Acórdão nº 08P588 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Abril de 2008

Magistrado ResponsávelSANTOS MONTEIRO
Data da Resolução02 de Abril de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam em conferência na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça : AA foi condenado em processo comum com intervenção do tribunal colectivo sob o n.º 23/06 .6PQPRT , da 3.ª Vara Criminal do Porto , em 28.3.2007 , como autor material de um crime de homicídio voluntário , p . e p. pelo art.º 131.º , do CP , na pena de 12 anos de prisão .

Inconformado com o teor do decidido interpõs recurso para o Tribunal da Relação do Porto que lhe negou provimento , e seguidamente , em 3.12 .2007 , para este STJ , apresentando na motivação as seguintes conclusões : A decisão recorrida condenou o arguido como autor material de um crime de homicídio com dolo eventual .

Da matéria de facto constante dos autos pode concluir-se que o recorrente agiu com dolo , intenção de provocar ofensas corporais graves , mas já não com a intenção de tirar a vida à vítima .

Quando o recorrente saiu de casa da BB , a vítima , esta ficou desmaiada , não tendo o recorrente previsto ou se conformado com o resultado grave , que veio a ocorrer .

Não previu no envolvimento que a morte viesse a ocorrer e se haja conformado com o resultado .

A decisão padece de erro notório na apreciação da prova e de contradição insanável entre a fundamentação e entre esta e a decisão , o que decorre desde logo da leitura da decisão em recurso e as regras da experiência comum .

Estamos perante um caso de combinação de dolo e negligência , dolo quanto à ofensa e negligência quanto ao resultado .

A pena é elevada com base numa especial censurabilidade do agente , uma vez que o perigo específico se concretiza num resultado agravante , in casu a morte .

Existe agravação da pena sempre que a ofensa corporal venha a desencadear de forma não intencional o resultado .

Inexiste prova directa ou sequer indiciária para se dar como provada a intenção de matar na forma de dolo mesmo na forma de dolo eventual .

Só por se laborar nos vícios do art.º 410.º n..º 2 , do CPP , se dá como provado que o arguido representou o resultado como consequência adequada da sua conduta , a morte da vítima , conformando-se com esse resultado .

Existindo dúvidas sobre a intenção de matar sempre o tribunal devia ter recorrido ao princípio " in d u bio pr o reo " e à presunção de inocência do arguido , devendo alterar-se a decisão recorrida quanto à qualificação jurídico-penal dos factos , considerando-se a existência de dolo quanto às ofensas corporais graves e a negligência quanto à morte da BB ., condenando-se o recorrente em pena de prisão não superior a 8 anos de prisão .

Caso assim se não entenda a pena peca por excesso , ultrapassando a medida da culpa e muito embora o tribunal tenha dado como provadas circunstâncias atenuantes da culpa e da ilicitude , tais circunstâncias não foram consideradas , por isso a pena peca por excesso .

O tribunal devia ponderar as circunstâncias em que o crime foi cometido , de confronto físico , a idade do arguido , de 42 anos , ser um toxicodependente , menos capaz a nível emocional e mental com a capacidade diminuída para avaliar a ilicitude dos seus actos.

Deve , ainda , considerar-se o comportamento posterior aos factos , especialmente que o arguido deixou de consumir estupefacientes , que é licenciado em Música , lecciona e trabalha no EP .

Confessou os factos e está arrependido , tem o apoio da família o que facilitará a sua ressocialização Quando for restituído à liberdade tenciona retomar a actividade de Professor de Educação Musical .

Deve , ainda , considerar-se o dolo eventual , por se tratar de uma culpa menos intensa , e por dever de compaixão do tribunal ponderar-se todo o contexto histórico capaz de explicar o sucedido e a atenuar a sua responsabilidade Por isso a pena não deve exceder 10 anos de prisão ., violando a decisão recorrida o disposto nos artigos 14.º , 15.º , 18.º , 147.º , 40.º, 70.º e 71.º , todos do CP , bem como o princípio " in dubi o pro re o , o art.º 32.º , da CRP , 127 e 410.º n.ºs 1 e 2 , do CPP .

Na Relação o Exm.º Procurador Geral-Adjunto pronunciou-se pela confirmação do acórdão recorrido e , neste STJ , a Exm.ª Procuradora Geral-Adjunta mostrou-se sensível à redução da pena para 11 anos de prisão .

Colhidos os legais vistos , cumpre decidir , considerando que se provaram os factos seguintes : 1. Na madrugada de 17 de Janeiro de 2006, a hora não concretamente apurada, mas após as 00,20 horas e antes das 03,45 horas, o arguido , AA, dirigiu-se à residência da ofendida , BB, sita na R. ......, ..., ...º Esq., na cidade e comarca do Porto; 2. Ali chegado, pediu à BB que o deixasse pernoitar, por se ter zangado com a mãe dela; 3. Com quem era casado e residia; 4. A BB acabou por aceder, deixando-o entrar na sua residência; 5. Pese embora as relações entre ambos fossem esporádicas e caracterizadas por algum distanciamento; 6. No período de tempo compreendido entre as 05,50 horas e as 06,10 horas, no interior da residência, onde apenas se encontravam os dois, mais concretamente na sala, e por razões não concretamente apuradas, mas que se prendiam com o consumo de álcool e de estupefacientes, por parte do arguido, ambos discutiram; 7. No decorrer da discussão e em circunstâncias não concretamente apuradas, o arguido veio a agredir a BB; 8. Enquanto era agredida, ela tentava, a todo o custo, defender-se; 9. E implorava que cessasse as agressões, dizendo «não me faças mal»; 10. Ao mesmo tempo, tentava chamar a atenção dos vizinhos e de conseguir, assim, obter o seu auxílio; 11. Ainda no decurso do envolvimento físico, o arguido, a certa altura, apertou-lhe o pescoço com as mãos, com força e de forma continuada; 12. Largou-a quando se apercebeu de que estava desfalecida; 13. Deixando-a estendida no chão; 14. Logo após, foi lavar-se à casa de...

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