Acórdão nº 520/13.7PCRGR.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Dezembro de 2015
Magistrado Responsável | HELENA MONIZ |
Data da Resolução | 17 de Dezembro de 2015 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça: I Relatório 1.
Nestes autos foi condenado, por acórdão, de 14 de maio de 2015, do Tribunal de --- (Inst. Central — 1.ª Sec. Cível e Criminal — J2), da Comarca ----, o arguido AA, pela prática, como reincidente, em concurso efetivo, - de um crime de roubo agravado, previsto e punido pelos arts. 210.º, n.ºs 1 e 2, al. b), e 204.º, n.º 2, al. f), todos do Código Penal (doravante CP), e art. 86.º, n.º 3, da lei n.º 5/2006, de 23.02, na pena de prisão de 7 (sete) anos, - de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos art. 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, al. e), todos do CP, na pena de prisão 4 (quatro) anos, e - em cúmulo, na pena única de prisão de 8 (oito) anos e 6 (seis) meses.
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Inconformado, o arguido AA interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, apresentando as seguintes conclusões: «I — As penas parcelares impostas ao ora recorrente são excessivas e devem ser reduzidas para medidas que se aproximam dos respectivos limites mínimos.
II — A pena única resultante do cúmulo jurídico deverá, consequentemente, ser reformada e substancialmente reduzida.
III — Ao decidir como decidiu, violou, o Tribunal “a quo” os artigos 40.º e 71.º do Código Penal.» 3.
O Ministério Público, junto do Tribunal da Comarca dos Açores, respondeu, tendo entendido que: « Vertendo ao caso em apreço, temos que o crime de roubo agravado praticado pelo arguido é, em face da reincidência, punido com pena de 4 a 15 anos de prisão e o crime de furto qualificado, como reincidente, punido com pena de 2 anos e 8 meses a 8 anos de prisão.
Concretamente no que respeita à questão que mais parece suscitar a reacção do recorrente, que se traduz no facto das penas parcelares e unitária aplicadas se mostrarem excessivas, ao contrário do alegado pelo arguido, o Tribunal a quo teve em conta para a determinação das penas a aplicar, aos seguintes elementos: - as exigências de prevenção geral serem bastante elevadas - o grau de ilicitude dos factos ser elevado - a quantia monetária subtraída ao ofendido BB ser elevada (3.000,00€) - terem sido provocadas lesões físicas no ofendido - ter agido o arguido com dolo directo - quanto ás exigências de prevenção especial, baseou-se o Tribunal - no teor do relatório social do arguido (na circunstância do arguido não ter rede de suporte familiar ou profissional, mantendo uma vida à margem da sociedade); - na análise do certificado de registo criminal do arguido, onde avultam condenações pela prática de crimes de idêntica natureza (contra a propriedade).
Na determinação da medida da pena unitária será ponderado o conjunto dos factos praticados e descritos no acórdão recorrido, bem como a personalidade do arguido, assim como a natureza dos crimes praticados - é, assim, uma visão conjunta, não tida em consideração nas condenações parcelares que emerge nessa personalidade a considerar, pelo que, por essa razão, a pena de cúmulo é decidida ex novo.
Essencial é considerar que na fixação da pena única se deve ponderar que na "avaliação da personalidade - unitária - do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto do factos é reconduzível a uma tendência (ou mesmo a uma "carreira") criminosa, ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade, só no primeiro caso sendo cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta. De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização)" - Jorge de Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, 521.
Devem, pois, considerar-se como critérios ou factores a ponderar na determinação da pena única os seguintes: - apreciação da globalidade dos factos em interligação com a personalidade do arguido; - avaliação da gravidade da ilicitude global dos factos; - valoração do conjunto dos factos, que fornece a imagem global do facto, o grau de contrariedade à lei e a grandeza da ilicitude; - apreciação da personalidade do agente, revelando esta se o facto exprime uma tendência ou mesmo uma carreira criminosa ou é antes uma mera emanação de pluriocasionalidade.
Aplicando tais critérios ao caso em apreço e considerando as circunstâncias acima descritas, atinentes, em conjunto, aos factos e à personalidade do arguido, entende-se que o restabelecimento da paz jurídica comunitária abalada pelos crimes, a recuperação do arguido para a sociedade e a personalidade deste manifestada nos factos, considerou o Tribunal a quo ajustada a pena única de 8 anos e 6 meses de prisão.
Ponderadas a gravidade e as circunstâncias existentes na globalidade dos factos praticados, a personalidade do arguido ora recorrente, o teor do CRC, bem como o seu percurso de vida, se conclui, que o Tribunal recorrido, alicerçado nos critérios oferecidos pelo legislador penal, doseou bem a medida das penas parcelares, bem como da pena unitária e aplicou ao recorrente a pena justa e adequada aos fins a que se destina.
Não foram assim violados os arts. 40 e 71 do CP.
Termos em que, não deverá merecer procedência o recurso interposto pelo recorrente, antes devendo manter-se a douta decisão recorrida. » 4.
Subidos os autos ao Tribunal da Relação de Lisboa, o Magistrado do Ministério Público neste Tribunal, “subscrevendo inteiramente os fundamentos da resposta do Ministério Público”, propugnou “pela improcedência de todos os recursos e a subsequente manutenção do decidido no acórdão recorrido, dispensando-nos de quaisquer considerações adicionais”.
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Por despacho do relator no Tribunal da Relação de Lisboa, de 5 de outubro de 2015, foi decidido que, tratando-se de um recurso exclusivamente em matéria de direito, restrito à medida da pena, e tendo sido o arguido condenado em pena de prisão superior a 5 anos, seria competente para a sua apreciação o Supremo Tribunal de Justiça, de acordo com o disposto no art. 432.º, n.º 1, al. c), do CPP. Em consequência os autos foram remetidos a este tribunal.
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Uma vez subidos os autos ao Supremo Tribunal de Justiça, no uso da faculdade concedida pelo art. 416.º, n.º 1, do CPP, o Senhor Procurador-Geral Adjunto no Supremo Tribunal de Justiça apresentou parecer concluindo: «2 - Do mérito do recurso: 2.1 – Emitindo parecer[1], como nos cumpre, cabe dizer que acompanhamos e secundamos as considerações aduzidas pela Ex.ma colega junto da 1.ª Instância, na resposta constante da peça processual exarada a fls. 242/246, sendo que a clareza e pertinência da argumentação ali desenvolvida, bem como dos fundamentos e elementos (nomeadamente factuais e normativos) aduzidos – nos quais genericamente nos louvamos –, nos dispensa, porque de todo desnecessário e redundante, do aditamento de mais desenvolvido esforço de contra-argumentação em defesa do decidido.
Apenas nos permitimos por isso, “ex abundanti”, enfatizar ainda o seguinte: 2.1.1 – Quanto às penas parcelares: Muito embora convocando, genericamente, as mesmas circunstâncias que a decisão recorrida havia enunciado, e ponderado, no exercício de determinação da medida de cada uma das duas penas parcelares em que o condenou, limita-se o recorrente a tecer sobre as mesmas meras e conclusivas afirmações de discordância, dizendo – nomeada e fundamentalmente – que o tribunal não teve em devida conta, citamos, «[…]que foram escassos os factos provados sobre as concretas circunstâncias da prática dos crimes, bem como a notória insuficiência das competentes alusões ou considerações quer aos sentimentos manifestados no seu cometimento e os fins ou motivos que o determinaram – quer sobre a personalidade do agente, a sua integração social, as suas condições pessoais, nomeadamente familiares – que deverão pender a favor do arguido, seja por aplicação do princípio “in dubio pro reo”, seja pela falta de fundamentos para penalizar o arguido».
Mas não tendo impugnado, como vimos, a decisão de facto proferida[2],segue-se que tal crítica, para além de desacompanhada de qualquer suporte factual que lhe dê respaldo, é totalmente infundada. Desde logo porque, como decorre da motivação oferecida, o recorrente pouco mais fez do que transcrever a matéria de facto dada por assente, dela ensaiando retirar, mas sem qualquer sucesso, ilações diferentes daquelas a que chegou o Tribunal. O que vale por dizer pois que, bem ao contrário do que sustenta o recorrente, foram sopesados todos os fatores relevantes, entre os quais os que ele próprio ora convoca. E, também ao contrário do que sugere, não vemos onde é que o recorrente funda a alegação de que são escassos, mesmo nesta matéria e para este efeito, os factos provados e todos os demais considerandos sobre a sua personalidade.
Convirá é não esquecer também, como parece querer fazer o recorrente, o peso concreto, muito significativamente elevado, das circunstâncias, apuradas na decisão, que depõem contra si. A graduação da medida concreta da pena deve ser efectuada, como é sabido, em função da culpa do agente[3] e das exigências de prevenção no caso concreto (art. 71.º, n.º 1 do CP), atendendo-se a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor ou contra ele (n.º 2).
Nos termos do art. 40.º, n.º 1, a aplicação de penas visa a protecção de bens jurídicos, entendida como tutela da crença e confiança da comunidade na ordem jurídico-penal (prevenção geral positiva) e a reintegração do agente na sociedade (prevenção especial positiva), sendo certo que, como também se sabe, a referência (legal) aos bens jurídicos conforma uma exigência de proporcionalidade entre a gravidade de pena e a gravidade do facto praticado, a qual, desta forma, integra o conteúdo e o limite da prevenção[4].
Mas, em caso algum, a pena pode ultrapassar a medida da culpa (n.º 2 do mesmo art. 71.º), sendo certo que “disso já cuidou, em primeira mão, o legislador, quando estabeleceu a moldura punitiva” (Ac. STJ de 10/4/96, CJ-STJ 96, II, 168).
Ora, In casu: - Não há dúvida de que a matéria...
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