Acórdão nº 852/12.1TBPTM-A.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Setembro de 2015
Magistrado Responsável | PINTO DE ALMEIDA |
Data da Resolução | 22 de Setembro de 2015 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça[1]: I.
AA, LDA, BB, CC e DD vieram deduzir oposição à execução que lhes foi movida pelo BANCO POPULAR PORTUGAL, SA.
Pediram a sua absolvição do pedido, em face do preenchimento e accionamento abusivo das livranças que servem de título executivo, em virtude da sua inexigibilidade e perda do direito de acção contra os executados avalistas.
Como fundamento, invocaram o preenchimento abusivo das livranças dadas à execução, alegando que, servindo as livranças dadas à execução de caução e garantia das responsabilidades decorrentes de empréstimos feitos à sociedade executada, subscritora das livranças, no âmbito de uma alteração ao contrato de empréstimo subjacente à 1ª livrança, veio a ser acordado que o mútuo se venceria na totalidade em data posterior àquela com que a 1ª livrança veio a ser preenchida, que os valores com que as livranças foram preenchidas não correspondem ao valor da dívida, que os valores relativos a imposto de selo e aos juros cobrados para além de não constarem dos títulos não foram devidamente selados e ainda que o exequente não efectuou os protestos nos termos do art. 44º da LULL, tendo perdido os seus direitos de acção contra os executados avalistas. O exequente contestou, tomando posição no sentido da improcedência das excepções invocadas.
Seguidamente foi proferido despacho no qual se conheceu das questões relativas à perda do direito de demandar os avalistas por falta de protesto e à falta de título para cobrança de imposto de selo, julgando improcedentes tais excepções. Percorrida a tramitação normal, foi proferida sentença em que se julgou parcialmente procedente a oposição, fixando-se a quantia exequenda em € 2.667.086,23.
Discordando desta decisão interpuseram os executados/opoentes recurso de apelação, que a Relação julgou procedente, decidindo: Julgar procedente a oposição à execução no que se refere à 1ª livrança, declarando nessa parte extinta a execução, a qual apenas prosseguirá com vista ao pagamento da 2ª livrança.
Inconformado, o exequente veio pedir revista, tando apresentado as seguintes conclusões: (…) B) O presente recurso tem por fundamento o erro na interpretação da declaração negocial com recurso aos artigos 236º e 238º do CC.
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A questão que se pretende seja analisada por este Supremo Tribunal no presente recurso, prende-se com a alegada violação do pacto de preenchimento da livrança: deve considerar-se, no entender da Recorrente que, relativamente à 1ª livrança, os executados estavam efectivamente obrigados ao pagamento de juros durante o período de carência de capital, sendo que a suposta violação do pacto de preenchimento da livrança, depende da interpretação que se faça da (real) vontade das partes na celebração do sobredito aditamento ao contrato de mútuo.
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O Tribunal da Relação, ao longo de toda a sua fundamentação, omite um ponto essencial - o facto dos Recorridos, em data posterior à assinatura do aditamento ao contrato de mútuo - 05/08/2011 - já na vigência do período de carência introduzido, terem procedido ao pagamento de juros no montante de € 46.563,73 em 30/08/2011, conforme extracto de conta junto aos autos a fls ...
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O facto dos Recorridos, em data posterior à assinatura do aditamento ao contrato de mútuo - 05/08/2011 - já na vigência do período de carência introduzido, terem procedido ao pagamento de juros no montante de € 46.563,73 em 30/08/2011, conforme extracto de conta junto aos autos a fls..., demonstra inequivocamente que os mesmos estavam conscientes que a carência introduzida não os exonerava do pagamento de juros. O pagamento de € 46.563,73 de juros remuneratórios não foi feito, seguramente, a título gracioso.
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Tal implica a priori, não obstante o que já se deixou exposto relativamente à vontade das partes, que efectivamente os Recorridos, durante a vigência do período de carência, estavam obrigados ao pagamento de juros e tinham conhecimento dessa mesma obrigação! Se assim não fosse, seguramente não teriam efectuado o pagamento.
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O thema decidendum do presente recurso centra-se, assim, na inexistência de violação do pacto de preenchimento pelo Exequente, ora Recorrente, porquanto, conforme detalhadamente se demostrará, o Tribunal da Relação incorre em erro na interpretação da declaração negocial com recurso aos artigos 236.° e 238.° do CC.
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No caso em apreço, o maior equilíbrio nas prestações obtém-se precisamente através da concessão de uma carência apenas parcial, abrangendo o capital, sem o que uma das partes tenha (ou tivesse) durante um ano ficado privada de qualquer contrapartida pela sua prestação, o que nunca antes tinha ocorrido na vigência do contrato que então se alterou.
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O Banco Reclamante não poderia ter outro entendimento que a não cobrança de juros durante o mencionado período, por constituírem a reposição do custo da privação de reembolso do capital mutuado, a solicitação dos Recorridos, calculado com referência às taxas de juros nominais contempladas no contrato de mútuo. (V.g. Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 19-03-2013).
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Consta de forma inequívoca do texto do aditamento que as partes deixaram expresso que "em tudo o mais se mantém em vigor o referido contrato de mútuo".
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Qualquer declaratário normal, colocado na posição dos Recorridos e nos termos gerais da teoria da impressão do destinatário, consagrada no art. 236°, n° I, do Código Civil, não deixaria de entender que, tratando-se de um mútuo oneroso, próprio da actividade bancária ou parabancária, sempre seria, remunerado enquanto o mutuante não fosse reembolsado do que prestou, como, aliás, resulta do contrato inicial, onde se descrevem os elementos que o compõe, e se incorporam nas respectivas prestações mensais e sucessivas, as diversas obrigações do mutuário, designadamente despesas, encargos e juros remuneratórios (a retribuição do crédito) segundo a taxa ali também estabelecida e aceite pelas partes O) Nesta perspectiva, faz todo o sentido que, através do aditamento ao contrato de mútuo, pelo período de carência nele previsto e o retardamento que dali resulta no reembolso do capital mutuado, as partes tivessem previsto novos prazos, em ordem a satisfazer a proposta da Sociedade Recorrida, na renegociação contratual, mas sem que o Recorrente mutuante perdesse a remuneração do capital em função do tempo de indisponibilidade, à semelhança do contrato inicial, para onde se remeteu na expressão "em tudo o mais se mantém em vigor o referido contrato de mútuo".
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Falecem, assim, todos os fundamentos apresentados pelo Tribunal da Relação por não identificarem um mínimo de correspondência verbal no texto do contrato de mútuo com hipoteca e respectivo aditamento relativamente ao período de carência e o constante do artigo 237° do Código Civil, respeitante aos casos de dúvida sobre o sentido da declaração negocial, nos quais deve prevalecer o sentido que conduzir ao maior equilíbrio nas prestações.
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Pelo que, deveria o Tribunal da Relação ter decidido pela improcedência do recurso apresentado pelos agora Recorridos e, subsequentemente, confirmado a decisão do Tribunal de Primeira Instância. Não o tendo feito, incorreu em erro de...
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