Acórdão nº 481/11.7TTGMR.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Janeiro de 2015
Magistrado Responsável | ANTÓNIO LEONES DANTAS |
Data da Resolução | 22 de Janeiro de 2015 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I Na presente acção especial emergente de acidente de trabalho, frustrada a tentativa de conciliação, e fixada pensão provisória a cargo do FAT, veio o sinistrado AA, dar início à fase contenciosa, com o patrocínio do Ministério Público, apresentando petição inicial em que termina peticionando a condenação de BB E CC, a pagarem-lhe: - a pensão anual e vitalícia de € 9.147,20 com início em 27/2/2012; - a quantia mensal de € 461,14 por 14 meses/ano, com início a 27/2/2012, relativa a prestação suplementar para assistência de terceira pessoa; - o subsídio de elevada incapacidade no valor de € 5.333,68; - o subsídio para readaptação de habitação no valor de € 5.333,68; - a indemnização no valor de € 8.114,96; - a quantia de € 678,80 relativa a despesas médicas; - a quantia de € 110 relativa a despesas de transporte; - e os juros de mora, à taxa legal.
Como fundamento da sua pretensão, invocou o Autor, em síntese, que desde 1983 prestava trabalhos agrícolas de poda e vindima para os RR, entre 15 a 30 dias por ano, em épocas regulares, determinadas e certas, pelo menos 10 horas por dia, contra retribuição diária de € 30,00 acrescida da subsídio de alimentação, sendo que os RR. destinavam parte da produção de vinho ao comércio.
E que, em 26.2.2011, quando o A. trabalhava como podador sob as ordens, direcção e fiscalização dos RR. num prédio rústico destes, sofreu uma queda, em resultado da qual esteve com ITA e, após a alta, ficou afectado de uma IPP considerada absoluta para toda e qualquer profissão, necessitando de assistência permanente de terceira pessoa, de readaptação do domicílio, para além de ter suportado despesas médicas e de transporte quer por causa dos tratamentos quer por causa deste processo e não tendo os réus pago nada nem transferido a responsabilidade de tal reparação para qualquer seguradora.
O Instituto da Segurança Social, I.P./Centro Distrital de Segurança Social de Braga deduziu, contra os mesmos Réus, pedido de reembolso da quantia total de € 6.764,93 que havia sido paga ao autor a título de concessão provisória de subsídio de doença e de prestações compensatórias de subsídio de Natal.
Os réus contestaram, em suma, alegando que a actividade prestada pelo Autor o era de forma desinteressada, sem remuneração, sem dependência económica do Autor aos réus e sem qualquer tipo de determinação ou ordem dada por estes, sendo que a actividade de poda não excedia 3 dias por ano, não tinha data certa ou regular, antes correspondendo a auxílio ocasional de curta duração para o fim de exploração para consumo próprio, e no quadro das relações de amizade e apoio entre amigos e vizinhos.
Alegam deste modo que não existiu acidente de trabalho, pelo que a acção deverá improceder e com os mesmos fundamentos, contestaram ainda o pedido deduzido pela Segurança Social.
A acção prosseguiu os seus termos vindo a ser decidida por sentença de 25 de Outubro de 2013 que integra o seguinte dispositivo: «Pelo exposto, julgo a presente acção provada e procedente nos termos sobreditos e, em consequência: I - Condeno os réus, BB e CC, a pagarem ao autor, AA: - a pensão anual e vitalícia de € 7.899,20 com início no dia 27/2/2012 (sem prejuízo das quantias já recebidas pelo autor a título de pensão provisória, paga pelo FAT e cujo valor respectivo será restituído ao FAT, a cargo dos réus, com a inerente desoneração do seu pagamento respectivo ao autor); - a prestação suplementar de € 461,14 por 14 meses/ano, com início no dia 27/2/2012, para assistência permanente de terceira pessoa (sem prejuízo da actualização anual correspondente à percentagem em que o seja o indexante de apoios sociais); - o subsídio por situação de elevada incapacidade permanente, no valor único de € 5.533,68; - o subsídio para readaptação da habitação no valor que venha a ser liquidado (sem prejuízo do limite máximo único de € 5.533,68); - a indemnização no valor de € 7.007,80 pela incapacidade temporária; - a quantia de € 678,80 relativa a despesas médicas; - a quantia de € 110 relativa a despesas de transporte (durante as fases conciliatória e contenciosa deste processo); - e os juros de mora, à taxa legal, desde a data do respectivo vencimento de cada uma daquelas quantias pecuniárias até integral e respectivo pagamento.
II - Condeno os réus, BB e CC, a pagarem ao Instituto da Segurança Social, I.P./Centro Distrital de Segurança Social de Braga a quantia total de € 6.764,93 paga ao autor, a título de subsídio de doença e prestação compensatória de subsídio de Natal, com a inerente desoneração do pagamento de tal quantia, por parte dos réus, ao autor.
Custas a cargo dos réus, sem prejuízo do apoio judiciário.
Valor da acção: € 102.554,06.
Registe e notifique.
Tenha-se em conta a pensão provisória fixada a cargo do FAT e os montantes já pagos ao sinistrado nos termos constantes de fls. 110 e 203-204 e outros que porventura tenham sido pagos posteriormente, cujo montante total será restituído ao FAT a cargo dos réus, com a inerente desoneração do pagamento desse montante respectivo pelos réus ao autor a título de pensão anual e vitalícia supra aludida».
Inconformados com esta decisão dela recorreram os Réus para o Tribunal da Relação do Porto, que veio a conhecer do recurso interposto por acórdão de 9 de Julho de 2014, que integra o seguinte dispositivo: «Nos termos supra expostos acordam conceder provimento ao recurso, revogando a sentença recorrida que substituem pelo presente acórdão que julga a acção interposta pelo Autor improcedente, absolvendo os RR. de todos os pedidos formulados, e, por consequência necessária, também do pedido deduzido pelo Instituto da Segurança Social, I.P./Centro Distrital de Segurança Social de Braga.
Sem custas.» Irresignado com esta decisão dela recorre de revista para este Supremo Tribunal o Autor, integrando as alegações apresentadas as seguintes conclusões: «- O Autor/sinistrado, ora recorrente, beneficia da presunção prevista no n.º 2 do art.º 3.° da Lei n.º 98/2009, de 04 de Setembro, norma segundo a qual se presume que "o trabalhador está na dependência económica da pessoa em proveito da qual presta serviços"; - Com efeito, os recorridos não lograram ilidir tal presunção, como lhes competia (art.º 350.° n.º 2, CPC); - Pelo acidente de trabalho ora em causa são devidos, como reparação, os montantes arbitrados na decisão proferida em primeira instância, atento o teor do art.° 71.º, n.ºs 9 e 11, da Lei n.º 98/2009, de 04 de Setembro; - O douto acórdão recorrido violou as disposições dos arts. 3.° 11.° 2, da Lei n.º 98/2009 de 04/09, 4.° n.º 1, al. c) da Lei Preambular do CT (Lei n.º 7/2009, de 12/02), 10.° do CT, e 350.° n.º l do CC.» Termina pedindo que seja concedido provimento ao recurso, revogado o «douto acórdão recorrido e confirmada na íntegra a decisão proferida em primeira instância».
Os recorridos responderam às alegações do recorrente sustentando o acerto da decisão recorrida e pedindo a respectiva confirmação.
Sabido que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente, nos termos do disposto nos artigos 635.º, n.º 3, e 639.º do Código de Processo Civil, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, está em causa na presente revista saber se os Réus ilidiram a presunção de dependência económica estabelecida no artigo 3.º, n.º 2 da Lei n.º 98/2009, de 4 de Setembro, relativamente ao sinistrado.
II As instâncias fixaram a seguinte matéria de facto: «1 - No dia 26/2/2011 (sábado), cerca das 14h. e 30m., o autor (AA) encontrava-se a podar videiras em cima de uma escada que se encontrava apoiada a um choupo quando um dos galhos do dito choupo se partiu, provocando a queda do autor ao solo, desde uma altura de cerca de 4 metros.
2 - Tal sucedeu num terreno rústico dos réus (BB e CC).
3 - Pelas 15h. e 46m. daquele dia, o autor deu entrada no Serviço de Urgência do Hospital Srª da Oliveira, em Guimarães, tendo sido transferido para o Hospital de S.João, no Porto, às 17h. e 15m. do mesmo dia, apresentando traumatismo toraco-‑abdominal e outras lesões constantes de fls. 15 a 59 dos autos e cujo teor aqui se dá por reproduzido 4 - O autor esteve afectado de incapacidade temporária absoluta desde 26/2/2011 até 26/2/2012, data da alta ou cura clínica e a partir da qual ficou com incapacidade permanente de 80% sendo considerada absoluta para todo e qualquer trabalho.
5 - O autor foi sujeito a exame médico, no Gabinete Médico-Legal de Guimarães, segundo o qual apresentava como sequelas paraplegia AIS A, nível neurológico D7, com força muscular nos membros superiores preservada bilateralmente e força muscular nos membros inferiores abolida bilateralmente...
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