Acórdão nº 132/09.0YFLSB de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Julho de 2009

Magistrado ResponsávelMARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA
Data da Resolução02 de Julho de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA instaurou contra BB uma acção na qual pediu: que fosse declarado resolvido o contrato de cessão de exploração do estabelecimento denominado ‘Boîte CC', instalado num determinado edifício de Vila do Conde, entre ambos celebrado em 12 de Janeiro de 2002; que fosse condenado a pagar-lhe "o preço mensal devido, correspondente aos meses de Janeiro e Fevereiro de 2003, no montante de 4.104 euros", a indemnizá-lo "pelo preço vincendo, cujo montante é de 20.217 euros (...), bem como os juros vincendos até integral e efectivo pagamento", a restituir-lhe determinados equipamentos ou, se a restituição não for possível, a pagar-lhe o seu valor (11.771,63 euros); e, em geral, a indemnizá-lo por todos os prejuízos sofridos, em montante a liquidar.

Como fundamento, e em síntese, alegou que o réu não pagou as retribuições mensais de Janeiro e Fevereiro de 2003; que resolveu o contrato, tendo o réu reconhecido o seu direito à resolução e entregado a chave do estabelecimento; mas que então verificou faltar diverso equipamento que o integrava.

O réu contestou. Alegou que tinha sido acordado um contrato de arrendamento, e não de cessão de exploração; que havia sido contactado por FT e JL, cuja intervenção (bem como a de RT, mulher de FT) requereu, com vista ao trepasse do estabelecimento referido, ficando combinado que celebraria o arrendamento directamente com o autor; que, nessa convicção, pagara a FT e a JL a quantia de 59.855,75 euros e ao autor 16.808,09 euros; que assinara o contrato de cessão pensando tratar-se de arrendamento; que nessa pressuposição realizara diversos investimentos; que o contrato é anulável por erro, já que estava convencido de estar a celebrar um trespasse com os intervenientes e um arrendamento com o autor ou, se assim se não entender, por usura, pois que o autor e os intervenientes aproveitaram conscientemente a sua boa fé para obter benefícios manifestamente excessivos e injustificados; que nunca entregou as chaves do estabelecimento ao autor, este é que o impediu de o explorar, causando-lhe diversos prejuízos.

Em reconvenção, pediu que o autor e os intervenientes fossem condenados a: "

  1. Verem declarado anulado por erro sobre os motivos o documento assinado pelo Réu ou, caso assim não se entenda, anulado por usura aquele contrato; b) subsidiariamente, reconhecerem que o contrato celebrado entre aqueles e o Réu foi um contrato de trespasse e arrendamento, devendo o mesmo ser declarado nulo e em consequência o Autor e os intervenientes serem condenados a restituir o que receberam indevidamente, nomeadamente restituírem o montante de 16.808,09 euros e de 59.885,75 euros respectivamente." Pediu ainda a condenação do autor, por ter deixado de auferir rendimentos, na quantia de 22.500 €; por ter ficado privado do incentivo financeiro a que recorreu para a actividade desenvolvida naquele estabelecimento, no montante de 20.000€; "por incumprimento do contrato" com a empresa Superbock, na quantia de 5000 €; "por incumprimento do contrato" com a empresa Bacardi, na quantia de 5.000 €; pelos trabalhos executados no estabelecimento que ainda se encontram por pagar, na quantia de 4.000 € ; por danos morais, na quantia de 10.000 euros.

Por despacho de fls. 139, foi admitida a intervenção requerida.

Os intervenientes contestaram. Por entre o mais, afirmaram que a quantia de € 59.855,75 foi recebida apenas por FT, que a fez sua, e não reverteu em proveito do casal; que JL nada recebeu; e que "são totalmente alheios à factualidade subjacente aos presentes autos", alegando o réu factos "cuja inverdade bem conhece", devendo portanto ser condenado como litigante de má fé.

Por sentença de fls. 823, a acção foi julgada parcialmente procedente. O réu foi condenado a pagar ao autor "a quantia de 250 € (...) atribuída a título de indemnização equitativa pelos copos e garrafas destruídos pelo réu"; quanto ao mais, foi absolvido do pedido.

A reconvenção também procedeu em parte. Os intervenientes JL e FT foram condenados a restituir ao réu os € 59.855,75 que haviam recebido e o autor foi condenado a pagar-lhe € 11.000 por privação de rendimentos, € 20.000 por perda do incentivo financeiro, € 3.500 e € 4.500 correspondentes a contratos que ficara impedido de cumprir e € 2.500 por danos não patrimoniais.

No que toca à devolução dos € 59.855,75, a sentença fundamentou-a nas regras do enriquecimento sem causa, por considerar verificadas os respectivos pressupostos.

Por acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de fls. 930, esta sentença foi confirmada.

  1. FT e JL recorreram para o Supremo Tribunal da Justiça. O recurso foi admitido, como revista e com efeito meramente devolutivo.

    Nas alegações que apresentaram, formularam as seguintes conclusões: «A. O princípio da concentração da defesa não pode ser entendido no sentido de exigir a impugnação do que não tenha sido alegado.

    1. Sob pena de violação do princípio "quod non est in actis, non est in mundo", e de atropelo do mais elementar bom senso.

    2. Nem na contestação e respectivo pedido reconvencional, o R. alguma vez aduziu, alegou, ou peticionou o enriquecimento sem causa, como fundamento dos pedidos formulados, nem de forma directa, nem velada, e nem sequer incidentalmente.

    3. Esta omissão inviabilizou, de forma peremptória e incontornável, que os intervenientes, na sua contestação, se pronunciassem quanto a tal instituto, ou quanto a qualquer outro que, à semelhança daquele, tivesse sido omitido pelo R. na sua defesa.

    4. De acordo com o disposto no art. 473° n.° 1 do Cód. Civil, a obrigação de restituição fundada no enriquecimento sem causa exige os seguintes requisitos: a) a ocorrência de um enriquecimento b) que careça de causa justificativa c) obtido à custa de quem requer a restituição (Cfr. sumário do Douto Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 18/06/2008, in www.dgsi.pt) F. O enriquecimento sem causa não se basta pois, com a mera obtenção de uma vantagem económica - exige, ainda, a ausência de causa jurídica justificativa do incremento patrimonial, e que o mesmo tenha sido obtido à custa de outrem.

    5. A inexistência de causa justificativa da deslocação patrimonial é, pois, um facto constitutivo do direito à restituição que, de acordo com o disposto no art. 342° n.° 1 do Código Civil, onera quem dele beneficia, com a sua alegação e a prova.

    6. Acresce que, segundo as regras do "ónus probandi": a) não basta que não se prove a existência de um causa da atribuição; b) é sendo preciso convencer o tribunal da falta de causa.

      I. Neste sentido ensinam P. Lima e A. Varela, no "...

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