Acórdão nº 1861/16.7YRLSB.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelROSA TCHING
Data da Resolução22 de Fevereiro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

MANDADO DE DETENÇÃO EUROPEU[1] Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça: I – RELATÓRIO 1. O Ministério Público junto do Tribunal da Relação de Lisboa promoveu o cumprimento do Mandado de Detenção Europeu (doravante MDE), emitido em 14 de novembro de 2016 por autoridade judiciária do Reino de ... – Sétima Secção da Audiencia Provincial de ... – para procedimento criminal no âmbito do processo n.º ..., contra o agora recorrente, AA, de nacionalidade espanhola, nascido a 22.12.1974, em Sevilha, ....

  1. O MDE foi igualmente inserido no Sistema de Informações de Schengen – SIS, tendo o procedimento criminal a correr termos em ... por objecto factos ( transporte num barco que ia atracar em ... 3516,15 quilos de haxixe) que, segundo a legislação espanhola, integram um crime de tráfico ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas, previsto e punido pelos artigos 368º e 370º, nº3 do Código Penal Espanhol, crime incluído na lista das infrações constantes da parte I do campo e) do formulário do MDE.

  2. Procedeu-se à audição do detido, nos termos do disposto no artigo 18.º da Lei n.º 65/2003, de 23 de Agosto, no âmbito da qual foi dado conhecimento ao mesmo de todo o conteúdo do MDE e das razões da sua detenção e apresentação ao tribunal, tendo o detido declarado não consentir na execução do MDE e na sua entrega às autoridades espanholas, nem renunciar ao benefício do princípio da especialidade.

    Requereu ainda o detido a concessão do prazo de dez dias para apresentar a sua oposição, nos termos do disposto no artigo 21.º, n.º 4, da Lei n.º 65/2003.

    Foi, então, proferido despacho pelo Ex.mº Sr. Juiz Desembargador, que concedeu ao detido o prazo de 10 dias para apresentação da oposição. E, considerando que «os factos indicados como fundamento do MDE integram, em crime de tráfico de estupefacientes punível com pena de prisão superior a 5 anos e 3 meses de prisão, pedidos pelo Ministério Público Espanhol», que « o arguido não tem residência em Portugal» e que « há, por isso, risco de fuga se ele não estiver em prisão preventiva, que se mostra necessária para o cumprimento do MDE», determinou que o requerido aguardaria a decisão destes autos em prisão preventiva, solicitando ao tribunal à ordem do qual o mesmo estava detido a sua colocação à ordem deste processo caso fosse colocado em liberdade.

  3. O detido deduziu oposição à execução do mandado nos seguintes termos: «1-Antes de mais importa salientar que os factos indicados como fundamento do MDE, respeitam ao cumprimento de uma pena de prisão efectiva, em virtude da existência de sentença condenatória, já transitada em julgado, tendo tal decisão sido proferida na ausência do ora requerido (Cfr. MDE).

    2-Acresce que, o requerido encontra-se sujeito à medida de coação de prisão preventiva à ordem do processo que, sob o nº 84/16.0ZFLSB, corre termos pela Comarca de Lisboa-Ministério Público-Lisboa-DIAP-5ª Secção, sendo-lhe imputada a prática do crime de falsificação de documentos.

    3-Nos termos do disposto na al. g) do n.º 1 do art. 12º da Lei 65/2003 de 23/8, “A execução … pode ser recusada quando: a pessoa procurada se encontrar em território nacional, tiver nacionalidade portuguesa ou residir em Portugal, desde que o mandado de detenção tenha sido emitido para cumprimento de uma pena ou medida de segurança e o Estado Português se comprometa a executar aquela pena ou medida de segurança, de acordo com a lei portuguesa”.

    4-Na verdade, o requerido pretende cumprir a pena de prisão em que foi condenado no processo referido no MDE, em território Português, porquanto, fugiu de ... para ... e, posteriormente, para Portugal, em virtude de ser alvo de ameaças constantes à sua integridade física por parte das pessoas envolvidas na rede de tráfico de estupefacientes da qual fazia parte, receando pela própria vida.

    5- Aliás, tal factualidade levou a que não tivesse comparecido no julgamento em ..., pois, essas pessoas disseram-lhe que se falasse e os denunciasse era um homem morto, o que muito amedrontou e intimidou o ora requerido, tendo este optado por fugir de ..., devido à existência de perigo real para a própria vida, sendo que o direito à vida é um direito absoluto.

    6- A recusa facultativa de execução do MDE, prevista no art. 12.º, al. g), da Lei 65/2003, de 23-08 - quando a pessoa procurada se encontrar em território nacional, tiver nacionalidade portuguesa ou residir em Portugal - só se aplica às situações em que o mandado de detenção foi emitido para cumprimento de uma pena ou medida de segurança e o Estado Português se comprometer a executar aquela pena ou medida de segurança, de acordo com a lei portuguesa, o que o requerido pretende que suceda face ao supra exposto (Cfr. Ac. do STJ de 19/07/2006).

    7-Porém, caso assim se não entenda, o que não se aceita, sempre se dirá que, a pendência em Portugal de processo criminal contra o requerido é motivo para deferir a entrega, com a suspensão desta até que se encontre findo aquele processo e, no caso de condenação, até ao termo do cumprimento da respectiva pena, o que o mesmo pretende se não se aceitar que cumpra em Portugal a pena de prisão em que foi condenado em ....» Termos em que requer seja proferida decisão de recusa de execução do MDE, assumindo-se o compromisso de fazer cumprir a pena em Portugal, de acordo com a lei portuguesa, ou, caso assim se não entenda, seja deferida a entrega do requerido até que se encontre findo o proc. nº 84/16.0ZFLSB e, no caso de condenação, até ao termo do cumprimento da respetiva pena.

  4. O Ministério Público apresentou resposta à oposição, sustentando, em síntese, que diferentemente do que alega o requerido, o MDE não tem por finalidade o cumprimento de uma pena aplicada pela autoridade judiciária de emissão, mas sim a entrega para efeitos de procedimento criminal, pelo que o artigo 12º, nº1, al. g) da Lei nº 65/2003, não é aplicável ao caso dos autos, não, podendo, por isso, a execução do MDE ser recusada com esse fundamento.

    Mais sustentou que, tendo o requerido nacionalidade espanhola e não constando que tenha residência em Portugal, também não é de caso de entrega condicional, nos termos do disposto na alínea b) do art. 13º da referida lei.

    E, tendo em conta que o requerido não requereu nem se mostra necessária a produção de prova para a decisão, concluiu pela improcedência da oposição, devendo ser proferida decisão deferindo a execução do MDE e, em consequência, ordenada a entrega diferida do requerido até que se mostre concluído o processo 84/16.0ZFLSB e, se for caso disso, cumprida a pena que nele seja aplicada, sem prejuízo da entrega temporária, se assim o pretender a autoridade de emissão, em conformidade com as condições a fixar por acordo, nos termos do disposto no artigo 31º da Lei nº 65/2003...

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