Acórdão nº 08S718 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Outubro de 2008

Magistrado ResponsávelVASQUES DINIS
Data da Resolução01 de Outubro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

I 1. AA intentou, em 19 de Maio de 2004, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, a presente acção declarativa de condenação, sob a forma comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra Banco BB, SA, pedindo que seja declarada a nulidade do seu despedimento e, em consequência, o Réu condenado: i) a reintegrá-lo no seu posto de trabalho, com a categoria, antiguidade e retribuição que teria se não tivesse sido despedido; ii) a pagar-lhe as retribuições já vencidas desde a data do despedimento, no valor de € 7.009,08, acrescidas de juros de mora à taxa legal, até integral pagamento e que perfazem € 35,05; iii) a pagar-lhe as prestações pecuniárias vincendas, relativas às retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até à sentença, acrescidas de juros à taxa legal desde o vencimento de cada uma dessas importâncias; iv) a pagar-lhe o correspondente valor compensatório, relativo às contribuições para a segurança social, a apurar em liquidação de sentença, v) e a pagar-lhe, a título de danos não patrimoniais, a quantia de € 10.000,00, acrescida de juros vincendos à taxa legal.

Alegou, em síntese, que: - É trabalhador do Banco Réu, desempenhando ultimamente - até 10 de Dezembro de 2002 -, as funções de subgerente, na agência de Solum, em Coimbra; - Em 10 de Fevereiro de 2004, recebeu do Réu a comunicação de despedimento, fundado em o Autor ter dado 115 faltas não justificadas, no período de 11 de Dezembro de 2002 a 30 de Maio de 2003; - Em 10 de Dezembro de 2002, o Autor foi detido preventivamente no âmbito de um processo-crime, detenção essa que o colheu completamente de surpresa pois se considerava - e considera - inocente das imputações que lhe foram dirigidas; - Na data da detenção, responsáveis do Banco Réu ficaram cientes dessa situação, tanto mais que a mesma foi do conhecimento da comunidade bancária de Coimbra, pelo que é de considerar que cumpriu a obrigação de comunicar (ao Réu) as suas faltas previsíveis, bem como o fundamento das mesmas; - Porém, por despacho de 10 de Janeiro de 2003, o Réu instaurou-lhe processo disciplinar, em cuja nota de culpa veio a imputar-lhe falta de comparência ao serviço, nos períodos compreendidos entre 11 de Dezembro de 2002 e 27 de Dezembro de 2002 e entre 28 de Dezembro de 2002 e 5 de Fevereiro de 2003, sem que tivesse justificado a ausência, ao mesmo tempo que o suspendeu preventivamente de funções; - Respondeu à nota de culpa, demonstrando ter comunicado ao Réu a detenção preventiva; - Apesar de se encontrar suspenso preventivamente desde Fevereiro de 2003, o Réu, desde Novembro de 2002 (parcialmente) deixou de lhe pagar a retribuição, pelo que intentou, em 19 de Novembro de 2003, uma acção judicial com vista a obter esse pagamento; - Encontrando-se detido preventivamente à ordem de um processo-crime, não é possível qualificar as faltas daí resultantes como injustificadas, pelo que a decisão de despedimento, tendo em conta o momento da prolação, é extemporânea e carece de fundamento legal, não podendo a mesma ser proferida sob condição resolutiva (condenação, com trânsito em julgado, do autor no âmbito do processo-crime); - A decisão de despedimento viola a presunção de inocência consagrada no n.º 2 do art. 32.º da Lei Fundamental; - A conduta do Réu, ao promover o ilegal despedimento do Autor, provocou-lhe grande sofrimento, angústia e perturbação emocional que justificam reparação.

Contestou o Réu, por excepção e por impugnação: por excepção, alegando a existência de litispendência quanto ao pedido de indemnização por danos não patrimoniais, uma vez que corria termos no 3.º Juízo, 3.ª Secção, do Tribunal do Trabalho de Lisboa, um processo (n.º 0000000) em que o Autor formulava, com a mesma causa de pedir, idêntico pedido; por impugnação, sustentando que o Autor não lhe comunicou a ausência ao trabalho, donde a existência de faltas injustificadas por parte do mesmo, que, por sua vez, justificaram a aplicação da sanção de despedimento com justa causa, ficando, todavia, a sua eficácia dependente da decisão, com trânsito em julgado, que vier a ser proferida no processo-crime em curso contra o Autor, motivo por que a presunção de inocência não foi afectada.

Acrescenta que a conduta do Autor é grave, uma vez que a vítima dos actos por ele praticados era cliente do Banco, e, daí, a impossibilidade de manutenção da relação laboral.

Conclui, por isso, pela improcedência da acção.

Houve resposta do Autor, a pugnar pela improcedência da excepção dilatória de litispendência.

Proferido despacho a decretar a suspensão da instância até ao trânsito em julgado da decisão a ser proferida no aludido Processo n.º 0000000, 3.º Juízo, 3.ª Secção do Tribunal do Trabalho de Lisboa, dele interpôs o Autor recurso, admitido como agravo, com subida imediata e efeito suspensivo, ao qual o Tribunal da Relação de Lisboa veio a conceder provimento, ordenando, em consequência, o prosseguimento dos autos.

No despacho saneador, foi julgada improcedente a excepção (dilatória) de litispendência, tendo sido elaborada a condensação, com a fixação dos factos assentes e a organização da base instrutória, sem reclamação das partes.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, no decurso da qual o Autor optou pela indemnização de antiguidade em substituição da reintegração, veio a ser proferida sentença que, julgando improcedente a acção, absolveu o Banco Réu dos pedidos.

  1. O Autor apelou e, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa confirmado a decisão da 1.ª instância, interpôs do respectivo acórdão o presente recurso de revista, que veio a motivar, mediante peça alegatória que rematou com as conclusões assim redigidas: 1 - A douta sentença da 1.ª Instância é nula, nos termos do primeiro segmento da alínea d) do n.º 1 do art. 668.º do CPC, por omissão de pronúncia, porquanto não apreciou, nem se pronunciou, sobre o número concreto de faltas que sustentam a apreciação da licitude do despedimento.

    2 - Pelo Tribunal da 1.ª Instância nada foi decidido sobre esta matéria, apenas se limitando a considerar a violação do dever de assiduidade.

    3 - Ao decidir não dando provimento à requerida nulidade o douto acórdão recorrido violou, por errada interpretação o primeiro segmento da alínea d) do n.º 1 do art. 668.º do CPC.

    4 - O Recorrido decidiu proceder ao despedimento por considerar existirem 115 faltas injustificadas do Recorrente, no período de 11 de Dezembro de 2002 a 30 de Maio de 2003.

    5 - Decorre dos autos que existiram apenas as 38 faltas ocorridas antes da suspensão preventiva decretada pelo Banco Recorrido, sendo que apenas essas ausências podem ser consideradas como faltas.

    6 - Mesmo que assim não se entenda, então, verificava-se uma situação de suspensão do contrato de trabalho por impedimento respeitante ao trabalhador, prevista no Dec. Lei n.º 874/76, de 28/12; 7 - A determinação do número de faltas é relevante para a apreciação da justa causa de despedimento; 8 - Na decisão de despedimento proferida pelo Banco Recorrido este considerou que as faltas dadas ao serviço pelo Recorrente estão directamente relacionadas com o facto de se encontrar preso preventivamente à ordem do processo-crime em que era arguido.

    9 - Assim, os efeitos da decisão de despedimento não podiam de deixar de estar dependentes da decisão final, com trânsito em julgado, que vier a ser proferida no processo-crime.

    10 - O despedimento foi comunicado por carta de 3/02/2004 e relatório final, de 9/12/2003, anexo à mesma, e recebida pelo Recorrente em 10/02/2004.

    11 - Nessa data em que o Recorrido tomou conhecimento do despedimento não existia trânsito em julgado do acórdão condenatório, nem sequer julgamento na 1.ª Instância, no processo-crime à ordem do qual o Recorrente se encontrava detido preventivamente, 11[-A] (1) - O despedimento é um acto unilateral e receptício, produzindo o seu efeito próprio - a extinção da relação laboral - a partir do momento em que chega ao conhecimento do trabalhador, seu destinatário; 12 - As faltas ao trabalho motivadas por prisão preventiva são justificadas se à data do despedimento ainda não existir decisão condenatória com trânsito em julgado no processo-crime.

    13 - Não se pode considerar o trabalhador culpado em sede do processo disciplinar (quanto às faltas) sem que a sua culpa (mormente no processo-crime) se encontre provada e decretada por sentença que não seja passível de recurso.

    14 - A sentença condenatória proferida no processo-crime, em data posterior ao despedimento, não releva para efeitos de não justificação daquelas faltas.

    15 - A justa causa tem de ser apreciada com referência à data da decisão de despedimento, pois só os factos contidos naquela decisão podem ser invocados em tribunal (artigo 12.º n.º 4 do DL 64-A/89, de 27/02).

    16 - Nesta medida, o trânsito em julgado da condenação em sede de processo-crime tornou-se irrelevante, face à conduta do Recorrente e à decisão por este [sic] proferida, no seu conteúdo e no tempo em que foi proferida.

    17 - No caso vertente, estamos perante um despedimento sujeito a uma condição uma vez que o Recorrido condiciona a um acontecimento futuro e incerto a produção de efeitos da sua declaração de despedimento.

    18 - Sendo que as normas do Dec. Lei n.º 64-A/89, de 27/02, são de natureza imperativa, nos termos do respectivo do art. 2.º.

    19 - Porém, verificando-se que o despedimento nasce logo que a respectiva declaração chega ao conhecimento do destinatário não pode ser admissível a aposição de condição suspensiva - ou de qualquer outra.

    20 - O Recorrido instaurou um processo disciplinar ao Recorrente [o] que fez no prazo legal, pelo que a caducidade do procedimento disciplinar não está em causa, nem é questionada nos presentes autos.

    21 - Nos termos do n.º 11 do art. 10.º do DL 64-A/89, de 27/02, a comunicação da nota de culpa suspende o decurso do prazo estabelecido no n.º 1 do art. 31.º do RJCIT, aprovado pelo DL n.º 49 408, de 24/11/1969.

    22 - A lei aplicável ao autos determina uma suspensão do prazo (nos termos...

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