Acórdão nº 1508/10.5TTLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Maio de 2017
Magistrado Responsável | RIBEIRO CARDOSO |
Data da Resolução | 11 de Maio de 2017 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça ([1]) ([2]) 1 - RELATÓRIO AA, residente no …, n.º … .., ..., ..., participou em 14/04/2010 um acidente de viação, atropelamento, por si sofrido em 17/04/2009 quando regressava a sua casa depois de se haver deslocado à clínica … para uma consulta médica realizada no âmbito do tratamento de lesões atinentes a um anterior acidente de trabalho, estando a responsabilidade civil, por acidentes de trabalho, transferida para a BB, S.A.
Na fase conciliatória do processo realizou-se a tentativa de conciliação a que se alude no art. 108º do C.P.T., que se gorou pelo facto de a seguradora não aceitar qualquer responsabilidade pelo alegado acidente “dado que, não obstante aceitar que o sinistrado se deslocava no trajecto normalmente utilizado por si na viagem entre os serviços médicos da seguradora e a sua residência, considera que o trajeto foi interrompido indevidamente”.
Declarada suspensa a instância nos termos do n.º 4 do art. 119º do C.P.T., o sinistrado apresentou petição contra a seguradora BB, S.A., pedindo a condenação desta a pagar-lhe: “
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As despesas de 1.000,00 euros em transportes e comedorias.
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Os salários correspondentes aos períodos de incapacidade temporária, no montante de € 18.323,72 (528,23 x 14) + (44,52 x 11) + (171,30 x 12) /12 /30 x 948 dias de ITA; c) Os dias de ITA entretanto intercorrentes, até decisão final; d) O capital de reservas matemáticas correspondente à pensão anual e vitalícia que lhe vier a ser fixada com início na data de alta ou consolidação das lesões, a apurar ainda pelo tribunal e que se computa numa incapacidade de 70% = 9.940,00 x 0,70 x 0,70 x 14,2790 (47 anos) = [€] 69.503,46; e) Juros legais desde o acidente até à decisão final e pagamento; f) Danos não patrimoniais a estipular, com base na equidade, e [€] 15.000,00; g) Pensão provisória de [€] 500,00 mensais.” Como fundamento alegou que no dia 17 de abril de 2009 sofreu um acidente quando se deslocava da clínica …., onde vinha sendo assistido em consequência de um anterior acidente de trabalho ocorrido ao serviço da sua entidade empregadora a “CC, S.A.”, para a sua residência.
Saiu da clínica cerca das 12,15h e apanhou o autocarro habitual de regresso a casa tal como o fez das demais vezes e, em determinada altura do percurso, sentiu-se indisposto e com fome, tendo decidido sair do autocarro para tomar um café e comer qualquer coisa e simultaneamente apanhar ar fresco pois a indisposição poderia ter estas causas.
Saiu numa paragem intermédia em relação ao seu destino, momento em que foi atropelado por um elétrico rápido que circulava em sentido contrário.
Depois de se restabelecer da indisposição, pretendia retomar o mesmo percurso até à sua residência.
Sofre de grave deficiência em termos de visão, quer ao longe, quer ao perto.
Sofreu gravíssimas lesões corporais e jamais poderá exercer a sua profissão habitual.
À data do acidente tinha o vencimento base de € 528,23 x 14 meses, acrescido de € 44,52 x 11 meses de subsídio de refeição e € 171,30 x 12 meses de outras remunerações, retribuição que estava integralmente transferida para a Ré seguradora.
Citada, a Ré contestou pugnando pela improcedência da ação mas aceitando a transferência para si da responsabilidade.
Alegou que no dia 17 de abril de 2009, o sinistrado, na sequência de acidente de trabalho anteriormente sofrido, deslocou-se a uma consulta médica à clínica …, que teve início pelas 11:30h e terminou pelas 12:00h.
Após ter saído da referida clínica, o sinistrado, no regresso a casa, interrompeu o seu percurso habitual. Com efeito, tendo entrado num autocarro em direção à paragem de … – em sentido inverso ao do seu percurso habitual entre a clínica … e a sua residência – apeou-se por motivo alheio aos tratamentos a que se deslocara e empreendeu a travessia da faixa de rodagem dos transportes públicos (Bus), vindo, nesse trajeto, a ser atropelado por um elétrico que, na circunstância, por ali passava.
O sinistro não se verificou no trajeto normalmente utilizado pelo sinistrado entre a clínica … e a sua residência, dado esse trajeto ter sido interrompido, razão pela qual aquele acidente não pode ser caracterizado como acidente de trabalho.
Acresce que o acidente se ficou a dever, exclusivamente, a negligência grosseira do próprio sinistrado ao proceder à travessia da via. Com efeito, no local do acidente a Av…. dispunha de duas sub-faixas de rodagem, uma delas destinada ao trânsito em geral e uma outra situada entre aquela e o cominho de ferro, afeta aos transportes públicos, entre ambas existindo um passeio desnivelado em altura, com cerca de 2 metros de largura, sendo que no bordo desse passeio, do lado da faixa afeta ao trânsito em geral, encontravam-se grades metálicas de proteção em contínuo com cerca de 1,20m de altura.
A 31,15 metros para o lado Nascente em relação ao local onde o atropelamento viria a suceder, existiam, em ambas as faixas de rodagem, passadeiras destinadas à travessia de peões, local em que o trânsito de veículos e peões era regulado por semáforos.
Cerca de 30 metros antes da referida passadeira e atento o sentido Poente-Nascente existia uma paragem/abrigo de transportes coletivos urbanos.
O autocarro em que o sinistrado se fazia transportar após sair da clínica …., parou na mencionada paragem/abrigo.
O sinistrado apeou-se e ato contínuo – estando a chover e sem fazer uso de qualquer chapéu-de-chuva – dirigiu-se para a parte traseira do autocarro, com este ainda parado, iniciando em correria a travessia da faixa de rodagem do corredor de circulação “Bus” e, sem se deter nem olhar para o seu lado direito, prosseguiu a travessia.
Na altura, transitava pela sub-faixa de rodagem do corredor de circulação “Bus” e no sentido Nascente-Poente um elétrico rodando pelos carris de ferro aí existentes.
Quando o sinistrado AA saiu da traseira do autocarro e se tornou visível para o guarda-freio do elétrico, já este se encontrava a não mais de 8 metros e a uma velocidade não excedente de 20 Kms/h.
O guarda-freio ainda travou o elétrico, não tendo, no entanto, podido evitar o atropelamento do Autor.
O INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, IP, notificado nos termos do n.º 2 do art. 1º do Decreto-Lei n.º 59/89 de 22-02, deduziu petição contra a “BB, S.A.
” pedindo o reembolso das prestações pagas ao sinistrado AA em consequência do acidente ocorrido em 17 de abril de 2009, no valor de € 14.418,53.
A Ré “BB, S.A.” contestou a pretensão do Instituto da Segurança Social, IP, concluindo como na contestação que deduzira à petição formulada pelo sinistrado.
Constatando a existência de discrepância entre a remuneração alegadamente auferida pelo sinistrado e a que a sua entidade patronal havia transferido para a Ré seguradora, determinou-se, oficiosamente a intervenção no processo da entidade patronal, ou seja, da sociedade DD, S.A.
ao abrigo do disposto no art. 127º do C.P.T., bem como a citação da mesma para contestar os pedidos deduzidos pelo sinistrado e pelo “ISS.IP”.
Contestou a DD, S.A.
, arguindo a sua ilegitimidade passiva, já que transferira toda a sua responsabilidade infortunística para a Ré seguradora e concluiu que deve ser absolvida do pedido deduzido pelo “ISS, IP”.
Entretanto a Ré seguradora apresentou requerimento de retificação dos valores de salário auferidos pelo sinistrado e que constavam da sua contestação, reconhecendo que assumira na totalidade a responsabilidade da entidade patronal deste, com base na retribuição global por ele auferida.
Na sequência deste requerimento foi a instância declarada extinta, por inutilidade superveniente da lide, no que concerne à intervenção da Ré DD, S.A.
, e convidado o Autor a aperfeiçoar a sua petição.
Foi proferido despacho saneador, selecionada a matéria de facto assente e organizada a base instrutória e determinada a abertura de apenso para fixação da incapacidade do sinistrado.
O pedido incidental de fixação de pensão provisória que havia sido requerida pelo Autor foi indeferido liminarmente, por ineptidão.
O A., inconformado, interpôs recurso de apelação que foi julgado procedente tendo-se determinado a prolação de decisão apreciando o pedido de fixação de pensão provisória.
O A., após para tal convidado, apresentou petição incidental aperfeiçoada pedindo que lhe fosse concedida a pretendida pensão provisória, pretensão que, após contestação da seguradora, foi indeferida.
O Instituto de Segurança Social, IP, por sua vez, deduziu ampliação do pedido por si formulado, pedido que, apesar de contestado pela Ré, foi admitido e, como consequência, foram aditados novos quesitos à base instrutória.
Realizada a audiência de discussão e julgamento, com gravação da prova aí produzida, foi proferida sentença julgando a ação totalmente improcedente, com a consequente absolvição da Ré dos pedidos contra si formulados.
Inconformado, o sinistrado interpôs recurso de apelação impugnando, para além do mais, a decisão sobre a matéria de facto.
A Relação escusou-se de apreciar o recurso no que tange à reapreciação da matéria de facto por considerar que o A. não especificou “os concretos pontos de facto” que considerava incorretamente julgados, não tendo cumprido o ónus imposto pelo art. 640º, nº 1, al. a) do CPC, e porque “o Autor/apelante fundou a pretensão de alteração da sentença recorrida na impugnação de matéria de facto por si apresentada… e que foi rejeitada”, foi proferida...
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