Acórdão nº 655/11.0TBFLG.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelSALAZAR CASANOVA
Data da Resolução08 de Outubro de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.

AA propôs ação ordinária contra BB - Fábrica de Componentes de Borracha para Calçado, Lda. e contra CC e DD pedindo a condenação dos RR, pessoas singulares, no pagamento ao A. da quantia de 79.807,96€, da proveniência referida de 1 a 21, acrescida de juros legais desde a data da assinatura do acordo referido em 13 [ver infra alínea F) da matéria de facto] ou, quando assim se não entenda, desde a resposta do A. a que se aludiu em 11 [ ver infra alínea H] ou ainda, quando assim se não entenda, desde a citação até efetivo e integral pagamento; subsidiariamente, e para o caso de o primeiro pedido ser julgado improcedente, que se declare a nulidade da constituição de todas as prestações suplementares constituídas pelo A. em favor da primeira ré BB, no valor global de 79.807,66€, e inscritas nos últimos balanços anuais desta e, consequentemente, condenada esta 1ª ré no seu reembolso ao A. com juros legais desde a citação até integral pagamento.

  1. A ação foi julgada improcedente em 1ª instância, decisão confirmada pelo Tribunal da Relação com voto de vencido.

  2. O A. recorre para o STJ sustentando na minuta de recurso, em síntese, que a referida quantia de 79.807,66€, (e não 79.807,96€) que corresponde a prestações suplementares detidas pelo autor na sociedade ré, foi cedida pelo autor ao ora 1º réu, conforme contrato datado de 9-4-2010, por valor igual ao seu valor nominal.

  3. Não se provou, como sustentava o réu, que essa quantia integrasse o valor de 350.000€ pelo qual foram cedidas as quotas detidas pelo autor na sociedade ré, uma cedida ao 1º réu por 190.000€, a outra cedida à sociedade por 160.000€ conforme escritura de cessão de quotas outorgada na mesma data de 9-4-2010 em que foi cedida a posição contratual nas prestações suplementares. 5.

    Houve, assim, uma separação, constante de documentos autónomos, entre o valor da transmissão da quota (350.000€) e os valores respeitantes ao pagamento de suprimentos (43.956,00€: ver ata de 9-4-2010 a fls. 257 do vol I) e de cedência da referida prestação suplementar (79.807,66€).

  4. Se as partes quisessem transmitir pelo preço da quota os créditos de suprimentos de prestações suplementares não só teriam consignado isso na escritura, como não teria havido qualquer pagamento adicional para além dos 350.000€ nem teria sido celebrado o contrato de cedência da posição contratual relativo às prestações suplementares formalizado por documento particular na mesma data, como se disse, em que foi outorgada a escritura de cessão de quotas.

  5. O crédito de prestações suplementares, a ser integrado no valor estipulado para a cedência das quotas, teria então de ser integrado, na respetiva proporção no valor da quota adquirida pela sociedade e não cedido na totalidade a favor do 1º réu.

  6. Analisada a cláusula segunda do mencionado contrato de cedência à luz da doutrina da impressão do destinatário constante dos artigos 236.º a 238.º do Código Civil, onde se lê " cede […] por valor igual ao seu valor nominal" esse valor nominal, no contexto gramatical da afirmação constante da indicada cláusula, não pode ser outro se não o valor de 79.807,66€ referente a créditos de prestações suplementares que o autor detinha na sociedade, ficando afastada qualquer interpretação que permita concluir que o negócio de cedência desse crédito foi gratuito ou sem contrapartida.

  7. Não é aceitável uma interpretação que conduza à solução de que esse valor estaria integrado no valor a pagar da quota social porque não foi somente o réu marido o cessionário da participação alienada pelos autores, mas também, e em percentagem maior, a própria sociedade que, assim, deveria, como se disse, então ficar com um crédito na proporção da quota que adquiriu, sendo certo que nenhuma das quotas do autor, que resultaram de divisão da quota única por ele detida tendo em vista a cessão ao 1º réu e à sociedade, foram objeto de cedência pelos respetivos valores nominais.

  8. Em momento algum os RR ousaram afirmar que a cedência do crédito do autor relativo às prestações suplementares foi um negócio gratuito ou sem contrapartida, o que vale por dizer que a cedência implicou uma venda pelo valor nominal do crédito dessas prestações.

  9. Ora, de acordo com o princípio do equilíbrio das prestações a que alude o artigo 237.º do Código Civil, a interpretação que melhor se ajusta é a da obrigação de pagamento do valor das prestações suplementares que o autor detinha na sociedade ré no montante de 79.807,66€ e desde logo porque o réu marido nada tem a perder na medida em que se tornou credor da sociedade pelo valor de tais prestações.

  10. Conclui o autor a sua minuta de recurso mencionando que os RR. não efectuaram o pagamento devido, "pelo menos desde a data da interpelação concretizada por via da notificação judicial avulsa, ou, quando não assim, então a partir da citação; os réus singulares incorreram em mora e na consequente obrigação de indemnizar o autor, por incumprimento culposo da sua parte (como se presume), correspondendo a indemnização à obrigação do pagamento dos respetivos juros de mora - tudo, nos termos conjugados dos artigos 405.°, 406.º, 577.°, 578.° do Código Civil, sendo - como assinalado - de presumir a culpa dos réus no incumprimento por força do disposto no artigo 799.° do mesmo diploma.

  11. O acórdão recorrido incorreu em erro de julgamento em matéria de direito porquanto não interpretou devidamente o contrato em causa à luz da boa aplicação das regras de interpretação previstas nos artigos 236°/1 e 237.º ambos do Código Civil, nem aplicou, como deveria, os normativos antecedentemente invocados de que resultaria, como resultará, a procedência da acção e a consequente condenação dos réus singulares no pedido principal que contra eles vem formulado.

  12. Termos em que, sufragando-se o entendimento expresso na douta declaração de voto de vencido por via do qual deveria já ter sido dado provimento ao precedente recurso, deverá, por isso, revogar-se o acórdão recorrido, substituindo-o por um outro que, julgando a acção procedente, condene os réus singulares no pagamento ao autor da quantia peticionada acrescida dos juros, nos termos referidos, com o que farão V. Exªs a merecida e habitual JUSTIÇA".

  13. Sustentam os réus, nas suas alegações, que o valor patrimonial da participação social do A. e dos suprimentos ascende a 400.486,90€, recebendo o autor, a título de negócio realizado, o valor de 393.956,00€, largamente superior à soma dos valores nominais da quota (50.000,00€), suprimentos (43.956,00€) e prestações...

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