Acórdão nº 905/05.2TTLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelANA LUÍSA GERALDES
Data da Resolução22 de Junho de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I – 1.

No dia 18 de Fevereiro de 2005, a AA – Companhia de Seguros, S.A., participou no Tribunal do Trabalho de Lisboa um acidente que vitimou mortalmente BB, ocorrido em 13 de Dezembro de 2004, quando este prestava a sua actividade sob as ordens, direcção e fiscalização da CC – …, Lda.

Frustrada a tentativa de conciliação, realizada na fase conciliatória dos autos, vieram: - DD e - EE, patrocinados pelo MP, e Enquanto beneficiários do sinistrado falecido, demandar os Réus: 1.

AA – …, S.A.

[1], 2. CC – …, Lda., e 3. Fundo de Acidentes de Trabalho, devido à situação de insolvência entretanto declarada da 2.ª Ré “CC”, Pedindo a reparação do acidente de trabalho participado nos presentes autos e deduzindo os pedidos de fls. 183 a 187.

Alegaram para tanto que, no dia 13/12/2004, o falecido BB foi vítima de um acidente quando trabalhava sob a autoridade, direcção e fiscalização da 2ª Ré CC, cuja responsabilidade por acidentes de trabalho estava transferida para a 1ª Ré AA – Cª de Seguros, S.A.

Assim, e tendo a morte do seu falecido pai ocorrido em consequência das lesões do acidente têm direito a pensão por serem filhos do sinistrado.

  1. Os Réus Fundo de Acidentes de Trabalho (designado nos autos por F.A.T.) e a Seguradora “AA” apresentaram contestação, nos termos que constam de fls. 296/300 e 310/313.

  2. Teve lugar uma tentativa de conciliação, em 28-11-2012, na qual, após aceitarem a fixação de um elenco de factos, as partes acordaram no seguinte: «As partes aceitam os termos da conciliação expressa no auto de conciliação com a rectificação que a responsabilidade emergente do acidente de trabalho estava transferida pela totalidade da retribuição anual para a Companhia de Seguros (€ 6.868,08), bem como a sua responsabilidade a título subsidiário, e com a rectificação do valor da pensão anual e temporária a seu cargo cujo valor é de € 2.747,23, aos filhos do sinistrado.

    Consideram deste modo prejudicado os montantes da prestação mensal de € 507,23 a cargo da entidade empregadora.

    A Cª de Seguros aceita pagar, como decorre da lei, o subsídio por morte aos filhos do sinistrado, no valor de € 4.387,20, e no âmbito da sua responsabilidade subsidiária.

    A Cª de Seguros aceita pagar a quantia de € 20,00 de transportes.

    O F.A.T. assumirá futuramente eventual responsabilidade nos termos legais decorrendo destes a não assunção do pagamento de prestações por responsabilidade agravada.» - (cf. fls. 374; sublinhado nosso).

  3. Seguidamente, pela MM.ª Juíza da 1.ª Instância foi proferido despacho a considerar válido o acordo, com o seguinte teor na parte que ora releva: «Verificada a capacidade das partes e a legalidade do presente acordo por o mesmo estar de acordo com as regras imperativas da Lei dos Acidentes de Trabalho, considero o mesmo válido.» 5.

    Posteriormente, foi junta a certidão da sentença que, em 28/10/2010, declarou a insolvência da 2ª Ré CC – …, Lda.

    – cf. fls. 379/385.

  4. Foi determinada a notificação do F.A.T., sob promoção do MP, para dizer o que tivesse por conveniente em face dos termos do acordo de fls. 374, lavrado no auto de tentativa de conciliação (designadamente no último parágrafo).

    Na sequência dessa notificação, veio o mesmo alegar que não era responsável pelo pagamento de prestações por responsabilidade agravada e que a Ré Companhia de Seguros “AA” assumiu a responsabilidade a título subsidiário pela totalidade da retribuição auferida pelo sinistrado, informando que nenhuma responsabilidade deverá ser por si assumida no âmbito dos presentes autos de acidente de trabalho – cf. fls. 390.

  5. Notificada a Ré Seguradora para comprovar o pagamento das quantias determinadas na decisão de fls. 374, em face do acordo referido no ponto 3), veio a mesma informar que apenas liquidou a verba referente ao subsídio por morte e transportes aos herdeiros do falecido (juntando documentos comprovativos), por considerar, no que concerne ao pagamento de pensões temporárias aos filhos do sinistrado, que o seu pagamento é da responsabilidade do F.A.T. – cf. fls. 437.

  6. Ouvido de novo o F.A.T., veio esta entidade reiterar o seu entendimento no sentido de que: «Não é devida qualquer quantia pelo F.A.T. nos presentes autos, atendendo a que as pensões devidas aos filhos do sinistrado ficaram a cargo da Seguradora, na qualidade de responsável subsidiária (face à insolvência da entidade empregadora).» - cf. fls. 443.

  7. Por sua vez o Ministério Público pronunciou-se no sentido de “nada ter a opor ao requerido pelo F.A.T.”, mas aduzindo o seguinte: «Em conformidade com o acordo de fls. 370 e segts., requer a condenação da Cª de Seguros nos pagamentos que ali expressamente assumiu, a incluir os pagamentos das pensões anuais e temporárias aos beneficiários legais do sinistrado» – cf. fls. 452.

    E em novo requerimento apresentado na mesma data, veio requerer que: “1- Se considere a não oposição ao requerido pelo F.A.T., a fls. 443, formu-lada no anterior requerimento como referente à responsabilidade subsidiária da Cª de Seguros.

    2- Assim, e na sequência do já requerido a fls. 439, deverá o F.A.T. considerar-se responsável pela diferença entre as prestações normais e as agravadas, face ao acordo de fls. 370 e segts., e ao que ficou exarado nos autos de tentativa de conciliação de fls. 263 e segts (cf. Acórdão STJ, de 17/6/2010, in www.dgsi.pt)» – cf. fls. 454.

  8. O F.A.T. veio de novo afirmar, a fls. 460, que «não é devida qualquer quantia a título de pensões agravadas pelo F.A.T. nos presentes autos.» 9. Pela MM.ª Juíza da 1.ª Instância foi então proferida a seguinte decisão: “Veio o Fundo de Acidentes de Trabalho (F.A.T.) dizer que não deve qualquer quantia nos presentes autos aos filhos do sinistrado que ficaram a cargo da Companhia de Seguros.

    O Ministério Público pronunciou-se no sentido de ser aquele responsável pela diferença entre as prestações normais e as agravadas em face do que ficou exarado no acordo de fls. 370 e segts.

    Notificado reitera o F.A.T. que do acordo resulta a não assunção por este pelo pagamento das prestações por responsabilidade agravada.

    Cumpre decidir.

    Resulta da acta de tentativa de conciliação (fls. 370-375) que as partes aceitaram “os termos da conciliação expressa no auto de conciliação com a rectificação que a responsabilidade emergente do acidente de trabalho estava transferida pela totalidade da retribuição anual para a Companhia de Seguros (€ 6.868,08), bem como a sua responsabilidade a título subsidiário e com a rectificação do valor da pensão anual e temporária a seu cargo, cujo valor é de € 2.747,23, aos filhos do sinistrado”.

    Os termos do acordo, que terá sempre de respeitar as regras legais imperativas, remete assim para os termos do auto de conciliação da fase conciliatória, que se encontra a fls. 263-269, desta decorrendo expressamente o pagamento apenas a título subsidiário das prestações aos filhos do sinistrado.

    No caso, o acidente de trabalho ocorreu em 13 de Dezembro de 2004, ou seja, ainda na vigência da redacção original do artigo 1º, do Decreto-Lei n.º 142/99, de 30 de Abril, em que pacificamente se entendia que o Fundo de Acidentes de Trabalho assumia a responsabilidade pelo pagamento das prestações agravadas ou, existindo responsabilidade subsidiária da Seguradora, pelo respectivo diferencial.

    O Decreto-Lei n.º 185/2007, de 10 de Maio, veio conferir nova redacção ao artigo 1º, n.º 5, daquele diploma legal, vindo a afastar a responsabilidade do Fundo de Acidentes de Trabalho pelo pagamento das denominadas “prestações agravadas”.

    Com efeito, ali se dispõe que “(V)erificando-se alguma das situações referidas no n.º 1 do artigo 295º, e sem prejuízo do n.º 3 do artigo 303º, todos da Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, o F.A.T. responde apenas pelas prestações que seriam devidas caso não tivesse havido actuação culposa”.

    Como se sumariou no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 17.06.2010, domiciliado em www.dgsi.pt: “(…) III – Todavia intui-se do modo como o legislador se exprimiu que a norma, na lei nova, limita a responsabilidade do F.A.T., ao mesmo tempo que não tem por objecto regular directamente situações jurídicas constituídas antes da sua entrada em vigor, ou seja, situações emergentes de acidentes de trabalho anteriormente ocorridos.

    IV – Por isso, em caso de acidente de trabalho ocorrido em data anterior à da entrada em vigor do DL n.º 185/2007, de 30 de Maio, e verificada a situação de impossibilidade de a entidade primitivamente responsável pela reparação dos danos emergentes de acidente de trabalho proceder ao pagamento das prestações agravadas, mantém-se a obrigação do F.A.T. de assegurar este pagamento ou o seu diferencial, caso haja responsável solidário”.

    Assim, tendo o acidente dos autos ocorrido em data anterior à alteração do artigo 1º, do Decreto-Lei n.º 185/2007, de 10.05, não existem dúvidas que o Fundo de Acidentes de Trabalho é responsável pelo pagamento das prestações agravadas ou pelo seu diferencial no caso de existir responsável subsidiário.

    As regras que acabámos de enunciar são imperativas, tal como aquelas que regulam os acidentes de trabalho.

    O Fundo de Acidentes de Trabalho invoca que terá sido acordado coisa diferente, o que se mostra irrelevante em face do regime legal imperativo.

    Contudo, entendemos que, pese embora os termos contraditórios que constam da declaração que aí consta, deverá entender-se que prevalece a primeira parte quando refere que: “O F.A.T. assumirá futuramente eventual responsabilidade nos termos legais”.

    Com efeito, com a segunda parte – “decorrendo destes a não assunção do pagamento de prestações por responsabilidade agravada” – reporta-se seguramente à lei vigente à data da conciliação. Contudo, verificando-se que à data do acidente era vigente lei que tal contraria, é esta necessariamente a aplicável.

    Nestes termos e pelos fundamentos expostos deve o Fundo de Acidentes de Trabalho, considerando a data em que o acidente ocorreu, pagar as prestações aos...

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