Acórdão nº 540/11.6TVLSB.L2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelTOMÉ GOMES
Data da Resolução22 de Junho de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na 2.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: I – Relatório 1. AA - Têxteis e confecções, S.A. (A.), instaurou, em 215/03/ 2011, ação declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra o Banco BB, S.A. (R.), alegando, no essencial, o seguinte: .

Em 14/11/2005, a A., no âmbito da sua atividade, entre outras, de fabricação de artigos têxteis confecionados, celebrou com o Banco R. um contrato intitulado Contrato de Permuta de Taxa de Juro, conforme o escrito reproduzido a fls. 10, com vencimento em 14/11/2010, posteriormente alterado em 05/09/2006, conforme escrito de fls. 11 e seguintes, nos termos do qual a A. receberia, trimestralmente, a EURIBOR a três meses (ACT360 dias) e pagaria anualmente a soma simples dos juros devidos nos quatro trimestres (ACT 360 dias); .

Nesses termos, a A. pagaria ao Banco R. uma taxa fixa, no caso da taxa EURIBOR a três meses ser menor ou igual à barreira estipulada de 4,2%, ou pagaria a EURIBOR a três meses, no caso de esta ser superior àquela barreira; .

Porém, em 30/06/2008, por solicitação e indicação exclusiva dos serviços do Banco R., foi celebrado um novo “Contrato de Permuta de Taxa de Juro”, conforme o escrito de fls. 23-29, em substituição do contrato anterior, com condições mais gravosas para a A. no contexto das taxas de juro que então se desenhava; .

No âmbito deste último contrato, foi expressamente garantido pelo Banco R. que o motivo da sua outorga era estabilizar os encargos da A. com o crédito anteriormente por ela contraído e que o mesmo conduziria a um reajustamento mais vantajoso das condições contratuais para a A., atento a que o inicialmente ajustado estaria já desadaptado das então existentes condições de mercado; .

Todavia, os referidos contratos foram assinados sem que os seus termos e condições fossem corretamente explicados pelo Banco R. à A., nem fornecida nenhuma outra instrução relativamente à forma como seriam executados, o que revela desrespeito pelo princípio da boa fé nos preliminares negociais e pelos procedimentos estabelecidos para as Instituições de Crédito na Directiva n.º 2004/39/CE relativa aos Mercados dos Instrumentos Financeiros; .

O swap contratado é um produto financeiro de natureza complexa e não um produto de proteção do risco de taxa de juro como o Banco R. exprimiu que ia contratar com a A.; .

Aquando da celebração do contrato, a A. não era detentora de uma vontade perfeita e esclarecida sobre o alcance daquela operação, no respeitante à sua forma de execução, aos benefícios, aos custos e aos riscos daí derivados; .

Tal contratação gerou um prejuízo trimestral de milhares de euros, o que ocorrerá previsivelmente até ao termo do último contrato em 2012; .

Quando o A. se começou a aperceber do prejuízo que desse contrato lhe advinha, encetou diversos contatos com o Banco R. no sentido de obter o cálculo do valor de resgate, o último dos quais em 06/11/2008, mas que só teve resposta em 06/11/2009; .

Sucede que, enquanto em 06/11/2008 o valor do resgate seria aproximadamente de € 20.000,00, em 06/01/2009 tal valor já era aproximadamente de € 274.000,00; .

Assim, se o Banco R. tivesse informado a A., oportunamente, do valor do resgate em 06/11/2008, esta teria então resgatado de imediato aquele valor; .

Nestas circunstâncias, a A. pretende pôr termo ao contrato de swap celebrado em 30/06/2008 com efeitos retroativos a 06/11/2008, já que a manutenção desse contrato ameaça a sua própria estabilidade e viabilidade financeira; .

Gorada a resolução do referido contrato por acordo, deve agora o mesmo ser declarado “nulo” nos termos dos artigos 252.º e seguintes do CC ou, caso assim se não entenda, ser reconhecido ao A. o direito à sua resolução por alteração imprevisível e anormal das circunstâncias nos termos do artigo 437.º do mesmo Código.

Concluiu a A. pedindo que: A – Em primeira linha, seja: a) – declarado nulo o contrato de confirmação de taxa de juro celebrado em 06/09/2007 (rectius em 30/06/2008); b) – reconhecido judicialmente que a A. nada deve ao R: B – Subsidiariamente, seja declarada a resolução do mesmo contrato com efeitos reportados à data em que foi pedida a cotação para o resgate, em 06/11/2008. 2.

Citado em 21/03/2011 (fls. 41), o Banco R. apresentou contestação, em que, em síntese: .

Impugnou o alegado pela A. quanto à violação do dever de informação nas negociações preliminares e ao erro sobre os motivos do negócio; .

Arguiu a ineptidão da petição inicial relativamente ao pedido principal, por contradição entre o pedido de nulidade do contrato e os factos integradores da causa de pedir referentes à responsabilidade pré-contratual; .

Invocou a ineptidão do pedido subsidiário por falta de causa de pedir; .

Subsidiariamente, desenvolveu a estrutura e características de cada um dos contratos swap celebrados com a A. e do seu alcance e consequências, no sentido de que o contrato em crise fora celebrado e querido pela A. com a assunção do risco das flutuações das taxas da EURIBOR dentro das barreiras convencionadas, não se tendo estabelecido qualquer limite para descidas dessa taxa abaixo dos 4,05%.

Concluiu o Banco R. pela improcedência da ação.

3.

A A. apresentou réplica, em que, além do mais, no tocante à invocada falta de causa de pedir do pedido subsidiário, sustentou que: .

À semelhança do que ocorreu com os contratos anteriores, o contrato celebrado em 30/06/2008 devia ter sofrido alteração por necessidade de reajustamento das taxas em face da evolução do mercado, tanto mais que as condições se alteraram em virtude da descida significativa das taxas de juro; .

Com tais alterações a A. sofreu prejuízos de € 96.678,50, no ano 2009; € 120.508,26, no ano de 2010; € 34.613,34 no ano de 2011 até março; .

Não corresponde à verdade ter sido prevista ou negociada entre as partes a descida da EURIBOR para os patamares verificados.

4.

Findos os articulados, foi proferido o despacho saneador de fls. 124-135, datado de 08/03/2012, a absolver o Banco R. da instância com fundamento na ineptidão da petição inicial, tendo o A. recorrido para o Tribunal da Relação de Lisboa que, através do acórdão de fls. 173-187, datado de 22/11/2012, julgou a apelação procedente e determinou o prosseguimento da causa, considerando terem sido alegados pela A. factos suscetíveis de configurar as causas de pedir tanto da pretensão de anulação como da resolução do contrato, esta por alteração anormal das circunstâncias.

5.

Na sequência dessa decisão, foi selecionada a matéria de facto tida por relevante com organização da base instrutória, conforme despacho de fls. 195-209, datado de 30/01/2013.

6.

Realizada a audiência final, foi proferida a sentença de fls. 497-526, datada de 05/11/2013, em que se concluiu: i) - pela inexistência de fundamentos para, com base em erro, se declarar anulado o contrato em crise; ii) - e pela procedência da pretensão subsidiária de resolução do contrato fundada em alteração anormal das circunstâncias, decidindo julgar a ação procedente nesta parte e, por consequência, declarando-se a resolução do contrato de swap celebrado entre as partes em 30/06/2008, com efeitos desde janeiro de 2009.

7.

Inconformado com tal decisão, o Banco R. recorreu, começando por expor extensas considerações sobre a pretensa violação do dever de informação a ele imputado na sustentação do pedido de anulação do contrato, o que se revelou inócuo, uma vez que a A. não impugnou a sentença da 1.ª instância naquela parte.

No mais, o Banco Apelante pediu, em primeira linha, que se revogasse a decisão recorrida e se julgasse a ação totalmente improcedente ou, subsidiariamente, para o caso de se entender que procedia a pretensão de resolução do contrato fundada na alteração anormal das circunstâncias, se determinasse a retroação da resolução apenas à data em que a R. foi citada para a presente ação. 8.

Entretanto, o Banco Recorrente juntou três pareceres jurídicos todos eles no sentido da inadmissibilidade da resolução do contrato de swap aqui em causa com fundamento em alteração anormal das circunstâncias. 9.

A Relação, através do acórdão de fls. 1349-1383, datado de 28/04/ 2015, julgou a apelação parcialmente procedente, confirmando o segmento decisório que decretou a resolução do contrato, mas determinando o seu efeito a contar da citação da R..

10.

Mais uma vez inconformado, o Banco R. vem pedir revista, que foi admitida a título de revista excecional, formulando conclusões que aqui se reconduzem, sinteticamente, às questões de saber se: a) - O instituto da alteração anormal das circunstâncias é aplicável a contratos aleatórios, como o é o contrato de swap, em que a variação das taxas de juros constitui o núcleo desse contrato, encontrando-se abrangida pela sua própria finalidade? b) - Ocorreu alguma alteração anormal das circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar, prevendo o contrato um cenário em que a taxa de juros EURIBOR a 3 meses, descendo para níveis inferiores a 4,05%, determinaria que a A. tivesse de pagar 4,72%? c) - A descida da taxa de juros abaixo de 4,05% constitui um risco próprio do contrato? d) - A resolução do contrato por alteração anormal das circunstâncias coloca em causa o interesse geral da segurança jurídica das relações e da estabilidade de outros contratos que o banco R. celebrou com terceiros dependentes do swap? 11.

A Recorrida apresentou contra-alegações a pugnar pela confirmação do julgado.

Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

II – Fundamentação 1. Factualidade provada Vem dada como provada pelas instâncias a seguinte factualidade: 1.1.

A A. é uma sociedade que se dedica entre outras à atividade de fabricação de artigos têxteis confecionados; 1.2.

Em 01-09-2004, com efeitos a 19-08-2004, CC, Lda - empresa então integrante do Grupo DD, cujos contratos a A. assumiu como seus – celebrou com o Banco R. um contrato de swap com o valor nominal de € 5.000.000,00, pelo prazo de 2 anos (doc. fls. 66 a 69); 1.3.

Este contrato não visava exatamente cobrir o risco da taxa de...

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