Acórdão nº 08B2654 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Outubro de 2008

Magistrado ResponsávelSALVADOR DA COSTA
Data da Resolução02 de Outubro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I AA - com o benefício do apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo, e de patrocínio judiciário assumido pela advogada M... J... C... - intentou, no dia 7 de Outubro de 2003, contra BB, o Hospital A... S..., S... G..., SA, CC, DD, EE e I... B...-C... de S..., SA, pedindo a sua condenação no pagamento de € 31.033,50 e juros de mora, com fundamento em danos patrimoniais e não patrimoniais derivados do decesso de seu pai, FF, no erro de diagnóstico médico e no contrato de seguro celebrado com a última ré, e todos eles, salvo a primeira, apresentaram instrumento de contestação.

O Hospital A... S..., SA invocou a prescrição do direito de crédito invocado pelo autor, a nulidade do processo por virtude de aquele não ter provado o seu parentesco com o falecido, e a impossibilidade de se defender por a matéria de facto controvertida respeitar à intimidade da vida privada.

CC afirmou a ilegitimidade do autor, por não ter comprovado ser o único titular do eventual direito à indemnização, o diagnóstico de quadro abdominal de FF não agudo ou complicação motivada pela diabetes, por virtude de estar vigil, eupneico, lúcido, sem vómitos, ter sido pedido o RX do abdómen para excluir alguns tipos de patologias, serem os exames complementares de diagnóstico solicitados adequados à necessidade de esclarecimento do quadro abdominal e de possíveis complicações das patologias coexistentes.

DD afirmou, por seu turno, não ser o vómito fecalóide causa de morte, não terem os exames a FF revelado a sua oclusão intestinal, serem as medidas prescritas adequadas, não ser previsível, face aos resultados dos exames, o agravamento do seu estado clínico, ser a sua situação urgente mas não emergente, por virtude de o diagnóstico ser a obstrução e não a oclusão.

EE alegou a prescrição do direito à indemnização, não ter o médico radiologista de estar presente no exame radiológico, mas apenas disponível para a interpretação de imagens, e não lhe poder ser imputada responsabilidade pelo atraso na sua realização.

I... B... SA invocou a prescrição e ter-se CC limitado na sua intervenção a procedimentos adequados à situação clínica do doente.

No despacho saneador foram julgadas improcedentes as excepções dilatórias de nulidade do processo por falta de prova do parentesco do autor com o falecido, da ilegitimidade do autor e a peremptória da prescrição, e o autor desistiu do pedido formulado contra a ré BB.

Seleccionada a matéria de facto e realizado o julgamento, foi proferida sentença, no dia 7 de Outubro de 2003, por via da qual os réus foram absolvidos do pedido.

Apelou o autor, e a Relação, por acórdão proferido no dia 24 de Janeiro de 2008, negou-lhe provimento ao recurso.

Interpôs o apelante recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões - tendo o médico que subscreveu o certificado de óbito indicado a causa da morte é de concluir não ter tido dúvidas sobre ela; - no âmbito do registo civil, o certificado de óbito faz prova plena dos factos nele contidos, designadamente a causa da morte, certo que a prova derivada do registo não pode ser ilidida por outra, salvo nas acções de estado ou de registo; - por razões de certeza jurídica, não pode o certificado de óbito ter força probatória plena para uns efeitos e não para outros, como a causa da morte a que se refere, não sendo cindível a verdade do documento; - os pontos terceiro a quinto da base instrutória deveriam ter sido julgados provados com base na prova plena derivada do certificado de óbito; - os documentos revelam dever ter sido feito um exame mais completo a FF, nomeadamente através do toque rectal e equacionado o diagnóstico presuntivo de oclusão intestinal e ter requisitado, com urgência, os meios complementares de diagnóstico, certo que CC suspeitou de tal oclusão, e não o foi; - deveriam ter sido considerados provados os quesitos 11º e 15, e não provados os quesitos 51º, 55º, 65º e 66º; - verifica-se a prática de actos ilícitos e culposos pelos recorridos CC, DD e o Hospital, que foram causais da morte de FF; - ao não considerar o certificado de óbito de FF documento autêntico, o acórdão violou o disposto nos artigos 371º e 372º, e, no restante, infringiu os artigos 483º e 487º, todos do Código Civil, pelo que deve ser revogado e declarada a responsabilidade dos recorridos pela morte em causa.

Respondeu I...-B...-C... de S..., SA, em síntese de conclusão: - a causa da morte consubstancia prognose póstuma e é insusceptível, por se tratar de matéria de facto, de alteração no recurso; - no recurso de revista não pode alterar-se a resposta aos quesitos indicados pelo recorrente, por ela ter assentado em prova testemunhal e documental de livre apreciação pelo tribunal; - o certificado de óbito não é documento autêntico porque o juízo pessoal de valor do documentador, incluindo a causa da morte, não é abrangido pela sua força probatória, ficando sujeito à livre apreciação do tribunal; - ele não preenche os requisitos dos documentos autênticos a que se reporta o artigo 369º do Código Civil, pelo que não faz prova plena da causa da morte de FF.

- a aspiração do vómito no circunstancialismo de consciência em que o doente se encontrava, não era previsível, e não foi excessivo o tempo de realização dos exames; - não foi praticado algum acto ilícito culposo por parte dos recorridos CC, DD ou pelo Hospital.

Respondeu, por seu turno, DD, em síntese de conclusão: - a causa da morte de FF referida no certificado de óbito é mero juízo pessoal do documentador, sujeito à livre apreciação do tribunal; - ele não preenche os requisitos do artigo 369º do Código Civil, pelo que não pode ser considerado documento autêntico; - as declarações nele inseridas não fazem prova plena, podendo ser impugnadas, cabendo ao recorrente produzir a sua prova; - trata-se de paciente com antecedentes clínicos e patologia associados importantes e variados, e ignora-se a patologia que desencadeou o processo e a causa da morte; - no recurso de revista não pode alterar-se a resposta aos quesitos indicados pelo recorrente, por ela ter assentado em prova testemunhal e documental de livre apreciação pelo tribunal; - actuou com respeito pelas legis artis, não praticou facto ilícito culposo, pelo que não se verificam quanto a si os pressupostos da responsabilidade civil.

A advogada M... J... C... pediu escusa de patrocínio, pedido não decidido antes da apresentação das alegações de recurso.

II É a seguinte a factualidade considerada provada no acórdão recorrido, inserida por ordem lógica e cronológica: 1. Representantes do Hospital A... S..., S... G..., SA, por um lado, e da I... B...-C... de S..., SA, declaram por escrito, consubstanciado na apólice nº ..., esta última assumir, mediante prémio a pagar pela primeira, a sua responsabilidade por danos patrimoniais e não patrimoniais resultantes de lesões corporais e ou materiais causados a terceiros pela exploração do Hospital Professor Doutor F... da F....

  1. O Hospital Professor Doutor F... da F... foi entregue, com base em contrato de gestão, ao Hospital A... S..., S.... G..., SA.

  2. FF nasceu no dia 26 de Março de 1926, filho de Á... L... D... e de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT