Acórdão nº 1175/14.7TTLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Outubro de 2017

Magistrado ResponsávelFERREIRA PINTO
Data da Resolução26 de Outubro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Processo 1175/14.7TTLSB.L1.S1 (Revista) – 4ª Secção[1] Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I a).

Introdução: AA intentou, em 12 de abril de 2014, a presente ação emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma do processo comum, contra “BB” no extinto Tribunal do Trabalho, de Lisboa, 2ºJuízo, 1ª Secção, agora Comarca de Lisboa – Lisboa - Instância Central - 4ª Secção do Trabalho - J2, pedindo que fosse reconhecida a existência de um vínculo de natureza laboral celebrado com o Réu e declarada a ilicitude do seu despedimento por ele efetuado e, que em consequência, fosse condenado: 1. A reintegrá-lo na estrutura profissional do Clube, em posto adequado à sua categoria profissional, Ou em alternativa, a pagar-lhe: 2. Em substituição da reintegração, uma indemnização de valor equivalente a 45 dias de retribuição base por cada ano completo ou fração de antiguidade, a qual ascende na presente data [data da propositura da ação] ao montante de € 156.750,00; 3. As retribuições que deixou de auferir desde 30 dias antes da propositura da presente ação até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento; 4. A quantia de € 25.000, a título de danos não patrimoniais; 5. A título de créditos laborais vencidos à data da cessação do contrato, a quantia de € 17.062,00; 6. Sobre os montantes pedidos, juros à taxa legal de 4% desde as datas de vencimento até integral pagamento.

~~~~~~~~~~ Alegou, para o efeito, e em síntese, ter sido admitido ao serviço do Réu em 23.08.1993, para desempenhar as funções de diretor do departamento de relações públicas, tendo prestado a sua atividade nesse regime até Abril de 2006, ocasião em que o Réu lhe propôs alteração na forma como prestava a sua atividade, nomeadamente mediante a assinatura de um contrato de prestação de serviço, como forma de ultrapassar dificuldades financeiras que o clube então atravessava, sendo que se trataria de uma situação transitória, até que o clube estivesse em condições de retomar a normal execução do contrato de trabalho.

Embora sem ter assinado o contrato, que lhe foi apresentado, por discordar de algumas cláusulas que ali constavam, o Autor aceitou passar a emitir faturas e ou recibos verdes pelas quantias que lhe eram pagas, continuando a executar as mesmas funções que vinha desempenhando anteriormente e nas mesmas condições.

Em 23 de Maio de 2013, o Réu pôs termo de forma unilateral à relação profissional estabelecida entre as partes, sem qualquer processo disciplinar ou de extinção de posto de trabalho, liquidando-lhe apenas cinco remunerações, sendo uma referente ao mês da cessação e as demais como compensação estabelecida unilateralmente pelo clube.

Nada mais lhe foi pago.

Tal conduta do Réu equivale a um despedimento ilícito e que sofreu danos não patrimoniais com esse comportamento.

~~~~~~~~~ Citado, o Réu contestou, invocando que o contrato de trabalho do Autor cessou por mútuo acordo em 30.04.2006, data a partir da qual vigorou entre as partes um contrato de prestação de serviço, tendo ocorrido alterações na forma como o Autor passou a prestar a sua atividade ao clube e nas concretas funções por ele exercidas.

Mais alegou dizendo que Autor estava a agir em abuso de direito ao deduzir as pretensões que formulou nestes autos sendo que, aquando da cessação do contrato, o Autor concordou que tinha apenas um contrato de prestação de serviço e que até compreendeu a sua dispensa.

Invocou, ainda, o Réu a prescrição dos créditos laborais do Autor e impugnou a factualidade alegada e referente aos danos morais peticionados.

Por fim, pediu que a ação fosse julgada improcedente.

~~~~~~~~~~ Foi proferido despacho saneador, onde a apreciação das exceções invocadas foi relegada para a sentença por ambas assentarem em matéria de facto controvertida.

Instruída a causa, realizou-se a audiência de discussão e julgamento, no decurso da qual o Autor optou expressamente pela indemnização em detrimento da reintegração.

Foi proferida decisão sobre a matéria de facto, que notificada às partes não suscitou qualquer reclamação.

Em 02 de novembro de 2015 foi proferida a seguinte sentença: a. Declarar que entre o Autor e o Réu vigorou, no período compreendido entre 23/08/1993 e 23/05/2013, um contrato de trabalho.

  1. Declarar ilícito o despedimento do Autor promovido pelo Réu e, em consequência: 1. Condenar o Réu a pagar ao Autor as retribuições contabilizadas desde 12.03.2014 até ao trânsito em julgado da presente sentença, tendo por referência a retribuição mensal de € 4.500,00, e ainda, desde a mesma data, as férias, subsídios de férias e de Natal, vencidos nesse mesmo período, contabilizados à mesma razão, sendo descontadas as importâncias que o Autor tenha obtido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento, devendo ainda o Réu entregar à Segurança Social o subsídio de desemprego atribuído ao trabalhador, se for esse o caso.

    A tais quantias acrescem os juros de mora vencidos, à taxa legal, desde a data de vencimento de cada uma das prestações.

    1. Condenar o Réu no pagamento ao Autor de uma indemnização de 30 dias de retribuição base, tendo-se em consideração o valor de retribuição de € 4.500,00, por cada ano completo ou fração de antiguidade, reportando-se esta a 02.08.1993, até ao trânsito em julgado da presente decisão judicial.

    À quantia apurada deve-se descontar € 21.000,00 recebida, pelo autor a título de compensação aquando da cessação do contrato.

    A tais quantias acrescem juros de mora vencidos, à taxa legal, desde a data da sentença.

  2. Condenar o Réu no pagamento da quantia de € 10.600,68, a título de retribuição de férias e subsídio de férias vencidos em 01.01.2013 e de proporcionais de férias e de subsídios de férias e de Natal do ano da cessação.

  3. Absolver o réu do demais peticionado.

    Para o efeito, diz a sentença, que “considerando a materialidade apurada, a substância e o enquadramento da realidade, conclui[u]-se pela existência de um vínculo de natureza laboral que subsistiu entre autor e réu desde 1/05/2006 e 23/05/2013, na continuidade do contrato de trabalho que havia sido celebrado em 23/08/1993, tratando-se na verdade de um único e mesmo contrato de trabalho”.

    Para chegar a esta decisão, ou seja, para qualificar juridicamente esse vínculo, como laboral, a sentença, aplicando o regime jurídico do Código de Trabalho de 2003, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto, concluiu que a factualidade provada preenchia cumulativamente todas as características consignadas no artigo 12º, do CT de 2003.

    II Inconformado, o Réu “BB” interpôs recurso de apelação, impugnando a decisão proferida sobre a matéria de facto, pugnando pela aplicação ao caso concreto da presunção de laboralidade estabelecida no artigo 12º, do Código de Trabalho de 2009 [CT/2009] e defendendo que a partir de 20.04.2006 a natureza da relação contratual era a de prestação de serviço e não laboral.

    Por acórdão de 15 de dezembro de 2016, decidiu-se “que à qualificação da relação existente entre as partes, que se iniciou em 23.08.93, se aplica[va] o regime jurídico do contrato individual de trabalho, anexo ao Decreto-Lei n.º 49.408 de 24 de novembro de 1969 (LCT), pelo que não tem aqui aplicação a presunção do artigo 12.º do citado Código de Trabalho de 2003, nem do Código do Trabalho de 2009, ou qualquer outra que não estava prevista na LCT”.

    Após a reapreciação da matéria de facto, foi julgada improcedente a sua impugnação e, face ao regime jurídico aplicável, ou seja, “ponderados todos os indícios […], apreciados na sua globalidade, [entendeu o acórdão recorrido] que eles revela[vam] que a situação de subordinação jurídica que existia antes de maio de 2006 permaneceu inalterada após essa data. Com efeito, a atividade do Autor continuou a ser essencialmente a mesma, e continuou a ser executada essencialmente do mesmo modo que o era anteriormente a essa data, com a única diferença, meramente formal, da emissão de faturas ou recibos verdes, para receber a remuneração mensal, que continuava a ser uma retribuição fixa, o que evidencia que era paga em função do tempo de trabalho e não do resultado do mesmo.

    Imp[unha-se], assim, concluir que a relação jurídica vigente entre as partes desde 23.08.1993 até 23 de maio de 2013, configurava um verdadeiro contrato de trabalho.” Consequentemente, foi confirmada a decisão recorrida.

    III b).

    Do recurso de revista: Inconformado, de novo, com esta decisão, o Réu dela interpôs recurso de revista nos termos gerais e recurso de revista excecional para este Supremo Tribunal de Justiça, pedindo que se revogue o acórdão recorrido, sendo o regime jurídico aplicável o do Código de 2009, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, e que se reconheça que o contrato celebrado com o Autor era um contrato de prestação de serviço, com todas as consequências legais daí advindas.

    Por despacho do Desembargador Relator, de 22 de março de 2017, foi admitido o recurso de revista nos termos gerais, face à diferente fundamentação do acórdão em relação à sentença e quanto ao recurso de revista excecional, entendendo que competia à “formação” estabelecida no artigo 672º, n.º 3, do CPC, apreciar a sua admissibilidade, ordenou a sua subida a este Supremo Tribunal de Justiça.

    ~~~~~~~~~ Subidos os autos a este Supremo Tribunal, fez-se a sua distribuição como de revista excecional.

    Distribuídos, a “formação”, por acórdão de 27 de abril de 2017, uma vez que a revista excecional é, por natureza, subsidiária (só sendo apreciada a sua admissibilidade se a revista nos termos gerais não for admitida) ordenou a sua remessa à Secretaria para serem distribuídos como de revista nos termos gerais.

    ~~~~~~~~~~ Por despacho de 22 de junho de 2017 foi admitido o recurso de revista nos termos gerais, por inexistência de dupla conforme, dado que ambas as decisões se basearam em regimes jurídicos divergentes.

    ~~~~~~~~~~ No recurso o Réu, depois de o motivar, apresentou as...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
1 temas prácticos
1 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT