Acórdão nº 28/12.8TTCBR.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelANTÓNIO LEONES DANTAS
Data da Resolução28 de Janeiro de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I No dia 6 de Janeiro de 2011, na cidade de Braga AA foi vítima de um acidente de trabalho, quando trabalhava sob autoridade e direcção de BB – .., …, …, Ldª, que tinha a sua responsabilidade por acidentes de trabalho transferida para a Ré CC, SA.

Instaurado o competente processo e realizada a tentativa de conciliação, o sinistrado e a Ré CC, SA, não se tendo conciliado, acordaram, contudo, na verificação dos seguintes factos: 1. o autor foi vítima de um acidente de trabalho, consistente numa queda no dia 6.1.2011, quando trabalhava, para a sua empregadora, com a categoria profissional de montador de tectos falsos, mediante a remuneração anual global, à data do acidente, de € 17.110,06; 2. teve alta médica em 30.3.2012; 3. à data do sinistro, a empregadora da autora tinha transferido para a ré seguradora a responsabilidade emergente de acidentes de trabalho.

Não houve, todavia, acordo das partes quanto ao resultado do exame médico realizado na fase conciliatória, o qual considerou o sinistrado afectado de uma IPP de 23,75%, com IPATH.

A seguradora requereu, então, exame por junta médica e, realizado este, concluíram os peritos, por maioria, que o sinistrado apresentava sequelas do acidente, em consequência das quais lhe atribuíram uma IPP de 23,175%, considerando que o mesmo não se encontrava afectado de IPATH, o que mereceu discordância do perito do sinistrado.

Solicitado ao Instituto do Emprego e da Formação Profissional o exame a que se refere o n.º 4 do artigo 21.º da Lei n.º 98/2009, de 4 de Setembro, e junto o respectivo relatório aos autos, foi proferida sentença, datada de 10 de Dezembro de 2013, em que se fixou a incapacidade do sinistrado, nos seguintes termos: «Requerido e realizado, oportunamente, exame por junta médica, os Srs. Peritos médicos entenderam por maioria que, o sinistrado é portador de incapacidade permanente e parcial de 23,175 % de IPP – vide, o auto de exame por junta médica de fls. 170.º a 173.º e, de fls. 135.º a 137.º do PP.

Conforme despacho de fls. 178.º do PP, ao abrigo do disposto no art. 21.º n.º 4 da NLAT, foi solicitado parecer prévio junto do Instituto do Emprego e da Formação Profissional, I.P (área competente) sobre a atribuição ou não ao sinistrado de uma IPATH (Incapacidade Permanente Absoluta para o Trabalho Habitual).

Pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional, IP foi elaborado o parecer técnico de fls. 181.º e sgs. do PP, findo o qual se considerou ter resultado do acidente sequelas graves no ombro direito que, afectaram todo o braço e, pé direito, afectando toda a perna, não tendo o sinistrado voltado a ter condições físicas para desenvolver quaisquer das actividades descritas, dado exigirem uma grande agilidade corporal, incluindo o uso com desenvoltura de ambos os braços e pernas, assim como elevados níveis de motricidade fina, designadamente ao nível das mãos e dedos.

Desta forma, concluímos que o A./sinistrado em consequência do acidente a que se reporta os autos ficou afectado de uma IPATH – Incapacidade Permanente Absoluta para o trabalho habitual -, para o exercício da sua profissão de montador de tetos falsos.» A referida sentença decidiu igualmente o litígio, nos termos do seguinte dispositivo: «Pelo exposto, decide-se condenar a seguradora no pagamento ao sinistrado da pensão anual e vitalícia devida desde 31/03/2012, no montante de € 9.348,08, (nove mil, trezentos e quarenta e oito euros e oito cêntimos), a deduzir, porém, os valores entretanto pagos pela R. segurador a título de pensão provisória, a que acresce a quantia de € 4.258,32, (quatro mil, duzentos e cinquenta e oito euros e trinta e dois cêntimos), a título de subsídio por situações de elevada incapacidade permanente, a pagar de uma só vez.» Inconformada com esta sentença dela recorreu a Ré CC, SA. para o Tribunal da Relação de Coimbra que veio a decidir o recurso interposto por acórdão de 15 de Maio de 2014, tendo-o julgado improcedente.

Inconformada com essa decisão dela interpôs a Ré recurso de revista excepcional, para este Tribunal, nos termos do n.º 3 do artigo 671.º e artigo 672.º, ambos do Código de Processo Civil, recurso que veio a ser admitido pela formação a que se refere o n.º 3 daquele artigo 672.º, por acórdão de 1 de Outubro de 2014.

A recorrente integrou nas alegações apresentadas naquele recurso, que definem, igualmente, o objecto da presente revista, as seguintes conclusões: «I – DA ADMISSIBILIDADE DO PRESENTE RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL: 1. De acordo com o disposto no art. 81º n.º 5 do Cód. Proc. Trabalho (na versão aplicável “in casu”), à interposição e alegação do recurso de revista aplica-se o regime estabelecido no Código de Processo Civil.

  1. Nos termos e para os efeitos do disposto no art. 721º n.º 1 do Cód. Proc. Civil, não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e ainda que por diferente fundamento, a decisão proferida na 1ª instância – são as situações de “dupla conforme” 3. Contudo, e apesar desta restrição de acesso a uma 2ª instância recursiva, o legislador entendeu consagrar as circunstâncias excepcionais em que apesar de se verificar esta “dupla conforme”, ainda assim é possibilitado às partes o acesso a um 3º e derradeiro grau de jurisdição. 4. Nesse sentido, estabelece-se, no art. 721º-A n.º 1 do Cód. Proc. Civil (intitulado “revista excepcional”) que, excepcionalmente, cabe recurso de revista do acórdão da Relação referido no n.º 3 do art. 721º quando: a. Esteja em causa uma questão cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito; b. Estejam em causa interesses de particular relevância social; c. O acórdão da Relação esteja em contradição com outro, já transitado em julgado, proferido por qualquer Relação do pelo Supremo Tribunal de Justiça, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, salvo se tiver sido proferido acórdão de uniformização de jurisprudência com ele conforme. 5. Salvo o devido respeito por diverso entendimento, é convicção da Seguradora recorrente que a questão que enforma o objecto do presente recurso – admissibilidade ou não da cumulação de fixação de IPATH e aplicação do factor de bonificação 1,5 previsto na TNI, Instruções Gerais, art. 5º al a), às mesmas lesões advenientes do mesmo acidente de trabalho - contende, atenta a sua natureza, com verdadeiros interesses de particular relevância social, na acepção que subjaz ao disposto no art. 721º- A n.º 1 al b) do Cód. Proc. Civil.

  2. Para além de consagração na nossa Lei Fundamental (CRP, arts. 59º n.º 1 al f) e 63º n.º 3), atenta a sobredita “relevância social” dos direitos à reparação emergentes para os trabalhadores de acidentes infortunístico-laborais, entendeu ainda o legislador dotar tais direitos – como os que se acham em apreços nos presentes de autos – e num escopo de verdadeira protecção ao trabalhador, da natureza de direitos inalienáveis, impenhoráveis e irrenunciáveis, nos termos expressamente consignados no art. 78º da Lei 98/2009.

  3. E ciente da importância da matéria em apreço, e em tudo o que contenda, pois, com estes direitos infortunístico-laborais, entendeu o legislador que as questões com os mesmos contendentes, em sede judicial, haviam de merecer tramitação como processo urgente.

  4. Ora, é inegável (e quase notória) a verificação, no caso que ora se submete a douta sindicância deste Supremo Tribunal de Justiça, de que estamos perante interesses de particular relevância social, quais sejam, pois, os interesses dos trabalhadores afectados por uma incapacidade para a prática do trabalho habitual, por via de um acidente de trabalho por si protagonizado, e bem assim a forma de fixação da respectiva incapacidade, e com o necessário impacto ao nível da efectiva reparação da afectação funcional emergente das lesões e sequelas de que o mesmo ficou a padecer.

  5. Sempre com o máximo respeito por divergente opinião, a concreta questão da compatibilização entre a fixação de incapacidade para o trabalho decorrente de infortúnio laboral, com natureza de IPATH e do factor de bonificação 1,5 aplicável a situações de necessidade de reconversão do posto de trabalho, mostra-se dotada de verdadeiro impacto, não só no caso em concreto, mas sobretudo na própria sociedade em geral dada a hipotética multiplicidade de eventuais destinatários – ou seja - todo e qualquer trabalhador.

  6. Adicionalmente, e atendendo aos citados interesses sociais em causa – direito ao trabalho, à reparação em sede de acidentes de trabalho, direito à saúde – urge, pois, considerar que se impõe uma aplicação da lei pautada pela segurança e certeza jurídicas que a dignidade da pessoa humana demanda – e note-se que o direito ao trabalho condigno e à justa reparação por acidentes de trabalho se mostram intrinsecamente relacionados com a dignidade humana, na vertente de uma existência condigna proporcionada pelos rendimentos de trabalho auferidos ou, no caso de acidentes, pelas pensões destinadas a obviar a perda da capacidade de ganho.

  7. Face ao supra expendido, e sempre com o merecido respeito por diverso entendimento, urge concluir que a concreta questão cuja apreciação se coloca agora a este Supremo Tribunal de Justiça consubstancia uma questão jurídica em que estão ao apreço interesses de particular relevância social, sendo, pois, admissível o presente recurso de revista excepcional, por força do disposto no art. 721º-A n.º 1 al b) do CPC.

    ACRESCE: 12. Nos presentes autos foram proferidas, na 1ª instância e posteriormente na Relação, duas decisões de idêntico teor, e que incidiram sobre a interpretação a conferir à seguinte questão: cumulação, para efeitos de determinação do grau de incapacidade para o trabalho da atribuição de IPATH com a atribuição do factor 1,5 decorrente da alínea a) do art. 5º das Instruções Gerais da TNI.

  8. Ambas as decisões sustentaram que a atribuição da sobredita natureza da...

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