Acórdão nº 4154/15.3TBLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelABRANTES GERALDES
Data da Resolução27 de Abril de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

I - AA intentou acção declarativa com processo comum contra BB, Lda, e Soc. Imobiliária CC, Lda.

, pedindo a execução específica do contrato de trespasse efectuado com a 1ª R. nos termos acordados e do contrato de arrendamento comercial efectuado com a 2ª R., também nos termos acordados, condenando-se as RR. a reconhecerem tais contratos. Subsidiariamente, para o caso de não proceder este pedido, pede a condenação solidária das RR. no pagamento da quantia de € 50.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, e de € 2.368.509,00, a título de indemnização por lucros cessantes, com juros de mora.

Alegou que encetou negociações com as RR. com vista ao trespasse de um restaurante da 1ª R. que estava instalado num prédio propriedade da 2ª R, tendo sido alcançado um acordo financeiro. Mas as RR. omitiram que não eram possuidoras de licença de utilização para toda a área ocupada pelo restaurante, a qual estava dependente de um processo de construção e ampliação no prédio. O A. apenas se apercebeu disto mais tarde e não quis avançar enquanto não verificou esta informação junto da CML, pois precisava da licença de utilização aprovada para efeitos de obtenção de financiamento. Inicialmente o legal representante das RR. não colaborou na obtenção desta informação, tendo acabado por dar poderes para que o processo camarário pudesse ser consultado. Mas depois, sem que nada o fizesse prever, foi comunicado ao A. que as RR. haviam efectuado o negócio com terceiro. A ruptura negocial causou no A. danos morais e se o negócio tivesse sido concretizado esperaria obter um lucro de € 1.214.617,00 a 6 anos (de 2015 a 2020).

As RR., regular e pessoalmente citadas, não contestaram, pelo que os factos articulados pelo A. foram considerados confessados.

Foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, condenando as RR. no pagamento ao A. da quantia de € 2.000,00, a título de danos morais emergentes de responsabilidade pré-contratual, com juros de mora, à taxa legal, desde o trânsito desta decisão até efectivo pagamento.

O A. interpôs recurso de apelação, mas a Relação confirmou a sentença.

O A. interpôs depois recurso de revista em que sustenta a procedência da acção tendo em conta o facto de as negociações estabelecidas com as RR. terem chegado a um ponto que despoletaram a obrigação de contratar, constituindo fundamento para a sua condenação na indemnização pelo dano contratual positivo. Pretende ainda que se determine a dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do art. 6º, nº 7, do RCP.

As RR. contra-alegaram.

Cumpre decidir.

II – Factos provados: (…) III – Decidindo: 1.

As RR., apesar de citadas, não apresentaram contestação, operando, por isso, o efeito cominatório semi-pleno, com tradução na admissão, por acordo (ou confissão ficta), dos factos que foram alegados pelo A.

Tal efeito foi activado quer na sentença, quer no acórdão da Relação que é objecto do presente recurso, que consignaram os factos que consideraram provados, a que agora se adicionaram outros factos que, conquanto não tenham sido relevados pelas instâncias, foram alegados na petição inicial, estando também admitidos por acordo.

  1. Na sentença da 1ª instância foi considerada verificada a responsabilidade pré-contratual de ambas as RR. emergente da ruptura injustificada da negociação a estabelecida com o A. tendo em vista o trespasse de um estabelecimento comercial e a outorga de um contrato de arrendamento relativo ao mesmo local, com alegação da violação do princípio da boa fé.

    Tal sentença apenas foi impugnada pelo A., na medida em que na delimitação do direito de indemnização apenas foi atribuído relevo ao interesse contratual negativo, reconduzido a uma indemnização por danos não patrimoniais no valor de € 2.000,00, sendo negado o direito de indemnização com base no interesse contratual positivo.

    Existem aspectos que condicionam, desde logo, a intervenção deste Supremo Tribunal de Justiça, devendo ter-se como definitivamente adquirido o preenchimento dos requisitos da responsabilidade pré-contratual que justificou a atribuição daquela indemnização, residindo a divergência apenas na amplitude dessa indemnização, em face do art. 227º do CC.

    Defende o A. que, atento o estádio em que se encontrava o processo negocial, a recusa das RR. se verificou numa altura em que já se constituíra a obrigação de contratar, de modo que a indemnização deve ser determinada em função do interesse contratual positivo, ou seja, dos lucros que o A. retiraria dos contratos em curso se acaso as RR. tivessem concluído o respectivo processo negocial, pretensão à qual as RR. agora se opõem.

    Tal como decidiram as instâncias, aquela pretensão não pode manifestamente proceder.

  2. Do acervo factual apurado emergem os seguintes aspectos que mais relevam para o caso: O A. e as RR., representadas por DD, iniciaram um processo negocial tendo em vista a outorga de um contrato de trespasse de um estabelecimento comercial de que era titular a 1ª R.. e um contrato de arrendamento com a 2ª R., proprietária do imóvel.

    Depois de uma primeira visita ao local, em 28-4-14, houve reuniões entre as partes e troca de correspondência entre o A. e a agência de mediação imobiliária que evoluíram para a apresentação de propostas e contrapropostas para a concretização dos negócios. E efectivamente em 12-9-14 a A. recebeu a informação da mediadora imobiliária de que o sócio-gerente de ambas as RR. havia aceite a uma proposta: trespasse do estabelecimento comercial pelo valor de € 350.000,00; pagamento do valor do trespasse em 3 prestações anuais, nos montantes de € 125.000,00, € 125.000,00 e € 100.000,00; celebração de um contrato de arrendamento comercial para restauração e similares, sem prazo efectivo e pela renda mensal de € 2.750,00; período de carência no pagamento das primeiras 3 rendas mensais; em alternativa ao contrato de arrendamento sem prazo, celebração de um contrato de arrendamento com prazo certo por 15 anos, mas com o direito de opção de compra do espaço onde está instalado o restaurante, durante o referido prazo, por preço razoável, antecipadamente fixado.

    No dia 24-9-14, foi marcada nova reunião para o próprio local e foi confirmada pelo A. a referida proposta financeira, tendo CC confirmado pessoalmente, em representação de ambas as RR., a aceitação da proposta.

    Nessa reunião o A. solicitou a DD a documentação relativa quer ao prédio urbano onde está instalado o estabelecimento, quer ao estabelecimento comercial: caderneta predial do prédio, certidão registral do prédio, licença do estabelecimento de restaurante e licença de utilização do espaço de esplanada existente em frente ao restaurante, referindo o mesmo que originariamente o restaurante apenas ocupava parte do r/c do prédio e, só mais tarde, quando o adquiriu ao seu anterior proprietário, o expandiu para o 1° piso, através do saguão existente no prédio, o que criou no espírito do A. a dúvida sobre se a ocupação da parte do 1° piso tinha cobertura legal.

    Perante as dúvidas do A., DD afirmou que havia requerido à CML projecto de licenciamento com vista à recuperação e ampliação do prédio onde o restaurante está instalado e que, no âmbito desse projecto, a sobreloja ocupada pelo restaurante já estaria licenciada para este fim.

    Refere, aliás, o A. no art. 58º da petição, que “essa documentação era essencial, não apenas para confirmar a legitimidade das duas RR … como a legalidade quer do restaurante quer da utilização do espaço público em frente do mesmo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
3 temas prácticos
3 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT