Acórdão nº 876/12.9TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Janeiro de 2016

Magistrado ResponsávelGABRIEL CATARINO
Data da Resolução26 de Janeiro de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)
  1. – Relatório.

“AA, Lda.”, antes denominada “BB, Lda.”, com sede em ..., intentou, no dia 23 de Abril de 2012, a presente acção declarativa de condenação, sob a forma ordinária, contra o “Banco CC, S. A.”, com sede em Lisboa, pedindo a resolução do contrato de permuta de taxa de juro celebrado entre Autora e Ré, em 17 de Abril de 2008, por virtude da alteração anormal das circunstâncias.

Para o pedido que impetra, a Autora alega: - No dia 17 de Abril de 2008, celebrou com a sociedade bancária demandada, um contrato de permuta de taxa de juros, pelo período de cinco (5) anos – data de início do contrato em 28/07/2008 e data de vencimento em 28/07/2013; - O contrato em apreço não representa qualquer possibilidade de ganho para a Autora, ao invés propina avultados e imanes ganhos para a demandada, tendo, na altura da propositura da acção gerado um prejuízo de € 218.042,02 e a manter-se o estado de coisas perdurarão, até final da execução do contrato, os prejuízos até ao montante de € 320.000,00; - A situação de prejuízos decorre, no entendimento da Autora, da crise económica e financeira internacionais e da descida abrupta, inesperada, anormal e imprevisível da taxa Euribor a 3 meses que se verificou no último trimestre do ano de 2008; - As partes, no momento da celebração do contrato, não representaram a situação que veio a ser gerada pelas convulsões económico-financeiras referidas e que veio a originar “um desequilíbrio brutal” no contrato, o que é passível de ofender os lídimos princípios da boa-fé contratual, por virtude de “uma drástica e anormal alteração das circunstâncias”; - No contrato ajuizado, a Autora comprometeu-se a pagar, trimestralmente, uma taxa de juros sobre a quantia de € 2.000.000,00: a) a taxa fixa de 4,66% caso a Euribor a 3 meses (fixada no segundo dia útil anterior ao inicio do respectivo trimestre) fosse i) inferior a 4,15% ou ii) simultaneamente igual ou superior a 4,66% e igual ou inferior a 5,30%; b) a taxa variável de juros “Euribor a 3 meses” (fixada no segundo dia útil anterior ao inicio do respectivo trimestre) caso essa taxa seja i) simultaneamente ao igual ou superior a 4,15% ou ii) superior a 5,30%; - Por seu turno o banco obrigava-se a pagar, trimestralmente, a taxa de juro variável “Euribor a 3 meses” calculada sobre a importância nominal acordada fixada no segundo dia útil anterior ao início do respectivo trimestre; - O colapso bancário (Lehman Brothers) decorrente de empréstimos à habitação ancorados em obrigações classificadas pelas agências de rating com triplo A, a que se convencionou apodar de “subprime” desencadeou uma crise económico-financeira e, concomitantemente, uma descida acentuada da taxa de juro de referência para as operações bancárias, denominada “Euribor”; - Os pressupostos em que assentou o negócio sofreram, no prazo de dois anos (2008-2009), uma variação nominal de 4,85% para 0,07%, o que induz uma alteração da base do negócio e um ratio negativo entre Abril de 2008 e Dezembro de 2010 de 80,54%, o que se repercutiria em 2011; - A autora teve perdas, nos quatro trimestres do ano de 2009 de cerca de € 54.000,00; no ano de 2010 uma perda global de € 79.195,17; no ano de 2011 uma perda de € 68.804,18; e no primeiro trimestre do ano de 2012, uma perda de € 16.042,67, no total de € 218.042,02. - A iniciativa da celebração do contrato partiu da entidade demandada, ainda que esta nunca tivesse subordinado a aprovação de linhas de crédito da outorga de contratos swap.

Na contestação que apresentou a entidade demandada, depois de um enquadramento da figura do swap – cfr. artigos 13 a 54 – refere que a demandante procurou limitar os custos de financiamento, pela fixação de uma taxa de juro referenciável que vigoraria durante o período de vigência do financiamento “passou a saber qual o custo máximo desse financiamento, uma vez que, independentemente, das variações da taxa de juro indexadas à “Euribor” esse custo nunca poderia ultrapassar a taxa de 4,66%” – artigo 59 da contestação. Na réplica – cfr. fls. 89 a 93 – a demandante manteve a posição evidenciada supra. No despacho saneador – cfr. fls. 103 a 123 – o tribunal de primeira instância decidiu “julgar improcedente, por não provada, a presente acção e, por via disso, absolver a Ré do pedido”.

Interposto recurso de apelação – cfr. fls. 209 a 235 – o tribunal de recurso, em decisão de, 15 de Janeiro de 2015 – cfr. fls. 547 a 573 – viria a “(..) negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

” Na manutenção da discordância com as decisões das instâncias, foi interposto recurso de revista (excepcional) que viria a ser inadmitido por douta decisão de fls. 1252 a 1256, por estimar não se verificar o requisito invadeável da “dupla conformidade” entre a fundamentação das decisões.

Para a revista que almejam, impõe a recorrente o quadro conclusivo que queda extractado, infra.

I.a. – Quadro Conclusivo.

“1. Contraposto o Acórdão cuja revista se pede com os Acórdãos Fundamento tirados pelo Supremo Tribunal de Justiça no âmbito do proc. n.º 1387/11.5TBBCL.G1.S1, de 10/10/2013 (junto como doc. 1) e pelo Tribunal da Relação de Lisboa proferido no proc. n.º 2587/10.0 TVLSB.L1-6 (cuja cópia se juntou como doc. 2) constata-se a existência da contradição sobre as mesmas questões fundamentais de direito a que alude o artigo 672.º do Código de Processo Civil que possibilita a chamada revista excepcional no caso de "dupla conforme".

  1. As questões jurídicas com solução jurisprudencialmente controvertida que justificam a admissibilidade da presente revista excepcional, subsumem-se a saber se um determinado contrato, pelas partes denominado de permuta de taxa de juros (contrato de swap); i) pode ser declarado objecto do instituto da alteração superveniente das circunstâncias prevista no artigo 437.º do Código Civil (conforme se defende no Acórdão fundamento do STJ); ii) e se o mesmo, quando meramente especulativo, pode ser declarado nulo, nomeadamente por se degradar num contrato de jogo e aposta, nos termos do artigo 1245.º do Código Civil (conforme se preconiza no Acórdão fundamento do TRL).

  2. É convicção da Recorrente que o Acórdão recorrido andou mal ao não declarar a nulidade do contrato que está na génese dos presentes autos ou a sua resolução, mal se percebendo que, tendo o Tribunal a quo conhecimento da existência dos arestos que aqui se apresentam como "acórdãos fundamento", não tenha empreendido um esforço argumentativo numa lógica dialéctica quanto aos mesmos.

  3. Antes dessa questão de fundo, a Recorrente assaca ao Acórdão recorrido o vício de nulidade por omissão de pronúncia (nulidade hoje prevista na alínea d) do artigo 615.º do CPC ex vi artigo 666.º do mesmo CPC) na medida em que deixou de apreciar o pedido ínsito nas conclusões 19, 20, 21, 22 e 26 das alegações de Apelação, no sentido de que fosse aditasse um conjunto de facto ao probatório que, no seu entendimento, que mantém, deveriam ter sido levados aos factos assentes por alegados pela Autora e não impugnados pelo Réu.

  4. O Tribunal recorrido entendeu desnecessário proceder a tal ampliação sendo porém certo que os factos cuja adição ao probatório se pretende têm total e óbvia ligação às questões decididas: as conclusões 19, 20, 21 e 22 têm total e precedente relevância para a decisão da questão relativa à alteração superveniente das circunstâncias, sendo que o facto mencionado na conclusão 26 releva para a apreciação sobre a questão da natureza especulativa do contrato e a inerente nulidade que se pediu.

  5. Com efeito, foi alegado e aceite nos articulados que os prejuízos sofridos pela Autora no âmbito do contrato dos autos resultam da crise económica internacional, concretamente da descida abrupta, inesperada, anormal e imprevisível da Taxa Euribor a 3 meses que se verificou no último trimestre de 2008 e a sua manutenção em níveis extremamente baixos.

    (vide artigos 15.º, 16.º, 18.º e 19.º da p.i.), sem que as decisões a quo os tenham inseridos no probatório apesar de plenamente provado por acordo.

  6. Foi igualmente alegado e aceite que a conjuntura de 2007 (em que a taxa Euribor 3 meses oscilou entre os 3,89 % e os 4,81 %) presidiu ao espírito da celebração do contrato dos autos (vide artigos 31.º a 37.º da p.i.) 8. Foi igualmente também alegado e aceite que em 2008 a Autora teve ganhos sem qualquer expressão (vide artigo 77.º da p.i.). Neste particular, o Tribunal a quo decidiu plasmar no ponto 20 que "a autora teve ganhos em valor não apurado". Por não corresponder ao posicionamento das partes nos articulados, deverá ser revogado o ponto 20 do probatório e corrigido em conformidade com o alegado em 47 da p.i. e aceite pelo Banco Réu.

  7. Igualmente omitiu o Tribunal, apesar de aceite pelas partes, que, tal como alegado em 13.º e 61.º da p.i. e aceite pelo Réu que - a Autora registou até ao primeiro trimestre de 2012 uma perda com o contrato que ascende a 218.042,02 €.

  8. Como se disse, todos os pontos de facto salientados deveriam ter sido levados aos factos assentes, e, não o tendo feito, a primeira instância havia violado o n.º 2 do artigo 490.º do C.P.C. (hoje n.º 2 do artigo 574.º do NCPC) - norma que, de resto, igualmente foi violada pelo tribunal recorrido.

  9. No que contende com o facto inserto na conclusão 26 da apelação, e que se pretendia, e pretende, ver aditado, que o swap dos autos não tinha a função que o Banco Réu alegou como sua razão de ser, deve dar-se como provado que: ... contrato dos autos não visava convencionar sobre o risco da taxa de juro inerente a operações de financiamento celebrados entre a Autora e o Réu, antes se concluindo que o contrato celebrado entre as partes é meramente especulativo.

  10. Radica tal pedido de ampliação na medida em que, tendo o Banco Recorrido, na sua contestação, excepcionado que o contrato dos autos visava garantir a taxa de juro de um financiamento que concedera à autora Apelante - vide, entre outros, os artigos 55.º, 57.º, 58.º, 59.º, 60.º, 62.º, 69.º, 71.º, 72.º, 73.º, 77.º, 78.º...

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