Acórdão nº 08S1900 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Outubro de 2008
Magistrado Responsável | BRAVO SERRA |
Data da Resolução | 22 de Outubro de 2008 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
I 1.
No Tribunal do Trabalho de Lisboa instaurou AA contra BB Portugal - Serviços Gerais de Limpeza, Ldª, e CC - Limpezas e Serviços, Ldª, acção de processo comum, solicitando a condenação da ré CC a "dar ocupação efectiva à A. na prestação de serviços de limpeza à empresa DD, nas instalações do Edifício ..., em Porto Salvo", e ser essa ré condenada a pagar-lhe as retribuições já vencidas, no montante de € 965, e as vincendas "até efectiva reintegração, incluindo as actualizações salariais verificadas no CCT", além de juros.
Mais peticionou, no caso de assim não ser entendido e vir a ser decidido "que não é aplicável a cláusula 17ª do C.C.T. para as empresas prestadoras de serviços de limpeza", a condenação da ré BB nos termos pedidos em relação à ré CC.
Aduziu, em síntese: - - que as rés são empresas que se dedicam à prestação de serviços de limpeza a terceiros, utilizando, nessa actividade, trabalhadores dos seus quadros de pessoal, os quais exercem as suas funções nas instalações dos recebedores desses serviços; - as relações contratuais entre as empresas prestadoras de serviços e os seus trabalhadores regem-se pelo contrato colectivo de trabalho publicado nos Boletins do Trabalho e Emprego números 8, de 28 de Fevereiro de 1996, 7, de 22 de Fevereiro de 1997, 9, de 8 de Março de 1998, 8, de 29 de Fevereiro de 2000, 7, de 22 de Fevereiro de 2001, 9, de 8 de Março de 2002, e 9, de 8 de Março de 2003, cuja aplicação foi tornada extensiva a todo o sector pelas Portarias de Extensão publicadas naqueles Boletins, nº 26, de 15 de Julho de 1996, 25, de 8 de Julho de 1997, 29, de 8 de Agosto de 1998, 1, de 6 de Janeiro de 2000, 23, de 29 de Agosto de 2001, 22, de 15 de Junho de 2002, 21, de 8 de Junho de 2003, e 12, de 29 de Março de 2004; - a cláusula 17ª de tal contrato colectivo contém normação idêntica à prevista no artº 318º do Código do Trabalho, prevendo a manutenção dos contratos de trabalho com a empresa que suceder na execução da empreitada de limpeza; - a autora, sócia do Sindicato dos Trabalhadores de Serviços de Portaria, Vigilância, Limpeza, Domésticas e Actividades Diversas, foi admitida ao serviço da ré BB em 3 de Janeiro de 2005, auferindo o vencimento base de € 188,76, acrescidos de € 14,96 de subsídio de alimentação e € 19,98, a título de horas nocturnas, tendo, como local de trabalho, as instalações da empresa DD, sitas no ...., Oeiras, de acordo com o contrato de prestação de serviço firmado entre esta e aquela ré; - a ré BB cessou a prestação de serviço à DD em 20 de Novembro de 2005, passando esse serviço, em 21 dos mesmos mês e ano, a ser prestados pela ré CC; - muito embora esta ré CC devesse ter mantido a autora ao seu serviço, o que é certo é que o não fez, tendo alegado que o local de trabalho deixara de ser o mesmo, já que, naquela data de 21 de Novembro de 2005, a DD mudara as suas instalações para o Edifício ..., em Porto Salvo, tendo a ré BB, por seu turno, invocado que a autora passara a ser trabalhadora da ré CC; - a autora encontra-se sem trabalhar e sem retribuição desde 21 de Novembro de 2001; - o conceito de local de trabalho não pode ser entendido como o espaço fixo onde o labor é executado, antes devendo sê-lo como estando ligado ao conceito de estabelecimento; - se, porém, for perfilhado diverso entendimento, então a ré BBdeve ser condenada a manter a autora ao seu serviço.
Contestou a ré CC, impugnando parte da factualidade invocada pela autora, defendendo que o serviço que veio a prestar à DD não se processou no mesmo local de trabalho onde, anteriormente, a autora exercia as suas funções, local esse que continua ocupado, aí se continuando a fazer limpezas, e impugnando ainda o valor da causa.
Igualmente a ré BBveio a apresentar contestação, sustentando, em súmula, que tão-somente deveria proceder o pedido principal, já que a DD lhe comunicara em Novembro de 2005 que a relação de prestação de serviço entre ambas firmada iria terminar, pois que a execução da limpeza da segunda iria ser assegurada por outra empresa, a CC, a quem a BBcomunicou a relação dos trabalhadores que, nas instalações da DD, prestavam funções de limpeza. Ainda invocou a ré BBque, se porventura viesse a ser entendido que à autora assistia o direito de ver mantido o seu contrato de trabalho firmado com a contestante, então tal contrato teria terminado em 3 de Janeiro de 2006, pelo que os montantes a pagar por ela teriam de ser calculados até essa data, nos termos do artº 440º do Código do Trabalho.
Em 20 de Outubro de 2006 foi indeferido o incidente de impugnação do valor da causa - vindo a ela a ser conferido o de € 15.901,95 -, foi proferido despacho saneador e elaboradas a matéria assente e base instrutória, vindo estas a ser objecto de reclamação, em parte atendida.
Por sentença de 20 de Abril de 2007, foi decidida a absolvição do pedido a ré CC e a condenação da ré BB a dar ocupação efectiva à autora e a pagar-lhe as retribuições, vencidas e vincendas até ocorrer essa ocupação, incluindo actualizações salariais, acrescidas de juros.
Inconformada, apelou a ré BBpara o Tribunal da Relação de Lisboa.
Este Tribunal de 2ª instância, por acórdão de 23 de Março de 2008, negou provimento ao recurso.
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Mantendo-se irresignada, pediu a ré BB revista, rematando a alegação adrede produzida com o seguinte quadro conclusivo: - "1. Ao caso dos autos é aplicável o CCT das Empresas de Limpeza, na versão publicada no BTE, 1ª Série, n.º 12, de 29.03.2004 (alteração salarial e outras e texto consolidado), objecto de Portaria de Extensão publicada no BTE, 1ª Série, n.º 17, de 08.05.2005, sendo discutida a aplicação, ou a não aplicação, do disposto na sua cláusula 17ª.
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Em termos literais, resulta dessa cláusula que os trabalhadores serão ‘transferidos' para a nova entidade se se verificar uma perda de local de trabalho por parte da entidade patronal, só sendo transferidos os trabalhadores que aí prestem normalmente serviço, conforme o disposto no n.º 4 da cláusula em análise.
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Para haver ‘transferência' não se pressupõe, ou se estabelece como requisito, que a nova entidade continue a prestar serviços no mesmo local, nem que o trabalhador tenha, ou mantenha, como local de trabalho as instalações do cliente onde os serviços de limpeza são prestados.
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Desta forma deve admitir-se que o n.º 2 da cláusula em análise é ainda aplicável, atenta a sua letra, nos casos em que os serviços de limpeza passam a ser prestados em outro local por outra empresa por a empresa beneficiária desses serviços ter também mudado de instalações, como é o caso dos autos.
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Dito de outro modo, o que está em causa é a ‘transferência' de um negócio para outra empresa, independentemente de ser continuado no mesmo local ou em outro local. Ocorrendo ‘transferência' do negócio, transferem-se igualmente os trabalhadores afectos a esse negócio para a nova entidade (nas condições do n.º 4 da cláusula 17ª), que continuarão a desempenhar o mesmo trabalho.
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Tal interpretação está em absoluta consonância com os fins que são visados na referida cláusula: o de garantir a estabilidade de emprego, com manutenção dos direitos dos trabalhadores, o de acautelar os interesses do ‘cessionário' porque assim se evita qualquer interrupção nos serviços, e o de contribuir para a viabilidade económica das empresas que perdem o serviço e/ou o cliente. Tal é igualmente a melhor interpretação face ao disposto no Art.º 318º do Código do Trabalho.
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O entendimento sufragado no Acórdão recorrido não tem, pois, qualquer apoio, quer na letra quer no espírito, da cláusula 17[ª] do CCT das Empresas de Limpeza. Aliás, a solução defendida no Acórdão recorrido constitui uma interpretação restritiva dessa cláusula, sem qualquer justificação, uma vez que nada permite concluir que as partes outorgantes desse CCT disseram, relativamente à cláusula em questão, mais do que o que pretendiam (Art.º 9º do Código Civil).
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Face à interpretação do Acórdão recorrido - de que o que se protege é a prestação em determinado espaço físico ‘local de trabalho' -, tal levaria a considerar que a cláusula em análise não seria aplicável nos casos em que a empresa beneficiária dos serviços muda de instalações dentro de um mesmo edifício (para os escritórios da porta ao lado, ou para andar diferente), o que contraria abertamente, desde logo, os fins visados pela referida norma, permitindo-se as mais diversas fraudes.
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Verificando-se, no caso dos autos, que à Recorrida CC foi adjudicada a limpeza das instalações da DD situadas no Edifício ..., Quinta ...., Porto Salvo, onde começou a fazer limpezas em 21 de Novembro de 2005, por nessa data a DD também ter mudado de instalações, do .... - Oeiras, para o Edifício ..., Quinta ...., Porto Salvo, e que no início do mês Novembro de 2005, a DD e a Recorrente fizeram cessar a relação de prestação de serviços entre ambas com efeitos a partir do dia 21 de Novembro de 2005, dado que passaria a ser outra empresa a assegurar a limpeza das novas instalações, nenhuma dúvida pode existir que no caso dos autos é aplicável o disposto na cláusula 17ª do CCT das Empresas de Limpeza.
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