Acórdão nº 810/04.0TBTVD.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Novembro de 2014

Magistrado ResponsávelÁLVARO RODRIGUES
Data da Resolução20 de Novembro de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: RELATÓRIO AA e mulher, BB, instauraram contra 1) CC-carpintaria, Lda, 2) DD e mulher EE e 3) FF e mulher GG, todos com os sinais dos autos, a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum ordinário, pedindo que fosse: a) declarado que a procuração outorgada pelos AA ao 2° R, foi obtida por dolo deste R; b) declarado que a procuração, bem como o contrato de compra e venda subsequente, no qual interveio o 2° R, usando a referida procuração, é nulo e de nenhum efeito e os RR condenados a reconhecer isso mesmo; c) declarado que os AA continuam a ser os únicos e legítimos proprietários do prédio urbano inscrito na matriz predial urbana sob o artigo … e descrito na Conservatória do Registo Predial de Torres Vedras sob o n° … e os RR condenados a reconhecer isso mesmo; d) declarado que nenhum dos RR tem qualquer titulo que permita a qualquer deles, ceder, a título oneroso ou gratuito, o supra referido prédio ou a impor qualquer ónus ou obrigação e condenados a reconhecer isso mesmo; e) ordenado o cancelamento na matriz e no registo predial de qualquer registo ou averbamento que tenha sido executado ou que se venha a executar com base na procuração e na escritura de venda do prédio e isso à custa exclusiva dos RR; f) declarada a nulidade da cessão de quotas outorgada em 07.06.2002 no 2° Cartório Notarial de Torres Vedras e ordenado o cancelamento do registo na Conservatória do Registo Comercial e os RR condenados a reconhecê-lo; g) os RR condenados a pagar aos AA, danos não patrimoniais no valor de € 20 000,00 e danos patrimoniais a liquidar em execução de sentença.

Alegam, em resumo, que na sequência de promessa do 2° R de que os ajudaria a superar as suas dificuldades – resultantes de problemas económicos e de saúde do A – e da necessidade de procuração para tal, os AA outorgaram-lhe uma procuração, sem que entendessem o real significado da mesma, nomeadamente sem se aperceberem do alcance e da amplitude dos poderes que com a mesma conferiam, já que são pessoas humildes e de poucas letras, alem de que o A estava incapacitado de entender o seu teor face ao seu estado de saúde.

Daqui retiram que a procuração é nula, pois nunca quiseram vender ou prometer vender o seu património, além de que estavam obrigados a manter a hipoteca dos imóveis e a não os alienar, pelo que estavam impedidos de conferir mandato para tal.

Mais alegam que procederam à cessão de quotas que detinham na sociedade 1ª Ré, ao 2° R, mas não receberam o preço da venda indicado na escritura.

Acresce que tal cedência ocorreu na sequência de o 2° R. lhes dizer que tal cessão era necessária para ele conseguir avultado crédito bancário, com a promessa de lhes pagar o empréstimo hipotecário e libertá-los da hipoteca da casa de habitação, assim os auxiliando.

Porém, o que os RR quiseram foi defraudar os AA, sem lhes pagarem assim como à entidade bancária, pelo que concluem que, com estes fundamentos, tal escritura é nula.

Fundam a responsabilidade das RR mulheres no proveito comum do casal e, finalmente, alegam que sofreram danos patrimoniais e não patrimoniais, em virtude das condutas dos RR., quantificando estes no valor peticionado e relegando aqueles para liquidação de sentença.

Contestaram os RR., arguindo a ilegitimidade da 1ª Ré e pedindo a sua absolvição da instância e a improcedência da acção quanto aos demais RR e absolvição do pedido.

Estribam a sua defesa impugnando a versão trazida aos autos pelos AA e alegando que a cessão de quotas por parte do A e a venda da totalidade do pavilhão e da parcela de terreno onde o mesmo se encontrava implantado foi proposta aos RR pelos AA.

Assim, os RR maridos acordaram com os AA a constituição de uma sociedade, a ora 1ª Ré, em que o A marido e os RR maridos teriam comparticipações iguais, a qual passou a explorar o estabelecimento de carpintaria anteriormente explorado pelo A (primeiro em nome individual e depois por uma sociedade em que ele participava).

Além disso, os AA outorgariam em favor dos RR escritura de compra e venda do pavilhão onde funcionava o estabelecimento de carpintaria e parcela de terreno em que o mesmo se encontrava implantado e, em contrapartida, os RR comprometeram-se a pagar as dívidas dos AA, incluindo as que oneravam o seu património pessoal, que os AA afirmavam não ultrapassar o montante de Esc. 45.000. 000$00.

Como até ao final do primeiro trimestre de 2002 o 2° R liquidou um total de dívidas muito superior, no montante de 113.477.195$00 e os AA não tinham possibilidade de pagar ao 2° R essa diferença, nem solver as dívidas contraídas, AA e RR acordaram na cedência de quotas do A na sociedade 1ª R ao 2° R, comprometendo-se este a liquidar as dívidas existentes à data da cedência de quotas.

Foi na sequência destes acordos e porque o pavilhão onde funcionava a carpintaria não possuía licença de utilização e, igualmente, não possuía os requisitos impostos para o regular funcionamento de um estabelecimento do género, não sendo assim possível outorgar escritura de compra e venda do referido imóvel, que os AA outorgaram a procuração em causa nestes autos, assim como depois celebraram a escritura de cessão de quotas do A para o 2° R, actos cujos conteúdos compreenderam e correspondiam à vontade dos AA, nomeadamente quanto ao mandato que conferiam ao 2° R.

Finalmente, alegam que têm vindo a amortizar as dívidas que eram da responsabilidade dos AA tendo pago até à data da contestação o montante de 169 517.976$10, quando o próprio A apenas tinha valorizado em 45 200 000$00 o pavilhão que constituí a carpintaria e o terreno onde o mesmo se encontra implantado.

Após a legal tramitação, foi realizado o julgamento da acção e proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu os RR dos pedidos.

Inconformados, apelaram os AA, sem êxito, para o Tribunal da Relação de Lisboa, que julgando improcedente a apelação, confirmou a sentença recorrida.

Ainda irresignados, os mesmos vieram interpor recurso de Revista para este Supremo Tribunal de Justiça, rematando as suas alegações, com as seguintes: CONCLUSÕES 1 - O Venerando Acórdão é nulo: as questões sob Conclusões n°s. 2, 4, 9 e 10, a documentação clínica junta aos autos e os factos assentes em C), D), E) - fls 9 não foram apreciadas o que traduz omissão de pronúncia e nulidade e denegação de Justiça: 2 - Da resposta ao ponto 9 da Base Instrutória retira-se que a intenção dos AA. antes da outorga da Procuração NÃO ERA VENDER O IMÓVEL...

4 - A incapacidade do A. pouco antes da procuração e ainda em fase de convalescença pós-hospitalar não mereceu uma linha na fundamentação da Douta Sentença, o que a torna nula.

9 - A procuração foi outorgada sem que os AA. se apercebessem do alcance e da amplitude dos poderes pois são pessoas humildes, de poucas letras.

O A. AA estava incapacitado em 4-10-2001 de entender o teor da Procuração face ao estado de doença que o afecta desde 1-5-2001, encontrando-se obnubilado e confuso.

10 - Os AA nunca quiseram vender ou prometer vender o património: o acto notarial é nulo pois os AA estavam impedidos de conferir mandato. Na verdade, os AA, estavam obrigados a manter a garantia das imóveis e a não aliená-los conforme Escritura idem B) dos factos assentes.

25- A ineficácia do negócio depende...

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