Acórdão nº 613/15.6T8PVZ.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelANTÓNIO SILVA GONÇALVES
Data da Resolução19 de Janeiro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça No Tribunal da Comarca do Porto, Póvoa de Varzim - Inst. Central - 2ª Secção Cível - J6, o autor AA, com domicílio na Avenida …, nº …, 2º direito, Lisboa, instaurou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra BB, alegando resumidamente: Outorgou com o R. um contrato denominado de prestação de serviços, tendo ficado estabelecido que a violação das suas cláusulas faria incorrer o R. no pagamento de uma cláusula penal fixada no mínimo de 500.000,00 euros, tendo sido outorgado para vigorar entre 23/03/2014 e 23/03/2016, e, tendo o mesmo sido por si cumprido, foi feito cessar por comunicação unilateral do R., realizada em 18/05/2014, sem qualquer fundamento.

Conclui pedindo que o Réu seja condenado a pagar-lhe a quantia de € 150.000,00 euros, acrescida de juros de mora a contar desde a citação.

O Réu apresentou contestação alegando desconhecer se o A. era agente ou não de jogadores, agenciado pela Federação Portuguesa de Futebol, pondo em causa todas os actos que o A. alega ter prestado como seu representante.

Alega ainda que o valor da cláusula penal que foi fixado é manifestamente exorbitante, podendo e devendo ser reduzido pelo Tribunal.

Conclui pela improcedência da acção.

O processo prosseguiu termos e, findos os articulados, foi proferido despacho saneador, com selecção dos temas da prova, sem que tivesse sido apresentada qualquer reclamação.

Observado o legal formalismo foi realizada a audiência final.

Após, foi proferida a competente sentença que julgou «a presente acção improcedente, absolvendo-se R. BB do pedido que contra si foi formulado pelo A. AA relativo ao pagamento de uma indemnização pela revogação unilateral do contrato de representação». Inconformado, desta sentença recorreu o autor AA para a Relação do Porto que, por acórdão de 07.07.2016 (cfr. fls. 133 a 156): 1.

Julgou improcedente o pedido de ampliação do objeto do recurso; 2.

Julgou procedente o recurso de apelação e, em consequência, revogando a decisão recorrida, condenou o réu BB a pagar ao Autor AA a quantia de 150.000,00 Euros, acrescida dos juros à taxa legal, contados a partir da citação.

Desagradado, recorre agora para este Supremo Tribunal o réu BB, que alegou e concluiu pelo modo seguinte: 1.

Através do presente recurso, o recorrente pretende colocar em crise a decisão que revoga a sentença recorrida e, em consequência, condena o Réu BB a pagar ao Autor AA a quantia de 150.000,00 Euros, acrescida dos juros à taxa legal, contados a partir da citação, bem como se pretende colocar em crise a decisão que julga improcedente o pedido de ampliação do objecto de recurso.

  1. Salvo o devido respeito, que é muito, a decisão deveria ter sido no sentido contrário, ou seja, o Tribunal "a quo", deveria ter mantido a decisão proferida em Primeira Instância, na parte em que o ora Recorrido delimitou o objecto do seu recurso, atendendo à matéria de facto dada como provada e às disposições legais aplicáveis.

  2. E no que concerne à ampliação do objecto do recurso, entende-se, salvo o devido respeito, que o tribunal a quo, deveria ter considerado a existência de fundamento para a resolução do contrato pelo ora Recorrente.

    Posto isto 4.

    No acórdão do qual ora se recorre, considerou o Tribunal "a quo" que "a alínea k) - " A cláusula penal tinha sido estabelecida para situação de rescisão do acordo sem justa causa" - dos factos não provados deva ser eliminada, uma vez que se trata de matéria conclusiva a retirar da análise do contrato.

  3. Ora, com o devido respeito pelo Tribunal "a quo" não pode o Recorrente concordar com tal decisão, uma vez que concorda com o Tribunal de Primeira Instância em decidir que "Nos termos do n.º 1 do art. 236.º do C. Civil, de acordo com a teoria da impressão do destinatário, a declaração deve ser entendida de forma objectiva”.

  4. Isto é, com o sentido que uma pessoa medianamente instruída e diligente atribuiria à referida manifestação de vontade, com um sentido que tenha «um mínimo de correspondência no texto do respectivo documento, ainda que imperfeitamente expresso», ex vi art. 238.º do C. Civil, já que estamos perante um negócio formal».

  5. Portanto, estamos perante uma questão de direito sobre a qual não está o Tribunal vinculado (cfr. n.º 3 do artigo 5.º do CPC)[1].

  6. Com base na lei, o Tribunal de 1.ª Instância decidiu, e bem, que "A possibilidade de revogação unilateral do contrato está prevista na cláusula 7.ª".

  7. Com efeito, a cláusula penal deve ser aplicada segundo a lógica da redação do contrato, conforme foi considerado na decisão de 1.ª Instância.

  8. Pois, se a referida cláusula tivesse sido introduzida para indemnizar uma revogação unilateral ilícita do contrato, aquela teria sido colocada após a cláusula das "causas de rescisão" (cláusula 7.ª), o que não aconteceu.

  9. Uma pessoa medianamente instruída e diligente atribuirá às manifestações de vontade um sentido que tenha "um mínimo de correspondência no texto do respectivo documento, ainda que imperfeitamente expresso", ex vi artigo 238.º do CC.

  10. As regras constantes dos artigos 236.º a 238.º do CC constituem directrizes que visam vincular o intérprete a um dos sentidos propiciados pela actividade interpretativa.

  11. Ora, o que se retira do artigo 236.° do CC "é que, em homenagem aos princípios da protecção da confiança e da segurança do tráfico jurídico, dá-se prioridade, em tese geral, ao ponto de vista do declaratário (receptor). No entanto, a lei não se basta com o sentido realmente compreendido pelo declaratário (entendimento subjectivo deste) e, por isso, concede primazia àquele que um declaratário normal, típico, colocado na posição do real declaratário, depreenderia (sentido objectivo para o declaratário).

    "»[2] 14.

    Ora, aqui chegados, é claro que qualquer pessoa, medianamente instruída, sagaz e diligente, ao analisar o Contrato de Representação, interpreta que a cláusula 5.ª se aplica apenas ao que antecede, como resulta óbvio da inserção sistemática das cláusulas.

  12. É nítido, que o valor estipulado a título de cláusula penal nada tem que ver com o direito de indemnização do aqui Recorrido pela revogação alegadamente ilícita efectuada pelo Recorrente, não visando a sua fixação.

  13. Pelo que deverá manter-se a decisão do Tribunal de 1.ª Instância referente à não condenação do Recorrido ao pagamento da indemnização prevista na cláusula penal.

  14. Acrescente-se que, também conforme foi decidido pelo douto Tribunal de Primeira Instância, o credor não pode exigir uma indemnização que exceda o valor do prejuízo resultante do incumprimento da obrigação principal, conforme estipula o n.º 3 do artigo 811.° do CC.

    [3] 18.

    Mantendo-se a decisão de que o ora Recorrente revogou o contrato sem justa causa, o que por mera hipótese se admite, este teria de se responsabilizar pelos danos causados ao Recorrido, nos termos e para os efeitos do artigo 798.° do CC.

  15. Porquanto, e como resulta da matéria de facto, não foram invocados, nem provados, quaisquer prejuízos, nos termos e para os efeitos n. ° 1 do artigo 342.°.

  16. Pelo que, a indemnização no valor de € 150.000,00 certamente excederia o valor do prejuízo sofrido pelo Recorrido - sempre se diga que não foi nenhum - resultante do alegado incumprimento da manutenção do contrato de representação.

  17. Assim sendo, deverá manter-se a sentença de Primeira Instância no que toca à não existência de...

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