Acórdão nº 1106/12.9YYPRT-B.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Abril de 2016

Magistrado ResponsávelABRANTES GERALDES
Data da Resolução28 de Abril de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

I – O Banco AA, S.A.

, interpôs contra BB acção executiva para pagamento de € 1.551.312,23.

Pelo executado foi deduzida oposição que foi julgada improcedente.

O executado interpôs recurso de apelação que foi julgado parcialmente procedente, sendo deduzida à quantia exequenda o valor de € 381.522,72.

O executado interpôs recurso de revista normal e, em termos subsidiários, recurso de revista excepcional.

Foi proferido despacho pelo ora relator considerando inadmissível o recurso de revista normal, atenta a verificação de uma situação de dupla conforme, na medida em que a Relação produzira um resultado quantitativamente mais favorável ao recorrente/embargante.

Este, contudo, veio reclamar para a conferência cuja decisão é integrada no presente acórdão.

Vejamos: No anterior recurso de apelação que foi interposto pelo embargante a Relação reduziu a quantia exequenda. Tal redução foi determinada em função da precedente alteração da decisão da matéria de facto no que concerne à repercussão financeira da não amortização do empréstimo a que os autos respeitam (ponto 56º da matéria de facto adiante enunciada). Foi tal modificação que levou a Relação a determinar a redução da quantia exequenda, quanto ao montante fixado no ponto 56º.

Todavia, a Relação já considerou insuficiente para sustentar uma redução superior a matéria de facto que também adicionou e que adiante se enuncia sob o ponto 58º. Relativamente a esta matéria de facto considerou que da mesma não decorria para o recorrente qualquer efeito, tendo em conta que se trata de matéria que se inscreve unicamente na relação subjacente estabelecida entre o Banco exequente e a subscritora da livrança.

Trata-se, nesta perspectiva, de uma fundamentação substancialmente diversa da que foi empregue pela 1ª instância e que, por isso, justifica o acesso ao recurso de revista nos termos da regra geral do art. 671º, nº 1, do CPC.

Por conseguinte, decidir-se-á considerando a interposição do recurso de revista normal, sem necessidade de remeter os autos à formação prevista no nº 3 do art. 672º do CPC para efeitos de apreciação da admissibilidade da revista excepcional.

II – No recurso de revista foram suscitadas pelo recorrente diversas questões:

  1. Entre elas encontra-se a arguição de nulidade do acórdão decorrente da omissão de pronúncia quanto à impugnação de uma decisão interlocutória.

    Ora, esta nulidade foi reconhecida e apreciada no acórdão complementar que se encontra a fls. 1239 e segs., o qual foi notificado às partes que não reagiram.

    Aliás, tratando-se de acórdão que reapreciou decisão interlocutória de natureza adjectiva, a sua impugnação para este Supremo Tribunal debater-se-ia com a forte restrição prevista no art. 671º, nº 2, do CPC.

    Por conseguinte, tal questão não será apreciada por este Supremo Tribunal de Justiça.

  2. Foram suscitadas na revista ainda as seguintes questões: 1) Ineficácia da livrança, por ter sido subscrita em branco apenas por um dos Administradores da Sociedade, sendo que, na data do preenchimento da livrança, já eram exigidas as assinaturas de dois Administradores, e liberação do avalista em face do disposto no art. 653º do CC; 2) Invocação por parte do avalista da aprovação do plano de insolvência relativamente à subscritora da livrança CC; 3) Nulidade da livrança por ter sido afectada por preenchimento abusivo; 4) Invocação por parte do avalista do facto de a exequente não ter procedido às amortizações de acordo com as instruções dadas pela sociedade mutuária e subscritora da livrança; 5) Invocação por parte do avalista da compensação resultante da consideração de spreads superiores aos que eram devidos pela sociedade mutuária; 6) Não dedução no capital em dívida da quantia de € 381.522,72 já considerada pela Relação.

    Houve contra-alegações, pronunciando-se a exequente no sentido da improcedência de cada uma das questões.

    Cumpre decidir.

    II – Factos provados: … III – Decidindo: 1.

    Necessidade de duas assinaturas para vincular a subscritora e liberação do avalista: Elementos a ponderar: - A livrança foi subscrita em 18-2-09 pela CC através da assinatura de um seu Administrador, sendo entregue à exequente aquando da celebração do contrato de financiamento; - Nessa data, a Sociedade obrigava-se através de um só Administrador, regime que apenas foi modificado em 29-4-10, passando a exigir-se a intervenção de dois Administradores; - A livrança foi preenchida em 18-9-10.

    Alega o avalista/embargante que a livrança apenas foi assinada em branco por um Administrador da Sociedade subscritora, sendo que na ocasião em que foi preenchida pela exequente já o respectivo pacto social havia sido alterado, obrigando-se a mesma Sociedade pela intervenção de outro Administrador.

    A argumentação do executado não procede por duas ordens de razões.

    Em primeiro lugar, ainda que houvesse alguma falha no procedimento relacionado com a vinculação da Sociedade subscritora da livrança a mesma não podia ser invocada pelo respectivo avalista.

    Na verdade, como decorre do art. 32º §2º da LULL, a responsabilidade assumida pelo avalista é independente dos vícios da obrigação cambiária, com excepção dos que colidam com a forma do título de crédito, o que não se verifica quando é suscitada a insuficiência de intervenientes para vincular a Sociedade subscritora da livrança.

    Em segundo lugar, a vinculação da Sociedade (tal como a identificação dos sujeitos que a podem obrigar) afere-se através do teor do pacto social vigente na data que o título de crédito foi subscrito, não sofrendo qualquer interferência em resultado de eventuais modificações posteriormente ocorridas.

    É este o resultado da admissão legal de livranças em branco que decorre do disposto nos arts. 77º § 2 e 10º da LULL.

    Não se ignora que tanto na jurisprudência como na doutrina não é uniforme o entendimento quanto ao momento da constituição da obrigação cambiária, se na data da sua emissão do título (tese da emissão), se naquela em que se processa o preenchimento dos elementos em falta, quando a sua entrega é acompanhada de um pacto de preenchimento (tese do preenchimento).

    A primeira tese foi acolhida no Ac. do STJ, de 29-11-11 (www.dgsi.pt) onde se refere que é com a subscrição da livrança que “cambiariamente, nasce e fica constituída a obrigação, bem como a responsabilidade do subscritor (e seus avalistas) pelo respectivo pagamento na data do vencimento”. Tese também adoptada nos Acs. do STJ, de 9-7-02 e 20-5-04, referenciados por Carolina Cunha (Letras e Livranças, pág. 641).

    Já a segunda solução é defendida por Pinto Furtado (Títulos de Crédito, pág. 145) e por Carolina Cunha (ob. cit., pág. 636), com argumentos que fazem todo o sentido mas que, no entanto, não interferem na resolução do caso concreto em que a questão está conexionada com a alteração do modo de funcionamento da Sociedade.

    Com efeito, independentemente da resposta à questão enunciada acerca do momento em que efectivamente se constitui obrigação cambiária (in casu da subscritora da livrança), tal não interfere na eficácia da anterior vinculação da Sociedade. Com efeito, mesmo quando se entenda que a constituição da obrigação opera no momento do preenchimento dos elementos em falta, com a precedente subscrição da livrança constitui-se a obrigação da subscritora de assumir a obrigação cambiária nos termos previamente ajustados (Carolina Cunha, ob. cit., pág. 637).

    Como bem o ilustra esta autora, as alegações em torno da vinculação cambiária de sociedades “correspondem – como o caso concreto, aliás, bem o evidencia – a uma tentativa dos avalistas (e da própria sociedade) para se eximir ao pagamento do título, mais do que a uma verdadeira desavença jurídica” (ob. cit., pág. 641), para logo de seguida concluir que “as alterações sofridas pela composição dos órgãos de representação não afectam os compromissos em cada momento assumidos pela pessoa colectiva” e que “o que importa avaliar é se, em cada momento, o sujeito que concretamente agiu pela sociedade era aquele a quem competia tal incumbência” (pág. 642).

    Deste modo, a eficácia da vinculação cambiária estabelecida em representação da CC nunca seria afectada pelo facto de, na data em que ocorreu o seu preenchimento, já ter sido modificado a sua forma de vinculação perante terceiros.

    O facto de estar associado à subscrição e ao aval de livrança em branco a assinatura simultânea de um pacto de preenchimento revela bem como é destituída de fundamento jurídico a argumentação tecida pelo executado em sentido contrário.

    Com a anterior resposta improcede também a outra questão que a esta estava associada relacionada com a alegada desoneração do embargante avalista.

    Não havendo motivo para considerar a CC desonerada da sua responsabilidade, enquanto subscritora da livrança, não faz qualquer sentido a argumentação deduzida pelo embargante para se eximir à sua...

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