Acórdão nº 209/13.7TBMGR.C1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelSOUSA LAMEIRA
Data da Resolução14 de Dezembro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – RELATÓRIO l.

AA, viúva, residente na Rua da …, n.º …, Fracção E, …, Marinha Grande, intentou a presente acção declarativa, hoje sob a forma de processo comum, contra BB - Companhia Portuguesa de Seguros de Vida, S.A.

, com sede na Avenida …, Lote …, em Lisboa, alegando, em síntese, que: Em 14/10/2002, a A. e o seu marido, CC, compraram à Sociedade Comercial Construções da DD, Lda., pelo preço de € 92.277,60, a fracção autónoma designada pela letra "E" (do prédio inscrito na respectiva matriz sob o artigo número 16….9, descrito na Conservatória do Registo Predial da Marinha Grande sob o número 8…8, afecto ao regime de propriedade horizontal), correspondente à Quinta …; tendo também intervido na respectiva escritura (que foi de compra e venda e empréstimo com hipoteca), como terceiro outorgante, o BCP, na qualidade de mutuante, tendo-se a aqui A. e o seu marido, na qualidade de mutuários, declarado devedores ao BCP da importância de € 92.277,60, “que do mesmo Banco receberam a título de empréstimo e que vai ser aplicada na precedente aquisição", para além de, para garantir o pagamento da quantia mutuada (e bem assim dos respectivos juros e outros acréscimos), haverem constituído hipoteca a favor do BCP, sobre a fracção autónoma adquirida.

Para além disto, a Autora e o marido (tendo-se obrigado, nos termos do contrato de mútuo com hipoteca concedido pelo BCP, a contratar um Seguro de Vida) celebraram com a R. BB Vida o contrato de seguro de vida, associado ao crédito habitação, com o certificado nº 95…6, titulado pela apólice nº 0006…0, com início em 10/02/2006, sendo o capital seguro de € 110.600,00.

As pessoas seguras eram a A. e o marido e o beneficiário, em caso de morte das pessoas seguras, o BCP.

No contrato de seguro os prémios teriam periodicidade mensal e cujo pagamento seria efectuado por débito na conta de depósitos à ordem de que a A. e o marido eram titulares com o nº 11…8.

Entretanto, no dia 09/05/2010, faleceu o marido da A. (deixando como herdeiros legais a A. e dois filhos, que [os filhos] repudiaram a herança), motivo pelo qual, em meados de Maio de 2010, a A. se deslocou à sucursal do "Millenium BCP" da Marinha Grande para comunicar o falecimento do marido e accionar o seguro de vida; tendo, “perante as dificuldades apresentadas”, pedido o exemplar das condições gerais e especiais aplicáveis à apólice de seguro de vida, o qual lhe foi remetido, por carta datada de 01/06/2010, pela R. BB Vida, que a informou que “nos termos da legislação em vigor e das condições contratuais aplicáveis, o certificado individual n.º 95…6 se encontra anulado por falta de pagamento dos prémios com data efeito a 01/09/2008”.

Ora, segundo a A., até aquela data, nunca a R. havia comunicado quer ao marido da A. quer à própria A. que o contrato de seguro se encontrava “anulado” ou “resolvido”, razão pela qual “a morte do marido da A., em 09/05/2010, se apresentava coberta”.

Acrescentando ainda: que a falta de pagamento de prémios não determina a resolução automática do contrato, que carece de ser comunicada; que “não bastaria a declaração de resolução dirigida ao falecido marido da autora”, sendo “imprescindível que tal declaração tivesse também sido dirigida à A. e que tivesse chegado à sua esfera de acção (caso em que se presumia o conhecimento) ou que se provasse o conhecimento, por ela, do teor da declaração directamente dirigida a ela (dispensando-se nesse caso a prova da recepção da declaração) ”.

Finalmente alega que “era por conseguinte indispensável que a R. tivesse feito duas comunicações de resolução do contrato de seguro, uma à A. e outra ao marido”.

Conclui pedindo: «Que seja declarado válido e eficaz o contrato de seguro do ramo vida titulado pela apólice n.º 0006…0/certificado n.º 95…6; Que seja a ré condenada a reconhecer o que vem pedido no número anterior e a pagar à autora o capital seguro contratado, necessário para a amortização do empréstimo concedido à autora e marido, assim como juros de mora sobre o capital seguro, à taxa legal, desde a citação até efectivo e integral pagamento».

  1. Contestou a Ré reconhecendo a adesão da A. e do marido ao Seguro de Grupo que a R. havia celebrado como o BCP, seguro que, nos termos das suas condições gerais, cessa para cada pessoa segura na data da resolução do contrato, o que, também nos termos das mesmas condições gerais (art.º 13.º), pode acontecer por falta de pagamento dos prémios, nos 30 dias posteriores à data do seu vencimento.

    Após o que alegou que foi exactamente isto que aconteceu, ou seja, não conseguindo, a partir de setembro de 2008, cobrar o prémio, procedeu, por falta de pagamento dos prémios, à resolução do contrato, enviando, para tal, cartas (a pedir a regularização do prémio e a declarar a resolução) ao marido da A. (CC), cartas que foram remetidas para a morada que consta do Certificado Individual de Seguro (assumido pelo seu sistema informático, em virtude de a A. e seu falecido marido já constarem, com tal morada, dos registo da R.), que foram recebidas e o seu conteúdo conhecido quer pela A. quer pelo seu marido.

    Alegou, ainda, que “sendo a A. apenas segurada e constando do Certificado Individual como entidade pagadora o seu marido, não tinha a A. que ser interpelada para pagar, nem tinha a ré de lhe comunicar a resolução do contrato”.

    Referiu também que ignora qual o valor em dívida ao banco mutuante e, bem assim, se existe mora ou se as prestações estão a ser garantidas, sendo que a A. tal não alegou.

    Concluiu pela improcedência da acção, em face da resolução do contrato.

  2. Replicou a A., mantendo as posições assumidas na PI.

  3. Foi proferido despacho saneador – que declarou a instância totalmente regular, estado em que se mantém – e foram seleccionados os factos assentes e organizada a base instrutória.

    Realizada audiência final, foi proferida sentença que julgou a acção totalmente improcedente e em que, consequentemente, absolveu a R. dos pedidos.

  4. Inconformada, apelou a Autora para o Tribunal da Relação de …, que, por Acórdão de 14 de Março de 2017, julgou totalmente improcedente a apelação e, consequentemente, confirmou a decisão recorrida.

  5. De novo inconformada, a Autora, recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça e, tendo alegado, formulou as seguintes conclusões: 1ª.

    O presente recurso vem interposto da Acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação de …, que julgou totalmente improcedente a pretensão da Recorrente. Decisão, com a qual a Recorrente não pode conformar-se.

    1. Da admissibilidade da revista.

      1. In casu está verificada uma situação de dupla conforme: a Relação confirmou, por unanimidade, a decisão da lª. instância.

      2. Pese embora, a ora Recorrente pretende ver reapreciada a causa pelo Tribunal de Revista, ao abrigo do disposto na alínea c), do nº. 1, do Artigo 721º do Código Processo Civil, por verificada contradição entre o Acórdão que se pretende impugnar e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido em 31 Janeiro de 2007, já transitado em julgado (processo nº 06A4485, nº convencional JSTJ000, relator Juiz Conselheiro Dr. Faria Antunes), juntando-se cópia do referido Acórdão-fundamento com o qual o Acórdão recorrido se encontra em oposição, protestando juntar, no prazo de dez dias úteis, a competente certidão (c/r. requerimento em anexo).

      3. Fazendo alusão ao Venerando Acórdão do Tribunal da Relação de …., importa discutir "se não havendo declaração resolutiva em relação à Recorrente, isso significa, forçosa e necessariamente, que todo a relação contratual se mantém incólume, válido e vigente, como se não tivesse havido resolução contratual em relação ao marido da Recorrente?" 5.ª No caso em particular, o Acórdão recorrido entendeu não ser assim, verificando, em consequência, uma oposição frontal dos dois Acórdãos, relativamente à apreciação da mesma questão e não meramente implícita ou pressuposta.

    2. Aspectos de identidade.

      1. Ambos os Acórdãos discutem a resolução contratual do contrato seguro - ramo vida - por inadimplemento da obrigação de pagamento dos prémios do seguro de vida.

      2. Resulta, igualmente, dos dois processos que a Ré Seguradora não comunicou directamente à Recorrente a falta de pagamento dos prémios e a vontade de resolver o contrato caso não fossem pagos no prazo suplementar.

      3. Estão ainda em sintonia quanto não bastava a declaração de resolução dirigida ao falecido marido da Recorrente, sendo imprescindível que tal declaração tivesse também sido dirigida a esta, e que tivesse chegado à sua esfera de acção (caso em que se presumia o conhecimento), ou que se provasse o conhecimento, por ela, do teor da declaração directamente dirigida a ela (dispensando-se nesse caso a prova da recepção da declaração).

      4. Pese embora, os dois Arestos apresentam soluções jurídicas substancialmente distintas.

      5. Extrai-se do Acórdão-fundamento que, para se mostrar resolvido o contrato de seguro, "era absolutamente necessário que a recorrente tivesse dirigido também directamente à recorrida uma declaração de vontade de resolver o contrato (caso não fosse regularizado o débito dos prémios do seguro), e que essa declaração tivesse chegado à posse dela ou pelo menos que se provasse que tomou conhecimento do seu teor, pois a resolução, como diz o arte 436º nº 1 do C Civil, é feita mediante comunicação à outra parte, e a recorrida também era parte no contrato") 10.ª Ora, não bastava a declaração de resolução feita ao marido da Recorrente: era também imprescindível que tal declaração tivesse sido feita e chegado ao poder da Recorrente ou que fosse dela conhecida.

      6. Era, por conseguinte, indispensável que a Ré Seguradora tivesse feito duas comunicações de resolução do contrato de seguro: uma à Recorrente, e outra ao seu marido.

      7. Reportando-se a situação a um contrato indivisível - isto porque se mostra legalmente impossível resolver o contrato de seguro só em relação ao marido da Recorrente ou só em relação a esta.

      8. Com efeito, a falta dessa comunicação à...

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