8.º da base instrutória; 1.9.
Tendo continuado a beneficiar da clientela angariada pela autora através da atividade do seu distribuidor “CC”, incluindo nos termos referidos em 1.10 – resposta aos artigos 9.º a 11.º da base instrutória; 1.10.
Após fevereiro de 2003, a A. ficou privada da clientela por si angariada na sequência do referido em 1.8 e do mail enviado por “CC” de fls. 17, datado de 03/02/2003, através da qual passara a angariar clientes e promover a venda dos mesmos produtos à mesma clientela no período de janeiro de 2002 a fevereiro de 2003; não tendo a A. representação de qualquer outra empresa que fornecesse/forneça os mesmos produtos da R. – resposta ao art.º 12.º da base instrutória com a inclusão da data constante do indicado documento de fls. 17; 1.11.
Nos últimos cinco anos que precederam o que se refere em 1.10, a A. auferiu comissões de valor não inferior a € 50.662,80, que reporta ao montante de € 97.763,80, tido por ela como o total das comissões devidas durante aquele período – alínea D) dos factos provados e resposta ao art.º 13.º da base instrutória[1]; 1.12.
Por carta de 26/01/04, a A. pediu à R. o pagamento de uma indemnização e das comissões que se encontravam por liquidar – alínea C) dos factos assentes. 2. Factos não provados Foi dado como não provado que: 2.1.
Do alegado em 8.º da base instrutória, a R. pôs fim ao contrato referido em 1.2 sem qualquer justificativo e por correio eletrónico de 03/02/2003 nos termos de fls. 17/18; 2.2.
A R. nomeou seu novo agente um empregado da A. – resposta negativa ao art.º 10.º da base instrutória; 2.3.
Do alegado em 13.º da base instrutória, o valor das comissões devidas pela R. à A. no período referido em 13.º da base instrutória era de € 97.763,80 – resposta restritiva ao art.º 13.º da base instrutória; 2.4.
A partir de abril de 2001, a A. não mais angariou qualquer cliente nem intermediou qualquer venda para a R. – resposta negativa ao art.º 14.º da base instrutória; 2.5.
Em várias ocasiões, a A. angariou e vendeu produtos de sociedades concorrentes da R. – resposta negativa ao art.º 16.º da base instrutória. De referir que, enquanto a 1.ª instância, por virtude da inversão do ónus da prova, deu por provado que a R. não pagou à A. o valor alegado por esta como respeitantes às comissões devidas e não satisfeitas por aquela, nos cincos anos anteriores a fevereiro de 2003, a Relação considerou não justificada tal inversão e assim não provada a matéria, nesse domínio, controvertida. 3.
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