Acórdão nº 47/17.8YFLSB de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelABRANTES GERALDES
Data da Resolução23 de Janeiro de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

I - AA veio impugnar contenciosamente a deliberação de 9-5-17 do PLENÁRIO do CONSELHO SUPERIOR da MAGISTRATURA sobre a inclusão no Movimento Judicial Ordinário de 2017 do lugar em que se encontrava provida como juíza de direito efectiva.

Alegou para o efeito quer se encontra colocada como juíza de direito efectiva, desde Setembro de 2000 até Setembro de 2014 nos Juízos de Pequena Instância Criminal de Lisboa, 2º Juízo, 3ª secção e, por força da reforma ocorrida em 2014, na Instância Local de Lisboa, Secção de Pequena Criminalidade – Juiz-2.

Por deliberação de 14-6-16 o Conselho Permanente do CSM atribuiu à A. a classificação de serviço de Suficiente pelo seu desempenho funcional no período compreendido entre 1-1-10 e 31-8-14 no 2º Juízo de Pequena Instância Criminal de Lisboa e, entre 1-9-14 e 31-12-14, na secção de Pequena Criminalidade da Instância Local de Lisboa – Juiz-2, da Comarca de Lisboa. Embora a recorrente entendesse que tal classificação era injusta, decidiu não reclamar nem impugnar a mesma porque em nada afectava a permanência no lugar em que estava provida como efectiva.

Considera a recorrente que: - Subjacente a tal deliberação está a violação do princípio da unicidade estatutária, na medida em que o art. 183º, nº 5, da LOSJ, integra matéria estatutária que deveria constar obrigatoriamente do EMJ; - A deliberação viola ainda o princípio da inamovibilidade dos juízes, uma vez que o EMJ não contém qualquer preceito que determine a transferência de juízes pelo facto de lhe ser atribuída uma classificação inferior à que detinham, violando também as condições necessárias à independência dos Tribunais; - Ademais, a perda do lugar em decorrência da referida deliberação equivale a uma sanção disciplinar aplicada fora de qualquer processo disciplinar; - Tal deliberação viola ainda o princípio da tutela da confiança, pois quando lhe foi atribuída a classificação de Suficiente, esta não implicava a movimentação obrigatória, a qual foi posteriormente introduzida por aquela norma.

O Conselho Superior da Magistratura respondeu no essencial da forma seguinte: a) Negou a alegada violação do princípio da unicidade estatutária, uma vez que a reserva estatutária não exige a integração de todas as norma núm único diploma, como o EMJ; b) Impugnou a alegada violação dos princípios da inamovibilidade dos juízes e da independência dos tribunais, considerando que a inamovibilidade constitucionalmente consagrada não assume a natureza de direito fundamental, seja como direito liberdade e garantia, seja como direito político, social ou económico e a garantia em causa não tem natureza absoluta, remetendo para a lei ordinária a definição das condições de transferência, suspensão, aposentação ou demissão. Assim, admite-se que a legislação infraconstitucional preveja situações de transferência, suspensão, aposentação ou demissão, excecionando o princípio geral da inamovibilidade.

A garantia de inamovibilidade mantém um substrato mínimo composto pela independência dos tribunais e, como tal, os preceitos infraconstitucionais não podem derrogar esta garantia ao ponto de pôr em causa a independência dos tribunais, só podendo ser derrogada para salvaguardar outro valor constitucional. No caso, a norma em causa esta devidamente justificada para garantia de um melhor exercício da função jurisdicional e aplicação da justiça.

  1. Contestou a alegação de que se verifica uma perda de lugar como sanção disciplinar ilegalmente aplicada, uma vez que a figura da sanção disciplinar tem um objectivo, enquadramento e tramitação procedimental próprios, que não se confunde com a situação em presença e com os efeitos da perda de requisitos. Os efeitos da aplicação do art. 183º, nº 5, da LOSJ, traduzem-se na apreciação e garantia legítima de um adequado nível de experiência e mérito do exercício da função jurisdicional, que não se confunde com a aplicação de sanções disciplinares.

  2. Impugnou que a deliberação em causa ponha em causa o princípio da tutela da confiança, esclarecendo que, na sequência da reforma do mapa judiciário introduzida pela Lei nº 62/13, de 26-8, e do movimento judicial ordinário de 2014, todos os juízes foram providos nos actuais lugares já ao abrigo da exigência de requisitos que resulta do art. 183º, nºs 1 e 2, da LOSJ. Em consequência do referido movimento, os juízes de direito titulares que não reuniam os requisitos para novo provimento no lugar que já ocupavam perderam o lugar ou foram providos a título interino.

As situações merecedoras de tutela de confiança a ponderar dizem respeito a juízes de direito que no movimento judicial ordinário de 2014, ou subsequente, detinham os requisitos para o seu provimento como titulares que entretanto perderam, na sequência de nova acção inspectiva.

Inexiste qualquer obstáculo constitucional ou infraconstitucional que impeça a aplicação imediata da lei, a tanto ensina o art. 12º, nº 2, do CC, dispondo sobre o conteúdo de relações jurídicas constituídas à partida. Por outro lado, por despacho do Exmº Vice-Presidente do CSM, de 9-1-17, foi permitida a realização de inspecções extraordinárias a todos os magistrados judiciais que tivessem perdido requisitos como consequência de notações atribuídas em data anterior a 1-1-17. Mas pese embora tal possibilidade, a recorrente, já conhecedora da nova realidade legislativa e das consequências da mesma, para as quais foi expressamente advertida, preferiu não se sujeitar a novo processo inspectivo.

Por outro lado, para que exista uma confiança digna de tutela, essa confiança tem que ser legítima, não se afigurando como tal a “certeza” invocada pela recorrente de que o seu desempenho qualitativo e quantitativo não teria consequências ao nível do lugar ocupado, sendo inadmíssivel conjecturar que um magistrado judicial poderia trabalhar menos ou de forma menos empenhada e conformar-se com a notação de Suficiente por ter a confiança de que tal não influiria no lugar ocupado.

Ademais, nunca o recorrido se pronunciou ou praticou qualquer acto que contribuísse para a alegada certeza e confiança que a recorrente alega. No passado a questão era controvertida, sendo convicção prevalecente que a perda de requisitos equivalia à perda de lugar.

Nas alegações a recorrente concluiu do seguinte modo: a) A destituição da recorrente ao abrigo do disposto no art. 183º, nº 5, da LOSJ, é ilegal e inconstitucional por violação do princípio da unicidade estatutária, porque se é certo que o EMJ, em determinadas matérias, remete para o direito subsidiário, como é o caso, por exemplo, do disposto nos arts. 69º e 131º, o mesmo já não se verifica em matéria de destituição de juízes; b) E a falta de uma tal norma remissiva não resulta de uma omissão e/ou...

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