Acórdão nº 620/11.8TTLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelANTÓNIO LEONES DANTAS
Data da Resolução11 de Fevereiro de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I AA, com o patrocínio do Ministério Público, intentou a presente acção emergente de acidente de trabalho, sob a forma do processo especial, contra BB, COMPANHIA DE SEGUROS, S.A. e CC, S.A. pedindo a condenação, a título principal, da seguradora e, subsidiariamente, da empregadora a pagarem-lhe: 1. A pensão anual e vitalícia no montante de € 6.177,10, com início em 2 de Fevereiro de 2011; 2. A quantia de € 5.533,68, a título de de subsídio por morte; 3. Juros de mora desde a data de vencimento de cada prestação até integral pagamento; Invocou, em síntese, como fundamento da sua pretensão que desde Dezembro de 2008 viveu em união de facto com DD e que este, em 1 de Fevereiro de 2011, sofreu acidente de trabalho ao serviço da ré CC, do qual resultou a sua morte; e que, na data do acidente, a Ré CC SA tinha a responsabilidade pela reparação de danos emergentes de acidentes de trabalho transferida para a BB, mas ambas as rés declinam a responsabilidade pela reparação do sinistro.

A Ré BB rejeita a sua responsabilidade sustentando que o contrato de seguro que celebrou com a ré CC não abrangia o sinistrado.

A Ré CC remete a responsabilidade pelo risco do sinistro para a seguradora pugnando pela validade e eficácia do contrato de seguro celebrado entre ambas e declina a sua responsabilidade por entender que o sinistro não configura acidente de trabalho.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção procedente e condenou a Ré CC, S.A. a pagar à Autora: - a pensão anual e vitalícia no montante de € 6.177,10, com início a 2 de Fevereiro de 2011, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, computados à taxa de 4% desde a data do vencimento de cada prestação até integral pagamento; - subsídio por morte no montante de € 5.533,68, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, computados à taxa de 4% desde a data do seu vencimento até integral pagamento; Foi igualmente decidido absolver a Ré BB, Companhia de Seguros, S.A. de todos os pedidos contra ela formulados nos autos.

Inconformada com esta decisão dela recorreu a Ré CC SA para o Tribunal da Relação de Lisboa, que veio a conhecer do recurso interposto por acórdão de 10 de Setembro de 2014, tendo decidido pela improcedência do mesmo e pela confirmação da sentença recorrida.

Irresignada com esta decisão dela recorreu aquela Ré, agora de revista, para este Supremo Tribunal, integrando nas alegações apresentadas as seguintes conclusões: «1 ° O acórdão recorrido apresenta uma "fundamentação essencialmente diferente" da sentença recorrida, pelo que não funciona o princípio da dupla conforme, sendo admissível o recurso de revista.

  1. Também, nos termos da al. c) do art. 674° do C.P.C, a revista pode ter por fundamento "as nulidades previstas nos arts. 615º e 666º.

  2. O Acórdão recorrido pronunciou-se sobre questões de que não podia tomar conhecimento, verificando-se assim uma nulidade.

  3. A decisão proferida em 1ª instância condenou a recorrente no pedido, fundamentando a responsabilidade desta na extemporaneidade da remessa da folha de férias do sinistrado à Seguradora.

  4. Por seu lado, o Acórdão sob recurso vem fundamentado num pré-juízo de valor sobre a conduta da recorrente e na mera presunção de má fé, em virtude de o sinistrado apenas ter sido incluído na "folha de férias" do mês anterior ao acidente, já depois da ocorrência deste.

  5. A confirmação da decisão pela Relação foi sustentada ao abrigo de um juízo referente à conduta da requerente e não pelo fundamento de extemporaneidade do envio da folha de férias à seguradora, conforme foi a fundamentação da sentença de 1.ª instância. 7° Em momento algum da fundamentação da sentença de 1.ª Instância é referido qualquer juízo de valor sobre a conduta da recorrente.

  6. A condenação da recorrente em 1.ª instância dá-se apenas por ter sido considerad[o] extemporâneo o envio da folha de férias à seguradora, mas nunca tendo sido questionada a conduta da recorrente sobre a inclusão do sinistrado nessa mesma folha.

  7. A matéria referente à má-fé da recorrente nunca nada foi alegada pelo autor ou por qualquer das partes, nem objecto de fundamentação de qualquer decisão, não foi objecto de qualquer tratamento ao longo do processo, não sendo levada à matéria de facto provada ou a provar.

  8. O objecto do recurso de apelação prendeu-se com a tempestividade do envio das folhas de férias do sinistrado à ré BB.

  9. Esta era a questão a ser analisada no recurso interposto para a Relação, consoante as respectivas conclusões, porquanto seria esta variável que implicaria a revogação da decisão de 1ª instância e a consequente condenação da Ré BB.

  10. Apesar de ter sido a questão da tempestividade do envio da folha de férias para a seguradora que pretendia a recorrente ver apreciada, o Acórdão sob recurso considerou prejudicada a apreciação de tal questão, para tomar conhecimento de matéria que não foi alegada, nem objecto das conclusões do recurso.

  11. O Acórdão ao longo de toda a sua fundamentação vem fazendo referência ao entendimento de que o seguro de acidentes de trabalho, na modalidade de prémio variável, não era adequado à cobertura da responsabilidade por acidentes de trabalho do empregador relativamente a trabalhadores economicamente subordinados.

  12. Tal questão não foi suscitada no recurso de apelação, designadamente nas suas conclusões.

  13. Ficou assente que o seguro em vigor era o da modalidade de prémio variável, por aceitação da ré seguradora, da autora e da sentença de 1ª instância.

  14. Se tal seguro era ou não adequado aos prestadores de serviço economicamente subordinados, é uma questão que nunca foi suscitada.

  15. Fundamenta-se também o Acórdão numa presunção de má fé da recorrente, que também nunca foi carreada para os autos, e tão-pouco no recurso.

  16. A questão da má-fé não tem suporte fáctico nem alegação de qualquer das partes nesse sentido.

  17. O tribunal a quo criou, assim, uma decisão sobre matéria nova, não submetida à apreciação do tribunal de 1.ª instância, nem suscitada em sede de recurso.

  18. Os recursos são meios para obter o reexame de questões já submetidas à apreciação dos tribunais inferiores, e não para criar decisões sobre matéria nova, não submetida à apreciação do tribunal de que se recorre.

  19. Existe excesso de pronúncia, nos termos do artigo 615º d) do Código de Processo Civil, estando o Acórdão ferido de nulidade.

  20. O sinistrado era prestador de serviços e não trabalhador, mas sob o regime de dependência económica, decorrente da circunstância do seu rendimento depender em mais de 80% da ré CC.

  21. Em 1 de Janeiro de 2011, entrou em vigor o Código Contributivo.

  22. No ponto 14 dos factos provados, refere o Acórdão que «Nessa mesma folha, a ré CC, SA (conforme nota de rodapé) fez constar que a inclusão do sinistrado era efectuada atendendo a que se tratava de um prestador de serviço na situação de dependência económica, invocando ainda o Código Contributivo da Segurança Social» (sic.); 25° Dos factos provados e aos quais ninguém pode fugir, resulta que há um motivo objectivo, lógico e de gestão de recursos humanos que justifica a inclusão do sinistrado na folha de férias e no seguro de acidentes de trabalho.

  23. Da folha de férias de fls., resulta que a ré não agiu assim apenas quanto ao sinistrado, mas em relação a todos os prestadores de serviço que se encontravam em idêntica situação.

  24. Das regras de experiência e do que se infere dos autos, a ré BB não questionou a legitimidade de tal procedimento, em relação aos demais prestadores de serviço incluídos na dita folha de férias, aceitando que o seguro de acidentes de trabalho foi e é válido para eles.

  25. Um acidente é isso mesmo: um acidente! Uma conjugação de factores que conduzem a um fim maligno.

    29° O Tribunal do Trabalho e a Relação de Lisboa não entenderam esta realidade! 30° Seguindo o raciocínio do Acórdão recorrido, a ré CC apenas estava obrigada a declarar a situação de prestação de serviços em regime de dependência económica trimestralmente, seja à Segurança Social, seja à Companhia de Seguros, se quisesse fazê-lo abranger pelo regime do seguro de acidentes de trabalho.

  26. Ocorrendo o acidente em 1 de Fevereiro de 2011, o sinistrado apenas apareceria na dita folha em 10 de Abril de 2011.

  27. Tendo a folha de férias, autonomizada das restantes, dado entrada em 8 de Fevereiro de 2011, não há censura à conduta da recorrente.

  28. Diz o Acórdão «Não obstante, porque era legalmente responsável pela reparação dos danos emergentes do acidente de trabalho relativamente a tais trabalhadores independentes, estava a ré CC, desde o início da relação com o sinistrado (em Julho de 2010), obrigada a transferir tal responsabilidade para uma seguradora, o que não fez até Janeiro de 2011» (sic.).

  29. Não ficou provado, factualmente, que, antes de 1 de Janeiro de 2011, a ré CC não tinha outro seguro que cobrisse o risco inerente à prestação de serviços.

  30. Apenas ficou provado que, em 1 de Janeiro de 2011 e por força da entrada em vigor do Código Contributivo, a CC passou a integrar os seus prestadores de serviços em regime de dependência económica no seguro de acidentes de trabalho, incluindo-os, a todos, numa folha de férias autónoma e fazendo-os abranger pelo seguro de acidentes de trabalho.

  31. Não ficou provado, porque tal jamais foi alegado por quem quer que fosse ou apreciado pelo tribunal, se, anteriormente a 1 de Janeiro de 2011, existia outro seguro válido.

  32. Com base em pré-juízos e preconceitos, o Acórdão presume para além do que lhe é lícito presumir, concluindo não existir um seguro anterior a 1 de Janeiro de 2011, sem qualquer suporte factual e apenas com a intenção de encontrar suporte para a presumida má-fé da ré CC.

  33. Sem prescindir, o tribunal a quo, embora tenha considerado prejudicada a questão sobre a tempestividade do envio da folha de férias, entendeu que "é a data da recepção pelo destinatário, isto é, pela seguradora, já que não está provado, nem sequer...

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