Acórdão nº 7846/11.2TAVNG-B.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelMANUEL BRAZ
Data da Resolução15 de Fevereiro de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça: I – Por acórdão de 17/03/2016, o Supremo Tribunal de Justiça julgou o recurso interposto pelo arguido AA de decisão de 1ª instância que, operando um cúmulo jurídico de penas, o condenou na pena única de 13 anos de prisão.

O cúmulo realizado em 1ª instância englobou as penas dos processos nºs 956/11.8GAVCD, 7846/11.2TAVNG, 26/10.6GGVNG, 169/11.9PIVNG, 584/10.5GDVFR, 498/10.9PDVNG, 577/10.2PDVNG, 589/10.9GEVNG, 354/10.0GEVNG e 827/11.8PAPVZ.

Naquele acórdão, o Supremo Tribunal de Justiça teve como certo que o crime do processo nº 827/11.8PAPVZ foi praticado em 02/12/2011, como constava da descrição dos factos da decisão recorrida. Em função disso, porque esse crime teria tido lugar posteriormente ao trânsito em julgado da condenação pronunciada no processo nº 354/10.0GEVNG, sendo anterior a esse trânsito a prática dos crimes dos demais processos, excluiu do cúmulo operado em 1ª instância a pena do crime daquele processo nº 827/11.8PAPVZ, fixando, em cúmulo jurídico das penas dos processos nºs 956/11.8GAVCD, 7846/11.2TAVNG, 26/10.6GGVNG, 169/11.9PIVNG, 584/10.5GDVFR, 498/10.9PDVNG, 577/10.2PDVNG, 589/10.9GEVNG e 354/10.0GEVNG, a pena única de 7 anos de prisão.

O condenado, com o fundamento de que o crime do processo nº 827/11.8PAPVZ foi praticado, não em 02/12/2011, mas em 02/09/2011, anteriormente ao trânsito em julgado das condenações pronunciadas nos outros referidos processos, requereu, ao abrigo do artº 380º, nºs 1, alínea b), e 2, do CPP, a correcção do erro e a inclusão da pena desse processo no cúmulo jurídico.

O Supremo Tribunal de Justiça, em acórdão de 14/04/2016, reconheceu o erro respeitante à data da prática do crime do processo nº 827/11.8PAPVZ, mas recusou a alterar a decisão reclamada com a inclusão no cúmulo da pena desse processo, na consideração de que a eliminação do erro, importando modificação essencial, não era permitida pela norma da alínea b) do nº 1 do artº 380º do CPP.

No provimento de recurso de constitucionalidade interposto pelo condenado, o Tribunal Constitucional, através do acórdão nº 851/2017, de 20/12/2017, decidiu “julgar inconstitucional a norma do artigo 380º, nº 1, alínea b), do Código de Processo Penal, interpretada no sentido de «o tribunal ter deferido pedido de rectificação de erro por si cometido no acórdão rectificado, irrecorrível, no que respeita à datação do cometimento de um crime, que passou de posterior a anterior à data decisiva para a integração da respectiva condenação no concurso de crimes e no cálculo da correspondente pena única, mas ter recusado emprestar consequência prática à rectificação, através da reformulação do cúmulo», por violação dos artigos 20º, nºs 1 e 4, e 32º, nº 1, conjugados com o 18º, nº 2, da Constituição da República Portuguesa”.

Em função do juízo de inconstitucionalidade do artº 380º, nº 1, alínea b), do CPP, na interpretação que este Supremo Tribunal dele fez no acórdão de 14/04/2016, tem de fazer-se a pertinente correcção do acórdão de 17/03/2016, incluindo no cúmulo a pena do processo nº 827/11.8PAPVZ.

II – Para o efeito, profere-se nesta data novo acórdão, que substituirá o de 17/03/2016, nos termos que seguem: O tribunal de 1ª instância, após a realização da audiência a que se refere o artº 472º do CPP, com intervenção do tribunal colectivo, proferiu, em 01/12/2015, acórdão que, operando um cúmulo jurídico de penas, condenou o arguido AA, nascido em .../1992, na pena única de 13 anos de prisão.

Dessa decisão o condenado interpôs recurso directamente para o Supremo Tribunal de Justiça, concluindo a sua motivação nos termos que se transcrevem: «1. A actividade delituosa do arguido, em apreciação no cúmulo jurídico em crise, concentrou-se em surtos bem definidos: final de 2009, meados de 2010, início de 2011 e meados/finais de 2011, quando o arguido tinha entre 17 e 19 anos de idade, vivia com a mãe, companheiro desta, irmãos (entre os quais o co-arguido BB), era consumidor de estupefacientes e se fazia cúmplice de delinquentes mais velhos.

  1. Todos os crimes a considerar – excepto a condução sem habilitação legal – foram praticados contra bens patrimoniais (v.g. roubo e furto qualificado, alguns na forma tentada) e de baixo valor (máquinas e ferramentas, sucata, malas de senhora, carteiras, fios ou voltas de pescoço), inexistindo violência física assinalável ou gratuita, antes, quando esta ocorreu, foi consequência lateral de gravidade reduzida no contexto (v.g. dores resultantes do puxão de um fio ou carteira).

  2. Reflexo do supra referido é que a medida concreta das penas englobadas no cúmulo foi sempre relativamente leve, oscilando entre 4 meses no caso mais leve, 1 ano e 8 meses a 2 anos na generalidade dos casos, e 3 anos no caso mais grave, o que evidencia bem tratar-se de pequena criminalidade, não organizada, complexa ou violenta, de baixa ou mediana gravidade, de carácter esporádico.

  3. As condições pessoais, familiares, sociais e profissionais do arguido, contemporâneas e posteriores aos factos, inculcam a imagem de uma fase ou predisposição passageira do arguido (imaturidade e pluriocasionalidade que não radica na personalidade) para a prática do crime, aliás muito potenciada pela dependência das drogas, longe de uma essencial ou especial predeterminação do arguido para a prática do crime como modo de vida marginal ao sistema/sociedade.

  4. Atento o exposto e face a uma moldura com 22 anos de amplitude (de 3 a 25 anos), a pena de 13 anos de prisão afigura-se concretamente desnecessária, desadequada e desproporcional ao caso concreto, sob pena de, pela soma das demais condenações já sofridas pelo arguido por igual criminalidade pouco grave, impulsionada pelo vício de estupefacientes, na passagem da sua adolescência para a vida adulta, o mesmo acabar ficar recluído durante boa parte desta.

  5. A decisão recorrida violou o disposto nos artigos 40°, 71° e 77°, n°s 1 e 2 do Código Penal.

    Pelo exposto, deve o presente recurso merecer provimento, com a consequente revogação do Acórdão recorrido na parte respeitante à concreta medida da pena, substituindo-o por outro que proceda a uma sensível diminuição da mesma».

    Respondendo, o MP junto do tribunal recorrido defendeu a improcedência do recurso.

    Este foi admitido.

    No Supremo Tribunal de Justiça a senhora Procuradora-Geral-Adjunto emitiu parecer no sentido de ser declarada a invalidade da decisão recorrida, por enfermar da nulidade de omissão de pronúncia.

    Foi cumprido o artº 417º, nº 2, do CPP.

    Não foi requerida a realização de audiência.

    Cumpre decidir.

    Fundamentação: Consta o seguinte do acórdão recorrido (transcrição): «A.

    O arguido AA sofreu, com relevância para os presentes autos, as seguintes condenações, transitadas em julgado: No processo comum singular nº 4595/12.8TAMTS da 2ª Secção Criminal – J8, Instância Central Vila do Conde 1. No dia 10 de Agosto de 2012, no Estabelecimento Prisional do Porto, sito em Custóias, o arguido AA e mais dois presos decidiram abordar outro recluso que exerce as funções de faxina na enfermaria e retirar-lhe, levar consigo e fazer seus os objectos de valor que aquele tivesse na sua posse, e enquanto um agarrou esse funcionário pelo pescoço e o atirou ao chão, os outros dois correram para o ofendido e arrancaram-lhe o fio em ouro com medalhas em ouro e uma pulseira em ouro tudo no valor de € 850,00, objectos que os arguidos fizeram seus, não obstante saberem não serem seus e que agiam contra a vontade do seu dono, agindo de forma livre e consciente.

  6. O ofendido veio a recuperar a medalha e a pulseira.

  7. A sentença foi proferida em 27.05.2013 e transitou em julgado em 5.7.2013, tendo sido o arguido condenado pela prática de um crime de roubo p. e p pelo art. 210º, nº 1, na forma reincidente, nos termos do art. 75º e 76º do CP na pena de 2 anos e 6 meses de prisão, efectiva.

    No processo comum singular nº 498/10.9PDVNG do extinto 3º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia 1. O arguido no dia 20 de Julho de 2010 entrou na residência de CC com o propósito de se apoderar dos objectos que lá encontrasse, tendo subtraído...

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