Acórdão nº 199/14.9GCOAZ.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Dezembro de 2015

Magistrado ResponsávelARMINDO MONTEIRO
Data da Resolução02 de Dezembro de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam em conferência na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça : Em processo comum com intervenção do tribunal colectivo foi submetido a julgamento no P.º n.º 199/14.9GCOAZ .S1 , no Tribunal da Instância Central de Santa Maria da Feira AA , vindo , a final , a ser condenado como autor material de um crime homicídio , simples , tentado , p . e p . pelos art.ºs 131º, 22º, 23º e 73º, do Código Penal, na pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão, julgando-se procedente e provado o pedido de indemnização civil formulado pelo Centro Hospitalar de Entre o Douro e Vouga, E.P.E., condenando-se , ainda , o arguido AA a pagar-lhe a quantia de €1.829,21, a título de danos patrimoniais, acrescido de juros vincendos a partir da notificação até integral pagamento, relegando-se para oportuna apreciação nos meios comuns o pedido cível indemnizatório formulado pela tente , sua irmã ,BB. I. Inconformado com o teor da decisão proferida , interpôs o arguido recurso para o STJ , apresentando na motivação as seguintes conclusões : O arguido foi condenado na pena efectiva de prisão de 5 anos e 6 meses. O arguido é uma pessoa ordeira e cordata.

O Tribunal deveria ter começado por um juízo de prognose sobre o comportamento futuro do arguido, decidindo com o que resultar dessa previsão.

O arguido colaborou com o Tribunal na descoberta da verdade.

O Tribunal “a quo” não fez uma correta aplicação no que respeita à determinação da medida da pena.

O arguido não tem antecedentes criminais, sendo primário e sendo esta a primeira vez que teve contacto com a justiça.

Foi o arguido/recorrente que ligou para a GNR a comunicar o que tinha acontecido, conforme referem as testemunhas CC e DD, Soldados da GNR, fls. 8 e 9 do douto acórdão.

No decurso do depoimento das mesmas testemunhas, elementos da GNR, que o tribunal certamente por esquecimento não fez constar no douto acórdão, são os próprios a confirmar que tinha sido o arguido que também terá ligado para o 112, pelo que quando ligaram para o CODU, informaram que já ia a caminho do local uma ambulância com dois elementos dos bombeiros voluntários de ..., (fls. 6 e 7 dos autos - auto de notícia) Resulta assim, que o arguido após ter praticado os actos, apercebeu-se da gravidade dos mesmos, ficou aflito e ligou para a GNR e para o 112 para socorrerem a vítima.

Foi também o comportamento do arguido que permitiu que o socorro da vítima fosse mais rápido e imediato para evitar possíveis consequências mais gravosas para a vítima.

O tribunal “a quo” refere que o arguido/recorrente confessou parcialmente os factos, porém o arguido confessou todos os factos dados como provados, pois os que não confessou foram os que foram considerados como não provados, por ausência de prova total. Referir apenas que o arguido fez uma confissão parcial é reduzir o papel do arguido na audiência de julgamento e a atitude do mesmo em audiência ao confessar os factos que praticou e que levaram à sua condenação. Assim, o papel do arguido deverá ser tido como relevante para a descoberta da verdade.

Mais que esse aspecto é importante referir a colaboração prestada pelo arguido ao longo de todo o inquérito, desde os primeiros momentos com a GNR que tomou conta da ocorrência, como durante a reconstituição pela PJ e durante todo o Inquérito, como colaborante.

Na óptica do arguido/recorrente, a postura do arguido durante o inquérito também deverá ser relevada para a medida da pena.

Por outro lado, conforme podemos aferir do relatório social do arguido transcrito a fls. 4, 5 e 6 do douto acórdão recorrido, resulta que o processo de desenvolvimento psicossocial do arguido foi modelado com baixo padrão sócio cultural, tendo revelado graves dificuldades de aprendizagem nos estudos e na escola, tendo começado a trabalhar aos 16 anos, como sapateiro.

Resulta do mesmo relatório social que o arguido é extremamente tímido e introvertido.

A situação económica do arguido, conforme consta do douto acórdão quando transcreve o relatório social, refere que o “AA era beneficiário do Rendimento Social de Inserção no valor de € 160,00 mensais, valores que considerava manifestamente insuficiente para fazer face a todas as despesas, pelo que era ajudado financeiramente pelo pai.

Conclui-se que a situação financeira do arguido é de fracos recursos económicos, sendo ajudado pelo pai para fazer face às suas despesas mensais, situação económica que também deveria ter sido ponderada na decisão da fixação da medida da pena, mas que não resulta do douto acórdão.

Pode-se concluir que caso o arguido fosse libertado o mesmo teria condições de sobrevivência, independentemente de lhe ter sido retirado o RSI, pois o pai o ajudaria no seu sustento, até conseguir fonte de rendimento.

O arguido era a companhia do pai, de 86 anos com quem todos os dias convivia, cultivavam em conjunto, as terras, propriedade do pai do arguido, donde retiravam, batatas, legumes, vinho, milho, fruta e outros bens alimentares.

O arguido fazia diminuir a solidão do seu pai com a sua presença diária, a quem lia a correspondência que lhe vinha dirigida, pois o seu pai não sabe ler nem escrever, a não ser fazer o seu nome.

Por último, reportando-nos do constante no douto acórdão de fls. 6, relativamente ao relatório social transcreve-se o seguinte: “A comunidade residencial, vítima e ex-cônjuge expressaram sentimentos de medo/rejeição ao regresso a meio livre de AA, invocando sentimentos de insegurança, atenta a proximidade das residências/hábitos e rotinas familiares e litígios insanáveis relativamente a partilhas.” Este texto corresponde integralmente ao vertido no ponto 6 “Dados Complementares” de fls. 353 dos autos aquando da avaliação/informação para obrigação de permanência na habitação com vigilância electrónica realizada em 6/11/2014, ou seja 14 dias após os factos praticados pelo arguido.” Se atentarmos à Introdução do relatório social, o mesmo refere “recolha de informação junto do pai, da irmã/vítima, BB, da irmã EE, de vizinhos, do Presidente do executivo da Junta de Freguesia de ...., e de elementos dos órgãos da polícia criminal (GNR de ...).” Mais refere nessa Introdução que: “De referir que as informações recolhidas junto de BB (vítima) se reportam a Novembro de 2014 não tendo sido possível, apesar de encetadas varias diligências, novo contacto presencial com a mesma.” Conclui-se, pois que o relatório social apresentado em 1/7/2015 não é um relatório actualizado nem fidedigno, pois reporta-se a sentimentos vividos logo após a ocorrência dos factos e não agora passados 8 meses.

O relatório refere que “A comunidade residencial, vítima e ex-cônjuge expressaram” quando na verdade não foi ouvida a vítima nem foi consultada a ex-cônjuge, pois tal não resulta da Introdução que a equipa tenha colhido qualquer informação junto da ex-cônjuge.

Conclui-se, pois, que este relatório social, nesta parte em concreto deverá ser visto “cum grano salis”, pois não é um relatório actualizado e verdadeiro, pois não resulta de um contacto directo e verdadeiro conforme refere da recolha de informação em si contraditória com a recolha efectivamente efectuada.

Não se entende de tanta informação recolhida conforme refere na introdução do relatório que não conste qual a informação obtida junto da irmã do arguido, EE, contactada telefonicamente, que perfilhou a necessidade do arguido vir para junto do pai, nem a informação obtida junto do Presidente da Junta de Freguesia que se desconhece qual foi, assim como da GNR de ....

Quanto à informação dos vizinhos, estranha a busca da mesma, desconhecendo-se a que vizinhos se refere, se o contacto foi via telefónica ou presencialmente, como obtiveram essa informação e a quem? Estranha-se que a vizinha do arguido, que ficou em frente à casa do pai do arguido (FF) não tenha sido contactada, nem a testemunha GG, referida a fls. 10 do douto acórdão, que tem uma oficina de automóveis a 30 metros da residência do arguido Ilídio.

Esta testemunha no seu depoimento refere que o arguido é pessoa pacata e não conflituosa, não é visto como perigoso pelos vizinhos ou pela família.

Não valorizar este depoimento presencial e testemunhal em detrimento de um relatório social “maquinado” pois transcreve o que já havia sido escrito em 6/11/2014 e não efectuou um relatório social actualizado à data da sua realização em 1/7/2015, entende o arguido/recorrente que nessa parte o tribunal “a quo” valorou o documento apresentado o qual é de livre apreciação, tendo desvalorizado o depoimento das testemunhas referidas a fls. 10 do douto acórdão, que nenhum interesse tinham na causa, Quem efectivamente tinha interesses era a vítima e a ex-cônjuge, cujas informações não foram recolhidas para a realização deste relatório social de 1/7/2015, conforme consta da introdução do mesmo, mas sim para a possibilidade de aplicação da medida de coacção da pulseira electrónica.

Pelo que neste capítulo, mal andou o tribunal “a quo” ao não valorizar correctamente o depoimento das testemunhas GG e HH, mas antes um documento baseado em informações não recolhidas, ou em contradição com o que consta no relatório e o constante da introdução do mesmo.

Do relatório social e constante no acórdão a fls. 5, o mesmo demonstra que o arguido tem “adaptação à realidade prisional, evidenciando um comportamento ajustado às regras.” Apresenta pois, a personalidade do recorrente sinais positivos de evolução e consciencialização, com vista a uma futura reinserção na sociedade, quando for libertado.

Estes elementos são...

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