Acórdão nº 2212/07.7TDLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 24 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelJOÃO SILVA MIGUEL
Data da Resolução24 de Junho de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam em conferência na 3.ª secção criminal do Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório 1. Nos autos de processo comum, com intervenção do tribunal coletivo, acima identificados, o tribunal coletivo da 1.ª Instância Central – 1.ª Secção Criminal - J13 do Tribunal da Comarca de Lisboa, foi, por acórdão de 4 de setembro de 2014, realizado o cúmulo jurídico, superveniente, de penas aplicadas, e transitadas, nestes autos e nos processos n.

os 557/04.7GGLSB, 209/06.3JDLSB, 697/04.2GGLSB, 1201/04.8GACSC e 650/04.6GISNT, ao arguido AA, sendo condenado na pena única de 15 (quinze) anos de prisão, oitenta dias de multa, mantendo-se a pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 3 (três) meses.

  1. Inconformado com o decidido, interpôs recurso do acórdão condenatório para este Supremo Tribunal[1], concluindo a motivação nos seguintes termos: «a) O Recorrente foi condenado, em cúmulo jurídico, numa pena de 15 (quinze) anos de prisão.

    b) Durante a reclusão, investiu na sua formação académica e mantendo-se laboralmente activo, revelando-se uma pessoa com competências sociais e profissionais, capacitada para se integrar na sociedade de uma forma adequada.

    c) A sua conduta não se reconduz a uma tendência ou carreira criminosa, mas antes a uma pluriocasionalidade que não radica na sua personalidade.

    d) O Recorrente revela uma personalidade menos gravemente desconforme ao Direito.

    e) Pelo que, atendendo a critérios de proporcionalidade e igualdade na aplicação das penas, a medida da pena no cúmulo jurídico não deve ultrapassar os 12 (doze) anos e 9 (nove) meses de prisão.

    f) Assim se satisfazendo integralmente as necessidades de prevenção geral e especial, privilegiando-se a futura reintegração do Recorrente na sociedade, em meio livre, para a qual se encontra plenamente capacitado.» A final pede que que «a pena de prisão [seja] reduzida para 12 (doze) anos e 9 (nove) meses, ou, subsidiariamente, se assim não se entender, se[ja]r a mesma reduzida para 13 (treze) anos e 7 (sete) meses, mantendo-se sempre a pena acessória de inibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 3 (três) meses, [e] que seja descontada a pena já cumprida no cumprimento da pena única aplicável ao concurso de crimes.» 3. Na resposta à motivação do recurso, o Ministério Público na 1.ª instância considera que «o Tribunal atendeu à circunstância da factualidade criminosa imputada reportar-se a núcleos temporais e instrumentais autónomos (…), com a finalidade de obter proventos materiais (…), sendo diversa a dimensão dos ilícitos praticados», tendo as falsificações natureza instrumental em relação às burlas, tal como atendeu «ao montante em causa na globalidade dos diversos ilícitos praticados em montantes pecuniários relevantes» e que se está perante «actividade persistente do arguido que se processou ao longo de cinco anos o traz à colação a consideração de que a reiteração da actividade criminosa pode fazer avultar os indícios de uma maior perigosidade e logo a partir daí fazer-se sentir exigências acrescidas de prevenção».

    E, porque o tribunal também atendeu «a circunstâncias [que] (…) depõem a favor do arguido como se consignou no douto acórdão (vd., designadamente, fls.9111 e 9112)» e que «[a] maioria das actuações criminosas relatadas ocorreram com uma dilação considerável até ao momento em que foi julgado, ou seja, no intervalo temporal que se situa em 2002 e 2007, não tendo antes disso antecedentes criminais», além de que «o seu processo de inserção social foi, em geral, positivo», «o Tribunal “ a quo” aplicou a sanção na medida certa, doseando a mesma no “ quantum” adequado.» 4. Neste Supremo Tribunal, a Senhora Procuradora-Geral Adjunta, no seu parecer, depois de assinalar que «a decisão recorrida, (…) seguiu uma forma de exposição algo desconforme e [de] difícil compreensão», o que, no essencial, se acompanha, referiu que o acórdão recorrido «não ter[á]ão tido em consideração várias circunstâncias para estabelecer a medida da pena de 15 anos de prisão, nomeadamente, a ausência de percurso criminal do arguido, ter agido pelo menos com um co-arguido, o aproveitamento escolar e profissional no estabelecimento prisional onde já se encontra há 8 anos (desde 2007)», pelo que «na medida da pena de prisão determinada no cúmulo e na pena dele resultante os julgadores, (…), deveriam ter tido em conta além destes factos também a eventual conexão da ocorrência dos crimes de natureza patrimonial e ainda a actual consciência crítica do arguido, que poderá também ser relevante se eventualmente tiver sido assumida em audiência. Acrescenta ainda que, «[n]a consideração dos factos (do conjunto dos factos que integram os crimes em concurso) está, pois, ínsita uma avaliação da gravidade da ilicitude global, que deve ter em conta as conexões e o tipo de conexão entre os factos em concurso», e «[n]a consideração da personalidade (da personalidade, dir-se-ia estrutural, que se manifesta e tal como se manifesta na totalidade dos factos), deve ser ponderado o modo como a personalidade se projeta nos factos ou é por estes revelada, ou seja, aferir se os factos traduzem uma tendência desvaliosa, ou antes se se reconduzem apenas a uma pluriocasionalidade que não tem raízes na personalidade do agente (Ac. do STJ de 6/10/2010, p. 107/08.6GTBRG.S1, 3ª sec)», não se lhe afigurando que «a pena aplicada ao arguido deva ser mantida atendendo à pena mínima e máxima aplicáveis tal como o arguido/recorrente tentou demonstrar», pelo que «a pena única a ser encontrada poderá eventualmente ficar próxima [dos] 12 anos de prisão, devido às circunstâncias que não terão sido devidamente avaliadas.» 5. Dado cumprimento ao disposto no n.º 2 do artigo 417.º do Código de Processo Penal (CPP), o recorrente veio desenvolver a sua motivação, na linha do que consta do parecer do Ministério Público, e invocar a «insuficiência de fundamentação no acórdão recorrido», por não ter sido levada em conta «a personalidade do agente e o modo como esta se interliga com o seu modus operandi» e «porque não foi feita uma apreciação global dos factos e da personalidade do agente para encontrar a nova fundamentação», mas sem que nas «conclusões e o pedido», que manteve nos seus exatos termos, argua ou ao menos aluda a qualquer vício, que inquine a decisão.

  2. Não tendo sido requerida audiência de julgamento, o recurso é apreciado em conferência [artigos 411.º, n.º 5, e 419.º, n.º 3, alínea c), do CPP].

  3. Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir.

    1. Fundamentação Conforme jurisprudência pacífica deste Supremo Tribunal, é pelo teor das conclusões, enquanto síntese da fundamentação e onde recopila as razões do pedido, por oposição à discordância da decisão (artigo 412.º, n.º 1, do CPP), que se delimita o objeto do recurso e se baliza os limites cognitivos do Tribunal Superior.

    A questão cuja reapreciação é requerida, tal como resulta das conclusões formuladas, respeita, no essencial, à medida concreta da pena unitária aplicada, que o recorrente tem por excessiva.

    Antes, porém, ter-se-á em conta que o recorrente invoca uma alegada insuficiência de fundamentação do acórdão recorrido, mas sem a integrar em algum vício de que a decisão padeça, nos termos do artigo 379.º do CPP.

    Com efeito, apesar de aludir à insuficiência de fundamentação, nomeadamente, por não ter sido feita uma apreciação global dos factos e da personalidade do agente, essa alegada deficiência não foi levada às conclusões, que, como se referiu, constituem a delimitação do objeto cognitivo do Tribunal, nem se invoca qualquer norma processual penal alegadamente violada.

    Por outro lado, apesar da parca fundamentação da decisão recorrida, esta comporta ainda o núcleo essencial para respeitar o que se preceitua no artigo 379.º, n.º 1, alínea a), por referência ao n.º 2 do artigo 374.º do CPP, atentas as alusões à ausência de antecedentes criminais e que «o seu processo de inserção social foi, em geral positivo», além de ter se aludir a um «percurso pessoal social não desajustado á média dos cidadãos e com evidência de capacidades de trabalho, comportamento prisional adequado com a conclusão do 12º ano e a realização de atividade profissional».

    1. Determinação da pena única i. Matéria de facto Foram os seguintes os processos, correspondentes factos provados, ilícitos penais e penas impostas, em que o recorrente foi condenado, por decisões transitadas em julgado, e que se encontram numa relação de cúmulo jurídico: I. N.º 2212/07.7TDLSB, da ex-5ª Vara Criminal de Lisboa (estes autos) Por acórdão proferido em 13 de março de 2014, transitado em julgado em 23 de maio de 2014, e pela prática, em julho de 2005, setembro de 2005, outubro de 2005, julho de 2006 e janeiro, fevereiro e março, todos de 2007, de factos constitutivos de 11 (onze) crimes de burla qualificada, p. e p. pelos artigos 217.º, n.º 1, e 218.º, n.º 2, alínea b), do CP, sendo punido, por cada um desses onze crimes, com 3 (três) anos de prisão; 11 (onze) crimes de falsificação de documentos agravada, p. e p. pelos artigos 256º, n.

    os 1, alíneas a) e e), e 3 do CP, punido, cada um destes crimes, com a pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão; 1 (um) crime de descaminho de objeto colocado sob o poder público, p. e p. pelo artigo 355º do CP, punido com 6 (seis) meses de prisão, e, em cúmulo jurídico, nos termos do artigo 77.º do CP, foi condenado na pena única de 10 (dez) anos e 3 (três) meses de prisão.

    Nestes autos resultou provado que: «1. Em data que concretamente se desconhece, mas anterior a 22/01/2007, o arguido AA logrou obter, por meio não apurado, o Bilhete de Identidade (BI) e outros documentos pessoais de BB.

  4. No local do BI correspondente à fotografia de BB, o arguido AA, ou alguém com o seu acordo e conhecimento, colocou a foto deste, passando, assim, a constar desse documento a fotografia do mesmo, sendo o nome e restantes elementos pessoais aí constantes correspondentes a BB.

  5. O arguido AA, ou...

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