Acórdão nº 83/14.6TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Dezembro de 2015

Magistrado ResponsávelGREGÓRIO SILVA JESUS
Data da Resolução10 de Dezembro de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Recurso de Revista nº 83/14.6TVLSB.L1.S1[1] Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – RELATÓRIO AA, S.A., com sede no Edifício …, ….º, Aeroporto de Lisboa, intentou, nas Varas Cíveis de Lisboa, acção declarativa com processo comum contra BB, residente na Rua …, …, ..., pedindo seja condenado a pagar-lhe a quantia de 28.500,00€, a título de reembolso de empréstimo, e juros de mora.

Para tanto, alegou, em síntese, que o réu foi admitido na TAP tendo exercido funções inerentes à categoria de operador de assistência em escala, e em 1/10/2003, por força da cisão simples do património da TAP, foi constituída uma nova sociedade, a autora, cujo objecto passou a compreender a actividade de assistência em escala, tendo sucedido na posição jurídica da TAP, pelo que o réu foi, também, transferido e integrado nos quadros de pessoal da autora Em 30/05/2007, autora e réu celebraram um acordo de pré-reforma, nos termos do qual, o réu deveria requerer à entidade oficial competente a passagem à situação de reforma.

Posteriormente, em 5/09/2008, autora e réu acordaram que aquela emprestaria a este o montante de 1.500,00€ por mês (14 meses por ano), até que lhe fosse concedida a passagem à reforma antecipada, em que a 1ª prestação teria lugar em 1/12/2008.

O prazo de empréstimo findava na data em que o réu começasse a receber do Centro Nacional de Pensões (CNP) a sua pensão de reforma, tendo-se o réu comprometido a dar conhecimento à autora da data na qual começasse a receber tal pensão, devendo o reembolso do empréstimo ser integralmente realizado no prazo de 10 dias a contar da data em que o réu recebesse do CNP a importância retroactiva da sua pensão de reforma.

Assim, a autora emprestou ao réu o referido valor acordado de Dezembro de 2008 a Maio de 2010, num total de 28.500,00€.

Em 23/03/2010, a autora foi notificada pelo Instituto de Segurança Social do facto de ter sido deferida a pensão de velhice ao autor., com efeitos reportados a 3/11/2008, não tendo o réu, contudo, informado a autora de tal facto, como acordado.

Na ausência do reembolso, por várias vezes a autora notificou o réu para regularizar o saldo em dívida, nunca tendo este respondido.

Regularmente citado, o réu contestou alegando, para além do mais que ora não importa, que, atenta a natureza da relação entre autora e réu e origem das prestações cuja restituição se pretende, o tribunal cível é materialmente incompetente para conhecer da acção, requerendo a remessa dos autos ao Tribunal de Trabalho de Vila Franca de Xira, por ser o competente.

Respondeu a autora pugnando pela improcedência desta excepção.

No despacho saneador foi julgada verificada a excepção de incompetência absoluta do tribunal e, em consequência, declarou-se o tribunal cível incompetente em razão da matéria, absolvendo-se o réu da instância.

Inconformada, apelou a autora, com êxito, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa, no seu Acórdão de 14/04/15, por unanimidade, revogado a decisão recorrida, declarando o tribunal cível competente para conhecer da acção.

O réu manifesta o seu desacordo vindo pedir revista, e das alegações que apresenta tira as seguintes conclusões: 1. O presente recurso tem por objecto o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, o qual revogou o despacho proferido em 1.ª instância pelo Tribunal das Varas Cíveis de Lisboa, no qual se considerava incompetente quanto à matéria e reconhecia competente o Tribunal de Trabalho.

  1. Andou mal o Tribunal da Relação, ao subtrair o presente da competência do Tribunal do Trabalho, uma vez que a Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça tem considerado competente o tribunal de trabalho quanto a factos essenciais da relação laboral e incluindo neste âmbito pagamentos a efectuar entre as partes mesmo finda a relação laboral (nesse sentido Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, nº 981/07.3TTBRG.Sl) 3. De facto, para correcta aferição da competência, é determinante a forma como a Autora formula o pedido e os respectivos fundamentos, bastando atentar nas primeiras linhas do relatório para resultar à saciedade a laboralidade da relação e das circunstâncias: O R. foi admitido na TAP há mais de 30 anos, tendo exercido funções inerentes à categoria de (...); Em 01.10.2003 (...) o R. foi, também, transferido e integrado nos quadros de pessoal da A.; Em 30.05.2007 A. e R. celebraram um acordo de pré-reforma (...); (...) emprestaria (…) até que fosse concedida a passagem à reforma antecipada (...) ¬ (fl. 1 acórdão recorrido).

  2. Independentemente do nomem júris a atribuir ao adiantamento prestado, a verdade é que o mesmo é parte integrante de um processo tendo em vista o termo da relação laboral e apenas e somente nesse pressuposto o mesmo foi celebrado.

  3. Não podemos deixar de observar que com o acordo de pré-reforma o contrato de trabalho entre o Recorrente e a Recorrida ficou suspenso, mas não cessou, mantendo-se inúmeros deveres em vigor, estando até expresso na cláusula 7ª, nº 2, a proibição de concorrência.

  4. Quanto o Recorrente assinou o "contrato de mútuo", continuava a Recorrida na posse dos seus poderes enquanto Empregadora, que determinavam o estado de subordinação jurídica do Recorrido, designadamente o poder disciplinar, podendo inclusive no seu decurso o trabalhador sofrer sanções disciplinares e até o contrato findar, por exemplo, por justa causa, mormente pela violação da cláusula de não concorrência.

  5. Mas não se tratou apenas de subordinação jurídica, mas também económica, uma vez que a prestação acordada seria e foi durante muito tempo o único meio de subsistência do trabalhador.

  6. Como aliás mui doutamente foi conclusão do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça indicado pela Recorrida - Acórdão de 16-11-2010 (Processo n.º 981/07.3TTBRG.S1),- e que atribui mais uma vez competência ao Tribunal do Trabalho "não relevará, desde logo, que a relação de trabalho se ache já extinta: apesar dessa extinção, nada impede que a "questão" ajuizada deva ser entendida como emergente da apontada relação (cfr. Ac. S.T.J. de 9/2/99, proferido no processo n.º 745/98).

  7. Face ao exposto, é de facto o termo da relação laboral um factor essencial a apreciar neste processo. Aliás, é o factor a ter em conta neste processo, e os comportamentos adoptados para o seu alcance, como actos preparatórios que conduziram à cessação da relação de trabalho.

  8. Pois, não fosse o Recorrente trabalhador da entidade (e não pretendesse a Recorrida o termo do contrato) e não teríamos adiantamento monetário de qualquer tipo, o qual se deveu única e exclusivamente ao vínculo que ligava as partes, de natureza laboral e à manifesta negligência com que a Recorrida conduziu os processos de passagem à situação de pré-reforma.

  9. De resto, a afirmação de inexistência de vínculo laboral porque aquando da passagem à situação de reforma, mais de dois anos volvidos, a mesma foi atribuída com efeitos retroactivos, significa escamotear conceitos jurídicos e realidade, o que é inadmissível.

  10. Deste modo, o acórdão recorrido aplicou erradamente a lei de processo, in casu, o artº 85°, alínea b), da LOFTJ, bem como andou em direcção oposta a acórdão do Supremo, nos termos do disposto no artº 671°, nº 2, alínea b), face ao teor do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16.11.2010, proferido no processo 981/07.3TTBRG.S1, bem como a jurisprudência da Relação de Lisboa, v.g., AC. TRL de 11.10.2007; 13. Nesses termos, e nos demais de Direito, deverá a decisão do Tribunal da Relação ser revogada, e substituída por outra que declare a incompetência do Tribunal Cível, assim se fazendo a tão almejada JUSTIÇA A autora contra-alegou defendendo a manutenção do decidido.

Colhidos os vistos legais, cumpre...

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