Acórdão nº 08A2671 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Outubro de 2008

Magistrado ResponsávelPAULO SÁ
Data da Resolução28 de Outubro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

1 Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I - AA, BB e mulher, CC, DD, EE e marido FF; GG e marido HH intentaram, a 20 de Março de 1997, no Tribunal da Comarca de Sintra, acção declarativa de condenação, com processo comum sob a forma ordinária, contra II e mulher JJ, pedindo que: a - se declare a nulidade da compra e venda de determinado imóvel, ordenando-se o cancelamento do registo efectuado a favor dos réus; b - sejam os réus condenados a indemnizá-los dos prejuízos que lhes causaram, montante a apurar no que se vier a liquidar; subsidiariamente c - seja declarada a nulidade parcial da aludida compra e venda.

Para tanto alegam, em síntese: Foram instituídos herdeiros do remanescente da herança de KK, integrando esse remanescente parte da denominada Quinta da Saúde.

A dita KK prometeu vender ao réu marido parte dessa Quinta e, falecida a KK, prontificaram-se a celebrar o contrato definitivo. Só que, sem que se apercebessem, nele foi englobado toda a Quinta da Saúde, o que tudo foi ardilosamente preparado pelo réu comprador.

Devidamente citados, contestaram os réus, arguindo a sua ilegitimidade e sustentando, em síntese, que o contrato-promessa celebrado com a KK abarcava todo o prédio denominado Quinta da Saúde e foi esse mesmo prédio que compraram aos autores, o que eles bem sabiam quando outorgaram esse contrato.

Em reconvenção pediram os RR. a condenação dos AA. como litigantes de má-fé e, para a hipótese da acção proceder, formularam pedido de condenação dos AA. a devolverem-lhes a importância de 8.000.000$00, valor pago pela compra da Quinta e ainda a indemnizá-los das benfeitorias nela efectuadas, no valor de 7.500.000$00., quantias essas acrescidas dos montantes correspondentes à desvalorização monetária.

Replicaram os autores para refutarem a argumentação dos réus.

Falecido o A. FF, procedeu-se à habilitação dos respectivos sucessores.

Foi elaborado despacho saneador e fez-se selecção da matéria de facto assente e elaborou-se a base instrutória, sem reclamações.

Procedeu-se, com estrita observância do formalismo legal, à audiência de discussão e julgamento, tendo-se respondido à matéria de facto, que foi objecto de reclamações, todas indeferidas.

A final foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, declarado nulo, em parte, o contrato de compra e venda e ordenado, nessa parte, o cancelamento do registo, tendo sido declarado prejudicado o conhecimento do pedido reconvencional.

Inconformados com o assim decidido, apelaram os réus, mas sem sucesso, porquanto o Tribunal da Relação de Lisboa julgou improcedente a apelação.

Ainda irresignados, recorreram os RR. , de revista, para o Supremo Tribunal de Justiça, imputando várias nulidades ao acórdão e continuando a pugnar pela improcedência do pedido dos autores.

O STJ decidiu que o acórdão recorrido não enferma dos vícios apontados às concretas questões apreciadas e revogou-o, para, em novo julgamento se proceder à reapreciação da prova relativamente aos pontos da matéria de facto impugnados.

A R. veio a proferir novo acórdão, no qual, negando provimento ao recurso se acordou em declarar a anulação do contrato de compra e venda, unicamente na parte em que AA, BB, DD, EE, FF, GG e HH, declaram vender ao terceiro outorgante marido, II, e este declara comprar, livre de quaisquer ónus ou encargos: a) casa de rés-do-chão, com a área de 70 m2, dependência com 70 m2 e logradouro com 100 m2, inscrita na matriz predial urbana da freguesia de Belas, sob o artigo 683; b) casa de rés-do-chão, com a área de 50 m2 e logradouro com 100 m2, inscrito na matriz predial urbana, da dita freguesia sob o artigo 684; c) casa de rés-do-chão com a área de 24 m2 e logradouro com 100 m2, inscrito na matriz predial urbana da dita freguesia, sob o artigo 685, no mais se confirmando a sentença recorrida.

De tal acórdão vieram os RR. interpor recurso de revista, recurso que foi admitido.

Os RR. apresentaram as suas alegações, formulando, em síntese, as seguintes conclusões: 1. Os AA, aqui Recorridos, AA, BB, DD, EE e GG, foram instituídos herdeiros do remanescente da herança deixada por KK, conforme testamento lavrado no 1º Cartório Notarial de Lisboa em 21/04/1988 (Doc. 1 da P.I., fls. 13 a 18).

  1. Pela Ap. ..........., foi registada a aquisição da Quinta da Saúde a favor dos AA., sem determinação de parte ou direito, por sucessão testamentária, constando da respectiva descrição nº .... a composição física da Quinta da Saúde descrita em 7.

  2. Os AA, aqui Recorridos, e os RR., aqui Recorrentes, celebraram em 22/06/1989, por Escritura Pública, lavrada pelo 17º Cartório Notarial de Lisboa, o Contrato de Compra e Venda da dita Quinta da Saúde com a composição física descrita em 7.

  3. Em Março de 1997, passados oito anos, os AA, intentaram a presente acção contra os RR., pedindo a nulidade do negócio entre eles celebrado, alegando que "Não se aperceberam, aquando da leitura da escritura, que o que estava a ser vendido, através da mesma, era toda a Quinta da Saúde" (Artigo 43º P.I.), "Por nunca antes ou depois da outorga da escritura terem tido em seu poder os documentos respeitantes à citada Quinta da Saúde (...), e que "Se de tal se tivessem apercebido, não teriam assinado a escritura (...), porque sempre ouviram a KK dizer: "que anos antes tinha vendido ao LL, três casas e respectivos logradouros" 5. E juntaram, então, uma escritura que atesta o negócio jurídico de compra e venda das ditas três casas, celebrado entre a então proprietária da Quinta da Saúde, D. KK e o seu arrendatário, Sr. LL, em 11/04/1984 (Doc. nº 1 da P.I., fls.46 a 50).

  4. Com aqueles fundamentos, os AA., pediram que se: "Declarasse a nulidade da compra e venda do imóvel denominado "Quinta da Saúde"; a condenação dos réus no pagamento aos autores de uma indemnização (a liquidar em execução de sentença), pelos prejuízos que lhes causaram; o cancelamento a favor dos réus, do imóvel "Quinta da Saúde" ou, em alternativa, a declaração de nulidade parcial da compra e venda do mesmo imóvel 7. Foi proferida sentença que julgou parcialmente procedente a acção, declarando parcialmente nulo, por venda a non domino, o negócio celebrado entre os AA e os RR.

  5. Os Recorrentes interpuseram Recurso de Apelação, mas o Tribunal Recorrido, sustentando, embora, que na presente acção estava em causa a anulação do negócio jurídico celebrado entre os AA e os RR, com fundamento em erro simples, negou provimento ao Recurso dos Apelantes pelo que estes, não resignados, interpuseram recurso para o S.T.J.

  6. Por acórdão proferido em 8.11.2008, o Supremo Tribunal de Justiça conheceu apenas parcialmente o objecto do Recurso intentado pelos RR porquanto conheceu apenas do Recurso sobre a Matéria de Facto, tendo revogado nesta sede o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, ordenando a baixa dos Autos àquele Tribunal para que efectue a reapreciação da prova produzida relativamente aos pontos da Matéria de Facto impugnados por via do Recurso.

  7. Dos vícios apontados à Sentença de 1.ª Instancia, o Supremo Tribunal de Justiça pronunciou-se apenas e tão só sobre a invocada falta de fundamentação da decisão sobre a matéria de facto, não conhecendo as demais questões de Direito suscitadas naquele Recurso, prejudicadas pela decisão de Revogar o Acórdão no que se referia ao Recurso sobre a Matéria de facto.

  8. Proferido novo Acórdão pelo Tribunal da Relação de Lisboa, no qual é efectuada a reapreciação da prova produzida relativamente aos pontos da matéria de facto impugnada pelos RR no seu Recurso de Apelação, mantendo na integra a decisão proferida sobre as questões de Direito suscitadas.

    1. Da Nulidade do Negócio Jurídico celebrado entre a D. KK e o Sr. LL 12. O Tribunal Recorrido não se pronunciou sobre a arguida nulidade do negócio jurídico celebrado entre a D. KK e o Sr. LL, em virtude do mesmo contrariar as regras sobre fraccionamento da propriedade, nomeadamente o disposto no artigo 27º do D.Lei 289/73, de 6 de Junho.

  9. Nos termos do DL. 289/73, a operação de fraccionamento do prédio misto ........, designado por Quinta da Saúde, só podia ser levada a cabo se da escritura de compra e venda constasse o número do alvará de loteamento ou, em alternativa, a certidão camarária que a isentasse do mesmo.

  10. Da Escritura de Compra e Venda celebrada entre a D. KK e o Sr. LL não consta o número de alvará de loteamento nem a menção a qualquer certidão camarária que a isentasse de mesmo.

  11. A omissão daqueles elementos na referida escritura desencadeou o efeito previsto no nº 2 do artigo 27º do D. L. 289/73, e nesse sentido se tem pronunciado este Tribunal assim como o Conselho Técnico da DGRN (cfr. Ac. STJ de 08-03- 77, 11-04-78, 30-05-78, 02-02--93, in www.dgsi.pt e Pareceres Técnicos da DGRN Proc. nº 80/90.R.P.4 e Proc. nº 85/96R.P.4. in www.dcirn.mj.pt e Ac. TRL de 02-02-93, CJ, ano 1, tomo 1, pp. 110/111).

  12. Na sequência da violação daquelas regras sobre fraccionamento da propriedade, o Sr. LL não pode registar as três casas em seu nome, sendo pouco verosímil que se tenha "esquecido", até porque, à data da celebração da Escritura de Compra e Venda das ditas casas, era ainda obrigatório submeter a registo todos os factos a ele sujeitos, "...quando incidam sobre prédios rústicos, urbanos ou mistos, situados nos concelhos onde esteja em vigor o cadastro geométrico da propriedade rústica" nos termos do previsto no artigo 14º do DL. 47611, de 28 de Março de 1967.

  13. Confrontado com o efeito previsto no nº 2 do artigo 270 do DL. 289/73, ou seja, com a proibição de efectuar o registo das casas em seu nome, infere-se dos acontecimentos subsequentes, que o Sr. LL e a D. KK, acordaram num distrate do negócio, face à impossibilidade de desanexar as casas senão através dum processo de loteamento.

  14. Distrate que explica e fundamenta o facto da D. KK ter mantido na sua posse todos os documentos relativos àquelas casas, e ter continuando a pagar sempre os respectivos impostos até à sua morte, conforme se alcança de...

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