Acórdão nº 448/09.5TCFUN.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Julho de 2015

Magistrado ResponsávelMARTINS DE SOUSA
Data da Resolução09 de Julho de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I.

AA, casada com BB, intentou contra CC e mulher, DD, EE, solteiro, FF e mulher, GG, todos identificados no processo, esta acção declarativa de condenação com processo comum, sob a forma ordinária, pedindo: a declaração de nulidade e invalidade da escritura pública de justificação notarial, celebrada em 30-12-2008, exarada de fls. 38 a 39 v, do Livro n.° … do Cartório Notarial Privado do Dr. HH, e, consequentemente, nulo o respectivo registo predial efectuado, com o seu respectivo cancelamento; a declaração de nulidade das compras e vendas tituladas em actos contínuos no mesmo Cartório, pelas escrituras exaradas de fls. 40 a 41 e 42 a 43 do Livro n.º ..., com todos os efeitos legais, e consequentemente nulo o respectivo registo, com o consequente cancelamento do registo predial do prédio misto, localizado ao sítio do ..., freguesia de ..., concelho do ..., com a área de 320 m2, dos quais 35 m2 são de superfície coberta, inscrito na matriz predial respectiva a parte rústica sob o artigo 7.°, da secção “AD” e a parte urbana sob o artigo 39.°, e actualmente descrito na Conservatória do Registo Predial do ... sob o n.º …, da freguesia de ..., e registado a favor dos réus FF e mulher GG, pela Apresentação 3329 de 10-02-2009, com todas as demais consequências legais; a declaração de que a autora é dona e legítima possuidora do prédio misto, com a área de 320 m2, dos quais 45 m2 são de superfície coberta, localizado ao Caminho do ..., n.º … de polícia, no sítio do ..., freguesia de ..., concelho do ..., inscrito na matriz predial respectiva, a parte rústica sob o artigo 77.° da Secção “AD” e a parte urbana sob o artigo ….°, como tal não descrito na Conservatória do Registo Predial do ...; a condenação dos réus a reconhecerem a favor da autora o direito de propriedade desta sobre o prédio acima referido, com todas as consequências legais.

Para tanto, alegou, em síntese: é proprietária do prédio identificado supra, por o ter adquirido por usucapião, após aquele lhe ter sido doado verbalmente pela anterior proprietária; os primeiros réus, faltando à verdade, outorgaram escritura de justificação notarial, onde se declararam proprietários do referido prédio; nessa mesma data, aqueles primeiros réus venderam o prédio ao réu EE, cunhado e irmão dos 1.° e 2.° réus, respectivamente; por sua vez, o réu EE vendeu o prédio ao réu FF; os réus FF e mulher conheciam os restantes réus, de quem são amigos, e sabiam que estes não eram proprietários do prédio.

Feitas as legais citações - sendo as dos réus CC e DD por éditos –, contestou apenas o réu FF, alegando que desconhecia os factos alegados pela autora quanto à sua propriedade; adquiriu o prédio com base nos documentos que lhe foram exibidos e por escritura de 23-07-2009, vendeu o prédio a II e JJ, requerendo a intervenção destes adquirentes como associados do réu.

Nessa sequência, foi requerida a intervenção processual destes últimos e a ampliação, quanto a estes, dos pedidos constantes da petição inicial, por forma a abranger a nulidade da compra e venda titulada pela referida escritura celebrada a 23-07-2009, exarada a fls. 28 a 31 do Livro …, do Cartório Notarial de KK.

Deferida essa intervenção e citados os intervenientes vieram os mesmos contestar, aduzindo, em síntese: a ineptidão da petição inicial, pelo facto de a autora não ter alegado factos referentes à partilha dos bens por morte da anterior proprietária do prédio; a nulidade da doação invocada pela autora, por ter sido feita verbalmente; o desconhecimento dos factos alegados pela autora quanto à posse do prédio; e a aquisição do prédio dos autos de boa-fé, com base na documentação que lhes foi exibida e com recurso a crédito bancário.

A autora replicou, respondendo às excepções invocadas por II e JJ, pugnando pela sua improcedência.

Após convite do tribunal, a autora requereu, ainda, a intervenção na lide do LL ..., S.A., por ser titular de hipoteca registada sobre o prédio dos autos, pedindo a ampliação quanto a este interveniente dos pedidos de nulidade de hipoteca voluntária, constituída a seu favor pela apresentação 2057, de 27-07-2009, sobre o prédio objecto da presente acção, descrito na Conservatória do Registo Predial do ... sob o n.° …, da freguesia de ....

Citado, o LL, S.A. contestou alegando que desconhece os factos alegados pela autora; financiou a aquisição do prédio pelos réus II e JJ, que, para tanto, constituíram hipoteca sobre o prédio adquirido, registada a 27-07-2009 e a presente acção apenas foi registada no dia 10-05-2012, pelo que, estando de boa-fé, não lhe é oponível a eventual nulidade de contratos anteriores, nos termos do art. 291.º do Código Civil.

Efectuada audiência preliminar, foi proferido despacho saneador, julgando improcedente a excepção de ineptidão da petição inicial, tendo-se seleccionado a matéria de facto assente e controvertida; prosseguiu o processo para julgamento, no qual foi ampliada aquela mesma matéria de facto e no seu têrmo, após ter sido respondida a matéria de facto controvertida, seguiu-se a prolação de sentença, com a seguinte decisão: Pelo exposto, decido julgar a acção parcialmente procedente e, em conformidade: declaro nula e ineficaz a escritura pública de justificação notarial, celebrada a 30 de Dezembro de 2008, pelos Réus CC e mulher, DD, exarada de fls. 38 a 39 v, do Livro n.º ... do Cartório Notarial Privado do Dr. HH, referida na al. A) dos factos provados.

declaro nula a compra e venda, titulada pela escritura pública de compra e venda celebrada a 30 de Dezembro de 2008, entre os Réus CC e mulher, DD, como vendedores, e o Réu EE, como comprador, exarada de fls. 40 e 41 v, do Livro de notas n.° ... do Cartório Notarial Privado do Dr. HH, referida na al. E) dos factos provados.

declaro nula a compra e venda, titulada pela escritura pública de compra e venda celebrada a 30 de Dezembro de 2008, entre o Réu EE, como vendedor, e o Réu FF, como comprador, exarada de fls. 41 e 42, do Livro de notas n.° ... do Cartório Notarial Privado do Dr. HH, referida na al. F) dos factos provados.

ordeno o cancelamento do registo de propriedade inscrito a favor do Réu FF e mulher, GG, efectuado na Conservatória do Registo ... relativamente ao prédio aí descrito sob o n.° … da freguesia de ....

declaro nula a compra e venda e a hipoteca, tituladas pela escritura pública de compra e venda e de mútuo com hipoteca e fiança, celebrada a 23 de Julho de 2009, entre os Réus FF e mulher, GG, como vendedores, e os Réus II e JJ, como compradores, e entre estes como mutuários, e o LL, Banco LL ..., S.A. como mutuante, e MM e NN, como fiadores, exarada de fls. 28 a …, do Livro de notas para escrituras diversas n.° … do Cartório Notarial Privado da Dra. KK, referida na al. I) dos factos provados.

ordeno o cancelamento do registo de propriedade inscrito a favor dos Réus II e JJ efectuado na Conservatória do Registo ... relativamente ao prédio aí descrito sob o n.° … da freguesia de ....

ordeno o cancelamento do registo da hipoteca inscrito a favor do Réu LL, Banco LL..., S.A. efectuado na Conservatória do Registo ... relativamente ao prédio aí descrito sob o n.º … da freguesia de ....

absolvo os Réus dos demais pedidos contra si formulados pela Autora.

Custas a cargo da Autora e dos Réus, na proporção do respectivo decaimento, que se fixa em 2/8 para a primeira e 6/8 para os segundos, sem prejuízo do benefício de apoio judiciário concedido à Autora.

Inconformados, os intervenientes II e JJ apelaram e a Relação de Lisboa, por Acórdão do pretérito dia 08-05-2014 decidiu “…julgar procedente a apelação revogando a decisão recorrida e em julgar inteiramente improcedente a acção, absolvendo os réus dos pedidos formulados.

” Agora insatisfeita, a autora AA veio interpor recurso de revista daquele acórdão, para o STJ, concluindo, assim, a minuta de recurso: “1) Os presentes autos tratam de uma ação de impugnação de escritura de justificação notarial; 2) Este tipo de ação declarativa é uma ação de simples apreciação negativa - art. 10°, n.º 2 e n.º 3, alínea a) do novo CPC (antes art. 4.°, n.º 2, alínea a) do CPC); 3) Nas ações de simples apreciação negativa, compete aos réus justificantes a prova dos factos constitutivos do direito que se arrogam – art. 343.°, n.º 1 do C.C.; 4) No caso sub judice, está em questão apenas o pedido da autora relativo à impugnação da escritura de justificação, único sobre o qual o douto Acórdão da Relação de Lisboa se pronunciou e do qual foi interposto o presente recurso, sobre o qual se deve exclusivamente atentar; 5) Os Réus CC e mulher DD, por escritura de justificação notarial celebrada a 30 de dezembro de 2008, exarada de fls. 38 a 39 v. do L. ... do Cartório Notarial Provado do Dr. HH, declararam serem os donos e legítimos possuidores do prédio misto em questão nos presentes autos, o qual veio à sua posse por compra verbal feita no ano de mil novecentos e setenta e sete, a OO e mulher PP, e a QQ; 6) Mais declararam os mesmos réus que “entraram na posse e fruição do aludido imóvel, posse que mantiveram sem interrupção até hoje, habitando a casa, usufruindo de todas as suas utilidades, cultivando e colhendo os frutos da parte rústica e suportando os respectivos impostos e encargos...”; 7) Cabia aos Réus CC e DD, e só a estes, virem aos autos provarem aquelas suas declarações, nos termos do imposto pelo artigo 343.°, n.° 1 do C.C., onde está claramente estabelecida a inversão do ónus da prova; 8) Os Réus justificantes CC e DD foram citados; 9) Os Réus justificantes CC e DD, não apresentaram qualquer tipo de Contestação nos presentes autos; 10) Só aos Réus justificantes, no caso concreto, os RR. CC e DD, competia fazer prova daquelas suas declarações proferidas na escritura pública de justificação notarial; 11) Simplesmente pelo facto dos RR. justificantes CC e DD não terem apresentado Contestação importa, automaticamente, a procedência do pedido de impugnação da escritura de justificação notarial...

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