Acórdão nº 771/12.1TTSTB.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Setembro de 2014

Magistrado ResponsávelANTÓNIO LEONES DANTAS
Data da Resolução25 de Setembro de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I Em 24 de Maio de 2012, AA foi vítima de um acidente de trabalho, quando se deslocava da residência para o local de trabalho, ao serviço de BB – ..., Ldª, que tinha a sua responsabilidade por acidentes de trabalho transferida para a CC, SEGUROS GERAIS, SA.

Instaurado o competente processo, prosseguiu este seus temos, e, frustrada a tentativa de conciliação com que culminou a sua fase conciliatória, o sinistrado veio apresentar petição inicial contra a R. seguradora pedindo a condenação desta no pagamento da quantia de € 736,94 de taxas moderadoras, da quantia de € 9.456,30 de indemnização por ITA, da quantia de € 248,85 de indemnização por ITP, do capital de remição de € 34.690,56 e de juros de mora até integral pagamento.

Alegou como fundamento da sua pretensão que no dia 24/05/2012, pelas 14,55 horas, quando se deslocava para o seu local de trabalho, sofreu um acidente que consistiu no embate da motorizada que conduzia com um peão tendo caído ao solo, de que lhe resultaram lesões no punho esquerdo, joelho direito e fractura da tíbia; que esteve afectado de ITA até 10/11/2012 e de ITP desde 11/11/2012 até 19/11/2012, tendo-lhe sido atribuída a IPP de 12,9876% em 20/11/2012; que à data do acidente trabalhava para BB – ..., Ldª, mediante o salário anual de € 28.442,06, que tinha a responsabilidade emergente de acidentes de trabalho para a Ré seguradora pela totalidade da retribuição auferida; que a conciliação não foi possível por a seguradora não aceitar a caracterização do acidente como de trabalho, nem o nexo de causalidade entre as lesões e o acidente; entende, porém, que o acidente ocorreu no trajecto de ida para o local de trabalho, sendo um típico acidente de trabalho “in itinere”, daí que lhe sejam devidas as prestações que reclama.

Contestou a seguradora pugnando pela improcedência da acção e pela sua absolvição do pedido, alegando, em resumo, que o acidente não pode ser considerado como acidente de trabalho, mormente como acidente “in itinere” e daí que sobre a contestante não recaia qualquer obrigação de indemnizar o Autor; que o acidente teria ocorrido fora de qualquer dos percursos possíveis entre a residência do sinistrado e o local de trabalho e fora do período de duração normal de tal percurso; não aceita que o Autor tenha sofrido as sequelas que invoca e, de qualquer forma, requer a submissão do Autor a Junta médica.

Aberto o apenso para fixação da incapacidade para o trabalho no qual, após realização de junta médica, foi proferido despacho fixando ao sinistrado ITA de 24/05/2012 a 10/11/2012, ITP de 50% entre 11/11/2012 a 19/11/2012, e alta em 20/11/2012, com IPP de 0,129876.

Realizada a audiência de julgamento, foi proferida decisão sobre a matéria de facto controvertida e depois foi proferida sentença julgando a acção procedente e condenando a Ré CC – Seguros Gerais, S.A., «a pagar ao sinistrado AA, com efeitos a partir de 21.11.2012, o capital de remição correspondente à pensão anual vitalícia de € 2.585,76, bem como as quantias de € 799,88 a título de incapacidades temporárias e de € 512,81 a título de despesas com tratamentos e deslocações, sendo todos estes valores acrescidos de juros de mora, à taxa do art. 559.º n.º 1 do C Civil, contados desde tal data e até integral pagamento» e condenou ainda a Ré CC – Seguros Gerais, S.A., a pagar ao Instituto da Segurança Social, I.P., «a quantia de € 8.773,02, acrescida de juros de mora, à mesma taxa, desde a citação e até integral pagamento».

Inconformada com esta decisão dela recorreu a Ré seguradora para o Tribunal da Relação de Évora que veio a conhecer o recurso por acórdão de 13 de Março de 2014, cujo dispositivo é o seguinte: «Termos em que acordam os juízes na Secção Social desta Relação em julgar a apelação procedente e, por via disso, na revogação a sentença recorrida, absolvem a seguradora recorrente do pedido contra ela formulado.

Sem custas dada a isenção de que o Autor beneficia».

Discordando desta decisão, o Ministério Público interpôs recurso de revista para este Supremo Tribunal, em representação do sinistrado, integrando nas alegações apresentadas as seguintes conclusões: «1. O presente recurso tem por fundamento a violação de lei substantiva que consiste essencialmente no erro de interpretação do disposto no artº 9° nºs 1, al a), 2, al e) e 3, da Lei nº 98/2009, de 4/9 (a qual denominaremos por "nova LAT''), por parte do douto Acórdão recorrido, ao concluir não estarmos na presença de um verdadeiro acidente de trabalho in itinere, com as legais consequências.

  1. É sabido que o acidente de trabalho denominado "in itinere", tal como se prevê no artº 9° nºs 1, al: a), e 2, da nova LAT, configura um elemento espacial (“trajectos normalmente utilizados”) e outro ligado ao elemento temporal ("durante o período de tempo de tempo habitualmente gasto pelo trabalhador"), para além do nexo de causalidade entre as lesões e o acidente.

  2. Ora, atenta a matéria de facto fixada nos autos, afigura-se-nos não haver dúvidas que o acidente em causa ocorreu num dos percursos utilizados normalmente pelo trabalhador.

  3. Aliás, o facto de ter ficado provado que o trabalhador/recorrente utilizava, ou podia utilizar, a partir da sua residência várias estradas para chegar ao seu local de trabalho, incluindo aquela em que, efectivamente, ocorreu o acidente, não deve levantar qualquer óbice à qualificação como acidente in itinere (vide nesse sentido Ac. do STJ de 05-05-2004).

  4. É quanto ao elemento "temporal" que o Acórdão ora sob recurso faz, salvo melhor opinião, uma errada interpretação (por demasiado restritiva) da lei, considerando, que o acidente ocorreu fora de tal pressuposto legal.

  5. No entanto, tal interpretação ainda que possa ter alguma correspondência na matéria de facto dada como provada, é mais aparente do que real; 7. Desde logo, se analisarmos o documento (nº 2), ora junto aos autos, verificamos que o A./recorrente chegava ao trabalho sempre antes da hora do turno, e quase sempre, muito antes, de tal hora, pelo que, de facto, o acidente não se verificou a cerca de 50 minutos da hora em que aquele ia trabalhar, de facto, tal como é referido no Acórdão ora sob recurso, mas a bastante menos! 8. Na verdade, constatando o cartão de ponto relativo à hora efectiva em que o trabalhador/recorrente entrou ao longo de quatro meses antes do acidente naquele turno (da tarde), verifica-se e comprova-se que o mesmo sempre entrou ao serviço antes da hora do referido turno, tendo, efectivamente, entrado, naquele turno, entre as 14h43m (em 11-01-2012) - o mais cedo - e as 15h 23m (em 10-04-2012) - o mais tarde - sendo que, por regra, fazia-o cerca de 20-25 minutos antes da hora.

  6. Assim, tendo em conta tal facto, entende-se que o A./recorrente, estaria no máximo, a cerca de 30 minutos, ou menos, de entrar ao trabalho, aquando do acidente sub judice.

  7. Ora, o autor Júlio Vieira Gomes (in "O acidente de Trabalho" «Coimbra Editora- págs. 175), numa anotação ao entendimento da autora...

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