Acórdão nº 33/16.5GCETR.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelRAUL BORGES
Data da Resolução07 de Fevereiro de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

No âmbito do processo comum, com intervenção de tribunal colectivo, n.º 33/16.5GCETR, da Comarca de … – Instância Central – 1.ª Secção Criminal – Juiz 2, foram submetidos a julgamento os arguidos: AA, divorciado, operário fabril, nascido a 24 de Novembro de 1981, natural da freguesia de …, Concelho do Porto, residente na Rua …, n.º …, em …. (Detido em 17-02-2016, sendo imposta medida de coacção de prisão preventiva em 18-02-2016, e libertado em 6-12-2016, na sequência do deliberado pelo acórdão da primeira instância).

BB, julgada na ausência.

***** Realizado o julgamento, em duas sessões, na segunda, foi lavrado termo de transacção entre o arguido e o demandante cível CC, proprietário da Ourivesaria DD e Pai da ofendida EE, no que respeita ao pedido cível enxertado pelo referido demandante, a qual foi homologada em despacho ditado para a acta.

***** Por acórdão do Tribunal Colectivo proferido em 6 de Dezembro de 2016, pela 1.ª Secção Criminal da Instância Central da Comarca de … - Juiz 2, constante de fls. 984 a 1042, e depositado na mesma data, conforme declaração de depósito de fls. 1045, foi deliberado: A) – Absolver o arguido AA da prática de um crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210.º, n.ºs 1 e 2, al. b), por referência ao disposto no artigo 204.º, n.º 2, al. f), ambos do Código Penal, relativamente aos factos ocorridos em 23/01/2016, sem prejuízo da diferente qualificação jurídica de tais factos; B) – Condenar o arguido, pela prática, sob a forma consumada e em concurso efetivo: a) – em autoria material singular, de: – Um crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210.º, n.º 1, do Código Penal, cometido em 23/01/2016, na pena de dois anos e três meses de prisão; – Dois crimes de roubo, p. e p. pelo artigo 210.º, n.ºs. 1 e 2, al. f), por referência ao disposto no artigo 204.º, n.º 2, al. f), ambos do Código Penal, sendo pelo cometido em 28/01/2016, na pena de três anos e nove meses de prisão, e pelo cometido em 07/02/2016, na pena de três anos e três meses de prisão; – Um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artigo 86.º, n.º 1, al. c), da Lei n.º 5/2006, de 23/02, na sua redação atual, na pena de um ano e três meses de prisão; b) – em coautoria com a arguida BB, de: – Um crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210.º, n.ºs 1 e 2, al. b), por referência ao disposto no artigo 204.º, n.º 2, al. f), ambos do Código Penal, cometido em 11/02/2016, na pena de três anos e três meses de prisão; e c) Em cúmulo jurídico, na pena única de cinco anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo, subordinada a regime de prova e à condição de comprovar nos autos o pagamento do valor global da indemnização que acordou com o demandante civil CC – 18.000,00 € (dezoito mil euros) -, em cinco prestações anuais, no valor de 3.600,00 € (três mil e seiscentos euros) cada uma.

  1. Condenar a arguida BB, pela prática, em coautoria, sob a forma consumada, de um crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210.º, n.ºs 1 e 2, al. b), por referência ao disposto no artigo 204.º, n.º 2, al. f), ambos do Código Penal, na pena de três anos e três meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo, subordinada a regime de prova.

Foi revogada a medida de coacção de prisão preventiva, com restituição do arguido à liberdade, conforme fls. 1040.

***** Inconformado com esta decisão, o Ministério Público interpôs recurso, nos termos constantes de fls. 1.054 a 1.074, invocando, inclusive, a “elevada quantidade de droga apreendida” na conclusão 9.ª, a fls. 1.070, o que o arguido na conclusão 3.ª da resposta apresentada, a fls. 1.101, considerou ser falso e preocupante, uma vez que não existiu qualquer estupefaciente apreendido, consideração ora presente na actual conclusão 8.ª.

O recurso foi regularmente admitido, a fls. 1.075.

O arguido veio responder nos termos constantes de fls. 1.093 a 1.101, tendo concluído que a decisão recorrida não merecia censura e que, por isso, deveria negar-se provimento ao recurso.

Por despacho de fls. 1.103, foi ordenada a remessa dos autos ao Tribunal da Relação do Porto.

****** O Tribunal da Relação do Porto, pelo acórdão proferido em 24 de Maio de 2016, constante de fls. 1.118 a 1.131 verso, concedeu provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público, e, em consonância, revogando a decisão da primeira instância, condenou o arguido nas seguintes penas: - 2 anos e 9 meses de prisão pelo crime de roubo cometido em 23-01-2016; - 4 anos de prisão pelo crime de roubo cometido em 28-01-2016; - 3 anos e 9 meses de prisão pelo crime cometido em 07-02-2016; Foram mantidas as penas de - 3 anos e 3 meses de prisão, pelo crime cometido em coautoria com a arguida no dia 11-02-2016; - 1 ano e 3 meses, pelo crime de detenção de arma proibida.

Em cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena única de 6 anos de prisão.

***** O arguido interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, apresentando a motivação de fls. 1.145 a 1.162, que remata com as seguintes conclusões: 1) Dos factos dados como provados, apenas se pode retirar que o grau de ilicitude não é reduzido, mas também não é elevado, já que, o arguido causou apenas danos patrimoniais, encontrando-se todas as vítimas ressarcidas, ao contrário do que, por lapso, se encontra redigido no acórdão do tribunal de primeira instância, o que facilmente se comprova através da consulta dos autos; 2) O arguido levou a cabo os seus intentos, como confessou, de forma precipitada, não premeditada, demonstrando profundo amadorismo na execução dos roubos, o que aliás, conduziu à sua rápida identificação e captura.

3) Quer o acórdão recorrido elencar como factores caracterizadores de especial audácia e de premeditação o facto de o arguido agir à noite, e fazer uso de camisola com capuz, o que carece de fundamento, já que, o uso de tal indumentária é particularmente comum no grupo etário em que se insere o arguido.

4) Além do mais, os roubos foram cometidos durante a proximidade do carnaval, festa com grande expressão na cidade de …, onde foram cometidos, estando sempre a noite pejada de gente, muita dela, vestida de forma bastante mais suspeita.

5) Os factos em causa integram o conceito de dolo directo, o que se aceita, todavia, este facto decorre do próprio tipo de crime.

6) Quanto a este ponto, o arguido confessou ter sido pressionado a levar a cabo estes roubos pela companheira da altura, que exercia sobre ele completo domínio, esta arguida também nos presentes autos, e já com registo criminal pela prática do mesmo tipo de ilícito.

7) Sobre esta matéria construiu o Ministério Público uma teoria de desculpabilização por parte do arguido, quando todos os factos, nomeadamente, aqueles que se reportam à concreta situação pessoal relativa a ambos os arguidos, indica que é o arguido recorrente quem fala verdade. Pena é que, apesar da arguida nem sequer se ter dignado a comparecer em julgamento, se dê relevo às suas afirmações prestadas em sede de inquérito.

8) Lamentavelmente, o Ministério Público arguiu uma falsidade, com certeza para melhor construir um perfil criminoso ao arguido, a de que foram apreendidas elevadas quantidades de droga em posse do mesmo, justificando assim o destino dado ao “rendimento” obtido pelos roubos.

9) De todo o modo, da matéria dada como provada não resulta qualquer conclusão sobre os sentimentos manifestados pelo arguido quando cometeu os ilícitos.

10) O arguido é primário, teve até a data dos factos um percurso normativo exemplar, pautado por hábitos de trabalho e de saudável inserção social. Encontra-se familiarmente integrado, vivenciando actualmente um quadro familiar de profunda felicidade, vivendo com os seus progenitores, septuagenários que precisam do seu auxílio, e com o seu filho menor de três anos de idade.

11) Apenas quando iniciou um relacionamento amoroso com a coarguida, que se revelou disfuncional, facto que, conjugado com a ausência do seu filho menor, fruto de anterior relacionamento, gerou um quadro de desestabilização que culminou com uma tentativa de suicídio em 07 de Outubro de 2015, e com o posterior despedimento em Novembro do mesmo ano.

12) É este relacionamento que emerge como factor desviante no trajecto do arguido, porém, por sua iniciativa, o casamento terminou, tendo sido decretado o divórcio em 25 de Julho de 2016.

13) O período em que se circunscrevem os factos tem a durabilidade de aproximadamente 15 dias, não se provando que subsistiriam caso não fosse detido.

14) O tribunal de primeira instância considerou o relatório social nos termos previstos no artigo 370º do CPP, apreciando-o de forma correcta. O relatório social não é propriamente um meio de prova, contudo, aplicam-se algumas das regras atinentes às provas: nº 4 do 370º do CPP.

15) Após a leitura do Acordão que, em primeira instância decretou a libertação do arguido, o mesmo passou a residir junto dos seus progenitores, longe do meio onde se encontrava inserido aquando da sua detenção, estando ainda na companhia do seu filho menor, cuja guarda foi judicialmente entregue aos avós paternos, afigurando-se assim a definitiva estabilidade emocional que o próprio arguido ambicionava, sendo que, a sua libertação não causou qualquer alarme social.

16) Tendo em conta as circunstâncias particulares do caso em apreço, a vida anterior do arguido, a sua personalidade, é de esperar que este conduza a sua vida de modo socialmente responsável, como aliás já sucede, encontrando-se a trabalhar desde Janeiro de 2017, destinando os seus rendimentos ao cumprimento da obrigação estabelecida perante a lesada “Ourivesaria DD”, conforme estabelecido no Acórdão de primeira instância, reparando as consequências patrimoniais decorrentes do crime que confessou ter praticado.

17) Portugal é reconhecidamente um país seguro, sem manifestações preocupantes no domínio da criminalidade violenta, à excepção da que ocorre no âmbito do crime de violência doméstica e das suas consequências.

18) Na comunidade onde os factos que aqui se discutem foram...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT