Acórdão nº 995/10.6TVPRT.P1.S1-A de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 24 de Setembro de 2014
Magistrado Responsável | TAVARES DE PAIVA |
Data da Resolução | 24 de Setembro de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Proc. nº 995/10.6TVPRT.P1.S1 – A Recurso de Uniformização de Jurisprudência Acordam os Juízes do Supremo Tribunal de Justiça, reunidos em Pleno das Secções Cíveis: I- Relatório A SEGURO AA SA intentou nas Varas Cíveis do … acção declarativa de condenação com processo ordinário contra BB, pedindo a condenação deste no pagamento da quantia da quantia de € 92.794, 00 acrescida de juros vincendos contados desde a citação até integral pagamento.
Para tanto alegou, em síntese, que o proprietário do veículo de matrícula 00-AJ-00 transferiu para si a responsabilidade civil por danos decorrentes da circulação deste veículo, o qual foi interveniente em acidente de viação ocorrido em 20.08.2009. Que, na sequência do acidente, os ocupantes do veículo sofreram diversos danos, que a autora foi chamada a indemnizar por força do contrato de seguro celebrado.
Mais alegou que no momento do acidente o AJ era conduzido pelo réu que seguia com excesso de álcool no sangue e por influência desse mesmo álcool, já que aquele condutor veio a acusar uma TAS de 0,76 g/l, não se encontrando por isso em condições de conduzir o veículo com segurança, afectando tal situação a sua condução.
Conclui, assim, que tem direito de regresso contra o condutor, o ora, Réu, pelas importâncias despendidas em consequência do acidente, nos termos do disposto no n.º1 alínea c) no art. 27.ºdo DL n.º 291/2007 de 21.08.
O réu foi pessoal e regularmente citado e contestou pedindo a improcedência da acção.
Para tanto alegou que aceita a ocorrência do acidente em apreço, mas o mesmo não ocorreu em virtude de condução sob influência do álcool; contudo, não se recorda sequer de ter efectuado qualquer teste ou de ter consentido na recolha de sangue.
Foi dispensada a audiência preliminar, foi proferido despacho saneador com selecção da matéria de facto e elaboração da base instrutória de que a autora reclamou e foi oportunamente decidido.
Procedeu-se ao julgamento da matéria de facto com gravação em sistema áudio dos depoimentos aí prestados, após o que foi proferida a respectiva decisão sem reclamação.
Por fim proferiu-se sentença que julgou improcedente a acção e absolveu o réu do pedido.
Inconformada com esta decisão, a autora interpôs recurso para a Relação do … que, pelo Acórdão de 2013.01.15 ( cf. fls. 267 a 275), julgou a apelação interposta improcedente e confirmou a sentença recorrida.
Novamente inconformada, a autora SEGURO AA SA, interpôs recurso de revista excepcional, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos. 721 n.º1 e 3 e 721-A n.º1 al. c) do CPC considerando o Acórdão «em contradição com outros, já transitados em julgado, proferidos no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito ( ou seja, saber se face ao agora estatuído no art. 27 n.º1 al. c) do DL 291/2007 de 21/8, continua a ser necessária a prova do nexo de causalidade, tal como resultava do art. 19.º al. c) do DL n.º 522/85 de 31/12 e da orientação do Acórdão de Uniformização n.º 6/2002 de 28/5/2002 publicado no DR Iª Série de 18/7 ) tanto pela Relação de Coimbra, como pela de Lisboa, como ainda pelo Supremo Tribunal de Justiça», recurso este que foi admitido e ordenada a sua distribuição normal, conforme Acórdão da Formação inserido a fls. 365/ 369.
Por despacho proferido pelo Exmº Relator inserido a fls. 376 foi suscitado junto do Exmo. Senhor Presidente deste Supremo Tribunal a uniformização de jurisprudência que, com os fundamentos explanados no despacho de fls. 378 a 382, considerou não verificados os pressupostos de necessidade e conveniência « para assegurar a uniformidade de jurisprudência» que justifiquem o julgamento ampliado da revista. Seguiu-se o Acórdão deste Supremo Tribunal inserido a fls. 389 a 395 que, depois de concluir que “ O artigo 27 n.º1 alínea c) do Decreto- Lei n.º 291/ 2007 de 21 de Agosto, atribui à entidade seguradora o direito de regresso contra o condutor do veículo culpado pela eclosão do sinistro, sempre que a condução se tenha operado com uma taxa de alcoolemia superior á legalmente admitida e sem necessidade de comprovar o nexo de causalidade adequada entre a condução sob o efeito do álcool e o acidente” concedeu a revista e, revogando o Acórdão recorrido, condenou o Réu BB a pagar á autora a quantia de € 92.794,00 acrescida de juros vincendos contados desde a citação até integral pagamento.
O Acórdão mereceu um voto de vencido subscrito pela Exma. Cons.ª Maria dos Prazeres Beleza, no sentido de confirmar o Acórdão recorrido. Notificado o Réu, BB, deste Acórdão e alegando estar o mesmo em contradição com outro anteriormente proferido por este mesmo Supremo datado de 6.07.2011, Proc. n.º 129/08.7TBPTL.G1.S1 no domínio da mesma legislação, ou seja, da alínea c) do n.º1 do art. 27.º do DL n.º 291/2007 de 21/8 e sobre a mesma questão fundamental de direito configurada “ na necessidade de verificação e prova do nexo de causalidade entre a verificação do acidente e a condução com taxa de álcool no sangue superior á legalmente permitida “ veio ao abrigo do art. 688.º do CPC interpor recurso para uniformização de jurisprudência.
Para o efeito apresentou alegações formulando as seguintes conclusões: I- O Douto Acórdão ora em crise, encontra-se em clara contradição com outro Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, designadamente o Acórdão do STJ de 06-07-2011, Processo n.º 129/08.7TBPTL.Gl.S1.
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Quanto à factualidade, o Acórdão cuja cópia se junta, também trata de um acidente de viação em que o condutor conduzia com uma TAS de 0,94 g/l tendo perdido o domínio da viatura, invadindo a hemifaixa de rodagem contrária ao seu sentido de circulação, colidindo com outro veículo causando danos a terceiros.
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Juridicamente determinou-se para essa situação, por interpretação da legislação aplicável, que o direito de regresso da seguradora apenas surge se tiver havido uma relação causal entre a etilização e a produção do evento, postulando-se o entendimento de que "O artigo 27.º do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21.8 deve ser interpretado de modo a continuar o entendimento de que o direito de regresso da seguradora, nos casos de condução sob o efeito do álcool, só surge se tiver havido uma relação causal entre a etilização e a produção do evento".
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Sendo a situação materialmente e juridicamente a mesma nos presentes autos, não pode o ora Recorrente ser condenado a satisfazer o direito de regresso à Recorrida, quando no domínio da mesma legislação, o Supremo Tribunal de Justiça, decidiu pela improcedência do direito de regresso, o qual para existir sempre terá a seguradora de alegar e provar que a etilização do condutor foi causa real, efetiva e adequada para a produção do evento.
V.
ln casu ficou provado que o excesso de velocidade foi causa necessária, directa e adequada do sinistro e em harmonia com o Acórdão do STJ de 06-07-2011, outra decisão se impunha, evitando-se assim, decisões diferentes para situações semelhantes ou iguais, contribuindo-se em termos concretos para uma melhor aplicação do direito.
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Pelo que, ao manter-se a decisão recorrida será fazer uma interpretação e aplicação contraditória do direito para situações semelhantes, senão mesmo iguais e consequentemente violando-se o princípio da igualdade consagrado no artigo 13º Constituição da República Portuguesa.
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O entendimento do Acórdão ora em crise de que a redação do 27º n.º 1 alínea c) do Decreto – Lei n.º 291/2007 de 21 de Agosto, supostamente determina que as seguradoras que pretendam exercer direito de regresso sobre os segurados não necessitam de alegar e provar o nexo de causalidade entre o sinistro e o estado de etilização do seu segurado, baseando a sua posição na alteração do teor literal do artigo 27º n.º 1 alínea c) do Decreto – Lei n.º 291/2007 de 21 de Agosto em relação ao Decreto - Lei 522/85, de 31 de Dezembro e na "voluntas legis", VIII. Pelo contrário, entende o Recorrente, no sentido da jurisprudência do Acórdão que se junta, que a interpretação e aplicação do 27º n.º 1 alínea c) do Decreto - Lei n.º 291/2007 de 21 de Agosto, no sentido de exigir à entidade seguradora alegação e prova do nexo causal entre o estado de etilização do condutor e o sinistro, revela-se adequada e assertiva no que diz respeito às exigências legais de interpretação, sendo esta interpretação a mais adequada à letra e natureza da legislação vigente.
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Entende o Recorrente que apenas este sentido cumpre todas as regras de interpretação da lei previstas no art. 9º do Código Civil.
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Ou seja, uma correcta interpretação legal considerará sempre todos os elementos hermenêuticos de interpretação da lei e não só o elemento literal, descurando dos restantes elementos histórico, sistemático e racional.
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Desde logo, não se vislumbra que o sentido dado ao artigo 19.º n.º 1 alínea c) do anterior Decreto - Lei n.º 522/85 aplicável até sua revogação a situações análogas às da relação material sub judice, tenha sido postergado.
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A controvérsia anterior que culminou com o Acórdão Uniformizador do STJ de 28-05-2002 havia sido apaziguada com o entendimento de que “A alínea c) do artigo 19.º do Decreto-Lei n.º 522/85, de 31 de Dezembro, exige para a procedência do direito de regresso contra o condutor por ter agido sob influência do álcool o ónus da prova pela seguradora do anexo de causalidade adequada entre a condução sob o efeito do álcool e o acidente".
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Não se encontra na evolução histórica e interpretativa daquele preceito legal, e considerando quer a génese da nova versão legal prevista no citado art. 27.º, bem como todo o conjunto de princípios norteadores do Direito Civil, razões jurídicas para entender de modo diferente o significado atual do fundamento do direito de regresso das seguradoras.
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Por outro lado e uma vez que o direito de regresso nasce da responsabilidade civil do segurado, considerar que a mera presença de uma taxa de etilização superior à permitida por lei por si só é...
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