Acórdão nº 29/14.1YFLSB de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Março de 2015
Magistrado Responsável | TÁVORA VICTOR |
Data da Resolução | 18 de Março de 2015 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
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RELATÓRIO.
Acordam na secção de contencioso do Supremo Tribunal de Justiça.
AA, Juiz .... em exercício de funções no Tribunal de Família e Menores ..., veio interpor contra o Conselho Superior da Magistratura com sede em Lisboa recurso da Deliberação terminando por requerer: - Em via principal, que seja declarada a invalidade (nulidade ou mera anulabilidade) da deliberação sob censura decorrente do facto de o CSM ter ignorado absolutamente os próprios critérios a que se autovinculou, primeiro para escolha dos juízes a frequentar o curso específico a ministrar pelo CEJ de formação de Juízes Presidentes, e depois de escolha dos próprios Juízes Presidentes a nomear.
- Em segunda via subsidiária, deve ser declarada a invalidade (nulidade ou mera anulabilidade) da deliberação sob censura por violação grave dos princípios da igualdade, da legalidade, da imparcialidade e da boa-fé.
- Em terceira via subsidiária deve ser declarada a invalidade (nulidade ou mera anulabilidade) da deliberação sob censura por não se encontrar fundamentada, nos termos constitucional e legalmente impostos (art. 268.º, n.º 3, da CRP; arts.º 124.º a 126.º do CPA) (pontos 3.78 a 3.125 deste articulado; conclusões XXII a XXV).
Apresentou as seguintes, Conclusões.
1. O CSM autovinculou-se, no procedimento de escolha e nomeação dos Juízes Presidentes, aos critérios que ele próprio enunciou no aviso n.º 4/2013 que deu início a um procedimento de escolha de juízes para frequentarem o curso de formação do CEJ, mas que posteriormente alargou à própria escolha dos Juízes Presidentes e no termo do qual procedeu a essas efectivas escolhas - a categoria profissional, a classificação de serviço, a antiguidade, comparação curricular entre candidatos, comparação entre as qualidades reunidas por cada candidato para o exercício do cargo, e finalmente uma comparação entre as explicitações de cada candidato relativamente ao modo como se propunha exercer as funções.
2. O CSM deliberou em relação à escolha e nomeação dos Juízes Presidentes dos Tribunais das Comarcas de Porto, Porto-Este, Braga, Viana do Castelo e Aveiro sem tomar em mínima consideração esses critérios.
3. Ao deliberar ignorando e desprezando em absoluto os critérios a que estava previamente vinculado, o CSM violou tais critérios e a boa-fé a que estava obrigado para com o requerente, com a consequente violação do princípio da legalidade e do correspondente direito fundamental do aqui requerente a que a administração - no caso o CSM - actue subordinada à Constituição e à lei (art. 266.º, n.º 2, da CRP, e arts. 3.º, n.º 1, e 6.º-A do CPA), de tudo resultando a nulidade da deliberação (art. 133.º, n.º 2, alínea d) do CPA), ou pelo menos a sua anulabilidade (art. 135.º do CPA) - pontos 3.1 a 3.12 deste articulado.
4. O princípio da igualdade impõe igualdade de tratamento para situações iguais.
5. Ora, segundo as declarações de voto do Exmo. Sr. Vice-Presidente do CSM transcritas nos factos provados e que não foram até hoje desmentidas pelos que por elas foram directamente visados, "… a generalidade das escolhas… " dos Juízes Presidentes - e poderão ser qualquer um dos 22 escolhidos - tiveram uma feição "marcadamente pessoal", foram marcadas por "resquícios de acentuada proximidade com determinado núcleo, há muito dominante na magistratura e estruturas coadjuvantes", bem como por "favoritismo para pessoas mais próximas de qualquer um dos Vogais", tratando-se de "escolhas… manifestamente pré-preparadas, trabalhadas e condicionadas pela dita comissão", sem mandato para o efeito, com vinculação de "voto nos candidatos propostos" pela comissão/grupo de trabalho que assim procedeu.
6. Por isso, face a essas declarações, alguns dos Juízes Presidentes escolhidos - e poderão ser qualquer um dos 22 escolhidos - terão sido privilegiados por terem certas relações com as pessoas que os escolheram ou por pertencerem a determinado núcleo associativo, ficando os concorrentes para o mesmo lugar correspondentemente prejudicados e privados do direito a tal lugar ou, pelo menos, da ponderação do direito ao lugar, tudo numa evidente manipulação do processo de votação e inerente violação do princípio da igualdade.
7. O princípio da igualdade também impõe um tratamento diferenciado para situações substancialmente diferenciadas.
8. Ao deliberar sem justificação material bastante que permitisse sustentar a prevalência e/ou postergação de quaisquer diferenciações, a deliberação sob censura também violou, nesta outra dimensão, o princípio da igualdade.
9. De tudo resulta, que a deliberação sob censura violou o princípio da igualdade e o correspondente direito fundamental do requerente, com a consequente nulidade da deliberação de escolha e nomeação dos senhores Juízes BB, CC, EE,FF e DD, como Juízes Presidentes dos Tribunais da Comarca de Porto, Porto-Este, Braga, Viana do Castelo e Aveiro (art. 135.º, n.º 2, alínea d) do CPA), ou pelo menos a sua anulabilidade (art. 135º do CPA).
10. O n.º 2 do art. 92.º da LOSJ ao enunciar os requisitos mínimos para a escolha dos candidatos ao cargo de Juiz Presidente - determinada categoria, determinada antiguidade e determinada classificação de serviço - também determina, a nosso ver e pelo menos indirectamente, que a categoria, a antiguidade e a classificação de serviço constituem critérios mínimos que devem ser levados em linha de conta para aquela escolha, sem prejuízo da enunciação de outros critérios complementares pelo próprio CSM, e também sem prejuízo da valoração de circunstâncias que anulem as indicações de escolha colhidas a partir dos critérios mínimos da categoria, da antiguidade e da classificação de serviço, circunstâncias anulatórias essas que, em qualquer caso, são de explicitação obrigatória a fim de que possam ser contraditadas e sindicadas.
11. Aqueles critérios mínimos não foram ponderados na escolha dos Juízes Presidentes dos Tribunais das Comarcas de Porto, Porto Este, Braga, Viana do Castelo e Aveiro, ou, pelo menos, foram valorizados na deliberação sem que tal valorização se mostre objectivamente fundamentada pela enunciação das supra referidas circunstâncias anulatórias.
12. Ao deliberar sem justificar factual e juridicamente as nomeações ou escolhas efectuadas, a deliberação sob censura violou o princípio da legalidade e o direito fundamental do aqui requerente a que a administração - no caso o CSM - actue subordinada à Constituição e à lei (art. 266.º, n.º 2, da CRP, e art. 3.º, n.º 1, do CPA), com a consequente nulidade dessa deliberação (art. 133.º, n.º 2, alínea d) do CPA), ou pelo menos a sua anulabilidade (art. 135.º do CPA).
13. Segundo o art. 24.º, n.º 2 do CPA, as deliberações que envolvam a apreciação de comportamentos ou das qualidades de qualquer pessoa são tomadas por escrutínio secreto.
14. Porém, a "escolha" dos juízes presidentes pelo CSM, nos termos do art. 92.º, n.º 2, da LOSJ não envolve a apreciação de comportamentos ou das qualidades de qualquer pessoa, pois averiguar se um concorrente tem melhores habilitações profissionais para o exercício de certa actividade de interesse ou serviço público, não é avaliar "das qualidades de qualquer pessoa", das qualidades ou características que necessariamente qualquer um tem (ou não tem).
15. A deliberação por escrutínio secreto é legalmente reservada para situações em que está em causa a livre escolha pelo órgão deliberativo de determinada pessoa em que é depositada uma confiança pessoal e, por vezes, política, o que não é manifestamente o caso, em que importa escolher os juízes com melhores habilitações profissionais/curriculares para o exercício do cargo de Juiz Presidente das futuras comarcas.
16. Ao deliberar sobre a escolha da presidência dos aludidos Tribunais de Comarca Porto, Porto-Este, Braga, Viana do Castelo e Aveiro, sob a forma de escrutínio secreto, o CSM violou aquele artigo 24º nº 2 do CPA com a consequente nulidade da deliberação da escolha e nomeação dos Juízes Presidentes – artigo 133º ns.º 2 alíneas d) e f) do CPA ou pelo menos anulabilidade. A acreditar nas declarações de voto do Exmo. Senhor Vice-Presidente do...
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