Acórdão nº 329/08.0TTCSC.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelGONÇALVES ROCHA
Data da Resolução15 de Abril de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1---- AA, residente em ..., veio intentar uma acção com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra BB (adiante designada por BB), com sede no ..., ..., pedindo, que o Tribunal: a) Condene a R. a reconhecer o A. como seu trabalhador, com quem celebrou um real e efectivo contrato de trabalho sem prazo; b) Declare a ilicitude do despedimento por não ter sido este precedido de processo disciplinar; c) Condene a R a pagar ao A, a quantia global de € 54.289,12, a título indemnização por danos não patrimoniais, retribuições e subsídios não pagos; d) Condene a R a pagar ao A. a indemnização a que se refere o art°.439° do CT, caso o A. opte pela não reintegração até ao trânsito em julgado da sentença do Tribunal; e) Condene a R. a pagar ao A, sobre as quantias em dívida, os juros vencidos e ainda os juros moratórios vincendos à taxa legal de 4 % ao ano, a partir da citação, até efectivo pagamento; f) Condene a R. a pagar ao A. as quantias que entretanto se vierem a vencer relativamente a retribuições, férias, subsídios de férias e de Natal, devidas a partir de 1 de Setembro de 2007.

Alegou para tanto que era professor de desporto da Ré desde 1993, dando aulas de natação, vindo a ser despedido em 2007, sem precedência de qualquer procedimento, o que lhe causou grande sofrimento, quer pela humilhação sofrida, quer pelas dificuldades financeiras que passou. Alegou ainda que a R não lhe pagou, ao longo dos anos de duração do contrato, os subsídios de Natal e de férias, bem como as horas de trabalho suplementar que lhe prestou.

A Ré apresentou contestação, pugnando pela inexistência do invocado contrato de trabalho, pois o A. limitava-se a dar algumas aulas semanais nas suas instalações, que o fazia sem auferir remuneração certa, pois era pago à hora e o número de horas variava de mês para mês, sendo o horário objecto de acordo com o mesmo. Conclui assim que não lhe são devidos quaisquer créditos laborais, bem como a reclamada indemnização.

Efectuada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença que decidiu julgar a acção improcedente, com a consequente absolvição da R. de todo o peticionado.

O autor, inconformado, interpôs recurso de apelação, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa julgado o recurso procedente, nos seguintes termos: “1. Reconhece-se o autor como trabalhador subordinado da ré, desde de Novembro de 1993 até à data do seu despedimento ocorrido em Julho de 2007. 2. Declara-se a ilicitude desse despedimento, e em consequência condena-se a ré a pagar ao autor as retribuições devidas desde o 30º dia anterior à propositura da acção até ao trânsito em julgado da decisão, a que deverão ser deduzidas as importâncias a que o autor tenha comprovadamente obtido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento, designadamente o montante do subsídio de desemprego. 3. Na indemnização por todos os danos, não patrimoniais e patrimoniais causados, estes últimos calculados, ao abrigo do art.º 439 do CT/2003, ou seja, na indemnização por antiguidade, em substituição da reintegração, contando-se, para o efeito, todo o tempo decorrido até ao trânsito da decisão final, ao abrigo do n.º 2 do art.º 439 CT, relegando-se para execução de sentença a liquidação do valor dessa indemnização.

  1. Condena-se ainda a ré no pagamento dos juros de mora, nos termos peticionados, sobre as quantias em dívida a partir da citação.” É agora a R que, inconformada, nos traz revista, rematando a sua alegação com as seguintes conclusões: “O Douto Acórdão recorrido estribou-se exclusivamente no chamado “método indiciário", constante do art. 12° do Código de Trabalho, ao fazê-lo desatendeu a outros critérios prevalecentes bem como ignorou outros que apontavam em sentido diverso, concluindo pela existência de um contrato de trabalho, fazendo errada interpretação da lei; O artigo 12.° do Código de Trabalho não é uma norma habilitante da qualificação contratual, mas tão só uma regra probatória, continuando-se, assim, perante elementos indiciários e perante um critério de prevalência; Os indícios não têm todos o mesmo peso, pelo que a actividade do julgador nunca pode ser de mera subsunção, mas terá de continuar a ser valorativa; A presunção do art. 12° do Código do Trabalho é ilidível, isto é, qualquer uma das características indicadas no referido artigo, podem também verificar-se num contrato de prestação de serviço; O elemento característico e definidor do contrato de trabalho é a subordinação jurídica do trabalhador que entronca no eventual poder disciplinar; Apreciando globalmente todos os índices revelados no desenvolvimento da relação contratual é de concluir que não se demonstrou factos bastantes para caracterizar com segurança, a subordinação jurídica e, pois, para qualificar a relação em causa como contrato de trabalho; O recorrido não estava sujeito ao poder de autoridade da recorrente sendo certo que este podia sempre optar por agir num ou noutro sentido, sem que lhe fossem assacadas responsabilidades (por ex. a participação nos festivais de natação), pelo que temos de concluir pela inexistência de subordinação jurídica.

    Conclui assim que a relação jurídica existente entre a recorrente e o recorrido não configura a existência de um contrato de trabalho, pelo que deverá ser revogado o acórdão recorrido, com as devidas consequências legais.

    O A também alegou, tendo concluído que: “ I. Tribunal da Relação de Lisboa concluiu pela procedência do Recurso de Apelação interposto pelo ora Recorrido, considerando este que a relação contratual vigente entre as Partes, desde Novembro de 1993 até 31 de Julho de 2007, se baseava num contrato de trabalho, pelo que o despedimento do Recorrido deveria ser considerado ilícito, por desrespeito dos formalismos legais; II. Para tanto fundamentou o douto Acórdão com a aplicabilidade directa do método indiciário, de acordo com o qual o preenchimento cumulativo dos indícios previstos no art.12º do Código do Trabalho de 2003, que estabelece uma presunção de contrato de trabalho; III. A relação contratual entre as partes iniciou-se em 1993 e manteve-se até 31 de Julho de 2007, data em que a Recorrente enviou carta ao Recorrido a comunicar o seu despedimento; IV. Resultou provado que o Recorrido estava inserido na estrutura organizativa da Recorrente, participando na organização de eventos e festivais de natação, actividade que não se encontrava dependente das respectivas aulas de natação, sendo que realizava a sua actividade sob as suas orientações - alínea a) do art. 12º do CT de 2003; V. Para tanto tenha-se em conta que o Recorrido era considerado um professor muito competente, muito interessado e atento a todos os movimentos dos utentes na piscina, sendo que todos apreciavam o seu trabalho; VI. Em 14 anos ao serviço da Recorrente o Recorrido nunca teve qualquer tipo de reparo ou censura ao seu trabalho, quer pela Direcção, quer pelos utentes, quer pelos responsáveis técnicos; VII. Além disso, a Recorrente mantinha um registo de todas as horas que o Recorrido trabalhava por mês; VIII. A Recorrida através dos seus coordenadores e responsáveis técnicos controlava não só o trabalho do Recorrido como também de todos os outros professores de todas as modalidades; IX. Também resultou provado que o trabalho realizado o era nas instalações da Recorrente, sendo que o Recorrido se encontrava sujeito a um horário previamente fixado - alínea b) do art. 12º do Código do Trabalho de 2003; X. Para tanto podemos referir que o Recorrido aquando a sua contratação, em Novembro de 1997 o foi para ministrar aulas de natação nas piscinas do Complexo de ...; XI. Nesse momento teve conhecimento dos horários previamente fixados pelos Coordenadores de cada actividade administrativa; XII. Enquanto prestou a sua actividade para a Recorrente, o Recorrido sempre que faltou comunicou a falta ao Coordenador Técnico, conforme estava previamente determinado; XIII. As faltas dadas eram consideradas justificadas ou não, pois se o fossem a Recorrida pagava-as como se de um dia de trabalho se tratasse; XIV. Para eventuais substituições a Recorrente dispunha de outros professores, dos quais se socorria sempre que algum professor faltava; XV. Tanto as piscinas como os materiais didácticos eram propriedade da Recorrente; XVI. O Recorrido cumpria assim um horário que lhe era estabelecido, sendo que a Recorrente mantinha o registo de todas as horas que aquele efectuava por mês; XVII. Resultou provado que o Recorrido era retribuído em função do tempo despendido na execução da actividade - alínea c) do art. 12º do Código do Trabalho de 2003; XVIII. O Recorrido não auferia uma retribuição certa, mas era pago tendo em conta um preço/hora, que recebia o preço de € 10,50 hora durante a semana e o preço de € 11,50 ao sábado; XIX. Note-se que o número de aulas prestadas pelo Recorrente apresenta diferenças nos diferentes meses, o que obrigatoriamente se reflecte na retribuição; XX. Resultou provado que os instrumentos de trabalho são fornecidos pela recorrente - alínea d) do art.º 12º do Código do Trabalho de 2003, designadamente material didáctico de apoio às aulas ministradas; XXI. Resultou provado que a prestação de trabalho executada pelo Recorrido ultrapassou um período ininterrupto superior a 90 dias - alínea e) do art.º 12° do Código do Trabalho de 2003, pois o Recorrido prestou a sua actividade profissional na Recorrente desde Novembro de 1993 até 31 de Julho de 2007 ¬ aproximadamente 14 anos; XXII. Em suma e de acordo com a factualidade assente podemos concluir que se encontra preenchida a presunção do artigo 12° do Código do Trabalho de 2003, pelo que se presume que as partes mantiveram um contrato de trabalho, pelo que deverá reconhecer-se o Recorrido como trabalhador subordinado da Recorrente desde Novembro de 1997 até Julho de 2007, por se terem por preenchidos os indícios enumerados no artigo referido, designadamente...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
4 temas prácticos
4 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT