Acórdão nº 08P2491 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Setembro de 2008
Magistrado Responsável | HENRIQUES GASPAR |
Data da Resolução | 16 de Setembro de 2008 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: 1. No Processo Comum (Tribunal Colectivo) n.º 358/04.2GDSNT, da 2.ª Vara de Competência Mista do Tribunal Judicial de Sintra, na sequência de acusação do Ministério Público os arguidos, AA, BB e CC foram pronunciados pela prática dos seguintes crimes: - o arguido AA: um crime de homicídio qualificado, p. p. pelos arts. 131º e 132º, n.º 1 e 2, al. d), g) e h) do Código Penal e outro de detenção de arma proibida, p. e p. pelo o previsto no art.º 6º da Lei 22/97 de 27/06.
- o arguido BB: um crime de ofensa corporal simples, p. e p. pelo art. 143º/nº1 do Código Penal.
- o arguido CC: um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelo art. 146º /nº1 e 2 do Código Penal, com referência ao disposto no art. 132º, nº 2, al. b), d), g) e h) do mesmo diploma.
-
Os assistentes FC e JL, representados pela sua mãe FS e DL, também assistente, representada pela sua mãe VP deduziram contra: - AA, e CC, o pedido de indemnização civil, no qual formulam os seguintes pedidos: a) a condenação do demandado AA a pagar aos demandantes civis a uma indemnização por danos não patrimoniais no valor total de € 145.000 sendo: - dano morte - € 75.000 - dos demandantes cíveis - € 70.000 b) a condenação do demandado civil AA a pagar, a titulo de danos patrimoniais, aos demandantes a quantia total de € 353.835, sendo que € 150.000 se reportam a danos patrimoniais futuros e as seguintes quantias ao sustento dos demandados conforme se descrimina: - ao demandante FC- € 46.835 - ao demandante JL - € 129.000 - à demandante DL - € 28.000 c) a condenação dos demandados AA e CC no pagamento aos demandantes cíveis da quantia de € 25.000 a título de danos não patrimoniais sofridos pela vítima JL, tudo acrescido de juros à taxa legal a partir do momento da notificação para os demandados civis contestarem, até integral pagamento.
O assistente FC, representado pela sua mãe FS, veio também deduzir pedido cível contra: - BB, pedindo o pagamento de uma indemnização de € 15.000 pelas dores sofridas, bem como do trauma causado em consequência directa da agressão de que foi vítima.
-
O tribunal colectivo julgou parcialmente procedente a matéria de acusação e parcialmente procedente o pedido cível e, em consequência, decidiu: A) Absolver o arguido BB da prática do crime que lhe era imputado, bem como do pedido cível contra si deduzido B) Condenar o arguido AA, como autor de um crime de homicídio qualificado, na forma consumada, p. e p. pelos artº 131º e 132º nº 1 e 2 al. d), [parte final], g) e h) [parte final] do Código Penal na pena de quinze anos de prisão; e, em concurso real, como autor de um crime de detenção ilegal de arma p. e p. pelos artº 6º com referência aos artº 1º e 2º todos da Lei 22/97 de 27/06, na pena de doze meses de prisão.
-
Efectuar o cúmulo jurídico das penas parcelares referidas em B) nos termos do artº 77º do Código Penal e condenar o arguido AA, na pena única de quinze anos e quatro meses de prisão.
-
Condenar o arguido CC como autor de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelo artº 146º nº 1 e 2, com referência aos artº 143º nº 1 e 132º nº 2 al. b), d), g) e h) todos do Código Penal, na pena de vinte meses de prisão.
-
Condenar o arguido AA no pagamento aos assistentes de 468.835 euros (quatrocentos e sessenta e oito mil oitocentos e trinta e cinco euros), a título de indemnização por danos patrimoniais e morais.
-
Condenar o arguido CC no pagamento aos assistentes de 5.000 euros (cinco mil euros) , a título de danos não patrimoniais.
-
-
Os arguidos AA e CC recorreram para o tribunal da Relação.
O tribunal de recurso concedeu provimento parcial ao recurso do arguido AA relativamente à matéria de facto, alterando, nos termos do art.º 431.º do CPP., o ponto 6 da matéria de facto que passa a ter a seguinte redacção: E concedeu provimento parcial ao recurso do Arguido CC , condenando-o como autor de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelo art.º 146.º n.º 1 e 2 , com referência aos art.º 143.º n.º 1 e 132.º n.º 2 al. b), d), g) e h) todos do Código Penal, na pena de 16 (dezasseis) meses de prisão, suspensa na execução por igual período, nos termos dos arts.º50.º e 51.º, n.º 1, al. a) do mesmo diploma, mediante a condição de entregar aos Assistentes , no prazo de seis meses a contar do trânsito da decisão, o montante de € 3.000,00, por conta da indemnização em que foi condenado.
O tribunal, no mais, manteve nos seus precisos termos a decisão recorrida.
-
Os arguidos AA e CC recorrem para o Supremo Tribunal com os fundamentos constantes das motivações que apresentam e que terminam com a formulação das seguintes conclusões: CC: 1 - O arguido, ora recorrente foi condenado pela prática, como autor de um crime de ofensa à integridade física qualificada, previsto e punível, pelo artigo 146º n° 1 e 2, com referência aos artigos 143º nº. 1 e 132. nº. 2 al. b), d), g) e h), todos do Código Penal, na pena de 20 (vinte) meses de prisão.
2 - Foi ainda condenado a pagar aos assistentes a quantia de 5.000 euros, a título de danos não patrimoniais.
3 - Não se conformado com a douta decisão. o recorrente apresentou recurso para o Tribunal da Relação, 4 - Foi proferido acórdão que julgou parcialmente procedente o recurso do recorrente, tendo a pena aplicada sido alterada para 16 meses de prisão, suspensa por igual período, mediante a condição de pagar aos assistentes, no prazo de 6 meses o montante de 3000€, por conta da indemnização em que foi condenado.
5 - O recorrente alegou que agiu em legítima defesa, uma vez que agiu para afastar um perigo que considera estar iminente, 6 - O Tribunal a quo julgou improcedente tal alegação, por entender que não foram preenchidos os requisitos da legitima defesa.
7 - O recorrente entende que se encontram preenchidos os requisitos, pois agiu para não ser agredido, e que em momento algum se apercebeu que o ofendido havia sido baleado.
8 - Ora, durante o julgamento, não foi apresentada nenhuma versão que afaste a versão do recorrente, pelo que, esta deveria de ter sido considerada, atento o Princípio do in dubio pro reo, previsto no artigo 32º. da CRP, e ter sido o recorrente absolvido do crime de que vinha acusado.
9 - Violou assim o Tribunal a quo o artigo 32° da CRP.
10 - Da matéria de facto provada, consta que o ofendido após a agressão ao N... dirige-se ao recorrente, 11 - Este facto é suficiente para dar credibilidade à versão do recorrente, que perante a agressão de que o seu amigo foi vitima pensou que também iria ser agredido, pelo que terá agido perante uma agressão iminente.
12 - Tal facto, aliado a versão do recorrente seria sempre de concluir que o recorrente agiu em legítima defesa, pelo que não se poderá considerar que este cometeu o crime de ofensa a integridade física qualificada.
13 - Violou assim o Tribunal a quo, os artigos 32º do CP, 410º n.º 2 do CPP e 32° da CRP.
14 - Mesmo que assim não se entenda, sempre se dirá, que não se encontram provadas as circunstâncias qualificativas do crime.
15 - O Tribunal a quo entende que se encontram provadas tais circunstancias, mas limita-se a fazer referencia a decisão então recorrida, 16 - Durante a audiência de discussão e julgamento várias testemunhas disseram que o ofendido subiu as escadas, entrou dentro da discoteca, foi ter com o filho à cozinha, levantou a camisa, acresce que a grande maioria das testemunhas também ficou com a ideia de que as balas não tinham atingido o ofendido, 17 - Se todas estas testemunhas não se apercebem que este foi ferido, porque motivo o recorrente tinha obrigação de se ter apercebido? A realidade é que este refere nas suas declarações, que não se apercebeu que as balas tivessem atingido o ofendido, pelo que não se pode considerar que o recorrente tinha conhecimento de que o ofendido se encontrava debilitado, 18 - Também não nos podemos esquecer que o ofendido não caiu em momento algum, pelo que o recorrente nunca se poderia ter apercebido de que este tinha sido atingido e que se encontrava indefeso.
19 - Quanto ao motivo fútil, atenta a alegada ausência de motivo, também aqui o Tribunal a quo não logrou provar tal ausência, uma vez que o recorrente, em declarações referiu os motivos da agressão, 20 - Não existindo qualquer outra versão que contradiga a do recorrente, deveria o Tribunal a quo a ter dado como provada, atendo o Princípio do in dubio pro reo.
21 - Deve assim considerar-se que também esta qualificação não se encontra demonstrada, 22 - Quanto ao facto de o meio utilizado ser particularmente perigoso e de forma insidiosa, por ter sido à traição pelas costas, também esta qualificação não se logrou provar.
23 - Mais uma vez, não existe nenhuma versão apresentada pelas testemunhas que contradiga a versão do recorrente, que referiu nas suas declarações que apenas empurrou a vítima, que nunca teve intenção de o ferir.
24 - Assim, e atento o principio de in dubio pro reo, também esta qualificação não se deve considerar como verificada, 25 - Assim se conclui, que não se verifica nenhuma das qualificações previstas nas alíneas b), d), g) e h) do artigo 132° do CP.
26 - Não existindo nenhuma das qualificações, não poderia o Tribunal a quo ter condenado o recorrente pela prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada.
27 - Assim, e mesmo que não se considere a versão do recorrente que apenas agiu em legítima defesa, então o Tribunal a quo apenas o poderia ter condenado pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143º do CP, o que implicaria uma pena concreta diferente ela aplicada.
28 - Violou assim o Tribunal a quo os artigos 146°, 132º e 143º do CP e o artigo 32° da CRP.
29 - Mesmo que as sim não se entenda, e que considerem não julgar procedentes nenhumas das alegações anteriormente referidas, sempre se dirá que a medida da pena concretamente aplicado ao recorrente é excessiva, 30 - O Tribunal a quo também não ponderou de forma...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO-
Acórdão nº 23/17.0JABRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 08 de Fevereiro de 2021
...nossos tribunais superiores, como o atestam, v.g., o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 16/09/2008, proferido no âmbito do Proc. nº 08P2491, relatado pelo Exmo. Sr. Conselheiro Henriques Gaspar, em cujo sumário se afirma: “X - Segundo a definição mais clássica de legítima defesa – a......
-
Acórdão nº 1633/08.2PBCBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 07 de Março de 2018
...2014, Almedina, pág. 1182 e acs. do STJ de 24 de Outubro de 2012, processo nº 2965/06.0TBLLF.E1 e de 16 de Setembro de 2009, processo nº 08P2491, in A prescrição do procedimento criminal é uma questão, no sentido supra exposto, e é oficioso o seu conhecimento. Dito isto. Os factos preenched......
-
Acórdão nº 1603/14.1JAPRT.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Abril de 2018
...como uma defesa de Direito contra o ilícito na pessoa do agredido”. Por sua vez, no acórdão do STJ de 16/09/2008, proferido no processo nº 08P2491, relatado pelo Conselheiro Henriques Gaspar, que passamos a citar na parte que interessa, encontram-se sintetizados, de modo exemplar, todos os ......
-
Acórdão nº 276/16.1PBTMR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 23 de Fevereiro de 2021
...Parte Especial, Tomo I, págs. 25-29; e acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 16 de Setembro de 2008, produzido no âmbito do Proc. n.º 08P2491 e do Tribunal da Relação do Porto de 26 de Abril de 2017, produzido no âmbito do Proc. n.º 2612/15.9JAPRT.P1, in No caso vertente, considerando ......
-
Acórdão nº 23/17.0JABRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 08 de Fevereiro de 2021
...nossos tribunais superiores, como o atestam, v.g., o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 16/09/2008, proferido no âmbito do Proc. nº 08P2491, relatado pelo Exmo. Sr. Conselheiro Henriques Gaspar, em cujo sumário se afirma: “X - Segundo a definição mais clássica de legítima defesa – a......
-
Acórdão nº 1633/08.2PBCBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 07 de Março de 2018
...2014, Almedina, pág. 1182 e acs. do STJ de 24 de Outubro de 2012, processo nº 2965/06.0TBLLF.E1 e de 16 de Setembro de 2009, processo nº 08P2491, in A prescrição do procedimento criminal é uma questão, no sentido supra exposto, e é oficioso o seu conhecimento. Dito isto. Os factos preenched......
-
Acórdão nº 1603/14.1JAPRT.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Abril de 2018
...como uma defesa de Direito contra o ilícito na pessoa do agredido”. Por sua vez, no acórdão do STJ de 16/09/2008, proferido no processo nº 08P2491, relatado pelo Conselheiro Henriques Gaspar, que passamos a citar na parte que interessa, encontram-se sintetizados, de modo exemplar, todos os ......
-
Acórdão nº 276/16.1PBTMR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 23 de Fevereiro de 2021
...Parte Especial, Tomo I, págs. 25-29; e acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 16 de Setembro de 2008, produzido no âmbito do Proc. n.º 08P2491 e do Tribunal da Relação do Porto de 26 de Abril de 2017, produzido no âmbito do Proc. n.º 2612/15.9JAPRT.P1, in No caso vertente, considerando ......