Acórdão nº 34/12.2TBLSA.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelGABRIEL CATARINO
Data da Resolução22 de Abril de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)
  1. – Relatório.

    O Autor, AA, instaurou acção com processo ordinário, pedindo a condenação da Ré, “BB, S.A.”, a pagar-lhe o preço acordado pela venda de uma máquina, no montante de 32.000,00€, acrescido de juros moratórios e compensatórios, a calcular desde 2 de Outubro de 2011 e até integral liquidação.

    Para fundamentar a sua pretensão alegou, em síntese: - Em Dezembro de 2007, adquiriu a CC e DD, uma máquina pintadora de papel com a referência E....

    - Trata-se de um cilindro metálico, com um peso aproximado de 15 toneladas, que tem como função a fase inicial de aplicação de tinta sobre as bobines do papel de suporte que alimentam essa máquina.

    - Os primeiros contactos foram estabelecidos com um senhor chamado EE, como representante da Ré.

    - Após várias negociações e em que outros valores e condições estiveram sobre a mesa, a Ré remeteu ao Autor um e-mail, datado de 21 de Julho de 2011, segundo esse o qual, a última oferta foi de €32.000,00 pelo cilindro e pelos acessórios mencionados nos e-mails anteriores e que são os seguintes: “Cilindro cromado de la máquina (diámetro de 3m); Motoreductores de la parte del desenrollado de la pintadora Motoreductor del grupo aplicador; Motoreductor del cilindro del grupo contrapresión y apoyo; Motoreductor del cilindro; Los dos motores del enrolado; Los cuadros eléctricos de la zona del desenrolado; Motoreductores y agitadores de las tinas de preparación de color y tinas de stock de la cocina.” - No dia imediato o Autor comunicou a aceitação desta proposta, ficando ainda estabelecido que as operações de carga e transporte eram por conta da Ré; que o pagamento seria feito por transferência bancária no momento em que a carga do material estivesse realizada; e, que a operação se realizaria entre a trigésima sétima e a trigésima nona semana desse ano; ou seja, até ao dia 02 de Outubro do ano corrente.

    A Ré contestou, e reconveio, alegando, em síntese: - Caso se venha a comprovar que o equipamento em causa é pertencente a terceiro, é manifesta a ilegitimidade do Autor para formular o pedido constante dos autos.

    - Desde sempre a Ré deixou bem claro que estava interessada no equipamento desde que o mesmo estivesse em perfeito estado de funcionamento, sem defeitos, ou seja, a venda esteve sempre condicionada à verificação dessa condição.

    - Daí que a Ré tenha sempre expressamente mencionado que só poderia adquirir o equipamento após inspecção que permitisse aferir o seu real estado.

    - Após sucessivas trocas de e-mails, no dia 10 de Outubro de 2011 dois técnicos da Ré, acompanhados de outros dois técnicos com conhecimentos na área do transporte de equipamentos pesados, deslocaram-se ao local onde se encontrava o equipamento para o inspeccionarem previamente ao seu transporte.

    - No entanto, ao invés do que havia acontecido em anterior ocasião, nesta ocasião puderam constatar que o cilindro apresentava um golpe no centro da sua superfície, sem espessura de cromado, defeito esse que marcaria o papel que a Ré produzisse, a cada volta.

    - Sendo a Ré uma sociedade comercial que se dedica à indústria do papel, é manifesto que tal defeito torna o equipamento inútil para o fim a que se destinava a sua compra.

    - A compra do cilindro não se tornou perfeita porque a compradora reclamou ao vendedor não querer o bem, denunciando os vícios da coisa, nos 8 dias seguintes à inspecção daquela.

    - Para o caso de se vir a entender que a venda não foi condicionada, então a Ré sempre poderá lançar mão do instituto da venda de coisa defeituosas, que, nos termos do Código Civil, remete para a venda de bens onerados, o que tem como consequência que o negócio poderá ser anulado.

    Concluiu pela improcedência da acção, ou caso assim não se entenda, pediu a declaração de anulação do contrato de compra e venda, ou caso assim não se entenda a condenação do Autor na reparação da coisa ou na sua substituição, com as devidas consequências legais.

    O Autor apresentou réplica, mantendo tudo o alegado na p. inicial, alegando que: - A Ré só formulou a sua proposta final, para aquisição do material, após a inspecção que levou a cabo por parte dos seus técnicos, tendo verificado o estado da máquina, pessoalmente, por intermédio de quem muito bem entendeu.

    - A existir defeito o Autor não é responsável pela sua reparação pois que o defeito surge já depois de efectivada a venda.

    Concluiu, pedindo que as excepções sejam julgadas improcedentes, bem como a reconvenção.

    Realizado julgamento, foi proferida sentença que decidiu: “Julgar a presente acção improcedente por não provada, e, em consequência: 1. Absolver a R., BB, S.A. do pedido formulado pelo A., AA; 2. Julgar inútil o conhecimento dos pedidos reconvencionais, declarando extinta a instância reconvencional por inutilidade superveniente da lide.” Na apelação que impulsou, o demandante viria a obter vencimento da lide, porquanto, o Tribunal da Relação de Coimbra, em acórdão prolatado, a 23 de Setembro de 2014 – cfr. fls. 611 a 641 – viria a conferir provimento ao recurso, e decidido julgar, “(…) procedente o recurso e, em consequência, revoga-se a decisão recorrida, julgando-se procedente a acção e improcedente a reconvenção, condenando-se a Ré a pagar ao Autor a quantia de € 32.000,00, acrescida de juros de mora, desde 2 de Outubro de 2011, até integral pagamento daquela quantia, calculados sobre ela, à taxa definida por lei, e absolvendo-se o Autor dos pedidos reconvencionais.” Da decisão prolatada, impetra a demandada revista, para o que dessume o quadro conclusivo que a seguir queda extractado.

    I.A. – Quadro Conclusivo.

    1. “Principiando em jeito de desabafo, não se pode deixar de considerar que o Tribunal da Relação de Coimbra fez uma deturpada interpretação dos depoimentos testemunhais, desconsiderando por completo as explicações técnicas dadas pelas testemunhas da Ré/Recorrente - sem que, em bom rigor, tenha justificado essa desvalorização - e, deste modo, dando como não provado o quesito 23.º da base instrutória.

    2. O acórdão ora colocado em crise fez uma errada (não) aplicação do artigo 925.º do Código Civil ao caso sub judice.

    3. A alínea Y) dos factos provados estabelece com meridiana clareza que "Desde sempre a Ré [ora Recorrente] deixou bem claro que estava interessada no equipamento desde que o mesmo estivesse em perfeito estado de funcionamento, sem defeitos".

    4. O facto de haver uma segunda inspecção após as partes terem chegado a um consenso quanto ao preço não faz com que o contrato deixe de ser sujeito a prova, e não se possa aplicar o artigo 925.º do Código Civil.

    5. Bem pelo contrário, a segunda inspecção apenas vem comprovar e reforçar que a Ré/Recorrente se queria certificar que o cilindro lhe era entregue em boas condições, para poder então pagar o preço anteriormente acordado.

    6. A interpretação preconizada pelo tribunal a quo esvazia o artigo 925.º do Código Civil.

    7. Pelo exposto, mesmo sem a factualidade revertida no acórdão em crise, continuam a existir factos assentes que justificam, mais do que suficientemente, que, pela aplicação do artigo 925.º do Código Civil, se volte à sentença de 1.ª Instância, proferindo acórdão declarando improcedente o pedido formulado na petição inicial e, consequentemente, absolvendo a Ré/Recorrente do pedido.

    8. Sem prescindir, o Tribunal da Relação de Coimbra opera também uma errada interpretação do artigo 913.º do Código Civil.

    9. Mesmo que pudesse nada ter ficado expressamente provado relativamente ao fim a que se destina o cilindro em apreço, então terá aqui inteira aplicação o n.º 2 do referido artigo 913.º do Código Civil.

    10. Ainda que se considere que o equipamento não padece de vício que impeça a realização do fim a que se destina, é inquestionável que sofreu uma enorme desvalorização fruto de "um golpe no centro da sua superfície, sem espessura de cromado".

    11. Tendo a Ré/Recorrente comunicado atempadamente o vício da coisa que lhe foi vendida, e pelo confronto das alíneas G) e CC) dos factos provados, terá direito a ver declarada a anulação do contrato de compra e venda em discussão nos autos, por força do artigo 905.º do Código Civil, aplicável ex vi artigo 913.º do mesmo código.” Contraminando a pretendia revogação da decisão impugnada, o demandante dessume epítome conclusivo que a seguir queda transcrito.

      “1. O prazo para interposição do recurso de revista é de 30 dias.

    12. Assim, notificada, a ora recorrente, do douto acórdão, proferido pelo Tribunal da Relação, presumivelmente, a 29 de Setembro de 2014, 3. Tinha até ao dia 29 de Outubro de 2014, para apresentar o recurso.

    13. O recurso foi apresentado ao recorrido, por meio de fax remetido ao autor, a 6 de Outubro de 2014, 5. Logo, o recurso interposto deve considerar-se intempestivamente apresentado.

    14. Quanto à conclusão 1 do recurso, dir-se-á que nos Tribunais se discutem factos e direito, não se apreciando "desafabos".

    15. Sendo que, atento o disposto no artigo 674.º do CPC, não pode a matéria alegada ser objecto de apreciação por este Tribunal "a quem".

    16. E, por uma questão de economia processual, dando por integralmente reproduzido, tudo quanto vertido: 10. Nas alegações de recurso, apresentadas pelo Autor, junto do Tribunal de 1.ª Instância; 11. E, bem assim, no douto acórdão, que, consequentemente, veio a ser proferido e, agora, em análise, 12. Dir-se-á, em resumo e, respondendo, sucintamente, às "conclusões apresentadas: 13. Nas conclusões 2 a 7, invoca a recorrente uma errada (não) aplicação do artigo 925.º do Código Civil.

    17. Invoca a recorrente o vertido na alínea "Y", dos factos provados.

    18. Contudo, em manifesta má fé, faz referência à versão da referida alínea, antes de a mesma ter sido alterada pelo Tribunal da Relação de Coimbra.

    19. Na verdade, a alínea "l", que se refere à resposta ao artigo 18.º e 19.º da base instrutória, antes, vertida, essa resposta, na alínea "Y", refere: "Z. A Ré sempre mencionou expressamente à Autora que só poderia adquirir o equipamento após inspecção que lhe permitisse aferir o seu real estado. (resposta aos...

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