Acórdão nº 5515/15.3T8OAZ-A.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelANTÓNIO LEONES DANTAS
Data da Resolução08 de Junho de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I AA, louvando-se do disposto no artigo 145.º do Código de Processo do Trabalho, veio, em 23 de dezembro de 2015, requerer exame médico de revisão de incapacidade para o trabalho, identificando como entidade responsável a BB - COMPANHIA DE SEGUROS, S.A., pedindo que seja deferido o pedido de realização de perícia médica, para aferição do agravamento da incapacidade e consequente indemnização, a suportar pela requerida seguradora.

Invocou em fundamento da sua pretensão, em síntese que: nasceu no dia 04 de março de 1967; exerceu profissão por conta própria na área da construção civil e no dia 26 de agosto de 1997 sofreu um acidente de trabalho que consistiu numa queda ao descer umas escadas; que, para salvaguarda das situações de risco laboral, havia efetuado com a CC, S.A., hoje integrada por fusão na BB – Companhia de Seguros S.A., um seguro no Ramo Acidentes de Trabalho titulado pela apólice nº ..., tendo como objeto seguro a atividade laboral do próprio tomador do seguro, em vigor na data do acidente, cobrindo a massa salarial anual de Esc. 1.440.000$00; depois de internamentos e tratamentos que descreve, a seguradora lhe atribuiu uma Incapacidade Parcial Permanente de 37,5 % (0,25 x 1.5) e incapacidade para o trabalho habitual, aceitou o acidente como de trabalho, o nexo de causalidade entre o acidente e as lesões sofridas, prestou-lhe assistência médica e medicamentosa, pagou-lhe valores a título de incapacidades temporárias e passou a pagar-lhe 307.170$00 como pensão anual, desde 1999.11.25, pensão que ulteriormente veio a remir; que o sinistro foi regularizado ao abrigo da Lei n.º 2127 – Dec. n.º 360/71 e alterações introduzidas pelo DL n.º 459/79, tendo a seguradora aplicado as respetivas regras técnicas para fixação da incapacidade; desde 2005, as lesões do pé e perna esquerdos se têm agravado significativamente, causando crescente sofrimento intermitente, que forçam o sinistrado a claudicar e a sobrecarregar muito também o membro inferior direito, situação de agravamento progressivo que revela que a situação clínica do sinistrado não se estabilizou nos 10 anos subsequentes à alta clínica.

A Seguradora, notificada para apresentar quesitos, veio tomar posição quanto ao requerido, referindo que o pedido de revisão formulado pelo sinistrado não pode ser admitido por se verificar a caducidade do direito invocado, pois o incidente de revisão foi instaurado mais de 15 anos a contar da data da alta e do acordo de fixação da incapacidade e da pensão, que teve lugar em 25 de novembro de 1999, sem que entretanto tenha sido deduzido qualquer outro incidente de revisão pois aplica-se o n.º 2 da Base XXII, da Lei n.º 2127. Invocou ainda que a Lei n.º 98/2009 apenas se aplica aos acidentes ocorridos a partir de 1 de janeiro de 2010, como constitui jurisprudência pacífica e, à cautela, sustenta não ser este o tribunal competente pois à data do acidente os tribunais onde se resolveria a presente questão seriam os tribunais comuns.

O requerente pronunciou-se quanto às exceções invocadas pela Seguradora, alegando a falta de fundamento das mesmas, tendo referido, no que se refere à competência do Tribunal do Trabalho para conhecer do pedido de revisão que, atendendo à data da entrada em juízo do presente incidente de revisão, ao caso é aplicável o Código do Processo de Trabalho (CPT) com as alterações introduzidas pelo DL nº 295/2009, de 13.10 (artº 6º), concretamente o disposto no artigo 145º CPT e que nos termos do disposto no art.º 85.º, al. c) da Lei nº 3/99, de 13.1, que alterou a Lei n.º 39/87, LOTJ de 23 de dezembro, compete aos tribunais do trabalho conhecer em matéria cível das questões emergentes de acidentes de trabalho e doenças profissionais, não resultando daí qualquer diferenciação entre acidentes decorrentes de trabalho subordinado ou de trabalho independente, pelo que a partir de 13 de janeiro de 1999 se devem aplicar também aos acidentes de trabalho por conta própria as normas atinentes aos Acidentes de Trabalho por conta de outrem por estar em causa o princípio da igualdade de tratamento consagrado na C.R.P., além de que o contrato de seguro do autor cumpria o estabelecido no DL n.º 159/99, de 11 de maio, sendo o Tribunal do Trabalho competente para a apreciação do pedido de revisão.

Foi então proferido despacho em que se julgou improcedente a exceção da caducidade e, quanto à competência material, decidiu-se o seguinte: «1. Subsidiariamente, a requerida invoca a incompetência do tribunal pois na data do acidente a questão seria resolvida nos tribunais comuns.

  1. O requerente opôs-se a esta incompetência porque, atenta a data da entrada em juízo do incidente, é este o tribunal competente.

  2. Em nosso entendimento, temos que ter em conta a data da entrada do incidente em juízo na medida em que, pelo menos ao que apuramos, nunca existiu um processo judicial relativo a este acidente e, como tal, nos termos do artigo 126.º, n.º 1, alínea c), da LSJ, este é o tribunal competente.

  3. Pelo exposto, julgo improcedente a exceção de incompetência absoluta deste tribunal.» Inconformada com esta decisão, dela apelou a Seguradora para o Tribunal da Relação do Porto, tendo o recurso sido admitido apenas no que se refere à questão da competência, vindo o mesmo a ser decidido por acórdão daquele Tribunal, de 7 de julho de 2016, que integra o seguinte dispositivo: «10. Em face do exposto, concede-se provimento ao recurso e revoga-se a decisão da 1.ª instância, absolvendo da instância a recorrente BB - Companhia de Seguros, S.A. atenta a incompetência em razão da matéria do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro - Secção de Instância Central - 3.ª Secção do Trabalho com sede em Oliveira de Azeméis.

Custas pelo recorrido».

Não conformado com esta decisão veio o sinistrado recorrer de revista para este Supremo Tribunal, integrando nas alegações apresentadas as seguintes conclusões: «1.ª. Em 23.12.2015, AA, trabalhador independente na área da construção civil, em incidente de "revisão de incapacidade", pediu que lhe fosse efetuado exame médico, nos termos do art.º 145.º do CPT; 2.ª. Com os presentes autos pretende a apreciação em juízo do eventual agravamento da incapacidade parcial permanente para o trabalho do sinistrado autor, enquanto trabalhador por conta própria.

  1. Esse "incidente" deu entrada na Instância Central – 3.ª- Secção do Trabalho – J1 - Oliveira de Azeméis - Comarca de Aveiro; 4.ª. O Tribunal do Trabalho é o tribunal competente para conhecer desta questão, como decidiu o douto Tribunal a quo.

  2. O acidente de trabalho ocorreu em 26.08.1997; 6.ª. O requerente exercia àquela data, por conta própria, a profissão de trolha na área de construção civil; 7.ª. Havia celebrado com a, hoje, BB - Companhia de Seguros SA, um contrato de seguro do Ramo Acidentes de Trabalho - Trabalhadores Independentes, pela apólice n.º ..., que a obrigava a seguradora a garantir o pagamento dos encargos provenientes de acidentes de trabalho em consequência do exercício da sua atividade profissional por conta própria (seguro de acidentes de trabalho como trabalhador independente); 8.ª. Do referido acidente não existiu qualquer processo judicial; 9.ª. Foi dada alta clínica ao sinistrado em 24.11.1999, pela seguradora, com uma IPP de 37,50%; 10.ª. Por acordo entre ambos - sinistrado e seguradora - esta obrigou-se a pagar-lhe uma pensão, anual e vitalícia, com início em 25.11.1999 e no valor de 307.000$00 (moeda da altura), 11.ª. Esta pensão foi calculada com base na Lei n.º 2127, de 3 de agosto de 1965 e no Decreto n.º 360/71, de 21 de agosto; 12.ª. Pensão que foi entretanto atualizada e objeto de remição com base na já referida legislação.

  3. O contrato de seguro celebrado entre o sinistrado enquanto trabalhador por conta própria e a seguradora destinava-se à cobertura dos acidentes sofridos por este e ocorridos na sua atividade profissional.

  4. A referida apólice estava em vigor, fora celebrada na modalidade de seguro completo, tendo como objeto a cobertura dos acidentes que pudessem ocorrer na atividade laboral do próprio tomador do seguro.

  5. As partes atribuíram ao dito contrato a equiparação a seguro de acidentes de trabalho.

  6. A requerida BB reconheceu estar tal acidente coberto pelo contrato de seguro da apólice n.º ... e aceitou a responsabilidade pelo sinistro e qualificou-o como de trabalho.

  7. A demandada seguradora tratou o sinistrado como acidentado de trabalho.

  8. O referido contrato de seguro era um contrato de seguro facultativo (art.º 405.º C.C.).

  9. À data inexistia seguro obrigatório para os trabalhadores por conta própria. Por isso, 20.ª. As partes por acordo equipararam o acidente dos autos a um acidente de trabalho, a que aplicaram a legislação vigente dos acidentes de trabalho por conta de outrem.

  10. Ou seja, tratando-se como se tratava de um seguro de acidente de trabalho por conta própria, o sinistro ocorrido no âmbito daquele contrato de seguro foi regulado como se um acidente de trabalho "tout court" se tratasse.

  11. O tribunal competente, em razão da matéria, para conhecer da pretensão desta pretensão é a Instância Central – 3.ª Secção - Jl - Oliveira de Azeméis - Comarca de Aveiro, como foi decidido na 1.ª Instância.

  12. O contrato de seguro celebrado entre as partes cumpria "materialmente" o estabelecido nas exigências do DL n.º 159/99, de 11 de maio, e estava em vigor aquando da atribuição do grau de incapacidade ao sinistrado - em 05.05.2000 - também por isso se deve considerar competente o foro do direito do trabalho para apreciar o eventual agravamento da incapacidade para o trabalho do sinistrado autor.

  13. A competência em razão da matéria para conhecer de qualquer acidente de trabalho, seja de trabalhador por conta de outrem, seja de trabalhador independente, seja de acidente legal ou contratualmente equiparado, pertence de acordo com a LOSJ, às Secções do Trabalho.» Termina pedindo que seja concedido «provimento ao presente recurso de...

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