Acórdão nº 47/07.6PAAMD-S.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Outubro de 2009

Magistrado ResponsávelSOUTO DE MOURA
Data da Resolução21 de Outubro de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: HABEAS CORPUS Decisão: INDEFERIDO Sumário : I - O crime de lenocínio do art. 169.º, n.º 1, do CP constitui “criminalidade violenta” para efeito do alargamento do prazo de prisão preventiva previsto no n.º 2 do art. 215.º do CPP, já que é punido com a pena de 6 meses a 5 anos e que não pode deixar de ser considerado um crime contra a liberdade.

II - Com a expressão liberdade e autodeterminação sexual o legislador quis contemplar à mesma os atentados à liberdade, mas desta feita centrados na área da sexualidade.

III - Como é sabido, o proxenetismo associa-se regularmente a uma limitação da liberdade de movimentos, e portanto da autonomia, das prostitutas, em troca da sua protecção. O que, assumindo uma dimensão especialmente grave, faz o agente incorrer no crime qualificado do n.º 2 do art. 169.º do CP.

IV - Não faz sentido nenhum que se considerem só os crimes contra a liberdade física como crimes violentos. Violência vem de vis, que tinha, como é sabido, o sentido de força física.

Porém, como também é por demais evidente, não só o conceito passou a abarcar a violência psicológica, como é esta que, nas nossas sociedades, mais malefícios causa. Hoje, o emprego da força física mostra-se cada vez menos necessário, até para cometer crimes.

Ainda por aí se justificaria uma equiparação de violência física a violência psicológica, para efeitos de protecção pelo sistema penal.

Decisão Texto Integral: A – PEDIDO AA, arguido preso no processo em epígrafe, da 1ª Vara Criminal de Lisboa, veio requerer a providência excepcional de HABEAS CORPUS, nos termos dos artigos 215º e 222° nº 1e 2 al. c) do CPP, com os fundamentos seguintes (transcrição): “1.º O ora recorrente foi detido e indiciado em sede de 1º Interrogatório por haver indícios dos crimes de lenocínio, auxílio à imigração ilegal e posse de arma.

  1. Encontrando-se detido, em situação de prisão preventiva, à ordem do Processo supra, desde 9 de Abril de 2008.

    Ora, 3.º tendo em conta os crimes que lhe são imputados/acusados e, sendo certo que a prisão preventiva foi-lhe aplicada com base no art.º 202 n°l al.b) do CPP, com remissão para o art° l, alínea j), do C. Penal.

  2. Nesse sentido veja-se a douta promoção do decretamento da prisão preventiva do ora arguido em sede de 1° Interrogatório, que consta afls,976 - 976v. dos autos, para o qual se remete e se dá por reproduzido para os devidos efeitos.

  3. Nesse douto despacho do Ex.mo JIC, qualifica-se o crime de lenocínio por força dos bens jurídicos pessoais envolvidos (liberdade e autodeterminação sexual enquanto bem pessoal), para assim se justificar a prisão preventiva do ora arguido), inserindo-se assim o conceito de "criminalidade violenta".

    Ora, 6º conforme o estatuído nesse artigo 1.°, alínea j) do Código P. Penal, que entende por "criminalidade violenta" "as condutas que dolosamente se dirigirem contra a vida, a integridade física ou a liberdade das pessoas e forem puníveis com pena de prisão máxima igual ou superior a 5 anos", encontrando aqui o elemento que faltava para fundamentar a prisão preventiva do ora arguido.

    Contudo, 7º no nosso modesto entendimento, parece-nos que esta interpretação extensiva do lenocínio é abusiva e não consentânea com o que o legislador quis dizer e, por isso intentou o arguido junto deste Colendo Tribunal, petição de Habeas Corpus, em Abril deste ano,,para a qual se remete e se dá por devidamente reproduzida para os devidos efeitos (extraída dos autos de Habeas Corpus n°47/07.6PAAMD-P.Sl).

    Na verdade, 8.° foi a mesma julgada improcedente mas, com um voto de vencido do Ex,mo Juiz Conselheiro Arménio Sottomayor, conforme consta da douta Decisão deste Colendo Tribunal e, para a qual se remete, dando-se por reproduzido para os devidos efeitos legais, nem que seja por sentir que encontrou eco num dos Colendos Conselheiros, que analisou isentamente e, não hesitou "interpretar e sustentar" a indignação do ora arguido.

  4. Sendo certo, que por muito se queira cair na tentação de repetir a intenção de renovar essa questão - por se achar que efectivamente não faz sentida encontrar-se preso preventivo, com base no despacho de decretamento da sua prisão preventiva - a verdade é que só afloramos a questão, por mera questão de patrocínio, mas que não passa disso, dadas as limitações legais, face ao indeferimento proferido.

    Contudo, 10.° mesmo entendimento/argumentação invocará o arguido, caso veja ressuscitada a questão da "criminalidade violenta", face ao estipulado no artº 215 n°2 do CPP, por se entender que a mesma não é consentânea com a sua situação pessoal, porque se assim for não hesitará em renovar toda a sua argumentação, com a mais valia da argumentação do Colendo Conselheiro Arménio Sottomayor, vertida no seu voto de vencido, já atrás mencionado.

  5. Agora, tendo em conta os crimes que lhe são imputados, a prisão preventiva pode prolongar-se até aos dezoito meses, conforme o estatuído no artigo 215.°, n.1, alínea d) do Código de Processo Penal, Mais, 12.° o processo supra não se revelou de excepcional complexidade, pelo menos nunca foi comunicado/notificado dessa excepção, pelo que não: foi elevado esse prazo de prisão preventiva, conforme previsto no n°3 do art°215 do CPP.

  6. Até à presente data, o processo ainda não transitou em julgado.

    Ou seja, 14º no caso vertente o ora requerente atingiu em 09.10.20009 o prazo de dezoito meses, nos termos da norma anteriormente invocada, prazo máximo permitido por lei para que um arguido esteja sujeito a prisão preventiva sem que tenha havido condenação com trânsito em julgado.

    Donde, 15.º se encontra, presentemente, em situação de prisão para além do prazo fixado pela lei, pelo que deve ser restituído à liberdade...

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